Acórdão nº 0846092 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 10 de Dezembro de 2008

Magistrado ResponsávelERNESTO NASCIMENTO
Data da Resolução10 de Dezembro de 2008
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo 6092/08-04 Relator - Ernesto Nascimento.

Processo comum singular .../07.1PASJM do .º Juízo do Tribunal Judicial de S. João da Madeira Acordam, em conferência, na 2ª secção criminal do Tribunal da Relação do Porto I. Relatório I.1. No processo supra em epígrafe identificado, foram os arguidos B.........., C.......... e D.........., submetidos a julgamento, depois de acusados pelo MP, pela prática, enquanto co-autores materiais, de um crime de difamação agravada, p. e p. pelos artigos 180º/1 e 184º, por referência ao artigo 132º/2 alínea l), todos do C Penal, tendo a final sido, todos eles, absolvidos.

  1. 2. Inconformado, com o assim decidido, interpôs o Magistrado do MP, o presente recurso, sustentando as seguintes conclusões: 1. o Tribunal a quo absolveu os arguidos B.........., C.......... e D.......... da prática do crime de difamação agravada de que vinham acusados, em co-autoria material; 2. não o fez por ter optado por uma das versões apresentadas em sede de audiência de julgamento, ou por insuficiência de prova no que toca aos elementos objectivos e subjectivos do tipo legal pelo qual os arguidos vinham acusadas; 3. com efeito, o Tribunal considerou encontrarem-se preenchidos os elementos objectivos e subjectivos do tipo legal do crime de difamação agravada; 4. porém, veio dizer que, na impossibilidade de optar por uma das versões apresentadas - a dos arguidos, ou a do ofendido - porque igualmente credíveis, não poderia condenar os mesmos; 5. não vemos porquê; 6. dado por assente que as expressões produzidas pelos arguidos são ofensivas da honra e da consideração do agente E.......... (o que os mesmos sabiam), apenas uma eventual ocorrência de uma causa de justificação seria susceptível de excluir a antijuridicidade do comportamento protagonizado pelos arguidos; 7. porém, para que se possa verificar se a situação em análise se mostra abrangida pelo nº. 2 do artigo 180º do C. Penal, exige-se que estejamos perante uma imputação de factos, não se mostrando abarcada pela norma a formulação de juízos ofensivos, a atribuição de epítetos ou palavras a que se alude no crime de injúrias, bem como a imputação de factos genéricos ou abstractos (nesse sentido, vd., entre outros, o Ac. da RC. de 23 de Abril de 2008, CJ, XX. III, Tomo II, 64, o Ac. da RG. de 11.10.2004, e o Ac. da RG. 8.01.2008, disponíveis in www.dgsi.pt); 8. ora, in casu, as expressões constantes de 9) dos factos provados substanciam verdadeiros juízos de valor, uma vez que têm ínsitas uma valoração que ultrapassa o juízo da realidade, transformando-se em juízo sobre o carácter e a actuação profissional do agente E.......... enquanto agente de autoridade; 9. pelo que não poderia a situação em concreto considerar-se abrangida pela norma do nº. 2 do artigo 180º do C. Penal, a qual se mostra violada; caso assim não se entenda, e se considere que, não obstante os "juízos conclusivos" constantes da participação, ainda assim, estes espelham os factos também na mesma descrita, sempre se dirá que: 10. os requisitos das alíneas a) e b) do nº. 2 do artigo 180º do C. Penal são cumulativos, como bem se deduz do uso da conjunção "e" a interligá-las; 11. pelo que o interesse referido na alínea a) apenas se pode ter por legítimo" (e independentemente de ser um interesse privado ou público) se exactamente se der por provado, no caso concreto, o referido na alínea b) do n°. 2 do mesmo preceito legal; 12. isto é: invocando os arguidos que se limitaram a dar conhecimento ao superior hierárquico do ofendido de que o mesmo tinha actuado com grave abuso de autoridade, caso efectivamente tal tivesse resultado provado, outra não podia ser a conclusão que não esta: os arguidos haviam provado a verdade da imputação efectuada, pelo que o interesse prosseguido - o de dar conta de uma situação que não poderia existir, ao nível das forças policiais - seria inequivocamente legítimo; 13. ora, se não resulta provado comportamento por parte do agente que permita justificar a participação efectuada, temos sérias dúvidas que, nesta situação, se possa falar de um interesse legítimo; 14. nesse sentido, vd. o Ac. da RC. de 25 de Janeiro de 2006 (www.dgsi.pt), na parte em que refere "ao denunciar a situação descrita, caso a mesma seja verídica, atentos os valores em causa, a arguida cumpre um interesse legítimo"; 15. assim, ao considerar não provado qualquer comportamento, por banda do agente E.........., susceptível de justificar a actuação dos arguidos, não poderia o Tribunal a quo, sem mais, considerar verificado o preceituado no artigo 180º/2 alínea a) do C. Penal; caso assim não se considere, 16. ainda que déssemos por assente que os arguidos tiveram por objectivo realizar um interesse legitimo, ainda assim, consideramos não se encontrar preenchido o requisito da alínea b) do nº. 2 do artigo 180° do C. Penal; 17. não pode, no nosso entender, aplicar-se o princípio in dubio pro reo a uma causa de exclusão da punibilidade; 18. com efeito, a materialização de tal princípio desdobra-se em dois vectores essenciais: o primeiro é de que o ónus probatório da imputação de factos ou condutas que integram um ilícito criminal cabe a quem acusa; o outro consiste que, em caso de dúvida razoável e insanável sobre os factos descritos na acusação ou na pronúncia, o tribunal deve decidir a favor arguido, (vd. nesse sentido, o Ac. da R.P. de 11.01.2006, disponível in www.dgsi.pt); 19. ora, não questionamos a aplicação deste princípio aos elementos do tipo legal de crime, nas suas vertentes objectiva e subjectiva; questionamos sim a sua aplicação aos elementos susceptíveis de excluir a punibilidade da conduta; 20. isto porque este princípio impõe-se ao juiz no sentido de este se pronunciar de forma favorável ao arguido, quando não houver a certeza sobre os factos decisivos para a solução da causa, que nada mais são do que as condutas susceptíveis de se integrarem no tipo legal de crime; 21. por outro lado, o nº. 2 do artigo 180° do C. Penal, ao prever a não punibilidade da conduta exige expressamente que o agente prove a verdade da mesma imputação ou tiver fundamento para, em boa fé, a reputar verdadeira (vd., entre outros, o Ac. do S.T.J. de 20 de Setembro de 1995, in CJ, III, Tomo 3, pág. 186; o Ac. da RC. de 19 de Junho de 1996, CJ, XXI, Tomo III, pág. 52); o Ac. do STJ de 8 de Abril de 1999, SASTJ, nº. 30, pág. 71); o Ac. da R.P. de 06.07.93, in www.dgsi.pt) e o Ac. da R.P. de 26.11.97, in www.dgsi.pt); 22. também o Ac. da RG. de 11.10.2004, disponível in www.dgsi.pt. na parte que ora interessa: "... passemos à questão da alegada causa de justificação a que se refere o artigo 180°/2 do C. Penal. Pois bem, relativamente a esta questão não há muito a dizer ... De facto, já anteriormente frisámos que o recorrente não logrou fazer prova dos pressupostos exigidos pelo citado preceito para que a punibilidade da difamação pudesse ser efectivamente excluída.

