Acórdão nº 08S2057 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 29 de Abril de 2009

Magistrado ResponsávelSOUSA PEIXOTO
Data da Resolução29 de Abril de 2009
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam, em conferência, na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: 1. AA, recorrido nos autos, veio: (i) ao abrigo do disposto nos artigos 668, n.º 1, alíneas b, c), d) e 669.º do Código de Processo civil, arguir a nulidade do acórdão e requerer o seu esclarecimento e reforma; (ii) requerer novo julgamento no tribunal a quo, nos termos do n.º 3, do artigo 729.º, do CPC, por considerar que se apresenta incompleta e contraditória a matéria de facto; (iii) requerer revista ampliada, com intervenção do Plenário da Secção Social, por tal se revelar necessário e conveniente para assegurar a uniformidade da jurisprudência (artigo 732.º-A, n.º 1, do CPC); (iv) arguir a inconstitucionalidade de diversas normas, quando interpretadas nos termos em que o fez o acórdão reclamado.

Alegou, em resumo, o seguinte: - «Mais do que saber se era líquida ou não a quantia a pagar, a MAKRO pagou mal ao Fisco deduzindo erradamente, o trabalhador não recebeu tal dinheiro mas o errado pagamento a um terceiro foi considerado liberatório, e a Justiça aplaude, com o descanso que, se foi mal pago, caberá demanda judicial tributária contra o Fisco, não timonada pelo mal--pagante mas sim pelo empobrecido (sem causa) aqui reclamante»; - «por isso, padece de Nulidade o Acórdão em crise porquanto deixou de "pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar" e que era apurar se (...) quem pagou ao Fisco, pagou bem, i.é., liberatoriamente - primeira parte da alínea d) do n.º 1 e ainda alíneas b) e c) desse número do art. 668.º do CPC»; - a tarefa do STJ de apurar a vontade das partes e sua convicção, aquando da celebração da transacção judicial, configura matéria de facto, porquanto não se trata de «recorrer a uma disposição legal» nem cuida «da interpretação de uma simples palavra da lei»; - daí que o Supremo ao alterar o entendimento do acórdão recorrido quanto à vontade das partes, conheceu de «questões de que não podia tomar conhecimento», cominada com a nulidade pelas alíneas d), b) e c) do n.º 1 do art. 668.º do CPC; - a não se entender que o acórdão é nulo, sempre se imporá novo julgamento no tribunal a quo, tendente a apurar a vontade das partes, uma vez que a matéria de facto se apresenta incompleta e contraditória; - declaradas as nulidades, mas entendendo-se não ser de baixar os autos à 2.ª instância, deverá, nos termos dos artigos 732.º-A e 762.º, n.º 3, 2.ª parte, do CPC, proceder-se a julgamento ampliado, com intervenção do Plenário da Secção Social do STJ, para assegurar a uniformidade de jurisprudência, uma vez que o acórdão se encontra em contradição com os acórdãos deste tribunal de 10-03-2005 (Revista n.º 4457/04) e 15-11-2006 (Revista n.º 1537/06), acórdãos estes proferidos no domínio da mesma legislação, que não põe em causa, directa ou indirectamente, a questão de direito de que se pretende ver fixada jurisprudência, isto é, se a quantia a pagar objecto da transacção era líquida ou ilíquida de impostos e contribuições; - é inconstitucional, por violação do disposto no art. 103.º da Lei Fundamental, a interpretação dada pelo acórdão reclamado às normas do n.º 3, alínea e) e n.º 4, do artigo 2.º, da alínea b) do n.º 1, do artigo 9.º, ambos do CIRS, do n.º 1, do art. 919.º do CPC, dos art.ºs 767.º e 769.º do CC; - a interpretação que o acórdão reclamado faz das diversas normas é, ainda inconstitucional, por violação do disposto nos art.ºs 11.º, 25.º, 26.º, 59.º e 210.º da Lei Fundamental.

A reclamada/recorrente pronunciou-se no sentido do indeferimento do requerido.

