Acórdão nº 339/11.0JALRA.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 11 de Setembro de 2013

Data11 Setembro 2013
ÓrgãoCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, em conferência, na 5ª Secção (Criminal) do Tribunal da Relação de Coimbra I – RELATÓRIO 1. No âmbito do Processo Comum (Colectivo) nº 339/11.0JALRA, do 1º Juízo do Tribunal Judicial de Torres Novas, o arguido A...

(melhor identificado nos autos), após ter sido acusado pelo Ministério Público e, posteriormente, pronunciado como autor material e em concurso real da prática de um crime continuado de abuso sexual de criança agravado p. e p. pelos artºs 30 nºs 2 e 3, 79, 171 nºs 1 e 2 e 177 nº 1 al. b) todos do Código Penal e de um crime continuado de coacção agravada p p pelos artºs 30 nºs 2 e 3, 79, 154 nº 1 e 155 nº 1 al b) ambos do CP, foi submetido a julgamento tendo, a final (a fls. 683 a 711), sido proferido acórdão em que se decidiu nos seguintes termos (transcrição): “IV. Decisão.

Pelos fundamentos expostos e após alteração da qualificação jurídica: a) julgamos procedente por provada a acusação do Mº Pº e em consequência condenamos o arguido A...

em concurso real e como autor material de: -- dois crimes de abuso sexual de crianças p p pelo artº 171 nº 1 do CP [pontos 6).- e 7).-] nas penas de 2 (dois) anos de prisão e 3 (três) anos de prisão respectivamente; -- um crime de abuso sexual de crianças p p pelo artº 171 nº 3 al a) do CP [ponto 9).- ] na pena de 5 (cinco) meses de prisão; -- dois crimes de coacção p p pelo artº 154 nº 1 do CP [pontos 6).- e 8).-] nas penas respectivamente de 4 (quatro) meses e 6 (seis) meses de prisão.

  1. em cúmulo jurídico de todas as penas vai o arguido condenado na pena única de 4 (quatro) anos de prisão efectiva.

  2. após trânsito passe mandados para cumprimento da pena.

  3. condenamos o arguido nas custas do processo, em 3 UC de taxa de justiça.

    (…)” 2. Inconformado com o assim decidido, o arguido interpôs recurso (constante de fls. 725 a 752), retirando da correspondente motivação as seguintes (transcritas) conclusões: 1. O douto acórdão para além de nulo nos termos do disposto no artigo 374° n°2 do Código do Processo Penal, de lavrar em erro notório na apreciação da prova, em insuficiência e errónea valoração das provas para a decisão de facto e contradição notória também na apreciação da prova, peca por alguma superficialidade e preconcebida análise crítica da prova, não fazendo a correcta interpretação e aplicação de determinados preceitos legais, nomeadamente, e entre outros, dos artigos 30º, 171° n°1; 171° n°3 al. a), 154° n°1 todos do Código do Processo Penal e 32° da Constituição da República Portuguesa, devendo, por conseguinte, ser revogado e substituído por outra decisão que absolva o arguido com as demais e legais consequências.

    1. Nos termos do disposto no artigo 374° n°2 do Código do Processo Penal, “Ao relatório segue-se a fundamentação, que consta dos factos provados e não provados, bem como de uma exposição, tanto quanto possível completa, ainda que concisa, dos motivos de facto e de direito, que fundamentam a decisão, com indicação e exame crítico das provas que serviram para formar a convicção do tribunal”.

    2. Ou seja, para além da indicação das provas que serviram para formar a convicção do tribunal, este tem ainda que expressar o respectivo exame crítico das mesmas, através do processo lógico e racional que foi seguido na apreciação das provas.

    3. Impõem-se pois, na nossa modesta opinião, que esse exame critico, indique, no mínimo, e não necessariamente de forma exaustiva, as razões de ciência e demais elementos que tenham, na perspectiva do tribunal sido relevantes, para assim se poder conhecer o processo de formação da convicção do tribunal.

    4. No caso dos autos e concretamente no que a este ponto diz respeito, o tribunal limitou-se a fazer referências genéricas às declarações da menor “a B... disse que o arguido é primo do seu pai e que às vezes ia para casa dele e da sua companheira a F...”; da testemunha E... — avó paterna da menor — A E... disse que o arguido foi muitas vezes a X... buscar a B... e foi sozinho” ou ainda da testemunha F... — no que ao ponto 16 dos factos dados como provados “declarações de F...”.

    5. Não é possível ao tribunal de recurso com base em tal argumentação poder concluir pela bondade da decisão, significando que a fundamentação constante da douta decisão por esta via colocada em crise, impede, por forma absoluta, o exame do processo lógico ou racional que esteve subjacente à decisão.

