Acórdão nº 01033/13 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 05 de Junho de 2014
Magistrado Responsável | FERNANDA MAÇÃS |
Data da Resolução | 05 de Junho de 2014 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam no Pleno da Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo I-RELATÓRIO 1- A……………., L.DA., identificada nos autos, propôs, no STA, acção administrativa especial contra o CONSELHO DE MINISTROS, impugnando o acto administrativo contido no artigo 3º, nºs 1, al. a), e 2 do DL 35/2013, de 28 de Fevereiro, “o qual encurta o prazo atribuído à Demandante, e a todas as demais empresas titulares de pequenas centrais hídricas (PCH) destinatárias do mesmo acto, para beneficiar do regime remuneratório anterior ao DL nº 33-A/2005.” 2- Por despacho do Relator, de 31/10/2013 (fls. 309/311), foi julgado liminarmente a absolvição da instância do Conselho de Ministros, face à procedência da excepção dilatória de incompetência em razão da matéria – sindicância de acto político-legislativo – que, por força do art. 4º, nº 2, al. a) do ETAF, está excluída do âmbito da jurisdição administrativa.
2-2- Inconformada, a A……………, L.DA., reclamou desse despacho para a conferência (fls. 316-339), que indeferiu a reclamação, por acórdão de 29.01.2014 (fls. 371-375), mantendo o despacho reclamado.
3- Notificada deste acórdão, A………………, L.DA., vem (a fls. 380) interpor recurso jurisdicional para o Pleno da Secção do Contencioso Administrativo do STA, ao abrigo do art. 25º, nº1, alínea a), do ETAF, e dos art.s 140º, e segs. do CPTA, ex vi CPC, concluindo as alegações do modo seguinte: “1ª Para sustentar que o ato impugnado, constante do artigo 3.°, n.° 1, alínea a), e n.° 2, do Decreto-Lei n.° 35/2013, de 28 de fevereiro, que encurtou de 35 para 25 anos o prazo ao abrigo do qual a ora Recorrente vem explorando as PCH de que é titular, é um ato administrativo sob forma legislativa é preciso demonstrar qual a norma legal pré-existente que o citado artigo 3°, n.° 1, alínea a), e n.° 2, supostamente executa, ou a cujas opções políticas se submete.
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A norma legal pré-existente que o citado artigo 3°, n.° 1, alínea a), e n.° 2, executa é a norma do n.° 20 do anexo II do Decreto-Lei n.° 189/88, de 27 de maio, na redação do Decreto-Lei n.° 33-A/2005, de 16 de fevereiro, alterado pelo Decreto-Lei n.° 225/2007, de 31 de maio, e mantido pelo próprio Decreto-Lei n.° 35/2013, de 28 de fevereiro, que estabeleceu um prazo máximo de 25 anos a contar da licença de exploração para aplicação do regime remuneratório definido nesse mesmo anexo às PCH.
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Caso se entenda que o ato impugnado não aplica uma norma legal pré-existente a um caso concreto, então não poderá deixar de se admitir que o mesmo consubstancia uma lei-medida ou uma lei individual, que define a situação jurídica de um grupo de casos concretos, com referência a destinatários individualizáveis, pelo que a sua exclusão da jurisdição administrativa, ao abrigo do disposto no artigo 4.°, n.° 2, alínea a), do ETAF não pode ser feita sem que previamente se averigue se o ato em causa é configurável como um ato legislativo individual que restringe direitos, liberdades e garantias e se existe alguma outra via para impugnar judicialmente o mesmo ato, sob pena de se abrir uma brecha inaceitável nos princípios da constitucionalidade dos atos do poder público e da tutela jurisdicional efetiva, consagrados nos artigos 3.°, n.° 3, 18.°, n.° 3, 20.° e 268.°, n.° 4, da Constituição.
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Ao considerar que o ato impugnado não é um ato administrativo sob forma legislativa, mas um verdadeiro ato legislativo, assim se declarando incompetente para o conhecimento da presente ação, a decisão recorrida viola o disposto nos artigos 4.°, n.° 2, alínea a), do ETAF, 268°, n.° 4, da Constituição e 52°, n.° 1, do CPTA.
