Acórdão nº 7271/2008-9 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 05 de Fevereiro de 2009

Magistrado ResponsávelJOÃO ABRUNHOSA DE CARVALHO
Data da Resolução05 de Fevereiro de 2009
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Nos presentes autos de recurso, acordam, em conferência, os Juízes da 9ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa: No 4º Juízo Criminal de Cascais, por acórdão de 28/04/2008, constante de fls. 467 a 490, foram os Arg.

[1] R...

e V...

, com os restantes sinais dos autos (cf. TIR[2] de fls. 58 e 106[3], impressão do BI[4] de fls. 236 e CRC[5] de fls. 337) condenados nos seguintes termos: "Nestes termos, acordam os juízes que compõe este Tribunal Colectivo: a) ABSOLVER o arguido V...

da prática do crime de condução sem habilitação legal, p. e p. nos termos do artigo 3.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 2/98, de 3 de Janeiro, de que este encontra acusado; b) CONDENAR os arguidos R...

e V...

como co-autores de um crime de sequestro qualificado, p. e. p. pelo artigo 158.º, n.

os 1 e 2, alínea b), do Código Penal, sendo: b.1) o arguido R...

na pena de três (3) anos e seis (6) meses de prisão.

b.2) o arguido V...

na pena de um (1) ano e nove (9) meses de prisão.

  1. CONDENAR o arguido R...

    , pela prática de um crime de extorsão, na forma tentada, p. e. p. nos termos dos artigos 22.º, 23.º e 223.º, n.º 1, do Código Penal, na pena de um (1) ano de prisão.

  2. CONDENAR o arguido R...

    , em cúmulo jurídico das penas supra referidas em b.1) e c), nos termos do artigo 77.º do Código Penal, na pena única de quatro (4) anos de prisão.

  3. SUSPENDER a execução da pena de prisão referida em b.2), imposta ao arguido V...

    , nos termos do artigo 50.º do Código Penal, pelo período de um ano e nove meses, sendo a presente suspensão acompanhada de regime de prova, nos termos do artigo 53.º do Código Penal. ...".

    * Inconformado, vieram os Arg. interpor recurso do referido acórdão, pedindo: "... reformando-se o douto Acórdão Recorrido, e em consequência, dar-se, como provada, a desqualificação do crime de sequestro qualificado, imputada aos aqui Arguidos/Recorrentes, Absolvendo-se o aqui Arguido V..., do crime de sequestro qualificado, Devendo os factos praticados pelo Arguido R..., qualificados como crime de ofensa à integridade física simples, Devendo, igualmente, considerar-se como não provado o crime de extorsão, na forma tentada, imputado ao aqui Arguido R....

    ".

    Fizeram-no com os fundamentos constantes da motivação de fls. 542 a 573, com as seguintes conclusões[6]: A) O objecto deste Recurso traduz-se, por um lado, em saber se o Tribunal Colectivo errou na apreciação da prova e, por outro, se errou na apreciação do Direito; B) No que diz respeito ao erro na apreciação da prova, face à prova produzida em audiência, não poderiam os Mmos. Juízes do Tribunal "a quo", com o devido respeito, imputar aos aqui Recorrentes R..., e, V..., a prática de um crime de sequestro qualificado, e, ao aqui Recorrente R..., de um crime de extorsão, na forma tentada; C) Na realidade, e no que diz respeito ao crime de sequestro qualificado, cumpria considerar, face à prova produzida em Audiência de Julgamento, ser inexistente qualquer acordo prévio, ou conjugação de esforços, entre os aqui Recorrentes, fundamentado no acompanhamento que o aqui Recorrente V...faz ao seu irmão, o aqui Recorrente R..., a casa da testemunha L...; D) Efectivamente, face à prova produzida em sede de Audiência de Julgamento, a deslocação do Recorrente V...à casa da Testemunha L, onde se encontrava o aqui Ofendido, apenas se verificou porque o seu irmão, o aqui recorrente R..., não conhecia bem a Testemunha L....

    E) Por outro lado, nunca os M. mos Juízes do Tribunal "a quo" poderiam considerar como provado que o Ofendido C... tenha de alguma forma sido compelido, de forma brusca, violenta e privado dos seus movimentos, a entrar no automóvel do aqui Recorrente R...e, a deslocar-se a casa do mesmo, de modo a infligir-lhe um tratamento desumano.

    F) Efectivamente, provou-se em sede de Audiência de Julgamento, não só a ausência de qualquer brusquidão, violência ou privação de movimentos do Ofendido, como, provou-se ter sido perfeitamente aleatório o facto do Recorrente V...ir sentado atrás ao lado do Ofendido.

    G) Até porque, e de forma a compreender aquele dia 8 de Setembro de 2005, importa esclarecer que o Ofendido não estava perante estranhos, que o Ofendido não se sentia de modo algum desprotegido, intimidado, ou privado dos seus movimentos, pois como admitido pelo próprio, os aqui Recorrentes e as testemunhas L... e J..., eram amigos e conhecidos da escola.

    H) Pelo que, não só ficou provado não ter ido o aqui Ofendido contra a sua vontade, como se fosse verdade, teria tido sempre possibilidade de ter reagido, gritado e fugido; I) Por outro lado, erram, igualmente, com o devido respeito, os M.mos Juízes do Tribunal "a quo", a qualificação do crime de sequestro, no que diz respeito aos factos ocorridos no interior da residência do aqui Recorrente R....

