Acórdão nº 0120/08 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 10 de Setembro de 2008

Magistrado ResponsávelSÃO PEDRO
Data da Resolução10 de Setembro de 2008
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na 1.ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo 1.

Relatório 1.1. A A... interpôs RECURSO CONTENCIOSO DE ANULAÇÃO da deliberação do CONSELHO DE JUSTIÇA DA FEDERAÇÃO PORTUGUESA DE FUTEBOL, que manteve a deliberação da Direcção da FPF que a classificou em décimo quinto lugar do campeonato da III Divisão de Futebol, Série E, relativamente à época desportiva de 2002/2003, e em consequência, consumou a sua descida ao Campeonato Regional da Madeira de Futebol (I divisão). Indicou como contra-interessados os 17 clubes que integravam a referida Série E, da III Divisão de Futebol.

1.2. Em 5-1-2006, foi proferida decisão sobre a questão prévia da falta de competência dos Tribunais do Estado.

Decidiu-se julgar o Tribunal competente.

1.2.1. Dessa decisão foi interposto recurso pelo Conselho de Justiça da Federação Portuguesa de Futebol que, após reclamação para o Ex.mo Sr. Presidente do Tribunal Central Administrativo - Sul, veio a ser admitido.

Terminou as alegações, formulando as conclusões seguintes: I. A decisão do tribunal a quo assentou numa errada interpretação da Lei de Bases do Sistema Desportivo, Lei 1/90 de 13 de Janeiro; II. O legislador entendeu quando aprovou a LBSD (Lei 1/90) que as especificidades existentes no desporto não se coadunam com o recurso para os tribunais em matérias que, pela sua natureza, devam ser decididas por instâncias disciplinares e jurisdicionais das federações que regem a mesma modalidade; III. Assim também entendeu o STJ, em douto Ac. de 18 de Abril de 1991; IV. A Lei 1/90, estabelecia, no seu art. 25°, n° 2, que «as decisões e questões estritamente desportivas que tenham por fundamento a violação de normas técnicas ou de carácter disciplinar não são impugnáveis fora das instâncias competentes na ordem desportiva».

V. Também o Tribunal Constitucional definiu como estritamente desportivas as decisões e deliberações que «tenham por fundamento a violação de normas de natureza técnica ou de carácter disciplinar», em doutos Acs. 473/98 e 488/98, I série, n° 284, de 10 de Dezembro.

VI. As federações detêm o poder, que lhes foi legalmente concedido, de elaborar e aprovar os regulamentos de natureza disciplinar, provas e arbitragem e das demais matérias estabelecidas na Lei, detendo ainda o poder público para aplicar e fazer cumprir essas mesmas leis.

VII. No entanto, a norma que prevê a desclassificação e seus efeitos foi aprovada pela Assembleia-Geral da Federação Portuguesa de Futebol e faz parte integrante do regulamento Disciplinar da mesma Federação.

VIII. É uma norma de natureza disciplinar e, como tal, reveste natureza de "questão estritamente desportiva", face ao disposto na LBSD, LBD e Regime Disciplinar das Federações.

IX. Por outro lado, os efeitos da desclassificação são aplicáveis a todos os intervenientes na prova, de forma a salvaguardar o princípio da igualdade desportiva.

X. Assim, a deliberação do Conselho de Justiça da Federação Portuguesa de Futebol que pune um clube com desclassificação, à luz da anterior Lei de Bases - Lei 1/90 - aplicável à data dos factos, é uma questão estritamente desportiva e, como tal, inimpugnável nos termos gerais do direito.

XI. A actual Lei de Bases, a Lei 30/2004 em nada altera este entendimento, apenas vem balizar o que se entende por questão estritamente desportiva, na qual se incluem as normas disciplinares.

1.3. Foi proferida sentença em 5-12-2006, declarando nula a deliberação/acórdão impugnado.

1.3.1. Da mesma sentença foram interpostos recursos pelo Ministério Público e pela entidade recorrida (Conselho de Justiça da Federação Portuguesa de Futebol).

1.3.1.1. O Ministério Público terminou as suas alegações de recurso, com as seguintes conclusões:

  1. O objecto do presente recurso é o de ter sido julgado procedente o Recurso Contencioso de Anulação apresentado por A..., relativamente à decisão do Conselho de Justiça da Federação Portuguesa de Futebol, que decidiu manter a deliberação da Direcção da FPF, que ordenou a reclassificação da Zona E, da III Divisão Nacional, na sequência da decisão do Conselho de Justiça que condenou o Clube Desportivo B... na pena de desclassificação e multa de cinco mil euros, pela prática da infracção prevista e punida pelo art.° 52, n.° 1 e 3, com referência ao art.° 38, n.° 1, al. a), b) e d), ambos do R. D..

  2. Resulta do processo disciplinar n.° ..., (Processo instrutor) instaurado contra Clube Desportivo B... que o Conselho de Disciplina da FPF, por acórdão de 04 de Julho de 2003, puniu o clube arguido com a pena de desclassificação e multa de 5.000,00€ e, "in fine" o seguinte: "Notifique-se por fax os clubes SPG C..., ACD A... e AC. D..., por serem os únicos a quem a decisão pode interessar, uma vez que implica a alteração na sua classificação, devendo essa notificação ser levada em conta na contagem para os mesmos do prazo do eventual recurso".

