Acórdão nº 29/13 de Tribunal Constitucional (Port, 15 de Janeiro de 2013

Data15 Janeiro 2013
Órgãohttp://vlex.com/desc1/2000_01,Tribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO 29/2013

Processo n.º 198/12

  1. Secção

Relator: Conselheiro José da Cunha Barbosa

Acordam na 1.ª secção do Tribunal Constitucional

  1. Relatório

    1. A., melhor identificada nos autos, recorre para o Tribunal Constitucional ao abrigo da alínea b), do n.º 1, do artigo 70.º, da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro, na sua atual versão (LTC), do Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, considerando que a interpretação por este adotada “ao admitir a violação do art. 403.º, da Lei n.º 25/2004 é claramente inconstitucional por se traduzir numa limitação inadmissível do exercício legítimo das funções de dirigente sindical, violando o entendimento que pacificamente decorre do art. 55.º, n.º 6, da Constituição e violando ainda o art. 112.º da Constituição, ao admitir que o citado art. 403.º, como norma regulamentar que é, podia alterar o regime constante do Código do Trabalho de 2003 em matéria de faltas justificadas.”

    2. A recorrida – B., S.A - intentou ação contra a recorrente, pedindo a condenação desta no pagamento de quantia de 9663,8 €, referente a remunerações salariais e outras prestações laborais indevidamente pagas, durante um período de tempo em que, por força do disposto no artigo 403.º, da Lei n.º 35/2004, de 29 de julho, o respetivo contrato de trabalho se encontrava suspenso. A decisão da primeira instância julgou procedente o pedido da (ora) recorrida. Inconformada, a recorrente interpôs recurso junto do Tribunal da Relação de Lisboa, que indeferiu o pedido, considerando que:

      (…)

      O referido art. 55.º consagra a liberdade sindical, fazendo-o nos seguintes termos:

      1. É reconhecida aos trabalhadores a liberdade sindical, condição e garantia da construção da sua unidade para defesa dos seus direitos e interesses.

      (…)

      6 – Os representantes eleitos dos trabalhadores gozam do direito à informação e consulta, bem como à proteção legal adequada contra quaisquer formas de condicionamento, constrangimento ou limitação do exercício legítimo das suas funções.

      Garante-se, assim, aos representantes eleitos dos trabalhadores o direito à informação e consulta, bem como à proteção legal adequada contra quaisquer formas de condicionamento, constrangimento ou limitação do exercício legítimo das suas funções.

      Todavia, como se assinala no Ac. do Tribunal Constitucional de 12 de julho de 2001 (…), do ponto de vista constitucional, não é de excluir que a proteção do exercício da atividade sindical dos representantes dos trabalhadores se possa concretizar por diferentes formas, designadamente no que toca à extensão e tipo de regime de proteção.

      (…)

      Na subsunção destes princípios ao caso concreto, o que está em causa, ao fim e ao resto, é a justificação das faltas dadas pela ré, dirigente sindical, precisamente para o exercício dessas funções, e que o legislador admite sem limitação temporal, embora, naturalmente, considerando os interesses do empregador, sem direito à remuneração.

      A apelante entende que o art. 403.º da Lei n.º 35/2004, de 29 de julho, também é inconstitucional por violar o disposto nos n.ºs 2 e 7 do art. 112.º da Constituição da República Portuguesa (…).

      A Lei n.º 35/2004, de 29 de julho, foi aprovada pela Assembleia da República, nos termos da alínea c) do art. 161.º da Constituição, que lhe confere competência para fazer leis sobre todas as matérias, salvo as reservadas pela Constituição ao Governo, ou seja, nos termos da mesma alínea à luz da qual foi aprovada a Lei n.º 99/2003, de 27 de agosto que aprovou o Cod. do Trabalho, razão pela qual não têm aqui qualquer aplicação os preceitos invocados.

      Acrescenta, finalmente, a apelante que como a ré é membro da Direção do STAD desde 1 de abril de 1999 e, desde há mais de 9 anos que as sucessivas empresas de prestação de serviços de limpeza que foram suas empregadoras na execução daqueles serviços no Aeroporto de Lisboa lhe pagaram a retribuição correspondente a uma semana de trabalho, acrescida do pagamento de férias, subsídio de férias e de Natal ainda que a ré estivesse a faltar para o exercício de funções sindicais por mais de um mês por forma consecutiva existe uma situação de autovinculação da autora ao pagamento daquela retribuição.

      Ficou provado que a apelada desde 2004 pagou à apelante o referido crédito de horas, o que sucedeu porque a sua máquina de recursos humanos se limitou a continuar a uma prática anterior (factos provados 32 a 36 e 38) e provado ficou também que a apelada é uma grande empresa, com centenas de estabelecimentos e mais de 400 trabalhadores, com uma rotatividade de pessoal de cerca de 40% ao ano (factos provados 7, 8, 30 e 31).

      (...)

      Improcedem assim in totum as conclusões do recurso.

      (…)

      Seguiu-se, finalmente, o recurso de constitucionalidade que agora se aprecia.

      Notificada, a recorrente concluiu as suas alegações nos seguintes termos:

      «(...)

