Acórdão nº 242 /00.9TAPRG.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 26 de Novembro de 2008

Data26 Novembro 2008
ÓrgãoCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

O Digno Magistrado do Ministério Público acusou o arguido …, casado, reformado / agricultor, nascido em 13/12/1935, natural de Poiares, concelho da Régua, filho de … e de …, residente na Casa dos Leões, Poiares, Peso da Régua.

imputando-lhe a prática de - um de um crime de burla qualificada, p.º e p.º pelos art.ºs 217.º, n.º 1, e 218.º, n.º 2, al. b), ambos do Código Penal (doravante CP.).

Por despacho de fls. 423 dos autos, foi admitida a intervenção como assistente de “CA…”, com sede em Sangalhos, Anadia.

Efectuado o julgamento foi proferida a sentença de fls. na qual se condenou o arguido como autor material, na forma dolosa e consumada, de um crime de burla qualificada, p.º e p.º pelos art.ºs 217.º, n.º 1, e 218.º, n.º 2, al.ª a), ambos do CPen., na pena de 03 (três) anos de prisão suspensa na sua execução pelo período de 04 (quatro) anos, com subordinação, porém, ao dever/condicionamento de o arguido proceder à entrega das quantias em que já foi condenado em sede cível (esc. 44.500.000$00, ou 221.965,06 euros, a que acrescem juros de mora vencidos, no montante global de 243.273,71 euros e, ainda, os vincendos sobre o referido montante de 221.965,06 euros e até efectivo pagamento) à assistente/lesada “CA….”, como reparação/satisfação àquela, no mesmo prazo de 04 (quatro) anos, a contar do trânsito em julgado, o que comprovará nos autos, à razão de um quarto do montante global respectivo no final de cada um de tais quatro anos.

Inconformado, recorreu o arguido, concluindo a sua motivação do seguinte modo: O douto aresto recorrido violou o preceituado nos artigos 217º, nº 1, 218º, nº 1 al. a) e 51º, nº 1 do Código Penal.

Dos factos dados por provados – dos quais, com o devido respeito, o arguido/recorrente considera terem resultado de erro notório na apreciação da prova, os constantes nos parágrafos 3,7,8 e 9 – não resultam preenchidos os requisitos impostos para a tipificação do crime de burla.

Aliás da fundamentação da convicção realizada pelo Tribunal “a quo”, nomeadamente no que concerne à análise da prova produzida – testemunhal e documental – também não resultam descritos quaisquer factos susceptíveis de integrar a previsão legal ficando-se pela fórmula repetida de “a forma como se sentiu enganada e os prejuízos sofridos” Não foram descritos factos susceptíveis de preencher a previsão legal, nomeadamente descrevendo os processos, os meios e os factos que, astuciosamente, o arguido/recorrente tivesse eventualmente criado.

Da análise conjugada dos depoimentos do arguido/recorrente, dos declarantes, administradores da Assistente bem como dos técnicos das entidades oficiais (Instituto da Vinha e do Vinho, Direcção Regional de Agricultura de trás os Montes) não resulta, contrariamente ao dado por provado, que o arguido/recorrente tenha “convencido” a assistente a realizar o negócio, nem, tão pouco, que o mesmo tivesse conhecimento e consciência que os direitos de plantio em causa não existiam. Tais depoimentos constam dos seguintes registos: 1- do arguido (registado na cassete nº 1,do início a final, e na cassete nº 2 a banda 709, cassete nº 2, lado B de banda 2230 a banda 1805, cassete nº 943 do Livro de Registos Magnéticos, lado A, de banda 1930 até à banda 360 do lado B) 2) do declarante … (registado na cassete nº 2 lado A, de banda 1805 e cassete nº 3 do início a banda 422).

A assistente teve conhecimento antes de efectuado qualquer pagamento que o arguido/recorrente se obrigava a adquirir a terceiros os direitos de plantio que a Quinta de Montargão não possuía – considerando a totalidade dos direitos objectos de negociação – para transmitir à Assistente (como também decorre da análise dos depoimentos supra referidos, como especial ênfase no depoimento do arguido/recorrente.

O incumprimento do negócio realizado entre o arguido/recorrente e a assistente é, exclusivamente, do domínio civil.

