Acórdão nº 0817231 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 25 de Fevereiro de 2009

Magistrado ResponsávelPAULO VALÉRIO
Data da Resolução25 de Fevereiro de 2009
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

ACÓRDÃO (Tribunal da Relação) Recurso n.º 7231/08 Processo n.º .../04.8TAPVZ Em conferência na 1.ª secção criminal do Tribunal da Relação do Porto RELATÓRIO 1- No ..º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Póvoa do Varzim, no processo acima referido, foi o arguido B.......... julgado e condenado, em processo comum colectivo, pela forma seguinte: - como autor de um crime continuado de peculato, previsto e punível pelos arts. 375.º, nº 1, 30º e 79º do Código Penal, na pena de 1 ano e 3 meses de prisão, suspensa na sua execução pelo prazo de 1 ano e 3 meses; 2- Inconformado, recorreu o arguido, tendo concluído a sua motivação pela forma seguinte: A marcação do julgamento foi ilegal e irregular já que foi marcada a 1ª audiência para 22/4/2008 às 10h00 e a 2.ª em caso de adiamento para 22/4/2008 às 14h00, por conseguinte um adiamento para o mesmo dia. O arguido, através do seu mandatário, no próprio dia 22/4/2008 às 10h00 comunicou a impossibilidade imprevisível de comparência do arguido, comprometendo-se este a apresentar atestado médico no prazo legal, prevendo assim a lei o adiamento. Atestado médico que foi apresentado no 3º dia útil seguinte e devidamente justificado por douto despacho do Meritíssimo Juiz A Quo com base no artº 117º 1 a 6 do CPP. Assim a audiência começou ilegalmente no dia 22/4/2008 com audição de todas as quatro testemunhas de acusação e sem a consequente presença do arguido, que poderia com autorização do Juiz intervir quando fosse caso disso durante a inquirição das testemunhas de acusação, tendo ficado disso impossibilitado e tendo sido assim violado o artº 32º 7 da CRP, e ainda o 333º2 do CPP dado que apenas permite iniciar a audiência com referência ao artº 117º 2 a 4 e não nº 1, 5 e 6 do mesmo preceito, caso em que não poderá iniciar-se a audiência sendo caso de nulidade insuprível por violação do princípio do contraditório que deve ser assegurado ao arguido. Demais o arguido nunca em lado algum autorizou o julgamento na sua ausência.

Também quanto ao relatório social surge nos autos a fls 555 a 558 com timbre da Direcção-Geral da Reinserção Social, sem nunca o arguido ter sido previamente dele notificado e sem ter o mesmo sido solicitado pela autoridade judicial e sem decorrer o mesmo do próprio julgamento como preceitua o artº 370.º do CPP, que foi violado, tudo em ordem a uma aceleração processual incompreensível que despreza os direitos do arguido no que concerne ao contraditório.

Bem como a testemunha de defesa do arguido C.........., arrolada por este e cujo requerimento se encontra em insistência a fls 559 foi sem mais indeferida a fls 563, pelo simples facto de não se encontrar na altura da audiência no país.

A acusação a fls 327 dos autos solicita em 28/8/2007 ao Centro Distrital de Segurança Social elementos cruciais acerca do arguido que poderiam possibilitar até o arquivamento dos autos, e na mesma data 28/8/2007, sem que obtivesse obviamente qualquer resposta, foi deduzida a acusação, sendo esta nula nos termos do artº 283.º 3 - f) do CPP, e isto tudo em nome de uma aceleração processual incompreensível.

Também não resultou provado nos autos nem na audiência de julgamento que o arguido tivesse prejudicado a Segurança Social, já que todos os cheques apresentados pelo arguido para pagamento de contribuições foram pagos, e isto é confirmado e corroborado pela própria Segurança Social quer no processo disciplinar, quer os autos, quer na própria audiência de julgamento, resultando mesmo do facto da Segurança Social não ter deduzido qualquer pedido de indemnização civil, pelo que, sem prescindir de todo o alegado o arguido sempre teria direito à aplicação do artº 206º 1 do CP, que preceitua em caso de inexistência de prejuízos a extinção da responsabilidade criminal, pelo que o douto acórdão ao não considerar este preceito violou o artº 206.º 1 do CP, porquanto o arguido nunca de nenhuma importância se apropriou.

Demais o acórdão definiu inteiramente os elementos integradores da aplicação do artº 206.º do CP como inteiramente coincidentes, sendo a sua não aplicação fruto de mera interpretação subjectiva do tribunal a quo.

Também o acórdão se refere ao crime continuado desde 2003 a 2004 o que não se provou nem na audiência de julgamento, tendo assim violado os artºs 30º e 79º. do CP .

