Acórdão nº 022/12 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 27 de Março de 2014
Magistrado Responsável | COSTA REIS |
Data da Resolução | 27 de Março de 2014 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam no Pleno do Supremo Tribunal Administrativo A…………, Procurador-Geral Adjunto, intentou neste STA, contra o CONSELHO SUPERIOR DO MINISTÉRIO PÚBLICO, acção administrativa especial impugnando a sua deliberação, de 20/09/2011, que lhe aplicou a sanção disciplinar de 90 de suspensão do exercício de funções.
Com êxito já que o Acórdão recorrido, muito embora tenha julgado improcedentes os restantes vícios imputados àquela decisão, entendeu que tinha havido violação de lei por o processo disciplinar onde foi o Autor punido ter sido distribuído sem que tivesse havido sorteio e, com esse fundamento, julgou a acção procedente e anulou a deliberação impugnada.
Quer o Autor quer o Réu interpuseram recurso.
O Autor concluiu a sua alegação do seguinte modo: I. Não se tendo pronunciado sobre o pedido formulado pelo Recorrente, de notificação do CSMP para juntar aos autos o Inquérito n.º 145/10.9YFLSB, absolutamente indispensável ao julgamento por ali ter sido arguida não apenas a nulidade do despacho de arquivamento junto a fls. 237 a 253 como a nulidade e inexistência de todo o inquérito, o acórdão incorreu em omissão de pronúncia, padecendo, em consequência, da nulidade prevista no art.° 668.° n.º 1, al.ª d), do CPC.
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O acórdão recorrido padece de erro de julgamento quanto à inexistência de infracção disciplinar, porquanto os factos que integram o procedimento disciplinar que antecedeu o acto sancionatório não evidenciam a existência de qualquer infracção disciplinar, assim violando os artigos 163.°, 170.º, 175.º e 183.° do Estatuto do Ministério Público (EMP).
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O acórdão recorrido padece de erro de julgamento por desconsideração da violação de lei por violação da liberdade de expressão e opinião do Recorrente, tal como consagrada no artigo 37° da Constituição e no n.º 1 do artigo 10.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem.
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O acórdão recorrido padece de erro de julgamento por desconsiderar que o Recorrente se limitou a exercer o dever obrigatório de denúncia previsto no n.º 1 do artigo 242° do Cód. Proc. Penal, o que constitui circunstância dirimente da responsabilidade disciplinar de acordo com a al.ª e) do art.º 21° do Estatuto Disciplinar dos Trabalhadores que Exercem Funções Públicas.
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O acórdão recorrido incorreu em manifesto erro de julgamento por desconsideração da nulidade por preterição do direito de defesa do recorrente, contrariando o acórdão do STA, de 31/08/2011 (Processo nº 758/11), preterindo o caso julgado e incorrendo em nulidade em conformidade com a alínea h) do n.º 2 do artigo 133º do CPTA.
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O Acórdão recorrido incorreu em manifesto lapso de julgamento por desconsideração da nulidade por preterição do direito de defesa do Recorrente, contrariando o Acórdão do STA de 31/08/2011 (proc. 758/11).
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O acórdão recorrido padece de erro de julgamento por desconsideração da nulidade por preterição do direito de defesa do Recorrente nos termos dos n.ºs 1 e 10 do art.° 32.° da CRP, da alínea d) do nº 2 do artigo 133° do CPA e dos art.ºs 195.° e 204.° do EMP.
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O acórdão padece de erro de julgamento por incongruência interna do acto impugnado, dado que a punição disciplinar se baseia no facto do Recorrente ter apresentado uma denúncia relativa a actos que não consubstanciavam a prática dos crimes que imputava aos denunciados, já que tais actos foram praticados no alegado entendimento da sua legalidade, não se compreendendo que a entidade demandada não tenha mandado extrair certidão para instauração de procedimento criminal pelo crime p. e p. no art.º 365° do Código Penal, que é de natureza pública.
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O acórdão recorrido padece de erro de julgamento por desconsideração do carácter excessivo da sanção aplicada ao Recorrente, em violação do princípio da proporcionalidade, constante do artigo 5° do CPA, não preenchendo os requisitos de aplicação do artigo 183° do EMP, o que indicia erro notório e grosseiro na aplicação da sanção.
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O acórdão recorrido padece de erro de julgamento por desconsiderar o impedimento do Sr. PGR, estava legalmente impedido de exercer a competência, como decorre do artigo 192° do EMP e do artigo 44° do CPA contaminando de ilegalidade o acto final sancionatório.
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O acórdão recorrido padece de erro de julgamento, ao sancionar o Recorrente por ter defendido a legalidade democrática com a denúncia contra os seus superiores em situação ilegal, ao invés do que decidiu por exemplo o Pleno do STA no Ac. de 16.6.11, R. 1106/09, “O «estatuto próprio» atribuído pelo art. 219. °, n.º 2, da CRP ao Ministério Público implica as restrições de direitos individuais dos seus magistrados necessárias para assegurar que as suas funções são exercidas de forma a garantir a satisfação do interesse primordial da defesa da legalidade democrática.” O Conselho Superior do M.P. rematou as suas alegações do seguinte modo: 1. A distribuição do processo disciplinar do Senhor Magistrado Autor foi efectuada pela Vice-PGR, em substituição do PGR, que detém competência para a prática do acto.
