Acórdão nº 2062/10.3TTPRT.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 09 de Outubro de 2013

Magistrado ResponsávelANTÓNIO LEONES DANTAS
Data da Resolução09 de Outubro de 2013
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I AA, intentou a presente acção declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra BB, SA, pedindo que a R. seja condenada a: a) atribuir ao A. a categoria profissional de Técnico de Qualidade, do 2.º escalão, desde Dezembro de 2009 e a pagar-lhe a respectiva retribuição, a que corresponde a quantia de € 1.989,44 a título de diferenças retributivas relativas ao período compreendido entre Dezembro de 2009 e Dezembro de 2010; b) pagar ao A. a quantia de € 5.149,75 a título de diferença entre a compensação devida pela decisão de despedimento colectivo e cessação do contrato de trabalho calculada com base na retribuição base correspondente à categoria profissional de Técnico de Qualidade do 2.º escalão; c) pagar ao A. a quantia de € 32,00 a título de diferenças de subsídio de alimentação; d) a reconhecer ao A. o direito a um complemento de reforma e a pagar-lhe a quantia de € 144,13 mensais a partir da data em que passar a essa situação; e) juros de mora sobre as referidas quantias desde os respectivos vencimentos.

Invocou como fundamento da sua pretensão, em síntese: a) - Que a Ré admitiu o Autor ao seu serviço em 1969 e lhe atribuiu a categoria profissional de Controlador em 1988 (vide a rectificação efectuada na audiência de julgamento a fls. 89), funções que actualmente são remuneradas pela Ré com uma retribuição salarial mensal base de € 635,66; b) - Que esta categoria nos termos do Anexo II, da Decisão Arbitral para a indústria gráfica e de transformação de papel, publicada no Boletim Trabalho e Emprego n.º 40, de 29/10/2009 e com Extensão determinada pela Portaria n.º 213/2010, de 15 de Abril, publicada no Diário da República, I Série, n.º 73, de 15/04/2010, passou a designar-se de Técnico de Qualidade, sendo-lhe atribuída retribuição superior, mas a R. reclassificou o Autor como Assistente Administrativo e manteve-lhe a retribuição salarial base, o que não fez com outro trabalhador com quem cessou o contrato de trabalho por mútuo acordo; c) - Que lhe são devidas diferenças salariais bem como um acréscimo na compensação pelo despedimento colectivo a que entretanto a R. procedeu; d) - Que a R. assegura aos seus trabalhadores um complemento de reforma desde 1988 e que não pode privar o A. desse seguro complementar sob pena de o prejudicar e discriminar de forma negativa relativamente a todos os seus ex trabalhadores e ex colegas que entretanto se reformaram.

A acção prosseguiu seus termos, vindo a ser decidida por sentença de 19 de Março de 2012, cujo dispositivo é do seguinte teor: «Pelo exposto, decide-se julgar parcialmente procedente a presente acção, e em consequência decide-se: - atribuir ao A. a categoria profissional de Técnico de Qualidade, do 2.º escalão, desde Dezembro de 2009 e condenar a Ré a pagar-lhe uma retribuição correspondente e a que corresponde a quantia de € 1.989,44 a título de diferenças retributivas relativas ao período compreendido entre Dezembro de 2009 e Dezembro de 2010; - condenar a Ré a pagar ao A. a quantia de € 5.149,75 a título de diferença entre a compensação devida pela decisão de despedimento colectivo e cessação do contrato de trabalho calculada com base na actual retribuição base do Autor e a compensação devida pela decisão de despedimento colectivo e cessação do contrato de trabalho calculada com base na retribuição base correspondente à categoria profissional de Técnico de Qualidade do 2.º escalão; - condenar a Ré no pagamento de juros moratórios calculados à taxa de 4% ao ano sobre as referidas quantias desde a data dos respectivos vencimentos e até efectivo e integral pagamento, - absolver a Ré no mais peticionado.

Custas pelo Autor e Ré na proporção de 1/3 e 2/3 respectivamente, sem prejuízo da isenção daquele.» Inconformados com o assim decidido, a Ré e o Autor apelaram para o Tribunal da Relação do Porto, este último «apenas na parte em que a Ré é absolvida de reconhecer ao Autor o complemento de reforma e pagar-lhe mensalmente a quantia de € 144,13 a partir do momento em que o Autor passar à situação de reformado».