Posteriormente, a fls. 713-714, e quando o processo já estava inscrito para conferência, o recorrido veio com novo requerimento, alegando, em resumo, o seguinte: - nos termos conjugados do art.º 87.º, n.º 2, do CPT e do art.º 728.º do CPC, o acórdão de fls. 641-655 tinha de ser tirado por unanimidade ou, havendo um voto de vencido, pela maioria de três votos em cinco, o que não aconteceu; - com efeito, a afirmação feita no n.º 2 do seu art.º 87.º do CPT de que "o Supremo Tribunal de Justiça tem os poderes estabelecidos no Código de Processo Civil" prende-se não só com os termos em que julga (art.º 729.º do CPC), mas também com os poderes de cada um dos juízes que constitui o tribunal de revista, porquanto tal questão influi manifestamente nos poderes do STJ e na forma de julgamento do recurso; - por via disso, o regime supletivo do CPC aplicável à revista ex vi CPT inclui o regime do art.º 728.º do CPC; - o entendimento preconizado no acórdão em crise é diverso e espelha uma corrente doutrinária que se sabe ser nova no seio da Secção Social do STJ, com a qual não podemos concordar, porquanto configura uma preterição dos direitos do trabalhador no acesso pleno ao duplo grau de jurisdição, estabelecendo uma distinção incompreensível quanto aos poderes dos juízes da Secção Social comparativamente com os juízes das demais secções do STJ; - sabendo o recorrente de antemão que o vício em questão não será atendido, não deixa, no entanto de o arguir, devendo ser proferido novo acórdão nos termos do art.º 728.º do CPC, que confirme a decisão da 2.ª instância; - para além disso, é inconstitucionalidade a interpretação dada pelo Acórdão reclamado ao n.º 2 do art.º 87.º do CPT e aos artigos 26.º, 36.º, alínea i), 37.º e 56.º, n.º 1, alíneas a) e j), da LOFTJ, quando interpretadas no sentido de que, em processo laboral, não tem aplicação o regime do art.º 728.º do CPC, uma vez que tal interpretação viola o princípio constitucional da separação de poderes ínsito no art.º 11.º da CRP e a previsão constitucional de que "O Supremo Tribunal de Justiça funcionará como tribunal de instância nos casos que a lei determinar, prevista nos n.os 4 e 5 do art.º 210.º da CRP.

Na resposta, a recorrente/ré alegou que o entendimento perfilhado pelo recorrido/autor acerca da aplicação do disposto no art.º 728.º do CPC não podia ser atendido, uma vez que actualmente, para haver vencimento quanto ao objecto do agravo no Supremo bastam dois votos conformes (artigos 709.º, n.º 5, 749.º e 762.º, n.º 1 do CPC) e não três como na revista; que, ainda que assim não se entendesse, estar-se-ia perante uma mera irregularidade ou nulidade secundária, que devia ter sido arguida no prazo de 10 dias, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 205.º e 153.º do CPC, o que não sucedeu; que do acórdão em apreço não cabe recurso ordinário, pelo que o poder jurisdicional do Supremo se esgotou com a prolação do mesmo, excepto no que toca a eventuais nulidades, não sendo, por isso, admissível a arguição de inconstitucionalidades.

Cumpre apreciar e decidir.

  1. Do requerimento de fls. 670-681 2. 1 Da omissão de pronúncia Como se deixou referido, o reclamante/recorrido, veio, desde logo, arguir a nulidade do acórdão, por omissão de pronúncia, por alegadamente não se ter pronunciado sobre a questão de saber se a recorrente lhe deduziu indevidamente IRS, que indevidamente também teria entregado ao Fisco.

    Tal questão, na perspectiva do reclamante, é mais importante do que saber se a quantia objecto de transacção era líquida ou ilíquida.

    De acordo com o disposto no artigo 668.º, n.º 1, alínea d), do Código de Processo Civil, é nula a sentença - ou o acórdão, por remissão do art. 716.º do CPC - «quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento».

    Esta invocada nulidade encontra-se directamente relacionada com o estatuído no art.º 660.º, n.º 2, do CPC, nos termos do qual «o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras».

    Impõe-se, pois, nos termos dos normativos legais indicados, que o juiz resolva todas as questões que as partes tiverem submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras.

    Porém, como observa Alberto dos Reis - (1), «(...) uma coisa é o tribunal deixar de pronunciar-se sobre questão que devia apreciar, outra invocar razão, boa ou má, procedente ou improcedente, para justificar a sua abstenção».

    E, mais adiante, aquele autor acrescenta: «são, na verdade, coisas diferentes: deixar de conhecer de questão de que devia conhecer-se, e deixar de apreciar qualquer consideração, argumento ou razão produzida pela parte. Quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão».

    Também sobre a fundamentação jurídica da sentença, escreve Antunes Varela- (2): «Por um lado o julgador não tem que analisar todas as razões jurídicas que cada uma das partes invoque em abono das suas posições, embora lhe incumba resolver todas as questões suscitadas pelas partes; a fundamentação da sentença contenta-se com a indicação das razões jurídicas que servem de apoio à solução...

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