    Daí que, tendo-se por assente que as imputações de facto e os juízos formulados pelo arguido nas circunstâncias que foram dadas como provadas são ofensivas da honra e consideração dos assistentes, e que nada se provou no sentido de excluir a antijuridicidade do comportamento protagonizado pelos arguido, então outra alternativa não resta senão a de considerar como preenchidos os crimes que eram imputados ao arguido.

    Tanto basta para o considerar responsável pelos três crimes acusados, nos termos dos artigos 26° e 30°, do Código Penal, uma vez que o arguido não comprovou qualquer causa geral ou especial que excluísse a culpa ou a ilicitude do seu comportamento"; 23. consideramos assim, que a dúvida quanto ao preenchimento da alínea b) do nº. 2 do artigo 180° do C. Penal não pode ter como consequência a absolvição dos arguidos, sob pena de se ultrapassar totalmente a letra e o espírito da lei; 24. ao concluir da forma que o fez, o Tribunal a quo violou o preceituado na alínea b) do n°. 2 do artigo 180° do C. Penal; 25. por fim, inexiste, no nosso entender qualquer "causa suplementar" de exclusão da ilicitude relativamente ao arguido D..........; 26. com efeito, a boa fé não pode significar uma pura convicção subjectiva na veracidade dos factos, antes tem de assentar numa imprescindível dimensão objectiva; 27. ao arguido, como Provedor da F.........., entidade para a qual as arguidas exerciam actividade profissional, competia-lhe certificar-se da veracidade do escrito que assinava, tanto mais quando o mesmo não se encontrava presente aquando da ocorrência dos factos que terão motivado a participação; 28. impondo-se-lhe, até, um "dever acrescido" de se assegurar do que se havia passado, face às circunstâncias concretas; 29. pelo que, também este argumento não pode colher para fundamentar a "dupla absolvição" do arguido, mostrando-se violado o preceituado na alínea b) do nº. 2 do artigo 180° do C. Penal; 30. provando-se os elementos objectivos e subjectivos do crime que se indiciava, e a sua prática pelos arguidos, e não se provando qualquer causa susceptível de excluir a ilicitude ou a culpa da conduta, como entendemos que não se provou, deveriam os arguidos terem sido condenados como co-autores do crime de difamação agravada; 31. o que se peticiona; 32. ao absolver os arguidos, violou a sentença recorrida o disposto no artigo 180°/2 do C. Penal.

  2. 3. Responderam os arguidos, pugnando pelo não provimento do recurso, sustentando as seguintes conclusões: 1. a douta sentença proferida nos autos deve ser de manter em toda a sua extensão, devendo o recurso da mesma interposto, ser julgado improcedente, pois que; 2. são de indeferir todas as suas conclusões; 3. pois não enferma de qualquer nulidade ou erro de apreciação e/ou fundamentação; 4. a sentença recorrida proferida e produzida no estrito respeito pelos princípios cognitivos, de imediação da prova, rigor de análise dos factos com incidência criminal e adequação do direito aplicável e aplicado; 5. faz plena e cuidada análise de toda a prova testemunhal junta aos autos; 6. não houve...

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