Acórdão nº 364/04.7TBFND.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 28 de Outubro de 2008

Magistrado ResponsávelTELES PEREIRA
Data da Resolução28 de Outubro de 2008
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra I – A Causa 1. A...

(A., Reconvindo e neste recurso Apelado) demandou B...

e C...

(RR., sendo a primeira Reconvinte e Apelante), invocando o incumprimento por estes de um contrato-promessa de compra e venda de imóvel[1], no qual ele (A.) ocupou a posição de promitente comprador (entrando, desde logo, na posse do imóvel) e os RR. a de promitentes vendedores, tendo ele entregue, a título de sinal, a quantia de €19.951,92, posteriormente reforçado em €7.481,97, tudo por conta do preço global acordado (que foi de €69.831,71). Tal incumprimento traduzir-se-ia na não marcação da escritura definitiva (não obstante a interpelação judicial para esse efeito) e na não obtenção – sempre pelos RR. – da necessária licença de utilização do imóvel.

Em função desta situação, formulou o A. os seguintes pedidos: “[…] a) [Serem] [c]ondenados os RR. a restituir ao A. as importâncias que receberam destes a título de sinal, em dobro, no montante de […] €54.867,77, face ao incumprimento intencional, culposo e reiterado por estes do contrato-promessa […]; b) Ser reconhecido ao A. o direito de retenção sobre o prédio prometido comprar por este […], até que lhe seja paga integralmente a importância referida em a).

[…]” [transcrição de fls. 8/9] 1.1.

Contestou a 1ª R. (fls. 54/61) por impugnação, invocando a impossibilidade de obtenção de licença de utilização, deduzindo daí a nulidade da promessa em causa, por ser, à partida, legalmente impossível cumpri-la[2], formulando os seguintes pedidos reconvencionais: “[…] a) […] [R]econhecer que as promessas e demais declarações de vontade contidas no contrato-promessa, são nulas, porquanto são legal, originária e objectivamente impossíveis, nos termos dos artigos 280º e 401º, nºs 1 e 3 do Código Civil; b) Consequentemente, deve ser declarada a nulidade do contrato-promessa de compra e venda celebrado entre os RR. e o A./Reconvindo, nos termos do artigo 286º do Código Civil; c) A reconhecer que [o A.] está no gozo do prédio objecto do contrato-promessa desde a data da sua celebração (31/01/2000) até hoje; d) A reconhecer que enriqueceu à custa dos RR. por virtude de uma causa que deixou de existir – o contrato-promessa, por ser nulo – e que os RR. se viram empobrecidos na mesma medida do seu enriquecimento; e) A pagar, a título de enriquecimento sem causa, a quantia de €500,00 mensais pelos 56 meses que ali viveu, o que perfaz o total na presente data de €28.000,00 a pagar aos RR., nos termos do artigo 473º e seguintes do Código Civil, e, ainda, no pagamento dos meses que ainda vier a usufruir do prédio objecto do contrato-promessa; f) E, finalmente, a restituir o prédio objecto do contrato-promessa aos RR., nos termos do preceituado no artigo 289º do Código Civil.

[…]” [transcrição de fls. 59/61] O A. respondeu a fls. 95/99, pugnando pela improcedência da reconvenção.

1.2.

Findos os articulados, alcançou o processo a fase de condensação, com a prolação do despacho de fls. 108/125. Neste, no trecho qualificado de “Despacho Saneador Stricto Sensu”, além da parte tabeliónica referente à competência, nulidades que afectassem todo o processo, personalidade e capacidade judiciárias, legitimidade e patrocínio, foram apreciados (no trecho de fls. 114/117), tendo presente a matéria de facto já então provada[3], os pedidos – da reconvenção – respeitantes à invocada nulidade do contrato-promessa (referida à impossibilidade legal, originária e objectiva que a Reconvinte atribuiu ao mesmo[4]), concluindo-se desde logo pela sua improcedência[5], o que se fez através da seguinte formulação decisória: “[…] [A]bsolver o Reconvindo dos pedidos de condenação no reconhecimento de que as promessas e demais declarações de vontade contidas no contrato-promessa são nulas, por serem legal, originária e objectivamente impossíveis, nos termos dos artigos 280º e 401º, nºs 1 e 3 do Código Civil, e de declaração da nulidade do contrato-promessa de compra e venda celebrado entre os RR. e o A./Reconvindo, nos termos do artigo 286º do Código Civil.

[…]” [transcrição de fls. 117, com sublinhado acrescentado][6] Ainda no âmbito do mesmo despacho saneador – e assim esgotamos os elementos do pedido reconvencional nele especificamente tratados –, consignou-se (trecho de fls. 118) que as questões respeitantes ao afirmado enriquecimento sem causa apresentavam sobreposição à questão – cuja apreciação foi relegada para momento posterior – de uma possível resolução do contrato, “[…] com as consequências previstas nos artigos 432º a 436º do Código Civil (CC) […]” (transcrição de fls. 118).