  3. O acórdão do Conselho de Disciplina foi notificado por fax, à Associação Cultural e Desportiva A..., no dia 4-7-2003, às 17.12 horas (cfr fls. 223 e 224 do processo disciplinar n.º ...); D) Ao tomar conhecimento do acórdão do Conselho de Disciplina o Presidente da Direcção da A. C. D. A..., ficou a saber e a conhecer a pena aplicada ao Clube Desportivo B..., assim como os efeitos da desclassificação deste clube e ainda que a classificação do seu clube iria ser alterada, resultando dessa alteração a despromoção do seu clube aos Campeonatos Distritais da Associação Regional da Madeira.

  4. Apesar disso, não recorreu do acórdão do Conselho de Disciplina para o Conselho de Justiça, (último grau de jurisdição dos órgãos jurisdicionais da FPF), conformando-se com a decisão que desclassificou o "C. D. B...", restando-lhe, agora, aceitar a decisão da Direcção da FPF.

  5. Contudo, o recurso interposto pelo C. D. B... para o Conselho de Justiça, ainda poderia aproveitar o aqui recorrente.

  6. Acontece que, o Conselho de Justiça confirmou o acórdão do Conselho de Disciplina, mantendo assim a desclassificação do B... e a despromoção aos Campeonatos Regionais do ora recorrente, face ao resultado do jogo disputados entre ambos os clubes. (cfr. fls. 262 e ss. do processo disciplinar n.° ...-2002/2003, Proc. n.º 1 - C.J. 2003/2004, do Processo Instrutor).

  7. Tal acórdão transitou em julgado, de imediato, por ser insusceptível de recurso.

  8. O acórdão do Conselho de Justiça foi comunicado à Direcção da FPF, que solicitou ao Departamento de Registos e Competições que elaborasse nova tabela classificativa da Série E, do C. N. da III Divisão, em função do resultado dos jogos, tendo em atenção a desclassificação do Clube Desportivo B... e os seus efeitos.

  9. Elaborada a tabela classificativa, a Direcção da FPF, através de Comunicado Oficial homologou os resultados dessa série e, em consequência a tabela classificativa.

  10. Dessa deliberação da Direcção da FPF, que homologou os resultados e a tabela classificativa o recorrente interpôs recurso para o Conselho de Justiça.

  11. A deliberação da Direcção só seria susceptível de recurso para o Conselho de Justiça se o acórdão desse órgão não estivesse a ser cumprido ou se estivesse a ser mal cumprido, "maxime" se a tabela classificativa estivesse mal ordenada.

  12. Não é o caso dos autos e essa deliberação é irrecorrível, uma vez que a deliberação apenas dá cumprimento a um acórdão transitado em julgado, por ser o único órgão que cumpre e faz cumprir as decisão dos Conselhos Jurisdicionais quando está em causa homologação dos Campeonatos organizados pela própria FPF.

  13. O que a A. C. D. A... devia ter feito, era atacar nos tribunais, não o acórdão do Conselho de Justiça que confirmou a deliberação da Direcção, mas sim o acórdão do Conselho de Justiça que confirmou o acórdão do Conselho de Disciplina, em que foi recorrente o Clube Desportivo B..., admitindo que o recurso interposto aproveita ao recorrente como parte interessada.

  14. Esse acórdão é única decisão dos órgãos da Federação Portuguesa de Futebol que produziu efeitos jurídicos na A.C. D. A....

  15. Andou mal o recorrente.

  16. Atacou o acórdão errado.

  17. Por sua vez, andou bem a FPF que deu integral cumprimento ao que foi decidido no acórdão do Conselho de Justiça.

  18. Na douta sentença faz-se referência ao art.° 38.° do R. D. da FPF e conclui-se que a desclassificação é um acto nulo, porque ocorreu após o fim do campeonato, pelo que tais normas não são de todo aplicáveis e que, caso fossem aplicáveis, são irrazoáveis, desproporcionadas, absurdas, ilógicas e infundadas.

  19. Os factos que levaram à instauração do processo de averiguações contra o Clube Desportivo B... e o árbitro E... ocorreram no dia 19 de Janeiro de 2003, por ocasião do jogo n.° 135 157, disputado nesse dia, no Estádio do C. D. B..., no Funchal, entre as equipas representativas do Clube Desportivo B... e o S. C. F..., a contar para o Campeonato Nacional de III Divisão, Série E. (cfr. fls. 10 do Processo Disciplinar n.° ...- P. Instrutor).

  20. Concluído o processo de averiguações, foi o mesmo transformado em processo disciplinar contra o Clube e o árbitro do encontro. (cfr. fls. 102 a 108 do Proc. disciplinar n.° ... do P. Instrutor) V) Por decisão do Conselho de Disciplina da FPF, datada de 04 de Julho de 2003, foi o Clube Desportivo B... condenado na pena de desclassificação e na multa de 5.000,00€ (cfr. fls. 209 a 216 do Processo Disciplinar n.° ... - P. Instrutor).

  21. Inconformado com esse acórdão veio o C. D. B... interpôr recurso para o Conselho de Justiça que confirmou a decisão do Conselho de Disciplina. (cfr. fls. 261 a 265, do Processo disciplinar n.° ...- P. 1. anexo).

  22. É óbvio que estamos perante factos que ocorreram durante e por causa dos jogos disputados na Série E, do C. N. da III Divisão.

  23. É ainda mais óbvio que a conclusão do processo de averiguações, as quatro fases do processo disciplinar (instrução, acusação, defesa e decisão) e finalmente o recurso para o Conselho de Justiça e posteriormente a deliberação da Direcção que cumpriu o acórdão do Conselho de Justiça, levou o seu tempo.

  24. Por...

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