Acórdão nº 45/05.4TAFIG.C2 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 21 de Janeiro de 2009

Data21 Janeiro 2009
ÓrgãoCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)
  1. – Relatório.

    Após acórdão deste tribunal – cfr. fls. 294 a 304 – em que se decidiu anular parcialmente a decisão proferida a fls. 173 a 184, por inobservância do disposto nos artigos 374.º e 379.º - omissão de fundamentação – proferiu o tribunal a quo nova decisão – cfr. fls. 314 a 327 – em que, reparada a falta, decidiu: “1. Condenar os arguidos MG...

    e LM..., cada um deles, por um crime de emissão de cheque sem provisão, previsto e punido pelos artigos 11º, nº 1, a) do DL nº 454/91, de 28.12, com a redacção introduzida pelo Decreto-Lei nº 316/97 de 19.11, na pena de 280 dias de multa, á razão diária de 4 euros, o que perfaz o montante de 1.120,00 euros; subsidiariamente 186 dias de prisão; 2. Julgar parcialmente procedente por provado o pedido cível e consequentemente condenar os arguidos a pagarem, solidariamente, á ofendida, “G…, Lda.”, o montante de 10.000,00 euros (correspondente ao montante do cheque), acrescido dos juros de mora, ás diversas taxas dos juros comerciais, desde a data de vencimento do cheque até efectivo e integral pagamento”.

    É desta decisão que traz novamente recurso a arguida, MG..., com a motivação explanada de fls. 352 a 356 e corrigida de fls. 409 a 413, rematando-a com o quadro conclusivo que a seguir fica transcrito.

    “a) O princípio da presunção de inocência ou in dubio pro reo impõe a prova inequívoca, sem margem para dúvidas, da intenção ou dolo e da consciência da ilicitude do comportamento do arguido; b) Alegando a arguida que só entregou o cheque ao filho porque este lhe prometera que, antes de o preencher e entregar a terceiros, provisionaria adequadamente a conta bancária, impunha-se fazer prova inequívoca de que esta alegação é falsa c) Do relatório da sentença, na fundamentação da prova da matéria de facto, não há referência a qualquer testemunha que se tenha pronunciado, por conhecimento directo, sobre a intervenção da ora recorrente, muito menos infirmando a sua alegação; d) Pelo que, ao dar como provados os factos constantes de 2,4, 7 e 8 do relatório, parte II da douta sentença impugnada, incorreu em erro de julgamento decorrente da violação do princípio da presunção de inocência consignado no n.º 2 do artigo 32.º da Constituição, e) E, ao não proceder ao exame crítico dos meios de prova utilizados para formar a convicção do Tribunal, violou o disposto no n.º 2 do artigo 374.º do Código de Processo Penal, vício gerador de nulidade, nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 379.º do mesmo Código, f) Devendo a sentença ser, nessa medida, anulada ou declarada nula, e lavrado acórdão que, dando como não provados os factos relacionados com a culpa e a consciência da ilicitude da ora recorrente, a absolva da condenação penal e, consequentemente, do pedido cível.

    g)Termos em que deve a douta sentença recorrida ser anulada ou declarada nula e lavrado Acórdão absolutório da acusação criminal contra a arguida e do correspondente pedido cível, assim se fazendo a costumada, Justiça!” Nesta instância a Exma. Senhora Procuradora-geral Adjunta tinha já emitido parecer – cfr. fls. 383 a 389 - no sentido que a seguir se deixa transcrito.

    “B – o Magistrado do Ministério Público junto da 1ª instância, na sua resposta à Motivação do recorrente, entende que o recurso merece provimento.

    C – Pela nossa parte, afigura-se-nos, que assiste razão à recorrente, embora se nos afigure com alguma utilidade uma chamada de atenção para os seguintes aspectos do presente recurso, designadamente para a seguinte questão prévia: Questão Prévia .

    1. Da conjugação do disposto no artigo 412.º n.º 1 e n.º 2 al. a), b) e c) do C.P.P., resulta que a motivação de recurso enuncia especificamente os fundamentos de recurso e termina pela formulação de conclusões, deduzidas por artigos, em que o recorrente resume as razões do seu pedido e que, versando o recurso sobre matéria de direito, as conclusões indicam, sob pena de rejeição, as normas jurídicas violadas. Como se constata das “ conclusões” da motivação de recurso apresentada, a recorrente não indicou quais as normas jurídicas violadas pela douta decisão recorrida, nem o sentido em que se interpretou cada norma e o sentido em que ela deveria ter sido interpretada ou com que deveria ter sido aplicada.

      Em suma, não respeitou a recorrente, o disposto no artigo 412.º n.º 1 e n.º 2 alínea a) do C.P.P., pelo que deverá o seu recurso ser rejeitado, por manifestamente improcedente, nos termos do artigo 412.º n.º 2 e 420.º, n.º 1, ambos do C.P.P ..

      Neste sentido se pronunciou o Ac. S.T.J. de 97/05/08 in proc. 234/97, quando diz: “É de rejeitar o recurso quando as conclusões do mesmo não contêm a indicação de qualquer norma jurídica como violada pelo acórdão recorrido.”.