E ainda o artº 375º ao condenar o arguido pelo crime de peculato quando sempre se provou quer nos autos quer na audiência que o arguido ao passar cheques das importâncias recebidas não teve intenção de se apropriar do dinheiro. Sendo que, e por isso é que o Ministério Público em audiência de julgamento apenas alegou o uso e não a apropriação, pelo que o arguido nunca podia nem devia ser condenado pelo crime preceituado no artº 375º peculato. E é a própria Segurança social que o afirma na nota de culpa a fls 3 dos autos item 5, Nem nunca o arguido falsificou ou adulterou quaisquer dados respeitantes a contribuintes e a quaisquer documentos, item 7 folhas 4 dos autos, nem se apropriou de qualquer quantia. Bem como não congeminou o arguido qualquer plano, como não se provou em audiência de julgamento. Sendo que aliás os únicos cheques que não foram pagos inicialmente e que o foram posteriormente datam de 30/6/2004 e 2/7/2004, foram o único dissenso que o arguido teve, que não se tratou de qualquer plano, e que de qualquer modo os cheques em questão (sete) foram pagos, não havendo o alegado crime continuado. E que relativamente a 32 cheques enunciados na pronúncia e no acórdão não houve qualquer prova de qualquer irregularidade.

Por outro lado também a pronúncia extravasou a acusação bem como o acórdão recorrido ao referir que ao arguido convinha lidar com elevados montantes para beneficiar de empréstimos, quando nenhum empréstimo ocorreu nem se provou que tivesse ocorrido, sendo que o que ocorreu foi uma alteração substancial da acusação sem que fosse dado ao arguido a possibilidade de defesa como preceitua o artº 303º 1 gerando, nulidade que se invoca, já que o arguido estava impedido então legalmente de interpor recurso do despacho de pronúncia, o que viola o artº 32º da CRP.

De qualquer modo convém referir que se provou que o arguido é funcionário da Segurança Social desde 1975, há 33 anos portanto, sendo sempre exemplar, competente, e tendo inclusivamente criado por sua iniciativa um software de gestão atendimento constante do relatório existente a fls 68 tem 10º. dos autos. Sendo que nunca teve antecedentes criminais, é casado uma funcionária da Segurança Social tem o 7º ano antigo do liceu e tem 3 filhos 25, 20 e 17 anos de idade respectivamente.

Também o douto acórdão entra em contradição quando se refere aos alegados cheques fictícios que não resultaram provados, sendo que o acórdão diz "da pronúncia ficou ainda por demonstrar que os números de cheques que o arguido fez constar nas guias de depósito e na gestão de tesourarias como meios de pagamento fossem fictícios" ao contrário da alínea e) do mesmo que diz que além do mais usou ficticiamente vária vezes ...havendo assim erro nos pressupostos de facto e de direito do douto acórdão. E são até os próprios autos mais uma vez a comprovar que o arguido nunca falsificou quaisquer documentos, fls 68 item 8.

Ainda de referir que onde o recorrente trabalhava não existia D......... . Pois que o arguido ao depositar as importâncias no E.......... e subsequentemente na D.......... estava convencido de que o podia fazer e fê-lo sempre de boa fé, e nunca houve falta de dinheiro ou reclamações dos contribuintes Por outro lado o arguido ainda não foi penalizado disciplinarmente já que o Tribunal Central Administrativo Norte lhe deferiu um pedido de suspensão de eficácia da decisão disciplinar e já que o arguido interpôs a competente acção administrativa especial com vista a anular a decisão disciplinar Finalmente de referir a confusão criada no acórdão ao referir-se ao mês seguinte , ou seja de que o arguido ficava com o dinheiro mais de um mês, o que não corresponde à realidade, porquanto é a própria testemunha de acusação F.........., que já trabalhou na Segurança Social da .......... inclusivamente com o arguido até 1999, e que é Presidente G.........., que procede à entrega de contribuições , que diz que nunca faltou nada e que o arguido sempre lhe entregou todos os recibos.

Pede a procedência do recurso e a absolvição penal 3- Nesta Relação, o Exmo PGA emitiu douto parecer, suscitando desde logo a questão prévia da inadmissibilidade do recurso quanto à matéria de facto dado o não cumprimento do n.º 3 e 40.º do art 412.º do CodProcPenal; não ocorrem as nulidades arguidas; conclui pela improcedência do recurso 4- Foi colhido o visto legal e teve lugar a conferência.

+FUNDAMENTAÇÃO Na 1.ª instância deram-se como provados os seguintes factos: a) O arguido B.......... é funcionário da Segurança Social desde 1975, sendo que desde 01 de Janeiro de 1986 e até 15 de Outubro de 2004 exerceu funções de tesoureiro no Serviço Local de .......... do Centro Distrital da Segurança Social do Porto, tendo de Outubro de 1999 até 15 de Outubro de 2004 exercido também funções de coordenador do Balcão de Atendimento da ...........; b) No exercício das referidas funções, o arguido tinha competência para receber, em nome da Segurança Social, contribuições de beneficiários, emitir e assinar recibos, registar e lançar os respectivos montantes e dar entrada dos mesmos, de imediato, nos cofres da Segurança Social, depositando-os em conta bancária de que a mesma era titular; c) Em data não concretamente apurada mas situada a partir de Fevereiro de 2003, o arguido B.......... congeminou um plano que lhe permitisse a apropriação e o uso, em proveito próprio, de algumas quantias entregues por beneficiários da Segurança Social, nomeadamente da G..........; d) Para tanto bastava-lhe apropriar-se das contribuições de um determinado mês e depois sucessivamente ir repondo as contribuições nos meses seguintes, altura em que se voltava a apropriar de montantes que só mais...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT