Acórdão nº 08S2310 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 12 de Novembro de 2008
Magistrado Responsável | SOUSA PEIXOTO |
Data da Resolução | 12 de Novembro de 2008 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: 1. Relatório Na presente acção declarativa, emergente de contrato individual de trabalho, proposta, no Tribunal do Trabalho de Torres Vedras, por AA contra G... - Gestão de Artes Gráficas, S. A., o autor pediu que o despedimento de que diz ter sido alvo por parte da ré, em 26 de Julho de 2005, fosse declarado ilícito e que esta fosse condenada a pagar-lhe: i) a quantia de € 55.332,38, a título de indemnização de antiguidade (calculada até Julho de 2006), acrescida do montante correspondente ao tempo decorrido entre o despedimento e a decisão final e dos juros legais; ii) os salários vencidos e vincendos desde a data do despedimento até à data do trânsito em julgado da sentença, acrescidos dos juros de mora; iii) a quantia de € 10.536,23 referente ao acordo de pagamento de créditos laborais devidos pela G..., L.da, com respectivos juros legais, calculados desde Julho de 2006.
Em resumo, o autor alegou o seguinte: - começou a trabalhar para a G... - Artes Gráficas, L.da, em 1 de Fevereiro de 1990; - em 1.8.1990, foi transferido para a G... - Gabinete Impressor, L.da, com manutenção de todos os seus direitos; - em 16 de Maio de 2005, a G... celebrou com a ré um contrato de cessão da exploração do estabelecimento; - na sequência do referido contrato, passou a trabalhar para a ré, a partir de 16 de Maio de 2005; - nos termos do art.º 318.º do Código do Trabalho, em caso de transmissão da empresa ou estabelecimento, transmite-se para o adquirente a posição jurídica de empregador nos contratos de trabalho dos respectivos trabalhadores, incluindo as dívidas já vencidas, à data da transmissão; - durante a vigência do contrato de cessão de exploração, a ré acordou com o autor o pagamento, em prestações mensais, dos créditos laborais que lhe eram devidos pela G..., no total de € 12.426,97, tendo iniciado o respectivo pagamento em Julho de 2005; - por carta de 21 de Julho de 2006, a ré comunicou ao autor que a G... tinha resolvido o contrato de cessão de exploração do estabelecimento em 27 de Junho de 2006, pelo que, a partir de 26 de Julho de 2006, deveria regressar à G...; - a partir daquela data (26.7.2006), a ré recusou receber o trabalho do autor, impedindo--o de entrar nas suas instalações e no seu local de trabalho; - face a tal recusa da ré, o autor considerou-se despedido; - na verdade, a resolução do contrato de cessão de exploração tinha efeitos imediatos, pelo que os contratos de trabalho incluídos nesse contrato também deveriam ter sido restituídos; - todavia, o autor e restantes colegas continuaram ao serviço da ré e só um mês depois da resolução é que a ré lhes comunicou que deveriam voltar para a G..., o que significa que os considerou como seus trabalhadores; - o despedimento de que foi alvo por parte da ré não foi precedido de qualquer procedimento, sendo, por isso, ilícito; - a ré deve ao autor a quantia de € 10.536,23, referente ao acordo com ele celebrado para pagamento dos créditos laborais devidos pela G..., uma vez que, de Julho de 2005 a Maio de 2006, apenas lhe pagou a quantia de € 1.890,74.
Na contestação, a ré arguiu a sua ilegitimidade, requereu a intervenção da G..., impugnou o despedimento e negou ter assumido pagar aos trabalhadores os salários que lhes eram devidos pela G....
Mais concretamente e com interesse para o objecto da revista, a ré alegou: - que não assumiu pagar aos trabalhadores os salários em dívida à data da celebração do contrato de cessão de exploração; - apenas se obrigou, como contrapartida da cessão de exploração, a pagar à G... (e não aos trabalhadores) a importância correspondente aos salários em dívida (€ 173.403,16), em 36 prestações mensais, como consta do n.º 2 da cláusula 4.ª do contrato de cessão, pelo que foi sempre a cedente G... a responsável pela liquidação aos trabalhadores (entre eles o autor) desses salários em atraso e não a ré; - por isso, a cedente emitia mensalmente à ré uma factura relativa ao quantitativo da prestação mensal acordada, cujo valor era para pagar os ditos salários; - todavia, como os trabalhadores em causa se encontravam a trabalhar para a ré, era esta que, para lhes facilitar a vida, lhes fazia a entrega desses valores; - e tanto é assim que o autor foi reclamar ao processo de insolvência os salários em atraso que lhe eram devidos pela G..., não se compreendendo como é que ele pode vir agora reclamar os mesmos créditos nestes autos; - por carta de 27 de Junho de 2006, recebida pela ré no dia imediato, o administrador judicial comunicou à ré a resolução do contrato de cessão de exploração do estabelecimento; - a ré aceitou a resolução, conforme consta da carta que, em 21 de Julho de 2006, enviou ao dito administrador; - após a recepção da carta de resolução, a ré teve de proceder a um exaustivo inventário de todos os equipamentos e de todos os activos e direitos, para que os pudesse devolver à esfera patrimonial da massa insolvente e assim dar cumprimento aos solicitado na carta de resolução; - as diligências que a ré teve de realizar foram vastas e morosas; - com efeito, confrontada com a carta do administrador judicial, a ré não podia modificar a estrutura da sua empresa, de um dia para o outro, e comunicar aos trabalhadores da G... que, a partir desse mesmo dia, deveriam regressar à G...; - efectivamente, naquele momento e num claro dever de solidariedade para com os trabalhadores, a ré entendeu que não devia devolver de imediato os trabalhadores, por se preocupar com a situação delicada com que seriam confrontados de serem colocados no desemprego; - por isso, a ré começou por informar verbalmente os trabalhadores do teor da carta recebida do administrador da insolvência e dos efeitos que a mesma iria ter sobre eles, o que fez verbalmente logo que recebeu a carta, e só depois é que lhes comunicou esse facto por escrito, por carta que lhes enviou em 21 de Julho de 2006, por ser esse o período temporal que demorou até ter realizado todas as diligências necessárias para dar cumprimento ao solicitado na carta do administrador de insolvência, tendo assumido, até, o pagamento dos vencimentos dos trabalhadores da G... por mais cerca de um mês, ou seja, até 26 de Julho de 2006, "data até à qual o A. ali permaneceu a trabalhar" para a ré.
