Acórdão nº 0826891 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 13 de Janeiro de 2009
Magistrado Responsável | GUERRA BANHA |
Data da Resolução | 13 de Janeiro de 2009 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Apelação n.º 6891/08-2 1.ª Secção Cível NUIP ..../04.0TBGDM Acordam na 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação do Porto.
I 1. Na acção declarativa com processo comum ordinário que correu termos no ..º Juízo Cível da comarca de Gondomar com o n.º ..../04.0TBGDM, proposta por B.......... e esposa C.........., residentes em .........., Gondomar, contra E..........., S.A., com sede em .........., .........., Santa Maria da Feira, os autores concluíram a sua petição inicial formulando a seguinte pretensão:
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Por via da aplicação sucessivamente subsidiária das disposições legais atinentes ao dolo (arts. 916.º, n.º 1, 913.º, n.º 1, 906.º, n.º 2, 905.º, 908.º e 911.º do Código Civil), erro na celebração do contrato (arts. 251.º, 247.º, 913.º, 905.º, 909.º e 911.º do Código Civil), incumprimento contratual (arts. 798.º e 799.º do Código Civil) e do instituto do enriquecimento sem causa (arts. 473.º e seguintes do Código Civil), deve ser a ré condenada no pagamento aos autores da quantia de € 14.523,06; ou, b) ainda e sempre subsidiariamente, deve s ré ser condenada ao pagamento da quantia de € 7.481,97, a título de incumprimento do acordo efectivamente celebrado (mas nunca concretizado) entre os representantes de ambas as partes; c) a qualquer das quantias deverão acrescer juros de mora legais, contados desde 15-10-2000 até efectivo e integral pagamento; d) finalmente, em qualquer dos casos supra admitidos, face à discrepância entre a área declarada e a área real do lote n.º .. da E.........., em .........., deve a ré, como loteadora originária, ser condenada a proceder à rectificação do alvará de loteamento n.º ../97, emitido em 19-03-1997 pela C. M. Gondomar, no prazo máximo de três meses, após o que pagará, a título de sanção pecuniária compulsória, a quantia de € 250,00 por cada dia de atraso, correndo por sua exclusiva conta todos os encargos daí resultantes.
Fundamentou a sua pretensão alegando, em síntese, que, por compra e venda formalizada notarialmente em 03-03-2000, os autores adquiriram à ré o prédio urbano implantado no lote n.º .. de um loteamento situado na E.........., em .........., Gondomar, pertencente à ré; de todos os documentos exibidos pela ré aos autores e por estes consultados previamente à dita compra e venda, constava que o dito lote tinha a área total de 397 m, elemento que foi determinante para a sua decisão de escolherem o dito lote, considerando que o preço unitário do metro quadrado era mais acessível e aliciante; aperceberam-se mais tarde, já depois de realizada a compra e venda, que a área total do lote era apenas de 324,21 m, ou seja, menos 72,79 m que a área contratada; na sequência da reclamação dos autores, os representantes da ré comprometeram-se verbalmente a pagar-lhes a quantia de 1.500.000$00 (€ 7.481,97) para os compensar daquela diferença de área, compromisso que a ré não veio a cumprir; concluem que a ré agiu dolosamente na indicação errada da área do terreno para poderem receber da venda do lote um preço superior ao que era devido.
Regularmente citada, a ré contestou, alegando, para além de outras questões já resolvidas em definitivo, a excepção da caducidade do alegado direito a indemnização dos autores, por terem já decorrido os prazos previstos nos arts. 888.º, n.ºs 1 e 2, 890.º, n.º 1, 917.º e 482.º, todos do Código Civil; e por impugnação alegou, além do mais, que a compra e venda incidiu sobre uma moradia já edificada sobre um lote de terreno murado e vedado, que os autores tiveram oportunidade de analisar e verificar antes da realização da escritura de compra e venda e que, inclusive, procederam à sua medição antes da dita escritura, pelo que, nada data da escritura, os autores tinham perfeito conhecimento da área real do lote que adquiriram; que, quando os autores optaram pela compra deste lote e celebraram o contrato-promessa preliminar à compra, este lote era o único disponível para venda, pelo que os autores não tinham outra opção de escolha neste loteamento; que antes da venda, houve necessidade de edificar um muro de suporte de terras, o qual retirou área ao lote adquirido pelos autores, facto de que estes foram informados; e que a discrepância de áreas apenas dá lugar à sua rectificação formal, nos termos previstos no art. 249.º do Código Civil, pedido que diz já ter sido apresentado na Câmara Municipal de Gondomar. Concluindo pela improcedência da acção.
A ré requereu ainda a intervenção acessória da sociedade F.........., LDA, com sede na rua .........., em Vila Nova de Gaia, com o fundamento de que, a vingar a pretensão indemnizatória dos autores, a ré terá direito de regresso sobre a chamada. Intervenção que veio a ser admitida por despacho proferido a fls. 247 (em sede de reparação de agravo interposto pela ré do despacho de fls. 227-228, que não havia admitido a requerida intervenção), tendo a chamada apresentado a contestação que consta a fls. 252.
Os autores ainda replicaram para responderem à matéria das excepções invocadas pela ré.
