Acórdão nº 0712062 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 04 de Março de 2009
Magistrado Responsável | ÉLIA SÃO PEDRO |
Data da Resolução | 04 de Março de 2009 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Recurso Penal 2062/07 Acordam na 1ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto 1.
Relatório No .º Juízo do Tribunal Judicial da Maia, foi julgado em processo comum (n.º..../04.5TAMAI) e perante Tribunal Singular o arguido B.........., devidamente identificado nos autos, tendo a final sido proferida a seguinte decisão: "(...) - Absolvo o arguido B.........., da prática do crime de abuso de confiança, previsto e punido pelo artigo 205º, nº 1 do Código Penal, relativamente à quantia de € 150, que recebeu da firma "C.........."; - Condeno o arguido na pena de 90 dias de multa à taxa diária de € 3,5, pela prática de um crime de abuso de confiança, previsto e punido pelo artigo 205º, nº 1, do Código Penal; - Condeno o arguido na pena de 120 dias de multa à taxa diária de € 3,5, pela prática de um crime de falsificação de documento, previsto e punido pelo artigo 256º, nº 1, alínea a) e 3, ex vi artigo 255º, alínea a), ambos do Código Penal.
- Condeno o arguido, em cúmulo jurídico, na pena única de 190 dias de multa à taxa diária de € 3,5, no total de € 665 (seiscentos e sessenta e cinco euros).
- Julgo parcialmente procedente o pedido de indemnização civil deduzido e em consequência condeno o arguido a pagar à demandante "D.........., Lda." a quantia de € 472,19 (quatrocentos e setenta e dois euros e dezanove cêntimos), acrescida de juros de mora à taxa de 4%, desde 31 de Outubro até efectivo e integral pagamento.
- Condeno o arguido nas custas do processo fixando a taxa de justiça em 2 UC's, acrescida da quantia correspondente a 1% e fixando a procuradoria no mínimo.
- Condeno o demandado e demandante nas custas do pedido civil, na proporção de metade cada.
(...)" Inconformado com tal condenação, o arguido recorreu para esta Relação, formulando, em síntese, as seguintes conclusões: i) Nulidade da sentença - O arguido vinha acusado de um crime de falsificação de documento p. e p. pelo art. 256º, 1, al. a) e n.º 3 com referência ao art. 255º, al. a) do C. Penal, por alegadamente ter recebido o cheque n.º .........., da empresa "E..........", com sede em Penafiel, e ter-lhe aposto no verso o carimbo da sociedade ofendida, e uma rubrica, tendo assim logrado depositá-lo na conta de que é titular no F.......... .
- Sucede porém que acabou indevidamente condenado por dois crimes (um de abuso de confiança e um crime de falsificação de documentos) quando vinha apenas acusado da prática de crime de falsificação de documento.
- O arguido não poderia ser condenado pela prática do crime de abuso de confiança relativamente à firma E.......... uma vez que não vinha acusado de tal crime.
- É que a existir uma alteração da qualificação jurídica dos factos esta teria necessariamente de ser comunicada ao arguido para formular a sua defesa, o que não foi feito, ocorrendo assim a nulidade a que se refere o art. 358º, 1 e 3 e o art. 379º, 1, b) do CPP.
ii) Factos relativos à empresa E..........
- Quanto aos factos referentes à empresa E.......... apenas se provou que recebeu dito cheque e que o depositou numa conta sua aberta especialmente para o efeito; - Ficou na posse do cheque dirigido à empresa D........., Lda. com o intuito de retê-lo até que a ofendida procedesse ao pagamento do que devia, no mínimo, cerca de € 1.500,00; - A ofendida acabou por despedir o arguido em 21-10-2004, sem processo disciplinar; - A sociedade apenas tomou conhecimento que este tinha o referido cheque após comunicação do arguido, através de carta; - Há assim erro na apreciação da prova.
