Acórdão nº 612/08 de Tribunal Constitucional (Port, 10 de Dezembro de 2008

Data10 Dezembro 2008
Órgãohttp://vlex.com/desc1/2000_01,Tribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 612/2008

Processo n.º 34/08

  1. Secção

    Relator: Conselheiro Carlos Fernandes Cadilha

    (Conselheira Ana Guerra Martins)

    Acordam na 3ª Secção do Tribunal Constitucional

    1. Relatório

    1. Na presente acção emergente de acidente de trabalho, o Tribunal da Relação do Porto, por acórdão de 19 de Novembro de 2007, recusou a aplicação da norma do n.º 2 da Base XXII da Lei nº 2127, de 3 de Agosto de 1965, com fundamento na sua inconstitucionalidade, no ponto em que determina que o pedido de revisão da pensão por modificação da capacidade de ganho da vítima apenas pode ser formulado dentro dos dez anos posteriores à data da fixação da pensão.

    Interposto, pelo Ministério Público, recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do disposto no artigo 70º, n.º 1, alínea a), e 72º, n.º 3, da Lei do Tribunal Constitucional, a então relatora proferiu decisão sumária, por remissão para anterior jurisprudência, declarando a referida disposição inconstitucional por violação do direito do trabalhador à justa reparação consagrado no artigo 59º, n.º 1, alínea f), da Constituição.

    Contra essa decisão deduziu o Ministério Público reclamação para a conferência por entender que a questão a decidir, dada a especificidade do caso, não poderia ser qualificada como simples, para efeito de ser apreciada em decisão sumária.

    Tendo sido deferida a reclamação, no prosseguimento do processo, o Ministério Público veio a apresentar alegações em que conclui do seguinte modo:

  2. - A norma constante do nº 2 da Base XXII da Lei nº 2127, ao consagrar um prazo – absolutamente preclusivo – de 10 anos, contados da fixação da pensão, para a revisão da pensão devida ao sinistrado por acidente laboral, com fundamento em agravamento superveniente das lesões sofridas, é materialmente inconstitucional, por violação do artigo 59º, nº 1, alínea f) da Constituição.

  3. - Não deverá – salvo melhor opinião – condicionar decisivamente tal julgamento de inconstitucionalidade a circunstância “fáctica” de terem ou não ocorrido actualizações intercalares da pensão: na verdade, sendo evidente que estas indiciam a existência de um processo patológico evolutivo, tornando absolutamente injustificada a aplicação rígida do referido prazo de caducidade, não poderá excluir-se que – à semelhança do que ocorre no direito civil – seja relevante um recidiva ou recaída tardia, desde que naturalmente o sinistrado faça prova cabal do nexo causal existente entre o acidente e o agravamento das lesões.

  4. - Termos em que deverá confirmar-se o juízo de inconstitucionalidade formulado no acórdão recorrido.

    Não houve contra-alegações.

    Cumpre apreciar e decidir.

    1. Fundamentação

      1. Como resulta dos elementos dos autos, na presente acção emergente de acidente de trabalho, foi atribuída ao sinistrado uma incapacidade permanente parcial para o trabalho de 20% por acidente de trabalho sofrido em 11 de Maio de 1993, com o consequente abono da correspondente pensão, que foi fixada em 7 de Junho de 1996.

        Um primeiro pedido de revisão, formulado ainda dentro do prazo cominado no n.º 2 da Base XXII da Lei nº 2127, de 3 de Agosto de 1965, foi indeferido, por despacho de 10 de Março de 2003, por se considerar que se não tinha verificado um agravamento das lesões que justificasse a modificação da capacidade geral de ganho do sinistrado.

        Um segundo pedido de revisão foi indeferido, em primeira instância, por ter entretanto decorrido o prazo de dez anos a que se refere aquele preceito.

        Em recurso, o Tribunal da Relação do Porto, através da decisão ora recorrida, ordenou a admissão e o posseguimento do incidente de revisão, desaplicando a referida norma da Base XXII, n.º 2, da Lei nº 2127, por inconstitucionalidade, no ponto em fixa um prazo preclusivo de dez anos para a formulação do pedido de revisão, baseando-se para tanto na fundamentação constante do acórdão do Tribunal Constitucional n.º 147/2006.

      2. A Base XXII da Lei de Acidentes de Trabalho de 1965, ao caso aplicável, sob a epígrafe «Revisão das pensões», dispunha o seguinte :

      3. Quando se verifique modificação da capacidade de ganho da vítima, proveniente de agravamento, recidiva, recaída ou melhoria da lesão ou doença que deu origem à reparação, ou quando se verifique aplicação de prótese ou ortopedia, as prestações poderão ser revistas e aumentadas, reduzidas ou extintas, de harmonia com a alteração verificada.

      4. A revisão só poderá ser requerida dentro dos dez anos posteriores à data da fixação da pensão e poderá ser requerida uma vez em cada semestre, nos dois primeiros anos, e uma vez por ano, nos anos imediatos.

      5. Nos casos de doenças profissionais de carácter evolutivo, designadamente pneumoconioses, não é aplicável o disposto no número anterior, podendo requerer-se a revisão em qualquer tempo; mas, nos dois primeiros anos, só poderá ser requerida uma vez no fim de cada ano.

        Esta norma, entretanto revogada, foi praticamente reproduzida no artigo 25º da referida Lei n.º 100/97, de 13 de Setembro, que estabelece o novo regime jurídico dos acidentes de trabalho.

        Estando em causa o prazo preclusivo mencionado naquele n.º 2, para efeito da admissibilidade da formulação de um pedido de revisão de pensões, deve começar por dizer-se que a situação versada no citado acórdão do Tribunal Constitucional n.º 147/2006, que serviu de...

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