Acórdão nº 00309/04 de Tribunal Central Administrativo Norte, 26 de Outubro de 2006

Magistrado ResponsávelFrancisco Rothes
Data da Resolução26 de Outubro de 2006
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

1. RELATÓRIO 1.1 A Administração tributária (AT), na sequência de uma inspecção à sociedade denominada “GRALPE - LDA.” (adiante Contribuinte, Impugnante ou Recorrida) e com o fundamento que esta registou indevidamente na sua contabilidade do ano de 1997 como custo fiscal uma provisão para crédito de cobrança duvidosa o montante de esc. 3.053.776$00, pois «já poderia ter efectuado a constituição ou reforço da provisão, em exercícios anteriores a 1997, visto já terem sido reunidos os requisitos para tal, de acordo com a alínea c) do nº 1 artigo 34º do C.I.R.C.

» (() As partes entre aspas e com um tipo de letra diferente, aqui como adiante, são transcrições.

-() Como procuraremos demonstrar adiante, pese embora a Impugnante sustentar que é outra a fundamentação, foi com este fundamento que a AT procedeu à correcção da matéria tributável declarada.

) - procedeu à correcção do rendimento colectável declarado para efeitos de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC) do ano de 1997, fazendo-lhe acrescer o montante daquela provisão e, consequentemente, - liquidou adicionalmente imposto e respectivos juros compensatórios, de que resultou o montante a pagar pela Contribuinte de esc. 1.338.960$00.

1.2 A Contribuinte impugnou esta liquidação, pedindo que a mesma fosse anulada. Para tanto, alegou, em síntese, os seguintes fundamentos: - foi notificada do relatório final da inspecção para além do prazo estipulado no art. 61.º, n.º 2, do Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária (RCPIT) (() Referimo-nos à redacção inicial do preceito – o RCPIT foi aprovado pelo Decreto-Lei n.º 413/98, de 17 de Dezembro – mas rectificada nos termos da Declaração de Rectificação n.º 7-A/1999, de 27 de Fevereiro.

), e já depois da data em que foi efectuada a liquidação, o que tudo constitui vício de forma por preterição de formalidades essenciais, que determinam a anulação do acto de liquidação; - não existe a decisão prevista no art. 77.º da Lei Geral Tributária (LGT), o que também constitui vício de forma a determinar que a liquidação seja anulada; - contrariamente ao que invoca a AT como fundamento da correcção, o crédito em causa não foi reclamado judicialmente em 1993, sendo apenas que nessa data a Contribuinte incumbiu um gabinete de advogados na Alemanha «de promover diligências para cobrança», o que não integra a previsão da alínea b) do art. 43.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (CIRC); - «só veio a constituir a provisão no ano de 1997, porquanto, face à ausência de informações sobre os resultados de tais diligências e de expectativas sérias de cobrança, se mostrou então justificado o risco de incobrabilidade».

1.3 A Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel proferiu sentença na qual deixou dito: - «No que tange ao prazo previsto no nº 2 do art. 61 do RCPIT, a sua natureza é meramente ordenadora ou disciplinadora, não inquinando como tal o procedimento de qualquer vício»; - «Relativamente ao facto de a notificação da liquidação ter sido efectuada antes da notificação do relatório, tal não se mostra provado, antes resulta, como provado que a notificação da liquidação foi emitida em 25 de Maio de 2001 e expedida com data de registo do CTT a 29/05/2001, pelo que resulta prejudicada a alegação da impugnante»; - «[...] no que concerne à violação do art. 77º da LGT afigura-se que tal vício também não pode ser assacado ao acto em causa, porquanto ao mandar prosseguir o procedimento mostra-se provada de forma sumária a concordância com o mesmo»; e, de seguida, relativamente à não aceitação da provisão pela AT: «Invoca a impugnante que só no ano de 1997 deu como incobrável a dívida, e que o número de processo referido na alínea h) da matéria dada como provada se refere ao número interno dado no gabinete de advogados na Alemanha ao processo, e não a um número de processo em Tribunal.

Era incumbência da impugnante fazer prova dessa alegação, sendo certo que através do depoimentos das testemunhas que apresentou a mesma resulta provada, pois ambas as testemunhas corroboram a posição defendida pela impugnante.

Assim, resulta claro dos depoimentos que não foi instaurada qualquer acção para cobrança do crédito (adiantamento para compra de uma máquina industrial), e que só no ano de 1997 a impugnante foi informada que a máquina em causa não iria ser fornecida nem o montante adiantado seria restituído.

Assim sendo, a constituição da provisão no exercício referente ao ano de 1997 afigura-se como legal, dado que só nesse ano o montante se mostrou incobrável».

Concluiu, na procedência deste último fundamento, pela anulação do acto impugnado.

1.4 Inconformada com essa sentença, a Fazenda Pública dela recorreu para este Tribunal Central Administrativo Norte e o recurso foi admitido, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito devolutivo.

