Acórdão nº 01030/13 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 05 de Junho de 2014

Magistrado ResponsávelPOLÍBIO HENRIQUES
Data da Resolução05 de Junho de 2014
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam no Pleno da Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo 1. RELATÓRIO A…………, S.A, já devidamente identificada nos autos, intentou a presente acção administrativa especial contra o Conselho de Ministros, pedindo a declaração de nulidade ou anulação do acto do conselho de Ministros, contido no artigo 3º, nºs 1, alínea a), e 2 do Decreto-Lei nº 35/2013, de 28 de Fevereiro, que determinou o encurtamento do prazo ao abrigo do qual a Demandante vinha explorando as pequenas centrais hídricas (PCH) de que é titular.

O relator, por despacho de fls. 291-292, julgou o Supremo Tribunal Administrativo incompetente em razão da matéria.

Apreciando reclamação, a conferência, pelo acórdão de fls. 393-397, confirmou o despacho do relator.

1.1. Inconformada, a autora recorre para o Pleno apresentando alegações com as seguintes conclusões: 1ª Para sustentar que o acto impugnado, constante do artigo 3º, nº 1, alínea a), e nº 2, do Decreto-Lei nº 35/2003, de 28 de Fevereiro, que encurtou de 35 para 25 anos o prazo ao abrigo do qual a ora Recorrente vem explorando as PCH de que é titular, é um acto administrativo sob forma legislativa é preciso demonstrar qual a norma legal pré-existente que o citado artigo 3º, nº 1, alínea a), e nº 2, supostamente executa, ou a cujas opções políticas se submete.

  1. A norma legal pré-existente que o citado artigo 3º, nº 1, alínea a), e nº 2, executa é a norma do nº 20 do anexo II do Decreto-Lei nº 189/88, de 27 de Maio, na redacção do Decreto-Lei nº 33-A/2005, de 16 de Fevereiro, alterado pelo Decreto-Lei nº 225/2007, de 31 de Maio, e mantido pelo próprio Decreto-Lei nº 35/2013, de 28 de Fevereiro, que estabeleceu um prazo máximo de 25 anos a contar da licença de exploração para aplicação do regime remuneratório definido nesse mesmo anexo às PCH.

  2. Caso se entenda que o acto impugnado não aplica uma norma legal pré - existente a um caso concreto, então não poderá deixar de se admitir que o mesmo consubstancia uma lei-medida ou uma lei individual, que define a situação jurídica de um grupo de casos concretos, com referência a destinatários individualizáveis, pelo que a sua exclusão da jurisdição administrativa, ao abrigo do artigo 4º, nº 2, alínea a), do ETAF não pode ser feita sem que previamente se averigúe se o acto em causa é configurável como um acto legislativo individual que restringe direitos, liberdades e garantias e se existe alguma outra via para impugnar judicialmente o mesmo acto, sob pena de se abrir uma brecha inaceitável nos princípios da constitucionalidade dos actos do poder público e da tutela jurisdicional efectiva, consagrados nos artigos 3º, nº 3, 18º, nº 3, 20º e 268º, nº 4 da Constituição.

  3. Ao considerar que o acto impugnado não é um acto administrativo sob forma legislativa, mas um verdadeiro acto legislativo, assim se declarando incompetente para o conhecimento da presente acção, a decisão recorrida viola o disposto nos artigos 4º, nº 2, alínea a), do ETAF, 268º, nº 4, da Constituição e 52º, nº 1 do CPTA.

  4. A decisão recorrida interpreta e aplica o disposto no artigo 4º, nº 2, alínea a), do ETAF no sentido de que, concluindo-se que o acto impugnado tem natureza legislativa, a sua sindicância não cabe no âmbito da jurisdição administrativa, sem que seja necessário apurar qual a exacta espécie dentro do género legislativo que está em causa, designadamente uma lei-medida ou uma lei individual restritiva dos direitos, liberdades e garantias, o que se mostra violador dos princípios da constitucionalidade e da tutela jurisdicional efectiva, consagrados nos artigos 3º, nº 3, 18º, nº 3, 20º e 268º, nº 4, da Constituição.

  5. A interpretação e aplicação do artigo 4º, nº 2, alínea a), do ETAF, consubstanciada na exclusão da jurisdição administrativa de um acto legislativo, sem averiguar se o mesmo reveste natureza individual e concreta restritiva de direitos e princípios constitucionais, viola ainda o artigo 13º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, sobre o direito a um recurso efectivo, em conjugação com o artigo 1º do Protocolo 1 da mesma Convenção, sobre a protecção da propriedade privada.

NESTES TERMOS Deve, com o douto suprimento de V. Exas., ser concedido provimento ao presente recurso, admitindo-se a sindicância do acto impugnado e declarando-se a sua nulidade, ou anulando-o, com as legais consequências.

Só assim se decidindo será cumprido o Direito e feita Justiça! 1.2. O Conselho de Ministros contra - alegou formulando as seguintes conclusões: I. Para determinar se os comandos impugnados, inseridos no Decreto-Lei nº 35/2013, de 28 de Fevereiro, constituem actos administrativos sob a forma de lei ou verdadeiros enunciados de natureza legislativa, há que testá-los face a todos os critérios de definição de lei e acto administrativo - orgânico, formal, estrutural, e sobretudo à luz do critério material, que é decisivo. II. Um enunciado materialmente legislativo exprime a vontade política primária da comunidade, definindo o que esta assume ser o interesse geral, ao passo que um enunciado de natureza administrativa desempenha um papel condicionado e subordinado de concretização, de realização prática do interesse geral superiormente definido pelo legislador. A lei cria o Direito; o acto administrativo aplica-o, sendo que a sujeição mais directa da lei ao princípio da constitucionalidade é um reflexo – e não a causa – dessa circunstância, pelo que essa sujeição não serve como critério de distinção entre lei e acto administrativo; III. Os comandos do art. 3º, nº 1, al. a), e nº 2 do DL nº 35/2013, de 28 de Fevereiro, não executam qualquer norma pré-existente. A sugestão de que a norma legal supostamente executada é aquela que consta do nº 20 do anexo II do DL nº 189/88, de 27 de Maio, na versão actual, é lógica e legalmente impossível: (i) porque isso se traduziria numa pretensa execução contra legem; (ii) porque os dois enunciados não coincidem nos destinatários; (iii) porque a norma supostamente executada é auto - exequível, não carecendo de qualquer acto jurídico de execução. Pelo contrário, os comandos impugnados, longe de se destinarem a executar qualquer comando legal pré-existente, verdadeiramente inovam, por si só, no ordenamento jurídico; IV. Os comandos constantes do art. 3º, nº 1, al. a) e nº 2 do DL nº 35/2013, de 28 de Fevereiro, têm, pois, natureza legislativa, o que só por si, é suficiente para afastar a competência ratione materiae dos tribunais administrativos; V. Os comandos impugnados configuram um acto genérico, ou...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT