Acórdão nº 0912/08 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 07 de Janeiro de 2009
Magistrado Responsável | SÃO PEDRO |
Data da Resolução | 07 de Janeiro de 2009 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam na 1ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo 1. Relatório A..., recorreu para este Supremo Tribunal do acórdão proferido no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto que julgou improcedente a ACÇÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL de impugnação de acto administrativo em matéria de contencioso pré-contratual, por si intentada contra o MUNICÍPIO DE VILA NOVA DE GAIA.
Terminou as suas alegações com as seguintes conclusões: 1. Vem o presente recurso interposto da douta decisão proferida em 9 de Julho de 2008 pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto que julgou improcedente a acção intentada pela Autora, ora Recorrente, e, em consequência, manteve o acto administrativo de 27 de Julho de 2007, consubstanciado no Despacho de Anulação do procedimento relativo ao Concurso Público Internacional para "Concessão do Serviço Público de Gestão e Exploração de Complexo Funerário Municipal", publicado no Suplemento ao Jornal Oficial das Comunidades Europeias, de 8 de Junho de 2007 (JO/S 5/08, de 08/06/2007, l33452-2007-PT, 1/3) e na II Série do Diário da República, de 18 de Junho de 2007 (DR II Série n° 115, de 18-06-2007, 16892), proferido pelo Presidente da Câmara de Vila Nova de Gaia em exercício (Dr. ...).
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Andou mal o Tribunal a quo, cuja decisão aqui recorrida, e sob censura, com o mui devido respeito, sempre terá que ser revogada, porque ferida de nulidade, desde logo por falta de fundamentação e por omissão de pronúncia, nos termos do disposto no art. 668°, n° 1, alíneas b) e d), primeira parte, do Código de Processo Civil [CPC], aplicável por força do art. 1° do Código de Processo nos Tribunais Administrativos [CPTA].
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Além disso, e se assim não se entender, sem conceder todavia no atrás alegado, sempre a decisão recorrida é nula, por oposição dos fundamentos à decisão, ao abrigo da alínea c) do supra citado art. 668°, n° 1, termos em que deverá ser suprida subsidiariamente.
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Com efeito, a decisão recorrida é nula porque não fundamentada.
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O Tribunal a quo deveria ter especificado, mediante indicação concreta das provas, os fundamentos que foram decisivos para a sua convicção e, bem assim analisar criticamente as provas indicadas, o que não fez.
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O Tribunal a quo deveria ter igualmente especificado, quais os fundamentos de direito, o que não fez, pelo que não se depreende a motivação do decidido.
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A decisão recorrida afigura-se pois absolutamente omissa quanto aos motivos da decisão, seja no que respeita à factualidade em que se baseia, seja quanto às razões jurídicas que suportam o julgamento.
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Sendo certo que o caso sub iudice consubstancia um caso de anulação do procedimento e não de adjudicação, sempre a Recorrente, defendeu que os requisitos do artigo 58º do Decreto-Lei n° 197/99 de 8 de Junho, então invocados no despacho impugnado, nunca se mostraram nem se mostram minimamente preenchidos.
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Desde logo porque não ocorreu nenhuma circunstância imprevisível, considerando que as alegadas "inovações" invocadas no impugnado despacho, são anteriores à abertura do próprio concurso, mas também porque o facto de apenas uma única entidade [a Recorrente] ter participado no concurso está longe, evidentemente, de preencher os pressupostos da alínea a) do aludido artigo 58° do Decreto-Lei n° 197/99 de 8 de Junho.
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Para além de que não surgiram quaisquer "outras razões supervenientes", pelo contrário, resulta claro, que se mantém intacto, o mesmo interesse público que justificou à data a abertura do procedimento inicial, tanto que o Município de Vila Nova de Gaia voltou a lançar novo procedimento para a mesma concessão [Concessão do Serviço Público de Gestão e Exploração do Complexo Funerário Municipal] cfr. Publicação no Diário da Republica, 2ª Série, n° 66, de 03/04/2008 e no Jornal Oficial das Comunidades Europeias n°s 62 de 29.03.2008.
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E ao qual - sublinhe-se - a Recorrente, para a cabal protecção dos seus direitos e legítimos interesses não deixou de apresentar a sua candidatura e bem assim a sua proposta, pese embora, sob reserva nos termos e para os efeitos previstos no art. 56° do CPTA.
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A invocação das duas alíneas a) e b) do artigo 58° do Decreto-Lei n° 197/99 de 8 de Junho não são cumuláveis e como tal excluem-se reciprocamente, o que demonstra o non sense da entidade administrativa Recorrida, sendo inequívoca a ilegalidade do despacho impugnado por falta de base legal, e como tal anulável, no quadro vigente.
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Concluiu porém o Tribunal a quo pela inexistência de qualquer ilegalidade, considerando que a anulação do procedimento nos termos impugnados, não revela nenhum erro patente ou uso de critério inadequado, antes entendeu que se mostra em concordância com a finalidade do aludido art. 58° do Decreto-Lei n° 197/99 de 8 de Junho.