SEM PRESCINDIR 2. O acto de distribuição foi RATIFICADO pelo Plenário do CSMP.
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O sorteio é o instrumento da distribuição, cujo único objectivo é a distribuição equitativa do serviço.
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Não tendo sido impugnada nem demonstrada a violação dessa finalidade, a distribuição operada não enferma de qualquer vício.
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O Acórdão errou quando julgou verificado o vício de violação de lei, por afronta da norma do artigo 30.º, n.º 1, do EMP. Por isso 6. Deve ser revogado e substituído por outro que julgue improcedente esse vício e que julgue a Acção totalmente improcedente.
Tanto o Autor como o CSMP contra alegaram.
O Autor rematou assim as suas contra alegações: I. A competência para a distribuição dos processos disciplinares pelo CSMP é uma competência própria e exclusiva deste Conselho, resultante da sua competência ampla para a prática de todos os actos de idêntica natureza ao exercício da acção disciplinar respeitantes aos magistrados do Ministério Público (vide artigo 27.°, al. a) do EMP).
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O Conselho Superior do Ministério Público não delegou no Procurador-Geral da República a prática do ato de distribuição dos processos disciplinares (vide artigo 31.º do EMP).
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Não detendo, assim, o Vice-Procurador-Geral da República competência para praticar a distribuição dos processos disciplinares em substituição do PGR (vide artigo 13.° do EMP).
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Em toda a matéria de facto relevante julgada provada no douto acórdão ora recorrido, não resultou fixada a existência de qualquer posterior deliberação do Plenário do Conselho Superior do Ministério Público que viesse ratificar o ato praticado pela Exma. Sr.ª Vice-Procurador-Geral da República, de distribuição do processo disciplinar então em crise.
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O objectivo do sorteio, enquanto instrumento da distribuição, é assegurar a distribuição do serviço pelos membros do CSMP e garantir a transparência e objectividade da distribuição.
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Tais princípios só podem ser assegurados pela existência de um suporte físico desse mesmo acto.
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Em toda a matéria de facto relevante julgada provada no douto acórdão ora recorrido, resulta evidente a ausência de qualquer suporte documental da existência de sorteio, nos termos previstos no n.º 2, do artigo 16º do Regulamento Interno da Procuradoria-Geral da República e, bem assim, a designação de relator no respeito desse trâmite legal.
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Sendo o acto nulo, por carecer em absoluto de forma legal, sem quaisquer efeitos jurídicos e insusceptível de ratificação, de acordo com as disposições combinadas dos artigos 133.°, n.ºs 1 e 2, alínea f); 134º, n.º 1 e 137.°, n.º 1 do CPA.
O CSMP rematou as suas contra alegações da seguinte forma: 1. O Acórdão recorrido operou um acertado e justo julgamento quanto aos vícios que o Sr. Magistrado Autor imputou ao acto punitivo, inexistindo qualquer fundamento para a sua revogação, designadamente ERRO DE JULGAMENTO.
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Não enferma de qualquer NULIDADE, designadamente por omisso de pronúncia, eventualmente detectável no despacho saneador, que não foi, nem pode já ser objecto de recurso.
FUNDAMENTAÇÃO I. MATÉRIA DE FACTO O Acórdão recorrido julgou provados os seguintes factos:
a) O requerente é Procurador-Geral Adjunto (PGA) no ………….
b) Na sequência da manutenção em funções do Sr. Vice – Procurador Geral da República, Dr. B…………, após ter atingido a idade da jubilação/aposentação, o requerente apresentou junto do Sr. Procurador Geral da República uma queixa-crime pela prática dos crimes de abuso do poder e de usurpação de funções - doc. 1 junto com a pi.
c) Com a data de 5/10/2010 o requerente dirigiu ao Presidente do Supremo Tribunal de Justiça um requerimento cuja cópia se mostra junta a fls. 90 e seguintes, denunciando o Sr. Procurador-Geral da República, o Sr. Vice-Procurador Geral da República e o Sr. Secretário da Procuradoria-Geral da República da prática de vários crimes, a saber: Com a conduta descrita, o primeiro denunciado ao omitir a requerida instauração do procedimento criminal contra o segundo, incorreu na prática de um crime de denegação de justiça p. p. no art. 369º do C. Penal; os dois primeiros denunciados incorreram em co-autoria e concurso real na prática dos crimes de abuso do poder e de usurpação de funções, p. p. respectivamente pelos art.ºs 382º e 358º do C. Penal e os três denunciados incorreram ainda como co-autores na prática de um crime de peculato de uso p. p. pelo art. 376º do C. Penal”; d) Em 17/11/2010, foi proferido despacho pelo Ex.mo Sr. Conselheiro Relator no processo 1445/19.9yflsb (que se iniciou com a denúncia acima referida), junto a fls. 385 a 400, aqui dado como reproduzido e donde consta, além do mais, o seguinte: “Concluindo: Os factos apurados não integram manifestamente nenhum dos crimes indicados na denúncia, nem qualquer outro ilícito criminal.
Nos termos do art. 277º, n.º 1, do CPP, determino o arquivamento dos autos.
Notifique-se o denunciante, nos termos do n.º 3 do mesmo artigo.
Dê-se conhecimento aos denunciados deste despacho.
(…)” e) Por despacho de 8/10/2010...
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