Acórdão nº 0827194 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 27 de Janeiro de 2009

Magistrado ResponsávelGUERRA BANHA
Data da Resolução27 de Janeiro de 2009
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Apelação n.º 7194/08-2 1.ª Secção Cível NUIP ..../04.6TJVNF Acordam na 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação do Porto.

I 1. Na acção declarativa com processo comum ordinário que correu termos no ..º Juízo Cível da comarca de Vila Nova da Famalicão com o n.º ..../04.6TJVNF, B.......... e mulher C.........., residentes na freguesia de .........., concelho de Vila Nova de Famalicão, demandaram D.......... e marido E.........., e F.......... e mulher G........., todos residentes na Rua .........., freguesia de .........., concelho de Vila Nova de Famalicão, formulando a seguinte pretensão: - Que os réus sejam condenados: a) a reconhecer que estão a ocupar as habitações nºs 3 e 4, considerando o sentido norte/sul, do prédio descrito no art. 1.º da petição inicial, sem qualquer título que legitime essa ocupação e por forma abusiva; b) a reconhecer que ao ocuparem as habitações da forma como o fizeram, lesaram os autores e demais comproprietários, que para além de não poderem dispor das mesmas para efeitos da divisão pretendida, perderam o eventual rendimento que tais habitações lhes poderiam trazer; c) a reconhecer que este rendimento indexado aos valores do mercado de rendas para habitação, equivale a uma renda de, pelo menos, 150 euros mensais; d) a reconhecer que levaram a efeito, por forma abusiva e sem o conhecimento e assentimento dos autores e demais comproprietários, obras de ampliação das habitações que ocupam; e) a entregar, imediatamente, aos autores e demais comproprietários, as habitações que ocupam, livres das suas pessoas, das pessoas dos seus respectivos agregados familiares e bens; f) a pagar aos autores e demais comproprietários o valor de 150 euros mensais, por cada habitação, a título de compensação pelos prejuízos sofridos pelos mesmos com a ocupação, desde a data que vier a ser apurada como do início da ocupação até à data da entrega efectiva das habitações; g) a demolir todas as obras que, abusivamente, construíram nas habitações ocupadas e no prédio descrito no artigo 1.º da petição inicial e a deixar completamente limpo o solo de tais habitações e prédio, dos materiais e lixos resultantes dessa demolição; a reparar as habitações ocupadas nas partes que venham a apresentar degradações pelas demolições e a pintar tais habitações.

Fundamentaram esta sua pretensão alegando, em síntese, que são comproprietários de um prédio urbano, constituído por 5 habitações autónomas, com quintal, sito na Rua .........., freguesia de .........., concelho de Vila Nova de Famalicão, inscrito na respectiva matriz sob o art. 690 e descrito na competente Conservatória do Registo Predial sob o n.º 01433/190601; que, há cerca de 8 a 10 anos, cada um dos casais demandados ocupou abusivamente uma dessas habitações (a habitação n.º 3 foi ocupada pelo casal D.......... e marido e a habitação n.º 4 foi ocupada pelo casal F.......... e mulher), já que o fizeram sem autorização e sem título que vincule todos os comproprietários, e, nessas circunstâncias e de forma clandestina, realizaram obras de ampliação nas traseiras das ditas habitações, que devem ser demolidas.

Os réus contestaram por excepção e por impugnação. Por excepção, alegaram que ocupam as habitações ao abrigo de um contrato de arrendamento que celebraram verbalmente com todos os comproprietários do imóvel, mediante o pagamento de uma renda mensal, que sempre pagaram e tem sido actualizada; e quanto às obras, confirmam que as realizaram, mas que tiveram o consentimento dos proprietários.

Os autores replicaram à matéria das excepções, dizendo que, se algum contrato de arrendamento foi feito aos réus e se algum comproprietário lhes deu consentimento para a realização das obras, tal contrato e consentimento não tiveram a participação dos autores nem do conjunto dos comproprietários, sendo-lhes ineficazes.

Realizada a audiência de julgamento, foi decidida a matéria de facto controvertida nos termos que consta do despacho a fls. 394-396, complementado com o despacho a fls. 403, e, após, foi proferida sentença, a fls. 407-419, que, julgando a acção parcialmente procedente, decidiu: a) condenar os réus a reconhecer que estão a ocupar as habitações n.ºs 3 e 4, considerando o sentido norte/sul, do prédio descrito no art. 1º da petição inicial, sem qualquer título que legitime essa ocupação e por forma abusiva; b) condenar os réus a reconhecer que levaram a efeito, por forma abusiva e sem a autorização prévia dos autores, obras de ampliação das habitações que ocupam; c) condenar os réus a entregar, imediatamente, as habitações que ocupam, aos autores e demais comproprietários, livres das suas pessoas, das pessoas dos seus respectivos agregados familiares e bens; d) condenar os réus a demolir todas as obras que, abusivamente, construíram nas habitações ocupadas e no prédio descrito no artigo 1.º da petição inicial e a deixar, completamente, limpo o solo de tais habitações e prédio, dos materiais e lixos resultantes dessa demolição; a reparar as habitações ocupadas nas partes que venham a apresentar degradações pelas demolições e a pintar tais habitações.