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A decisão recorrida interpreta e aplica o disposto no artigo 4°, n.° 2, alínea a), do CPTA no sentido de que, concluindo-se que o ato impugnado tem natureza legislativa, a sua sindicância não cabe no âmbito da jurisdição administrativa, sem que seja necessário apurar qual a exata espécie dentro do género legislativo que está em causa, designadamente uma lei-medida ou uma lei individual restritiva dos direitos, liberdades e garantias, o que se mostra violador dos princípios da constitucionalidade e da tutela jurisdicional efetiva, consagrados nos artigos 3°, n° 3, 18.°, n.° 3, 20.° e 268.°, n.° 4, da Constituição.
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A interpretação e aplicação do artigo 4.°, n.° 2, alínea a), do ETAF, consubstanciada na exclusão da jurisdição administrativa de um ato legislativo, sem averiguar se o mesmo reveste natureza individual e concreta restritiva de direitos e princípios constitucionais, viola ainda o artigo 13.° da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, sobre o direito a um recurso efetivo, em conjugação com o artigo 1.° do Protocolo 1 da mesma Convenção, sobre a proteção da propriedade privada.
NESTES TERMOS Deve, com o douto suprimento de V. Exas., ser concedido provimento ao presente recurso, admitindo-se a sindicância do ato impugnado e declarando-se a sua nulidade, ou anulando-o, com as legais consequências.
Só assim se decidindo será cumprido o Direito e feita Justiça!” 4- Admitido o recurso, fls. 417, o recorrido Conselho de Ministros apresentou (fls. 422-457) Contra-alegações, com as Conclusões seguintes: “I. Para determinar se os comandos impugnados, inseridos no Decreto-Lei n.° 35/2013, de 28 de Fevereiro, constituem actos administrativos sob forma de lei ou verdadeiros enunciados de natureza legislativa, há que testá-los face a todos os critérios de definição de lei e acto administrativo — orgânico, formal, estrutural, e sobretudo à luz do critério material, que é decisivo; II. Um enunciado materialmente legislativo exprime a vontade política primária da comunidade, definindo o que esta assume ser o interesse geral, ao passo que um enunciado de natureza administrativa desempenha um papel condicionado e subordinado de concretização, de realização prática do interesse geral superiormente definido pelo legislador. A lei cria Direito; o acto administrativo aplica-o, sendo que a sujeição mais directa da lei ao princípio da constitucionalidade é um reflexo — e não a causa — dessa circunstância, pelo que essa sujeição não serve como critério de distinção entre lei e acto administrativo; III. Os comandos do artigo 3.°, n.° 1, alínea a), e n.° 2 do Decreto-Lei n.° 35/2013, de 28 de Fevereiro, não executam qualquer norma legal pré-existente. A sugestão de que a norma legal supostamente executada é aquela que consta do n.° 20 do anexo II do Decreto-Lei n.° 189/88, de 27 de Maio, na versão actual, é lógica e legalmente impossível: (i) porque isso se traduziria numa pretensa execução contra legem; (ii) porque os dois enunciados não coincidem nos destinatários; (iii) porque a norma supostamente executada é auto-exequível, não carecendo de qualquer acto jurídico de execução. Pelo contrário, os comandos impugnados, longe de se destinarem a executar qualquer comando legal pré-existente, verdadeiramente inovam, por si só, no ordenamento jurídico; IV. Os comandos constantes do artigo 3.°, n.° 1, alínea a), e n.° 2 do Decreto-Lei n.° 35/2013, de 28 de Fevereiro, têm, pois, natureza legislativa, o que, só por si, é suficiente para afastar a competência ratione materiae dos tribunais administrativos; V. Os comandos impugnados configuram um acto genérico, ou seja, um verdadeiro acto normativo. Os destinatários e a situação, nos comandos impugnados, são...
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