Realizada a audiência de julgamento, foi proferida sentença, a fls. 489-521, que, julgando a acção parcialmente procedente, decidiu: a) condenar a ré a pagar aos autores, para redução do preço pago no âmbito da escritura pública referida no ponto 2 da matéria de facto provada, a quantia a liquidar em decisão ulterior, correspondente à área do logradouro em falta, no total de 72,79 m, a calcular por referência à data de 3 de Março de 2000 e tendo presente o preço total pago de 27.400.000$00, com o limite de € 14 523,06; b) condenar a ré a diligenciar pela rectificação do alvará de loteamento n.º ../77 da Câmara Municipal de Gondomar, quanto à área do lote n.º .., por forma a que de tal documento conste 324,21 m como área total do lote .., sendo 91 m de área coberta e 233,21 m de área descoberta, rectificação a obter no prazo de 6 meses.
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Desta sentença apelaram a ré e os autores.
2.1. A ré concluiu as suas alegações do seguinte modo (fls. 615-641):
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Deve ser admitida a reclamação à matéria assente na base do que supra se alegou e que aqui se dá por reproduzido, ao abrigo do art. 511.º, n.º 3, do CPC.
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Deve ser anulado o depoimento da Advogada/testemunha Dra. G.........., em virtude de prestado contra o não levantamento do sigilo profissional da Ordem dos Advogados e consequentemente anuladas as respostas que nele assentaram, nomeadamente dos n.ºs 4 e 9 [da base instrutória].
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Deve ser julgada procedente a excepção de caducidade deduzida pela Apelante, desde logo revogando a decisão por inexistir qualquer abuso de direito ou dolo da Apelante no que toca ao conhecimento da área do lote e tão pouco inexiste qualquer vantagem para a Recorrente na alegada redução de área do lote, tudo em função do que supra se alegou e que aqui se deixa por integralmente reproduzido.
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Deve ser alterada a matéria de facto dada como provada e, por consequente, ser dada a resposta propugnada aos quesitos n.º 2, 6, 8 e 9, e com base no depoimento das testemunhas (H.......... e I..........) supra referidas, mas também da análise cuidada e objectiva dos documentos juntos aos autos e aceites pelas partes que não deixam dúvidas quanto aos factos que deles se extraem.
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Na verdade, a decisão da matéria de facto, proferida pelo Meritíssimo Juiz a quo, padecia de falta de motivação, contradição, insuficiência, incorrecção e inexacta apreciação da prova constante dos autos, violando o art. 653.º, n.º 2, do C. Processo Civil.
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A sentença fez, também, errada apreciação da factualidade apurada e constante dos autos, e interpreta e aplica incorrectamente a lei.
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Não resulta de qualquer prova pericial, inspecção ao lote ou qualquer acto judicial que atestasse com rigor qual a verdadeira área do lote, nem onde está a área que alegadamente falta ao mesmo.
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Resulta dos autos prova de que (...) o preço estipulado no contrato de compra e venda não teve por base a área do lote e, como consequência, não poderá existir qualquer indemnização aos Recorridos ou redução do preço liquidado.
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A Apelante carece de legitimidade para alterar a área do lote, sendo que os Recorridos poderão, enquanto proprietários, proceder a essa alteração - cfr. atesta a douta sentença sob recurso no 3.º § de fls. 519.
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Não existe qualquer matéria de facto que sustente o alegado dolo da Apelante ou a intenção de enganar os Recorridos quanto à área do lote .. .
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Normas violadas: os preceitos supra citados e que aqui se dão por integralmente reproduzidos, destacando a violação dos arts. 158.º, 659.º e 668.º do CPC.
A este recurso responderam os autores, concluindo pela improcedência do recurso.
2.2. Por sua vez, os autores formularam as conclusões seguintes (fls. 647-671): 1.ª - Como, em sede de motivação, se começou por assumir no douto despacho de reposta à matéria de facto, esta deve pressupor e exigir uma análise crítica das versões dos factos, por apelo às regras da normalidade e experiência comum.
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- Atentos os depoimentos das testemunhas J.......... (gravado na cassete 1, lado A, do início a 2300 unidades), K.......... (gravado na cassete 1 do lado B de 2341 até ao fim, e cassete 2 lado A do início até 1500 unidades), L.......... (gravado na cassete do lado B de 731 até ao fim e cassete 2 do lado A, do início a 1124 unidades), e M.......... (gravado a cassete 1 do lado B, de 981 a 2340 unidades), deveria o Digno Tribunal a quo ter considerado provado o facto constante do quesito 3.º da base Instrutória, pois que, da análise crítica de todos os elementos de prova, impunha-se, à luz das regras da experiência comum e da normalidade do comportamento humano, que reconhecesse a existência do acordo de 13-10-2000 entre Apelantes e Apelada, assente no pagamento por estes àquela da quantia indemnizatória de esc. 1.500.000,00, acordo esse que acabou por não ser cumprido.
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- Além dos depoimentos supra referidos (de que se destaca o carácter hesitante e nada convincente do depoimento de M.........., quanto à inexistência do acordo), a própria reacção da Recorrida...
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