No despacho saneador, o M.mo Juiz julgou improcedente a excepção da ilegitimidade da ré, indeferiu o pedido de intervenção da G... e conheceu do mérito da causa, julgando a acção totalmente improcedente.
O autor recorreu e o Tribunal da Relação de Lisboa, julgando parcialmente procedente a apelação, condenou a ré a pagar ao autor a quantia de € 10.536,23, a título dos salários de que a G... lhe era devedora, à data da cessão de exploração do estabelecimento, acrescida de juros de mora desde 31.7.2006.
Inconformada com a decisão da Relação, a ré interpôs recurso de revista, concluindo as respectivas alegações da seguinte forma: 1.ª - O douto Acórdão sob recurso decidiu, como se transcreve, que: "O A. propôs a acção em 10/7/2007, por conseguinte antes de decorrido um ano sobre a reversão (que ocorreu com a aceitação da resolução pela R., portanto com a recepção da carta de 21/7/2006, ou seja, no período em que a ora apelada ainda respondia solidariamente pela referida dívida), pelo que, no que concerne ao pedido formulado sob o n.º 3, a apelação terá de proceder...".
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- Aceitando-se a factualidade, tal como fixada na primeira instância, não pode a ora recorrente concordar com a interpretação e aplicação do artigo 318.º do Código do Trabalho, à situação em causa, 3.ª - Pois, tendo ficado provado que a ora recorrente recebeu a carta do Administrador da Insolvência, Dr. B...V..., em 28 de Junho de 2006, a qual lhe comunicava a resolução dos contratos de cessão de exploração e de marcas, celebrados em 16 de Maio de 2005, nos termos do citado preceito legal e nos termos do n.º 1 do artigo 436º do Código Civil, deveria o Digno Tribunal da Relação de Lisboa ter considerado que aquela resolução tinha operado e produzido efeitos em 28 de Junho de 2006, ou seja, na data da declaração da resolução desses contratos e, não em momento posterior; 4.ª - De facto, a citada norma legal estabelece que a resolução se possa fazer por declaração à parte contrária, sendo este o momento em que opera a mesma, mesmo que haja necessidade de posteriormente obter a declaração judicial de que o acto foi legalmente resolvido.
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- Neste sentido o Acórdão do ST J de 27/06/2006, Proc. n.º 06A1758: "A resolução do contrato opera por meio de declaração unilateral receptícia do credor de acordo com os artigos 436.º nº 1 e 224.º, n.º 1 do C.C.", entre outros já indicados.
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- Também é esse o entendimento de Vaz Serra, RLJ, 102º -168: "O disposto no art.º 436.º, n.º 1, não exclui que, se a parte a quem a resolução é declarada, entender não existir o direito de resolução ou que ele foi mal exercido, se venha a discutir em juízo se ele existia ou foi bem exercido; mas, neste caso, a sentença que julgue existente e bem exercido o direito de resolução é simplesmente declarativa, limitando-se a declarar que o direito foi correctamente exercido.
Os efeitos de resolução contam-se, portanto, da data da declaração de resolução, ou antes, daquela em que esta declaração, segundo o princípio aplicável à eficácia das declarações de vontade receptícias ou recipiendas, produz efeitos" (sublinhado nosso).
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- Ora, assim sendo, a reversão do estabelecimento, nos termos do n.º 3 do artigo 318.º do Código do Trabalho, forçosamente, operou na data de 28 de Junho de 2006 e não posteriormente.
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- Nesta circunstância, verifica-se, também, de acordo com o constante dos autos e bem assim do douto Acórdão da Relação que "O A. propôs a acção em 10/07/2007", ou seja, a acção na base deste processo...
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