- Por outro lado, o arguido sempre afirmou até à presente data que a quantia não era sua e que a restituía assim que fizessem contas consigo, alegando direito de retenção; - Nunca movimentou o dinheiro; - A apropriação do cheque encontra uma verdadeira causa de justificação, que é a prática do direito de retenção (art. 754º do C. Civil), não podendo ser punível tal conduta.
iii) Crime de falsificação - Quanto ao crime de falsificação, desconhece-se por completo quem apôs a assinatura ou o carimbo no cheque, o que resulta do depoimento de todas as testemunhas.
- O arguido nega tal facto e não existe qualquer prova testemunha, pericial, documental, análise grafológica, ou qualquer outra.
- Foram incorrectamente dados como provados os pontos 4, 6, 7 e 8 constantes da sentença recorrida.
Respondeu o Ministério Público junto do Tribunal de 1ª instância, pugnando pela manutenção da sentença recorrida.
Nesta Relação, o Ex.º Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.
Foi cumprido o disposto no artigo 417º, 2 do CPP, tendo o arguido respondido, reiterando o alegado na motivação do recurso.
Colhidos os vistos legais, realizou-se a audiência, com observância do legal formalismo.
Cumpre decidir.
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Fundamentação 2.1.
Matéria de Facto A sentença recorrida deu como assente a seguinte matéria de facto: 1.
Factos Provados 1. O arguido B.......... foi empregado da sociedade comercial "D.........., Lda.", com sede na .........., .., ......., .........., Maia, até Outubro de 2004, data em que a empresa dispensou os seus serviços.
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A sociedade dedica-se à recolha e distribuição de folhetos de publicidade ao domicílio, actividade que o arguido exercia por conta e sob direcção daquela.
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O arguido contactava e angariava clientes e recebia valores.
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No decorrer da relação laboral que mantinham, o arguido deslocou-se a clientes da sociedade ofendida e procedeu à recolha de valores oriundos de transacções comerciais havidas entre aquelas empresas, que fez seus.
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No início do mês de Outubro de 2004, o arguido dirigiu-se à empresa "E..........", com sede em Penafiel, e recebeu o cheque nº .........., da conta titulada por aquela sociedade com o nº ..........., no valor de € 472,19, datado de 4/10/2004.
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Uma vez na posse do cheque, o arguido apôs-lhe no verso o carimbo da sociedade ofendida, bem como uma rubrica, tendo assim logrado depositá-lo na conta de que é titular, no F.........., com o nº ......, e feito sua tal importância.
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O arguido B.......... agiu livre e conscientemente, com o propósito de fazer sua a importância recebida do cliente da sociedade ofendida, a qual estava à sua guarda, bem sabendo que agia contra a vontade real e presumida daquela sociedade e que a sua conduta era prevista e punida por lei.
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O arguido agiu livre, deliberada e conscientemente, com o propósito de endossar o cheque como se fosse seu titular, com o fito de o depositar na sua conta, como fez, assim iludindo a confiança normalmente depositada nos cheques, querendo com isso obter benefício que sabia ser ilegítimo e bem sabendo que a sua conduta constituía ilícito criminal previsto e punido por lei.
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O representante legal da ofendida sentiu-se transtornado com o comportamento do arguido.
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O arguido é divorciado, tem dois filhos maiores, casados e que vivem na África do Sul.
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O arguido é reformado auferindo € 200 por mês, tem casa própria, tem um veículo automóvel, de marca Opel .........., de 1999, pelo qual paga de empréstimo bancário € 227, por mês, sendo auxiliado financeiramente pela sua filha.
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Do certificado do registo criminal do arguido nada consta.
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Factos não provados Não se provaram quaisquer outros factos com interesse para a decisão da causa, designadamente os que a seguir se enunciam: 1. O arguido exercia, ainda, poderes de supervisão sobre os restantes funcionários.
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O arguido deslocou-se abusivamente a clientes da sociedade ofendida.
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Em data que não foi possível apurar, mas que se situa entre os meses de Setembro e Outubro de 2004, deslocou-se à empresa "C..........", com sede na Maia, cliente da ofendida, onde recebeu a quantia de € 150, em numerário, que abusivamente fez sua.
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O legal representante da ofendida sentiu vergonha e...
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