O Tribunal da Relação veio a decidir os recursos interpostos por acórdão de 19 de Dezembro de 2012, com um voto de vencido, cujo dispositivo é o seguinte: «Em face do exposto, decide-se: 6.1. determinar o desentranhamento e entrega às partes dos documentos, juntos com as alegações a fls. 170 e ss. e fls. 192 e ss.; 6.2. negar provimento aos recursos interpostos pela R. e pelo A. e confirmar integralmente a douta sentença recorrida.

Sem custas o recurso interposto pelo A., atenta a isenção de que o mesmo beneficia.

Custas do recurso interposto pela R. a cargo da mesma».

Irresignado com esta decisão, dela recorre agora de revista para este Supremo Tribunal o Autor, integrando nas alegações apresentadas as seguintes conclusões: «1. Discorda-se do aditamento à matéria de facto do ponto 20 por se entender que tal matéria não constitui factos mas sim estipulações contratuais e como tal não devem fazer parte do elenco dos factos provados.

  1. Ao incluir a mesma o Tribunal violou o disposto no Art. 646°, n.° 4 do C.P.C.

  2. Sem prejuízo da manutenção ou não do aditamento a que supra se refere, entende-‑se que o Acórdão proferido lavra no mesmo erro da primeira instância ao situar a decisão no plano do contrato de seguro celebrado pela Recorrida quando o Recorrente não teve qualquer intervenção no mesmo.

  3. Porquanto, em causa nos autos está um direito que o Recorrente se arroga proveniente do seu contrato de trabalho com a Recorrida.

  4. Precisamente, o que está em causa nos autos é a atribuição pela entidade empregadora - Recorrida - de um direito aos seus trabalhadores como contrapartida do trabalho que estes lhe prestam, ou seja um direito retributivo.

  5. Não faz assim sentido, o recurso a uma cláusula de um contrato celebrado entre a Recorrida e a Companhia de Seguros.

  6. Até porque, o contrato de seguro celebrado entre a Recorrida e a Companhia de Seguros não produz efeitos na esfera jurídica do Recorrente.

  7. O Recorrente em relação ao contrato de seguro celebrado entre a Recorrida e a Companhia de Seguros é um terceiro em relação ao qual o contrato de seguro só poderia produzir efeitos nos casos e nos termos em que estivesse previsto por lei - Art. 406°, n.° 2 do Código Civil, o que in casu não ocorre.

  8. Pelo que, também se discorda da invocação que faz o douto Acórdão no sentido de que ainda que procedesse a obrigação da Recorrida a sua condenação não podia ser directa na medida em que o que esta se obrigou foi a assegurar um seguro complementar de reforma.

  9. A Recorrida se não "transferiu" o pagamento dessa responsabilidade para terceiros - a Companhia de Seguros - obviamente que tem que ser ela a pagar a quantia que o Recorrente teria direito a título de seguro complementar de reforma.

  10. O Acórdão recorrido violou por isso a norma do n.° 2 do Art. 406° do CC.

  11. Mas não só, pois, o que resultou provado nos autos foi a existência de um seguro complementar de reforma, instituído e assegurado ao longo de anos aos trabalhadores, o que necessariamente implica que o direito ao seu recebimento passou a fazer parte integrante do contrato de trabalho, neste caso do Recorrente.

  12. Estamos então perante um verdadeiro direito adquirido no âmbito de um contrato de trabalho.

  13. E que, se durante anos a Recorrida atribuiu aos seus trabalhadores como contrapartida do trabalho que estes lhe prestavam um seguro complementar de reforma, a Recorrida não podia unilateralmente excluir o Autor do mesmo.

  14. Ora, é exactamente a falta de consentimento do Recorrente na cessação do seu contrato que é fundamento para a obrigação da Recorrida reclamada. E não se diga que o Recorrente ao não ter impugnado o despedimento assentiu na cessação do seu contrato de trabalho. Os fundamentos para a impugnação de um despedimento colectivo são objectivos e de cunho manifestamente económico não estão r\a alçada da vontade dos trabalhadores.

  15. A Recorrida violou por isso a sua obrigação contratual para com o Recorrente seu trabalhador, é que os contratos não só são para cumprir como produzem os seus efeitos inter partes. - Art. 406° do Código Civil.

  16. Pelo que, o Acórdão recorrido ao desvalorizar a forma de cessação do contrato e ausência de vontade expressa do Recorrente nessa cessação violou também a norma prevista no n.° 1 do Art. 406° do CC.

  17. Ademais, não se pode aceitar como uma actuação de boa fé a de uma entidade patronal que, ao fim de mais de 22 anos, atendendo a que foi em 1988 que atribuiu o complemento de reforma em causa e atendendo a que o despedimento colectivo em...

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