Acórdão nº 08S3437 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 18 de Fevereiro de 2009

Magistrado ResponsávelMÁRIO PEREIRA
Data da Resolução18 de Fevereiro de 2009
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça I - A autora AA, com o patrocínio do Ministério Público, instaurou no Tribunal do Trabalho de Guimarães contra BB Seguros S.A.

e CC, Lda, acção emergente de acidente de trabalho, pedindo a condenação das Rés a pagar-lhe, na medida das suas responsabilidades a) € 12,90 relativo a transportes; b) o capital de remição de uma pensão anual de € 1.220,86 com início em 21.10.2005; c) € 5.431,43 relativo a indemnização pelos períodos de incapacidade temporária; d) os juros de mora nos termos do art.138º do CT.

Alega a Autora que, no dia 20.10.2004, quando trabalhava para a 2ª Ré, foi vítima de um acidente, que descreve, sendo que, por causa dele, sofreu lesões que lhe determinaram uma IPP de 22,79%.

A Ré Seguradora contestou, alegando que o acidente se ficou a dever a inobservância das regras de segurança por parte da entidade patronal, razão por que não responde pelo mesmo, a título principal.

A Ré patronal veio apenas tomar posição relativamente aos documentos que a Ré Seguradora juntou com a contestação.

Saneada, condensada e julgada a causa, foi proferida sentença a condenar as Rés a pagar à Autora a) o capital de remição da pensão anual de € 1.028,16, com início em 21.10.2005, sendo € 1.021,65 da responsabilidade da Ré Seguradora e € 6,51 da responsabilidade da empregadora; b) a indemnização global de € 6.088,35 por incapacidades temporárias, sendo € 5.392,17 da responsabilidade da Seguradora e € 696,18 da responsabilidade da entidade patronal. Foi ainda a Ré Seguradora condenada a pagar à Autora € 12,90, a título de gastos com transportes. Ambas as Rés foram ainda condenadas no pagamento dos juros de mora à taxa legal, no que respeita às quantias atrás referidas.

Da sentença, apelou a Ré Seguradora, pedindo a revogação da sentença, e a sua substituição por acórdão que declare a responsabilidade, a título principal, da entidade patronal pelo acidente.

A Relação do Porto julgou improcedente a apelação, tendo confirmado a sentença.

II - Novamente inconformada, a ré BB Seguros interpôs a presente revista em que formulou as seguintes conclusões: 1ª. Da conjugação do n.° 1, do art. 8°, do D.L 441/91, 14.1, do n.° 4 do artigo 56°-A do Regulamento Geral de Segurança, Higiene e Saúde no Trabalho nos Estabelecimentos Industriais, e art. 18° do D.L. n.° 82/99, de 16.03, resulta que em caso algum é permitido o contacto das mãos do trabalhador com os elementos móveis do equipamento de trabalho no momento em que os mesmos estão em funcionamento, devendo a entidade empregadora "anular" todas as hipóteses de risco de contacto.

  1. Quando na parte final do art. 56°-A, n.° 4, da Portaria 53/[7]1, se fala na necessidade da existência de comandos bimanuais, tal significa que é o trabalhador que acciona a descida da prensa, devendo carregar em dois botões, em simultâneo, com cada uma das mãos.

    E deve ser esta operação que provoca, de imediato, a descida da prensa, obrigando o trabalhador a ter as mãos colocadas nos botões.

  2. Ou seja, do teor do art. 56°-A, n.° 4, resulta que a descida da prensa deve ocorrer apenas e tão só enquanto o trabalhador mantém ambas as mãos nos botões, a significar que quando ele retira as mãos dos botões o mecanismo de descida da prensa está completo e findo, ou então deve imediatamente parar.

  3. Ora, se não há dúvidas de que o comando bimanual consiste num sistema de segurança do qual resulta que a descida da prensa deve ocorrer apenas e tão só enquanto o trabalhador mantém ambas as mãos nos botões, a significar que quando ele retira as mãos dos botões o mecanismo de descida da prensa está completo e findo, ou então deve imediatamente parar, então: A. se a descida da prensa em causa, contrariamente ao que deveria ser, ocorria sem a pressão constante das mãos da A. nos aludidos botões, e B. se a sinistrada teve tempo para - após accionar o comando bimanual da prensa, apercebendo-se que o forro do sapato colocado na máquina não estava bem posicionado na gáspea, e, para rectificar a posição do forro - introduzir a mão direita no interior da prensa, sendo atingida pela máquina, que lhe apertou os dedos da mão direita, é lógico e forçoso concluir que, carregando a trabalhadora com ambas as mãos nos comandos bimanuais, o prato da prensa não descia de imediato, permitindo que a trabalhadora introduzisse a mão no interior da máquina.

  4. Ora, se o Douto Acórdão recorrido tivesse feito apelo, nos termos dos artigos 349° e 351° do Código Civil, às máximas da experiência e aos princípios da lógica teria chegado à conclusão de que se o sistema de comandos bimanuais da máquina em questão se encontrasse a funcionar correctamente, a trabalhadora sinistrada nunca teria tido tempo de introduzir a mão dentro da prensa.

  5. Não estando, à data do acidente, a prensa em questão inacessível às mãos da sinistrada quando a punção descia, através do correcto funcionamento do referido sistema de segurança de comando bimanual, conclui-se que a entidade patronal não observou as normas de segurança supra enunciadas, dever que sobre ela recaía e cujo cuidado é exigível a um empregador normal.

  6. Verificada a violação de regras de segurança, a presunção de culpa funciona desde que se verifique um nexo de causalidade entre essa violação e o acidente.

  7. Traduzindo-se a culpa (mera culpa) na omissão dos deveres de cuidado exigidos ao agente, a falta de observância das regras sobre segurança do trabalho mais não é do que a omissão de um especial dever de cuidado imposto por lei.

  8. A Lei actual passou a considerar, expressamente, a falta de observância sobre as regras de segurança, higiene e saúde no trabalho como fundamento de agravamento do direito à reparação.

  9. A R. alegou e provou a violação de normas de segurança por parte da entidade patronal e a existência de nexo de causalidade adequada entre esta conduta e o acidente sofrido pela A.. Isto porque, 11ª. A descida total do prato superior da prensa contra a mesa não carecia de pressão constante nos botões do comando bimanual (n.° 15° da matéria provada) apesar da máquina em questão apenas ser accionada pela pressão exercida simultaneamente em dois botões - comando bimanual - por ambas as mãos da trabalhadora (n.° 14 da matéria provada).

  10. O facto da máquina em questão permitir, indevidamente como vimos, que o prato concluísse a sua descida até atingir a mesa sem o exercício da pressão simultânea nos botões do comando bimanual, possibilitou que a A. introduzisse a mão direita na prensa acabando aquele prato por apertar-lhe os dedos da referida mão.

  11. Nesta sequência, impõe-se concluir que a R. é responsável, a título principal, pelo pagamento da pensão e da indemnização devidas à A., em virtude do acidente sofrido, por inobservância das normas de segurança previstas nos arts. 8º do D.L. n.° 441/91, de 14.11, 56°, n.° 4 e 56°-A, n.° 4 do Regulamento Geral de Segurança, Higiene e Saúde no Trabalho nos Estabelecimentos...

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