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E fê-lo em termos tais que configura uma nulidade, nos termos do art. 668°, n° 1, alínea b) do CPC, dada a inexistência da especificação dos fundamentos de facto que adoptou.
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Relativamente aos fundamentos de direito que justificam a decisão, igualmente o Tribunal a quo se resguarda por detrás da ambiguidade de conceitos jurídicos, desde logo o interesse público, não sindicando em concreto a actuação da entidade recorrida, limitando-se a extrair a consequência da improcedência dos autos.
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A sumariedade que preside à apreciação dos factos e razões de direito, não permitia ao Tribunal a quo avançar pelo conhecimento do mérito da acção, como manifestamente fez.
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É certo que o Tribunal a quo entende, que no domínio dos procedimentos da Administração Pública em sede de contratação, está vinculada à lei e não a poderes discricionários.
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Todavia, não conhece em concreto da actuação do Recorrido, e se este, ao anular o despacho impugnado, nos seus precisos termos, se pautou pelos princípios de legalidade e da prossecução do interesse público a que se encontrava obrigado, e bem assim pelos princípios da boa fé e da estabilidade dos concursos, imparcialidade e igualdade.
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O Tribunal a quo não sindicando a actuação do Recorrido, conforme o fez, em matéria de erros patentes ou critérios manifestamente desajustados, faz com que seja forçoso concluir que a ponderação efectuada não tem qualquer sentido, porque infundada.
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Não basta o Tribunal a quo afirmar que não se percebe a existência de factos indiciadores de que as razões invocadas no despacho de anulação impugnado sejam manifestamente erradas, remetendo para o próprio despacho a fundamentação utilizada.
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Ao Tribunal a quo, com o mui devido respeito, cabia indicar quais as razões de facto e de direito em que se baseou para assim decidir nos termos do acórdão recorrido, não sendo compreensíveis as razões que determinaram o Tribunal a quo a julgar improcedentes os vícios que a Recorrente assacara ao despacho contenciosamente acometido.
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Donde, e conforme tudo quanto aqui ficou dito, o douto acórdão ora recorrido padece do vício de falta de fundamentação, o que constitui uma causa de nulidade do mesmo, com as legais consequências, nos termos do artigo 668°, n° 1, alínea b), do CPC, aplicável in casu por força do disposto no artigo 1° do CPTA.
Mais sucede que a decisão recorrida é também nula por omissão de pronúncia.
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Desde logo porque a Recorrente, no seu articulado inicial havia requerido a produção de prova testemunhal, que o Tribunal a quo indeferiu, todavia sem proferir despacho fundamentado nos termos e para os efeitos previstos no art. 90º, n° 2 do CPTA, o que para além de consubstanciar uma clara violação da lei, com as legais consequências nos termos do disposto no art. 201° do CPC, aplicável por força do já citado art. 1º do CPTA, ainda impediu a Recorrente de fazer prova dos factos vertidos no seu articulado inicial, ainda que subsidiariamente, particularmente em matéria indemnizatória.
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A inexistência de despacho fundamentado com vista ao indeferimento da produção de prova testemunhal nos termos requeridos pela Recorrente constitui um acto contrário à lei, com influência na decisão da causa, por isso nulo processualmente, nos termos do artigo 201°, n°1 do CPC, aplicável por remissão do artigo 1° do CPTA.
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Por outro lado, o douto Acórdão recorrido é nulo, nos termos do já citado art. 668°, n° 1, alínea d) do CPC, porquanto o Tribunal a quo manifestamente deixou de pronunciar-se sobre uma questão que devia apreciar - o pedido subsidiário formulado pela Recorrente.
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O que de outro modo sempre está em correspondência directa com o dever que era imposto ao Tribunal a quo [vide art. 95° do CPTA] de decidir todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, salvo aquelas cuja decisão estivesse prejudicada pela solução dada a outras, o que não se verifica no caso em apreço.
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A Recorrente havia formulado dois pedidos, um principal, outro subsidiário, nos seguintes termos: a) anulação do despacho do Presidente da Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia em exercício que anulou o procedimento relativo ao Concurso Público Internacional para "Concessão do Serviço Público de Gestão e Exploração de Complexo Funerário Internacional", com o consequente prosseguimento dos trâmites do mesmo até final, e bem assim ser mandada restituir ao Réu a proposta que na altura foi mandada devolver à Recorrente; e cumulativamente ser o Recorrido, condenado ao pagamento de uma compensação por danos emergentes sofridos pela Recorrente desde a data do acto impugnado até ao trânsito da decisão a proferir nos autos, a liquidar em execução de sentença; b) ou subsidiariamente, caso o pedido formulado na alínea anterior improceda, nos termos do artigo 469° do Código de Processo Civil, ser o Recorrido condenado à pagar à Recorrente uma indemnização por danos emergentes sofridos e lucros cessantes, no valor nunca inferior a € 6.500.000,00.
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Donde, o Tribunal a quo, ao não pronunciar-se, injustificadamente, sobre o aludido pedido subsidiário, tudo nos termos e fundamentos constantes da petição inicial, resulta que o acórdão recorrido padece de nulidade por omissão de pronúncia nos termos do já mencionado art. 668°, n°...
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