1.5 O Representante da Fazenda Pública junto do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto apresentou as alegações de recurso, que resumiu em conclusões do seguinte teor, que se transcrevem ipsis verbis: « 1. A questão controvertida nestes autos é a de saber se a impugnante podia considerar como custo fiscal do exercício de 1997, provisões para créditos de cobrança duvidosa referentes a créditos reclamados extrajudicialmente em 1993, ou se deveria ter constituído a respectiva provisão e considerado custo fiscal, neste referido exercício de 1993.

2. Entendeu o tribunal que não foi instaurada qualquer acção para cobrança do crédito (...) e que só no ano de 1997 a impugnante foi informada de que a máquina em causa não iria ser fornecida nem o montante adiantada restituído.

Contrariamente defende-se que a Administração Tributária ao efectuar a correcção ao rendimento tributável declarado do exercício de 1997, por não consideração como custo fiscal das provisões ora em causa, actuou de conformidade com os critérios objectivamente definidos na lei.

3. Segundo o Plano Oficial de Contabilidade (POC), a constituição de provisões deve respeitar apenas às situações a que estejam associados riscos e em que não se trate apenas de uma simples estimativa de um passivo certo.

4. Na base desta consideração, estão os princípios contabilísticos da especialização dos exercícios e da prudência, porquanto se pretende que a contabilidade traduza uma imagem verdadeira e apropriada da situação financeira e dos resultados das operações da empresa.

5. Atentos estes princípios, e procurando uniformizar a fiscalidade e a contabilidade, o legislador fixou, nos art. 33º e 34º do CIRC, na redacção vigente à data, regras precisas e objectivas quanto à constituição ou reforço das provisões para créditos de cobrança duvidosa, fiscalmente dedutíveis, as quais se aplicam no caso concreto: Þ Os créditos resultam da actividade normal da empresa, Þ No fim do exercício os créditos possam ser considerados de cobrança duvidosa, Þ Que os mesmos estejam evidenciados como tal na contabilidade, Þ São créditos de cobrança duvidosa aqueles em que o risco de incobrabilidade se considera devidamente justificado, Þ Este risco considera-se devidamente justificado relativamente aos créditos que estejam em mora há mais de seis meses e existam provas de terem sido efectuadas diligências para o seu recebimento.

6. O tribunal deu como provado que os créditos de cobrança duvidosa para os quais foram constituídas provisões no exercício de 1997, consequentemente consideradas pela impugnante como custo fiscal neste exercício, foram reclamados extrajudicialmente em exercício anterior, mais concretamente em 1993.

7. No cumprimento dos normativos atrás citados, e no respeito pela periodização do lucro tributável definida no art. 18º n.º 1 do CIRC, a impugnante deveria ter registado nas contas apropriadas o crédito de cobrança duvidosa e constituído a respectiva provisão em 1993, para ser fiscalmente aceite como custo nesse exercício, na medida em que nesse ano foi reclamado extrajudicialmente, consequentemente, foi nesse ano que o risco de incobrabilidade de tal crédito se verificou devidamente justificado, face ao disposto no art. 34º n.º 1 alínea c) do CIRC, não podendo retardar a constituição das provisões para o exercício de 1997, por não terem ocorrido os condicionalismos inerentes à sua aceitação como custo fiscal.

8. Se a incobrabilidade dos créditos não se verificar, as provisões constituídas com o fim de precaver esse risco, são anuladas por transferência para a conta de resultados, tendo em vista a sua tributação como proveitos do exercício, na esteira do que preconiza o n.º 2 do art. 33º do CIRC, relativamente às provisões que não devam subsistir por não se terem verificado os eventos a que se reportam.

9. A doutrina vigente é no sentido de que a constituição da provisão é obrigatória para o contribuinte que dela se pretende aproveitar, e também no sentido de que tem de ser inscrita como tal no primeiro exercício em que ocorreram os pressupostos previstos na lei.

10. Para que a constituição, em 1997, dos créditos de cobrança duvidosa em causa nestes autos, fosse aceite como custo fiscal, teria de ser demonstrado e provado pela impugnante, pois que tal ónus lhe cabe, face ao disposto no art. 342º do CC, e hoje, art. 74º da LGT, que o risco de incobrabilidade se verificou nesse exercício, o que não logrou fazer, carecendo de qualquer suporte legal a constituição e consideração como custo fiscal de provisões constituídas quatro anos depois de terem sido reclamados extrajudicialmente os respectivos créditos.

11. Esta reclamação extrajudicial do crédito constitui um indício seguro e corresponde a um critério objectiva e legalmente definido, de que nesse momento os créditos foram tidos pela impugnante como de cobrança duvidosa, tanto bastando para legitimar a actuação da Administração Tributária no sentido das correcções técnicas que se impunham ao resultado tributável do exercício de 1997.

12. Ao não decidir desta forma, a douta sentença recorrida violou as disposições legais supra...

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