A serem verdadeiros os factos constantes da acusação e dados por provados em audiência de julgamento – i que, como já se referiu, não se admite, em aporte, nomeadamente os que aqui se reproduzem: 2. Na sequência, veio o arguido a convencê-los a realizar um negócio de transferência da propriedade(…) 7 (…)( e isso porque o arguido, ao agir ao descrito, a convenceu disso. 8. O arguido sabia que o aludido 1252 não tinha quaisquer direitos de plantio e que a sociedade “CA…”. “só lhe tinha entregado os 92.5000.000$00 devido aquela convicção. 9 – O arguido, ao agir como descrito fê-lo livre , consciente e deliberadamente, bem sabendo que com a sua conduta causava à sociedade assistente “CA…”..”um prejuízo de 44.500.000$00, corresponde ao benefício que para si obtinha , e que a sua conduta era proibida por lei.

Terem ocorrido devido a uma grande displicência da assistente, já que podendo facilmente confirmar a autenticidade dos documentos exibidos pelo arguido/recorrente – aliás nunca posta em causa – junto das entidades competentes, nomeadamente o Instituto da Vinha e do Vinho e a Direcção geral de Agricultura de Trás–os–Montes , como seria exigido a qualquer normal cidadão, minimamente diligente, nada fez.

Não é, pois, minimamente admissível, à luz do senso comum, da normal diligência exigida a qualquer cidadão, que a assistente não tivesse conhecimento da alegada não existência dos direitos de plantio: como referiu o arguido, no depoimento supra identificado, existia uma parte dos direitos transaccionados na Quinta de Montargão e a outra parte o arguido/recorrente comprometeu-se a adquirir para, posteriormente, os entregar à assistente.

Se assim não fosse, como seria concebível que a assistente com os seus Administradores e Técnicos, com o seu conhecimento na área vitivinícola entregasse 92.500.000$00 ao arguido/recorrente? O douto aresto ao suspender a execução da pena com “subordinação ao dever/condicionamento de o arguido proceder à entrega das quantias em que já foi condenado em sede cível”, não respeita as condições previstas no artº 51º do CP.

Não se trata no caso sub judice de uma indemnização nem da satisfação moral da assistente.

Esta é já detentora de um título executivo (uma sentença) e executou, no seguimento de tal decisão, o património do recorrente.

Em consequência deve ser revogada a douta decisão recorrida e substituída por outra que a) declarando improcedente por não provada a acusação deduzida a ora recorrente, ou se assim não se entender com o devido respeito, sem conceder, nem conceber.

Deve substituir-se a decisão em crise por outra que, condenando o arguido nos precisos termos daquela, suspenda a execução da pena sem subordinação ao dever/condicionamento de o arguido proceder à entrega das quantias em que foi condenado em sede cível.

O Mº Pº na comarca respondeu pugnando pela improcedência do recurso para tal concluindo: O Tribunal “a quo” captou de forma fidedigna a prova produzida em sede de audiência de discussão e julgamento, sendo os factos provados no acórdão condenatório o espelho dessa mesma prova.

Os factos provados no acórdão condenatório sob o nº 3,7,8 e 9 não enfermam do vício elencado na alínea c) do nº 2 do artº 410º do CPP, sendo a sua redacção lógica e racional conforme as regras da experiência comum.

Os factos provados constantes do acórdão condenatório são os bastantes para preencherem os elementos objectivos e subjectivo do crime de burla agravada p. e p. pelos artigos 217º, nº 1 e 218º, nº 2 al. a) do CP.

A suspensão da execução da pena pelo período de 4 anos, sujeita ao dever/condicionamento de o arguido proceder à entrega das quantias em que já foi condenado em sede civel, mostra-se conforme ao disposto no corpo do artº 51º do CP e da sua alínea a) nenhum reparo nos merecendo.

Nesta Relação o Exmo. Procurador –Geral Adjunto emite parecer no sentido de que deve ser negado provimento ao recurso face á matéria de facto apurada e de acordo com o grau de culpa e ilicitude.

Parecer que notificado não mereceu resposta.

Colhidos os vistos legais e efectuada a audiência há que decidir : O âmbito dos recursos afere-se e delimita-se através das conclusões formuladas na respectiva motivação conforme jurisprudência constante e pacífica desta Relação, bem como dos demais tribunais superiores, sem prejuízo das questões de conhecimento...

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