Acórdão nº 142/15 de Tribunal Constitucional (Port, 03 de Março de 2015

Magistrado ResponsávelCons. João Pedro Caupers
Data da Resolução03 de Março de 2015
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 142/2015

Processo n.º 298/14

  1. Secção

Relator: Conselheiro João Pedro Caupers

Acordam na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional:

I – Relatório

  1. Por despacho da 1.ª instância foi revogada a suspensão da pena de 4 meses de prisão em que fora condenado o arguido A..

    Na sequência deste despacho, o arguido requereu que lhe fosse autorizado o cumprimento da pena de prisão em regime de permanência na habitação ou, se o tribunal assim não entendesse, em regime de prisão por dias livres, o que foi indeferido por despacho de 2 de outubro de 2012.

    O arguido recorreu para a Relação da Relação de Guimarães que, por Acórdão de 18 de novembro de 2013, julgou improcedente o recurso, confirmando o despacho recorrido.

    O arguido interpôs recurso deste acórdão para o Supremo Tribunal de Justiça. Esse recurso não foi admitido, por despacho que considerou o acórdão insuscetível de recurso para este Tribunal, nos termos artigos 432.º, n.º 1, alínea b) e 400.º, n.º 1, alínea c), do Código de Processo Penal (“CPP”), por o Acórdão da Relação não ter conhecido do mérito da causa.

  2. Tendo o arguido reclamado deste despacho, ao abrigo do artigo 405.º do CPP, o Vice-Presidente do Supremo Tribunal de Justiça proferiu, em 20 de fevereiro de 2014, a seguinte decisão:

    (…)

    1 - O reclamante veio interpor recurso para o Supremo Tribunal de Justiça do Acórdão do Tribunal da Relação que julgou improcedente o recurso interposto do despacho da 1ª instância que indeferira o cumprimento da pena de prisão em regime de permanência na habitação ou, se o tribunal assim não entendesse, em regime de prisão por dias livres.

    A alínea c) do n.º 1 do art. 400.º do CPP, estabelece serem irrecorríveis «os acórdãos proferidos, em recurso, pelas relações, que não conheçam, a final, do objeto do processo».

    O objeto do processo penal é delimitado pela acusação ou pela pronúncia e constitui a definição dos termos em que vai ser julgado e decidido o mérito da causa – ou seja, os termos em que, para garantia de defesa, possa ser discutida a questão da culpa e, eventualmente, da pena.

    No caso concreto, o Acórdão de 18 de Novembro de 2013 de que o reclamante pretende recorrer proferido em instância de recurso, não conheceu do objeto do processo, por não ter julgado do mérito da causa, mas antes conhecido de uma questão suscitada já depois da decisão final.

    Assim, não é o recurso admissível ao abrigo da alínea c) do n.º 1 do art. 400.º do CPP, tal como foi decidido.

    2 - O reclamante invoca que a não admissão do recurso constitui uma grave violação dos arts. 20.º, 29.º, 32.º, 202.º e 205.º da CRP e o art. 6.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem.

    Não é de conhecer desta questão, já que não existem decisões inconstitucionais.

    Tal vício só pode reportar-se a uma norma, seu segmento ou interpretação quando aplicadas e sendo (ratio decidendum) na decisão posta em crise.

    Suscita ainda a inconstitucionalidade da norma da alínea c) do n.º 1, do art. 400.º do CPP, quando interpretada no sentido de não haver recurso para o Supremo Tribunal de Justiça de Acórdão da Relação que não conhece do mérito da causa, por violação do art. 32.º, n.º 1, da CRP.

    Mas sem razão.

    O direito ao recurso não é absoluto, tanto mais nos casos em que a questão já foi apreciada em duas instâncias.

    E cada vez mais se acentua a tendência para considerar o Supremo Tribunal de Justiça com vocação de Juízo de revista tendo como escopo primeiro o uniformizar jurisprudência.

    Por outro lado, o art. 32.º, n.º 1, da CRP, que inscreve o direito ao recurso como uma garantia de defesa do processo criminal, que é de considerar exercido para efeitos constitucionais com o julgamento em segundo grau de jurisdição, como ocorreu no caso.

    Com efeito, no caso, houve duplo grau de jurisdição sobre a questão suscitada - a decisão de que se pretende recorrer decidiu o objeto que lhe foi definido relativamente à decisão da 1.ª instância impugnada.

    3 - Do exposto, resulta que indefiro a reclamação.

  3. É desta decisão que vem interposto o presente recurso, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do art.º 70.º da Lei da Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional (LTC), visando a apreciação da constitucionalidade da norma constante do artigo 400.º, n.º 1, alínea c), do Código de Processo Penal (CPP), na interpretação normativa da decisão reclamada, no sentido de «entender que não é admissível recurso para o Supremo Tribunal de Justiça de Acórdão da Relação que não conhece do mérito da causa».

    Tendo o recurso sido admitido e prosseguido para alegações, o recorrente concluiu da forma seguinte:

    A. A interpretação da referida norma no sentido de entender que, não é admissível recurso para o Supremo Tribunal de Justiça de Acórdão da Relação que não conhece o mérito da causa, viola os princípios constitucionais do Estado de Direito Democrático, os mais elementares direitos e garantias de defesa do arguido, constitucionalmente consagrados nos artigos 20º, 29º, 32º, 202º e 205º da Constituição da República Portuguesa.

    B. É manifestamente inconstitucional o critério normativo aplicado na decisão recorrida, segundo o qual não cabe recurso para o Supremo Tribunal de Justiça de Acórdão do Tribunal da Relação, que não conheça o mérito da causa.

    C. Tal entendimento, traduz um encurtamento inadmissível das possibilidades de defesa do arguido, e dele decorre violação do princípio das garantias de defesa, incluindo o direito ao recurso.

    D. Com efeito, e salvo douto entendimento em contrário, a não admissão do recurso, constitui grave violação dos princípios constitucionais que impõe ao processo criminal assegurar todas as garantias de defesa do arguido, concretamente o que se dispõe no artigo 20º, 29, 32º, 202º e 205º da CRP e até o que se dispõe no artigo 6º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem.

    E. O ora RECORRENTE/ARGUIDO, entende, salvo o devido respeito por opinião em contrário que aquele critério, ao considerar irrecorrível uma decisão proferida pelo Tribunal da Relação, que não conheceu o mérito do processo, não assegura plenamente a garantia efetiva de direito ao recurso consagrada no artigo 32º n.º1 da Lei Fundamental Portuguesa.

    F. É totalmente inconstitucional o entendimento plasmado na decisão recorrida de que se mostra indiferente para a plenitude daquela garantia constitucional, ou seja o efetivo direito ao recurso.

    E. A decisão proferida pelo Venerando Supremo Tribunal de Justiça, é uma decisão assente em critérios absolutamente formais.

    G. Perante direitos de defesa, as meras rejeições formais que limitam intoleravelmente, dificultam excessivamente, impõem entraves burocráticos ou restringem desproporcionadamente o direito ao recurso, não podem ser admissíveis

    H. Por isso e em sede interpretativa do citado artigo 400.º, n.º 1, c), do CPP, afigura-se- nos que está vedado um entendimento ou interpretação mediante o qual se fixem preceitos tão restritivos...

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