      Porém, não sendo este o entendimento perfilhado, quanto à matéria de direito, e seguindo a jurisprudência do Tribunal Constitucional, no sentido de ter julgado inconstitucional a norma dos artigos 412.º n.º 1 e 420.º, n.º 1 do C.P.P., quando interpretada no sentido da falta de conclusões levar à rejeição imediata do recurso, sem que previamente seja feito o convite ao recorrente para aperfeiçoar a deficiência, por violação do artigo 32.º n.º 1 da C.R.P. (Ac. Trib. Const. 19/1/99, Ac. Trib. Const. de 14/3/2002, publicado no Diário da Republica de 15/5/2002, II Série e. Ac. Trib. Const. de 07/10/2002, publicado no D R. 1ª série- A), deverá ser notificado o recorrente para aperfeiçoar o seu recurso, devendo ao formular as respectivas conclusões, indicar as normas jurídicas violadas, sob pena de, não o fazendo, então dever ser rejeitado tal recurso.

      Tendo a decisão de que se recorre e o respectivo recurso e resposta sido apresentados já na vigência da Lei 48/2007 de 29/08 em 15/09, há que ter em consideração o disposto no artigo 417.º n.º 3 do C.P.P., que expressamente determina que o Sr. Desembargador Relator convide a recorrente a completar e esclarecer as conclusões formuladas, no prazo de 10 dias, quando as conclusões não contiverem as indicações previstas no artigo 412.º, nºs 2 a 5 do mesmo diploma legal.

      Pelo que se emite parecer no sentido de que o Exmo. Sr. Desembargador Relator efectue convite à recorrente para aperfeiçoar o seu recurso, em matéria de direito, no prazo de 10 dias.

    2. - Nulidade da decisão Contudo, se assim se não entender, e se decidir que se deduz da Motivação apresentada, quais as normas jurídicas violadas, não havendo necessidade de formular tal convite, parece-nos que a decisão recorrida se encontra ferida de nulidade a que se refere ao artigo 379.º n.º 1 a) do C.P.P., por continuar a não respeitar o cumprimento do disposto no n.º 2 do artigo 374.º do C.P.P., ou seja, não efectua o exame crítico dos meios de prova utilizados para formar a convicção do tribunal, mesmo após o Tribunal da Relação de Coimbra ter anulado uma anterior decisão com esse fundamento.

      Nos termos do artigo 374.º n.º 2 do C.P.P. como explicitação do princípio constitucional inscrito no artigo 32.º n.º 1 e 205 n.º1 da C.R.P, ganha particular e decisiva Importância a fundamentação da decisão, ou seja, a exigência que dela conste não só a enumeração dos factos provados e não provados, mas ainda uma exposição, tanto quanto possível completa, ainda que concisa, dos motivos de facto e de direito, que fundamentam a decisão, com indicação e exame crítico das provas que serviram para formar a convicção do Tribunal.

      Desiderato prosseguido (para além da exigência da indicação das provas) com a novel imposição, não tanto o de se exigir um detalhado exame crítico da prova produzida, que a ter lugar é suportado pela documentação da prova e sua reapreciação por parte do Tribunal Superior, mas antes no exame crítico dos meios de prova, designadamente a sua razão de ciência de forma a como refere o Tribunal Constitucional no Ac. n.º 680/98 “ explicitar o processo de formação da convicção do tribunal”.

      Como também se afirma no Ac. ReI. Porto de 05/06/02, Proc. 0210320 in www.dgsi.pt “ estes motivos de facto que fundamentam a decisão não são nem os factos provados, nem os meios de prova, mas os elementos que em razão das regras da experiência ou de critérios lógicos constituem o substrato racional que conduziu a que a convicção do tribunal se formasse em determinado sentido, ou valorasse de determinada forma os diversos meios de prova apresentados em audiência … “.

      Sendo certo que, “tal fundamentação deverá intraprocessualmente permitir aos sujeitos processuais e ao Tribunal superior o exame do processo lógico ou racional que lhe subjaz, pela via do recurso” e extraprocessualmente “assegurar pelo conteúdo um respeito efectivo pelo princípio da legalidade na sentença, e a própria independência e imparcialidade dos juízes, uma vez que os destinatários da decisão não são apenas os sujeitos processuais, mas a própria sociedade … “.

      Como salienta o Prof. Figueiredo Dias in Direito Processual Penal, pág. 204 e segs II a convicção do juiz há-de ser uma convicção pessoal – até porque nela desempenha um papel de relevo não só a actividade meramente cognitiva mas também elementos racionalmente não explicáveis, p. ex a credibilidade que se concede a determinado meio de prova, e mesmo puramente emocionais –, mas em todo o caso, também ela uma convicção objectivável e motivável, capaz de se impor aos outros … “ Por isso mesmo “uma tal convicção existirá quando e só quando o tribunal tenha logrado convencer-se da verdade, para além de toda a dúvida razoável … “ assumindo-se aqui como fundamental ° princípio da imediação, isto é, “a relação de proximidade comunicante entre o Tribunal e os participantes do processo, de modo tal que aquele possa obter uma percepção própria do material que haverá de ter como base da sua decisão … “.

      Só estes princípios permitem, na verdade, o indispensável contacto vivo e imediato com os arguidos, a recolha da impressão deixada pela sua personalidade e a avaliação o mais correcta possível da credibilidade das declarações prestadas pelos participantes processuais, bem como uma plena audiência...

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