  1. absolver os réus dos restantes pedidos contra si deduzidos.

    1. Os réus apelaram dessa sentença, extraindo das suas alegações as conclusões seguintes: a) É nula a sentença proferida pelo Tribunal de 1.ª instância, uma vez que não especifica os fundamentos de facto e de direito com base nos quais justifica a decisão que julgou procedente o pedido deduzido na alínea d) da petição inicial, qual seja, o de condenar os demandados a reconhecer que levaram a efeito, por forma abusiva e sem a prévia autorização dos demandantes, obras de ampliação das habitações que ocupam, nulidade que invocam nos termos do artigo 668.º, n.º 1, alínea b), do Código de Processo Civil [e não Código Civil, como, por lapso, foi indicado]; b) Relativamente à decisão proferida sobre a matéria de facto, discordam os recorrentes das respostas dadas aos n.ºs 16, 17, 18, 19 e 20 da Base Instrutória.

  2. Discordam, porém, só na parte em que nas mesmas o Tribunal denomina os pagamentos mensais (e posteriormente depósitos à ordem), que os Recorrentes faziam ao comproprietário H.........., como meras "quantias" ou "montantes" e, não como "rendas".

  3. Na verdade, toda a prova produzida sobre os factos relacionados com o aspecto em análise, em especial a prova testemunhal assinalada nas alegações, aponta no sentido de que aqueles pagamentos constituíam rendas.

  4. Aliás, tendo em consideração a periodicidade mensal com que aqueles pagamentos eram feitos e o facto de os mesmos constituírem uma contrapartida pela ocupação que os recorrentes exerciam sobre as habitações propriedade do H.......... (e demais comproprietários), outra não podia ser a conclusão que não fosse a de considerar aqueles pagamentos como rendas.

  5. Assim sendo, deve ser alterada a decisão sobre este aspecto da matéria de facto, mantendo-se as respostas dadas aos referidos quesitos, mas julgando-se, os factos dos mesmos constantes, provados sem restrições, o que implicará a substituição dos termos "quantia mensal" e "montante" por "renda".

  6. Quanto ao aspecto jurídico da causa, entendem os Recorrentes serem dois os pontos da sentença recorrida, incorrectamente julgados: o de considerar inválidos os contratos de arrendamento celebrados entre os recorrentes e o proprietário H.........., e o de julgar abusivas as obras executadas ou mandadas realizar pelos primeiros.

  7. Quanto ao primeiro, sustenta o Tribunal a quo a sua decisão com base no facto de o comproprietário H......... não ter legitimidade negocial para celebrar os referidos contratos, por não ter, por um lado, os necessários poderes de administração que lhe permitissem a celebração daqueles negócios jurídicos, e por outro, por não ter o necessário consentimento dos demais consortes, conforme o disposto no artigo 1024.º, n.ºs 1 e 2, do Código Civil.

  8. Sucede, porém, que o artigo 1407.º do Código Civil manda aplicar com as necessárias adaptações o artigo 985.º do mesmo diploma legal, que, nos casos de propriedade comum ou compropriedade, como é o caso dos autos, na falta de convenção em contrário, todos os com proprietários têm igual poder para administrar.

  9. Ora, dos autos não resultou provado a existência de qualquer acordo entre os comproprietários naquele sentido, pelo que, o referido comproprietário detinha, como detinham todos os outros consortes, os necessários poderes de administração para celebrar aqueles contratos.

  10. Por seu turno, nos termos do n.º 2 do artigo 1024.º do Código Civil, o necessário consentimento de todos os comproprietários, pode ser manifestado antes ou depois de celebrados os contratos, não lhe sendo exigida qualquer forma expressa, razão pela qual pode aquele consentimento ser prestado expressa ou tacitamente.

  11. Resultou provado que todos os comproprietários, incluindo os recorridos, tinham conhecimento de que os demandados ocupavam as habitações desde 1982, no caso de F.......... e mulher e, desde 1992, no caso de D.......... (vide ponto 23 da fundamentação de facto), e não provado que os demandantes e os outros comproprietários, ao constatarem aquela situação, tenham manifestado o seu desagrado ou oposição em relação aos mesmos (vide resposta dada ao quesito 7 da Base Instrutória).

  12. Ora, pelo tempo decorrido desde a data da celebração dos contratos, até à data da propositura da acção e pelo silêncio dos Demandantes, ora Recorridos, e demais comproprietários a quem assistia o direito de se oporem, é de considerar que o exigido consentimento teve lugar, no caso de forma tácita e posteriormente à celebração dos respectivos contratos de arrendamento.

  13. Como tal, devem os contratos de arrendamento ser considerados válidos, porque celebrados legitimamente entre o comproprietário H.......... e os recorrentes e, consequentemente, legitima a ocupação que estes exercem sobre as habitações.

  14. Erra, por isso, o Tribunal de 1.ª instância, com a decisão que profere sobre este aspecto da causa, na...

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