    6. Designadamente qual o motivo que da credibilidade dada à testemunha E... em contraponto com o depoimento da testemunha D... — mãe da menor — que em sede julgamento questionada pelo Mm° Juiz Presidente sobre quem ia levar e buscar a menor a X... para passar as férias e alguns fins-de-semana em casa da avó paterna, afirmou a testemunha nestes autos (CD relativo à sessão do dia 05.02.2013, com inicio às 12:17:50, nas passagens 06:46 a 7:17, depoimento consignado em acta de sessão de audiência de fls. 652 a 657 — Cf. fls 657) “Foi lá várias vezes a minha casa”, à pergunta “Ia sozinho quando lá foi? Respondeu “não eu acho que ele uma vez foi sozinho.. .“ à pergunta “ Ia com quem?” Respondeu “Ia com a avó da B..., chegou a ir a minha casa com a esposa co o filho pequeno e com a mãe dele” á pergunta “Portanto foi sempre acompanhado ou foi alguma vez sozinho? Que a Sra se lembre? Respondeu “é assim, eu acho que ele uma vez foi sozinho, eu não tenho bem a certeza mas uma vez foi sozinho” 8. Uma tal fundamentação em que se faz um insuficiente exame critico, viola manifestamente o disposto no artigo 374° n°2 do Código do Processo Penal acarretando a nulidade do acórdão nos termos do disposto no artigo 379° n°1 al. a) do mesmo diploma legal.

    7. Uma tal fundamentação em que se faz um insuficiente exame critico, viola manifestamente o disposto no artigo 374° n°2 do Código do Processo Penal acarretando a nulidade do acórdão nos termos do disposto no artigo 379° n°1 ai. a) do mesmo diploma legal.

    8. O tribunal a quo após a produção de toda a prova o Tribunal a quo entendeu que, e a provarem-se os factos imputados ao arguido, poderão existir mais do que um crime de abuso sexual de criança, e mais do que um crime de coação agravada, não estando assim o comportamento do arguido integrado no conceito de crime continuado, até porque, a acusação não refere circunstâncias exteriores que facilitassem de algum modo a prática deste comportamento mais do uma vez. (cfr. Acta de fls. 712 a 714, cfr fls. 713).

    9. Ou seja, o arguido vem acusado da prática de um crime continuado de abuso sexual de criança agravado p.p. pelos artigos 30º n°2 e 3, 79°, 171° n°s 1 e 2 e 177° al. b) todos do Código Penal e de um crime continuado de coação agravada p.p. pelos artigos 30° n°s 2 e 3, 79°, 154° n°1 e 155° n°1 al. b) ambos do Código Penal.

    10. Face à prova produzida o tribunal a quo considerou que não estavam reunidos os pressupostos para que se estivesse na presença do crime continuado, condenando o recorrente em cinco crimes.

    11. Apesar do tribunal a quo, nos termos do disposto no artigo 358° n°3 do Código do Processo Penal ter dado a palavra ao arguido a verdade é que não concretizou em que consistia a alteração da matéria factual que conduziu à alteração da qualificação jurídica dos factos descritos na acusação. (cfr. Acta de fls. 712 a 714, cfr fls. 713).

    12. Designadamente quanto aos pontos 6, 7 e 9 dos factos dados como provados em contraponto com os pontos 7°, 8°, 10° e 11° da acusação.

    13. É inconstitucional por violação do princípio constitucional do acusatório, contraditório e garantia das garantias de defesa — artigo 32° n°5 da Constituição da Republica Portuguesa — a eventual interpretação dada ao artigo 358° n°1 do Código do Processo Penal, no sentido de que não ter que ser comunicada ao arguido as alterações factuais que conduziram à alteração da qualificação jurídica dos factos, caso a defesa tenha sido estruturada tendo em conta esse dado, designadamente através de apresentação de álibi, o que aconteceu no decurso do presente processo.

    14. As garantias de defesa do arguido só estão asseguradas quando, da exposição dos factos que sustentam a acusação e bem ainda dos factos trazidos para a audiência de julgamento, por via dos depoimentos prestados resulta a possibilidade razoável de serem impugnados e sujeitos ao princípio do contraditório.

    15. Em suma, tendo o arguido sido condenado com base em factualidade diversa da que constava na acusação, sem que se tenha procedido à prévia comunicação prevista no artigo 358° n°1 do Código do Processo Penal, leva a que o acórdão, aliás douto, seja nulo, irremediavelmente nulo, por força do disposto nos artigos 358°, 359° e 379° n°1 al. b) do Código do Processo Penal.

    16. Nos termos o disposto no artigo 412° n°3 do Código do Processo Penal, o recorrente considera os infra referidos concretos pontos de facto incorrectamente julgados, pelo que expressamente se impugnam e se indicam para os efeitos previstos na al. a) da supra referida norma legal: Pontos 6°; 70; 8° e 9° dos factos considerados provados.

    17. No ponto 6° - “Entre 23 de Fevereiro de 2009 e Junho de 2009, em data não concretamente apurada, quando a menor se encontrava sozinha com o arguido em casa deste, o arguido chamou-a pelo menos uma vez, para o seu quarto e pediu à menor B... que lhe mexesse no pénis, ao mesmo tempo que se masturbava, ejaculando para cima do corpo da menor, após o que lhe disse “se dissesse (o que se tinha passado) à avó ele (arguido) não lhe dava mais salgadinhos e lhe batia.

    18. O depoimento da menor B... - gravado em áudio (CD relativo à sessão do dia 05.02.2013, com inicio às 10:28:35, nas passagens 05:00 a 05:14 e 37:28 a 37:48, depoimento consignado em acta de sessão de audiência de fls. 652 a 657 — Cf. fls 656) impõe decisão diversa.

    19. Em sede de julgamento a menor questionada sobre os factos ocorridos em casa do arguido, designadamente no quarto deste, referiu que “Se não mexesse na pila do arguido a pedido deste, não lhe dava mais salgadinhos que a menor gosta muito e que o arguido tinha lá em casa” referindo ainda que “Se contasse a mais...

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