    J) Efectivamente, deveriam os M. Mmos Juízes ter apreciado, para fundamentar a sua convicção, as circunstâncias concretas do caso, nomeadamente, o meio utilizado, as características físicas do Ofendido e a configuração do local.

    K) Isto porque, era o aqui Ofendido um conhecido e colega dos aqui Recorrentes, que não estava impedido de se movimentar convenientemente, ou de estar a ser ameaçado, não sendo fisicamente inferior ao aqui Recorrente R..., muito pelo contrário.

    L) Pelo que, com o devido respeito, o essencial a ter sido decidido pelos M. mos Juízes do Tribunal "a quo", face à prova produzida em Audiência de Julgamento, era a de colocarem a seguinte questão: Estava o aqui Ofendido, atentas as circunstâncias concretas de se encontrar entre conhecidos da escola e amigos, nunca ter sido amarrado ou forçado, de ter estado sempre livre de se deslocar, impedido da sua liberdade de movimento? A resposta era claramente não, e portanto, não poderem fundamentar como crime de sequestro qualificado.

    M) Por outro lado, não foi o Ofendido C... vitima de qualquer tratamento desumano, cruel, degradante e grave, em consequência de qualquer privação da liberdade, como pretenderam qualificar os M.mos Juízes do Tribunal "a quo", o crime de sequestro; N) Na verdade, o relatório médico, que serve de convicção ao Tribunal "a quo" é realizado 14 meses depois dos factos ocorrerem, e poderem as cicatrizes descritas terem surgido depois dos factos terem ocorrido.

    O) Acresce que, o aqui Ofendido C... apenas se desloca aos Bombeiros Voluntários para fazer um pequeno curativo horas depois de ter saído da casa do Recorrente R..., naquele dia 8 de Setembro de 2005, por volta das 03h00.

    P) Pelo que, atentas as circunstâncias, não podiam os M.mos Juízes do Tribunal "a quo" considerarem encontrarem-se preenchidos os elementos objectivos do crime de sequestro qualificado, a ambos os recorrentes.

    Q) Não só porque os mesmos requisitos não se verificam, como também, os M.mos Juízes ao longo da Decisão descrevem apenas a conduta do aqui Recorrente R....

    R) Assim sendo, e face ao supra exposto, ainda que tenham os M. mos Juízes do Tribunal "a quo", baseado a sua convicção à luz das regras do senso comum, as regras da experiência e da livre apreciação da factualidade, não pode a mesma ser uma apreciação arbitrária, da prova produzida, neste sentido, (Ac. Relação do Porto, Proc. nº 0345574, de 14.04.2004.); S) Até porque, dessa forma, e ao errarem os M.mos Juízes do Tribunal "a quo", na apreciação da prova, violaram um dos princípios basilares em Direito Penal, o princípio do in dubio pro reo, ao decidirem na dúvida contra os Arguidos, aqui Recorrentes.

    T) Já no que concerne ao crime de extorsão, na forma tentada, p. e p. nos termos dos arts. 22º, 23º e 223º nº 1 do C. Penal, imputado ao aqui Recorrente R..., não podiam os M. mos Juízes do Tribunal " a quo" considerar como provado, uma vez que do depoimento prestado pelo Ofendido, em momento algum ele identifica quem falou com a seu mãe, se o aqui Recorrente R..., ou, o aqui Recorrente V..., não tendo o aqui Ofendido, igualmente, esclarecido, o que é que foi falado com a sua mãe a aqui Testemunha A...

    .

    U) Pelo que, a convicção do depoimento da Testemunha A...por si só era insuficiente, tendo em conta não poder a mesma identificar o sujeito com quem falou, V) Até porque, e tendo em conta as declarações do próprio Arguido R..., quanto ao significado das peças em ouro para si, o mesmo, pretendia apenas o ouro que lhe pertencia, e não qualquer quantia monetária, não pretendendo dessa forma enriquecer ilegitimamente à custa da mãe do aqui Ofendido; W) Pelo que, e atenta a prova produzida, não podiam os M. mos Juízes do Tribunal "a quo" considerar provado ter o aqui Recorrente R...praticado qualquer crime de extorsão, ainda que de forma tentada.

    X) Por fim, e no que concerne à matéria de Direito, entendemos que os Doutos Julgadores cometeram um erro, na determinação das normas aplicáveis ao caso "sub judice", pois, e, por tudo o exposto anteriormente, relativamente à matéria de facto, resulta claramente dos Autos, que se encontra desqualificado o crime de sequestro qualificado, bem como, o crime de extorsão.

    * O Ex.m.º Magistrado do Ministério Público respondeu, nos termos da peça de fls. 586 a 588, pugnando pela confirmação integral do acórdão recorrido, concluindo da seguinte forma: "1ª. Os arguidos recorrentes não alegaram a existência de qualquer vício do acórdão, nos termos do art.º 410º do CPP, nem tão pouco uma análise detalhada do mesmo permite concluir que ele exista, pelo que, atento o disposto nos art.ºs 430º e 431º do CPP, o recurso cai por terra.

    1. Se assim se não entender, sempre se dirá que não assiste razão aos recorrentes, porque, sendo certo que confessaram os factos objectivos, negando a violência, não justificam, por um lado, as razões que fizessem o ofendido acompanhá-los voluntariamente, como pretendem, de uma casa (onde estavam umas jóias do arguido R... e que, supostamente, teriam sido «furtadas» pelo ofendido) para a do arguido; essa deslocação só se justifica ter sido levada a cabo pela força, posto que, se assim não fosse, o ofendido não precisaria de acompanhar os arguidos para a casa do...

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