Acórdão nº 5074/10.3YYPRT-B.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 31 de Outubro de 2013

Magistrado ResponsávelJOSÉ MANUEL DE ARAÚJO BARROS
Data da Resolução31 de Outubro de 2013
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)
  1. SECÇÃO – Processo nº 5074/10.3YYPRT-B.P1 Juízos de Execução do Porto - 2º Juízo – 1ª Secção SUMÁRIO (artigo 663º, nº 7, do Código de Processo Civil) I - Não é admissível a adjudicação do bem penhorado ao exequente ou ao credor reclamante com garantia por valor inferior a 70% do valor base, não podendo a mesma ocorrer na fase da venda por negociação particular II – Deve ser recusada a proposta de adjudicação que o credor hipotecário reclamante formulou nessa fase, no montante de 222.852,00 €, cerca de 54% de 412.000,00 €, valor base fixado para o bem penhorado Acordam no Tribunal da Relação do Porto I RELATÓRIONesta execução em que é executado B…, tendo sido oportunamente penhorado um prédio e tendo o credor C…, SA, reclamado crédito no montante de 365.672,75 €, garantido por hipotecas sobre o aludido prédio, após verificação e graduação, foi ordenada a venda deste, tendo-se frustrado a mediante propostas em carta fechada, por referência ao valor base de 412.000,00 €.

Já na fase de venda por negociação particular, veio o referido credor apresentar uma proposta de adjudicação, pelo montante de 222.852,00 €. Ao que o executado se opôs, apenas estando disposto a aceitá-la na condição de que o dito montante fosse suficiente para pagar toda a dívida garantida pelas hipotecas de que o dito credor é titular.

Perante o que foi proferido despacho a: 1) indeferir o requerido pelo executado por a proposta ser incondicional e incondicionável; 2) determinar que o senhor encarregado da venda deverá ouvir as demais partes (exequente, executado e credor reclamante) quanto à proposta apresentada pelo credor reclamante em causa, em sede de venda por negociação particular e, caso no prazo que conceda a essas partes para oferecerem proposta superior nenhuma seja apresentada, deverá aceitar a dita proposta que consta dos autos a fls. 78 e 79 – caso em que deverá atender à dispensa do depósito do preço dado ser feito por quem ficou graduado em primeiro lugar no apenso de reclamação de créditos, apenas havendo lugar ao depósito das custas prováveis de harmonia com o previsto no artigo 455º do Código de Processo Civil.

Inconformado com tal despacho, veio o executado interpor o presente recurso, o qual foi recebido como de apelação, com subida imediata e em separado, com efeito meramente devolutivo.

O credor em causa contra-alegou, pugnando pela manutenção do decidido.

Foram colhidos os vistos legais.

II FUNDAMENTAÇÃO1. CONCLUSÕES DAS ALEGAÇÕES DE RECURSO 1. A aquisição do bem pelo próprio credor implica que os termos daquele reconhecimento se tenham, de certa forma, por minorados, não na valência do reconhecimento da dívida e do seu incumprimento, que se nos afigura impugnável, mas antes na subsistência do dever de prestar pelo devedor hipotecário após entrega do bem.

  1. A procedência da pretensão do credor C…, SA, – obrigação de pagamento do simples remanescente da dívida após valor de adjudicação – configuraria uma situação de abuso de direito, na modalidade de desequilíbrio no exercício de direito, porquanto, sendo titular de um direito de crédito, formal e aparentemente exigível por incumprimento contratual, a sua executoriedade e reconhecimento judicial desencadearia resultados totalmente alheios ao que o sistema poderia admitir.

  2. A procedência da pretensão desse credor implicaria que os executados ficariam devedores de uma determinada quantia par aquisição de um bem do qual já não dispunham e que havia revertido ao credor da dívida por um valor substancialmente inferior àquele que configura a sua obrigação e que consubstanciou a materialidade subjacente da relação contratual: o valor atribuído pelo credor ao bem, que o considerou idóneo para constituir garantia adequada aos sucessivos mútuos que concedeu aos executados. É a este valor do bem, mercê da aquisição pelo credor hipotecário, que deve ser dada primazia pela materialidade subjacente na tutela judicial.

  3. O desequilíbrio no particular exercício deste direito de crédito encontra cobertura mediata num dos princípios basilares do direito das obrigações – o princípio do enriquecimento injustificado, de consagração jurídica oriunda da codificação justiniana do Digesto, positivado no artigo 473º, nº 1, do Código Civil, do qual se pode retirar um princípio de proibição de enriquecimento injustificado, tutelado por uma acção destinada a reagir contra esse enriquecimento (…) consistindo num princípio em forma de norma.

  4. Tal exercício (entenda-se, sempre, o reconhecimento de dívida de mais de 130.000,00 € após venda executiva ao credor hipotecário) constituiria uma descaracterização da correspectividade entre o dever de prestar dos executados e o...

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