    3. A Recorrida intentou ação contra a ora Recorrente invocando e pedindo em suma o seguinte:

      a) No dia 1 de fevereiro de 2004 tomara a seu cargo a execução dos serviços de limpeza no Aeroporto de Lisboa, sucedendo na execução dessa prestação de serviços a outra empresa onde de que a Recorrente era trabalhadora, tendo a Recorrente ficado ao serviço da Recorrida desde então mas não mais tendo prestado trabalho por estar a tempo inteiro no desempenho de funções de Dirigente Sindical no STAD;

      b) Nos termos do art. 403º do Regulamento do Código do Trabalho de 2003, quando as faltas dadas para o exercício de funções sindicais se prolongassem por mais de 30 dias, o contrato de trabalho de trabalho existente com o trabalhador faltoso considerava – se suspenso;

      c) Não tendo a Administração da Recorrida detetado que o serviço de processamento de remunerações continuara a pagar à Recorrente o crédito de dias devido por faltas dadas para o exercício de funções de Dirigente Sindical pela Recorrente, a Recorrida só por mero acaso se apercebera desse facto;

      d) Razão porque pedia a condenação do R. a devolver – lhe a quantia de € 9.663,18, referente a pagamentos indevidos nos anos de 2006, 2007 e 2008 atenta a suspensão do contrato de trabalho;

    4. Proferida sentença, foi o pedido deduzido pela Recorrida julgado procedente, condenando – se a Recorrente a pagar à Recorrida a quantia peticionada, uma vez deduzida do montante de € 536,88, acrescido de juros e peticionados pela A. em sede de reconvenção, sentença esta confirmada pelo Acórdão recorrido que se fundamentou na validade do art. 403º do Regulamento do Código do Trabalho de 2003, norma que, no entender da Recorrente é claramente inconstitucional por conter uma limitação inadmissível ao direito do exercício legitimo das funções de dirigente sindical, violando o art. 55º, nº 6, da Constituição, e violando ainda o art. 112º da Constituição, pois como norma regulamentar que é não podia alterar o regime de faltas justificadas do diploma que regulamentava, no caso o Código do Trabalho de 2003;

    5. A questão da suspensão do contrato de trabalho antes da entrada em vigor do Código do Trabalho não se colocava nos termos em que a Recorrida a coloca nos autos;

    6. Na verdade, como salienta Jorge Leite ( in “Crédito remunerado para o desempenho de funções sindicais”, Questões Laborais, Ano I, 1994 ), o direito ao recebimento da retribuição do empregador no caso de trabalhadores em exercício de funções sindicais não se equaciona à luz do impedimento prolongado por facto imputável ou não ao trabalhador, ocorrendo antes uma situação de impedimento voluntário do trabalhador no exercício de um direito constitucionalmente garantido ( art. 55º - da Constituição ), direito à liberdade sindical que nasce do reconhecimento pelo legislador constitucional de que as Associações Sindicais são “indispensáveis centros de referência de determinados interesses dos trabalhadores que representam e interesses do próprio regime democrático elevados que foram a seus agentes essenciais”;

    7. As faltas prolongadas para o exercício de funções sindicais reconduziam – se pois ao exercício de um direito constitucionalmente garantido não se inserindo pois no regime legal do impedimento prolongado e não determinando por essa razão a suspensão do contrato de trabalho – Ver no mesmo sentido os Acórdãos da Relação de Lisboa, de 15/6/88 e de 22/5/2002 e do STJ, de 16/12/83 e de 22/5/2002;

    8. Com a entrada em vigor do Regulamento do Código do Trabalho, em 28 de agosto de 2004 (Ver art. 3º da Lei 35/2004), entrou em vigor o art. 403º daquele Regulamento, no âmbito do qual as faltas dadas pelo exercício da atividade sindical que se prologuem efetiva ou previsivelmente para além de um mês se aplica o regime da suspensão do contrato de trabalho por facto respeitante ao trabalhador;

    9. Como se pode ler no Parecer da PGR, de 20 de novembro de 2009,

      O crédito de horas ou de tempo, figura jurídica que, estando implicada na situação que determinou esta pronúncia, vai merecer especial atenção, pode definir-se como uma «faculdade que a lei concede aos trabalhadores de interromperem a sua prestação de trabalho por períodos de tempo de duração variável, sem prejuízo de qualquer direito ou regalia, para que eles possam exercer determinadas atividades, as quais se entendeu deverem ser especialmente protegidas»;

      8.

      Seguindo essa mesma orientação, já o art. 8º do Pacto sobre os Direitos Económicos, Sociais e Culturais, assinado em Nova Iorque, em 7 de outubro de 1976, e ratificado pelo Estado Português em 31 de outubro de 1978, vinha estabelecer que o direito dos sindicatos exercerem livremente a sua atividade, apenas podia sofrer as limitações previstas na lei e que fossem necessárias numa sociedade democrática, no interesse da segurança social ou da ordem pública ou para proteger os direitos e as liberdades de outrem;

      9.

      O citado art. 403º vem limitar a possibilidade das Associações Sindicais se organizarem de modo eficaz na defesa dos interesses dos seus associados, e a questão a decidir nestes autos é a de saber se tal limitação é compatível com o art. 55º da Constituição e se respeita...

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