Foram, enfim, fixados – e continuamos a referir-nos ao despacho de fls. 108/125 – os factos assentes[7] (fls. 119/123) e elaborada a base instrutória (fls. 123/125).

1.2.1.

Notificada deste despacho, apresentou-se a R./Reconvinte, inconformada com a absolvição parcial dos pedidos reconvencionais, a apelar do mesmo (requerimento de fls. 135), sendo tal recurso admitido a fls. 170, com subida a final.

Referem-se a este recurso interlocutório as alegações de fls. 174/182, que a Apelante rematou com as seguintes conclusões: (…………………………………………………………………) 1.3.

Prosseguindo o processo para a fase de instrução, ocorreu a perícia documentada a fls. 197, tendo o A. apresentado quanto a ela a reclamação de fls. 201/202, desatendida pelo despacho de fls. 206. Deste agravou o A. a fls. 209/210, sendo tal recurso admitido a fls. 213, com subida diferida, constando as alegações do A. (nesse contexto Agravante) de fls. 217/222 e as contra-alegações da R. (nesse contexto Agravada) de fls. 234[8].

1.4.

Alcançou-se, enfim, o julgamento (as actas respectivas constam de fls. 276/280 e 282/283), findo o qual, fixados que foram os factos por referência à base instrutória (despacho de fls. 284/285), foi proferida a Sentença de fls. 288/295 (constitui esta a decisão objecto do recurso final de apelação, cuja subida propiciou a chegada a esta Relação dos dois recursos anteriormente interpostos), cujo pronunciamento decisório final foi o seguinte: “[…] [D]ecidimos, na procedência desta acção, condenar os RR. […] a: 1. Restituir ao A. […] as importâncias que receberam destes a título de sinal, em dobro, no montante total de 11.000.000$00, ou seja €54.867,77, face ao incumprimento intencional, culposo e reiterado por estes do contrato-promessa em causa nestes autos, a que acrescem os juros de mora à taxa legal desde a citação e até efectivo e integral pagamento; 2. Reconhecer ao A. o direito de retenção sobre o prédio prometido comprar por este […], até que lhe seja paga integralmente a importância referida em 1).

  1. Na improcedência do pedido reconvencional, absolver o A. dos pedidos a que aludem as alíneas d) a f).

[…]” [transcrição de fls. 295, com omissão do ênfase no original] 1.5.

Inconformada, interpôs a R. o presente recurso de apelação (fls. 301), recebido a fls. 307, constando as correspondentes alegações de fls. 314/322, tendo estas sido rematadas com as seguintes conclusões: (……………………………………………………………..) O A./Apelado respondeu a fls. 325/335, pugnando pela confirmação da Sentença apelada (e do Saneador/Sentença em causa na primeira apelação).

II – Fundamentação 2.

Como sucede com qualquer recurso, o âmbito objectivo deste, o que aqui significa das duas apelações da R. e do agravo interposto pelo A. (este e a primeira daquelas de natureza interlocutória), é fixado pelas conclusões com as quais a parte recorrente remata as respectivas alegações [artigos 684º, nº 3 e 690º, nº 1 do Código de Processo Civil (CPC)], importando, assim, decidir as questões colocadas – e só elas – através dessas conclusões – e, bem assim, as que forem de conhecimento oficioso –, exceptuadas aquelas questões cuja decisão se mostre prejudicada pela solução dada a outras (artigo 660º, nº 2 do CPC).

Ora, e este traduz o primeiro passo na delimitação do âmbito impugnatório, constata-se que em nenhum dos casos (nem nas apelações nem no agravo) promovem os recorrentes a (re)discussão dos factos fixados e pressupostos em qualquer uma das decisões recorridas.

Serve isto para dizer que a matéria de facto se mostra definitivamente fixada, nos termos em que a Sentença final a assumiu e elencou a fls. 289/292[9], sendo tal matéria a seguinte: (………………………………………………………………………………….) 2.1.

Estão em causa dois recursos de apelação (do de agravo cuidaremos mais tarde, pela razão enunciada no início da nota 9) com um âmbito de sobreposição temática total. Com efeito, ambos – e as duas apelações foram interpostas pela R./Reconvinte – se fundam na repetida invocação de uma impossibilidade originária, legal e absoluta do contrato-promessa, assentando ambas em argumentos totalmente coincidentes[10], referidos à questão da licença de habitabilidade, designadamente às condições estabelecidas para emissão desta, assumindo a Apelante a não obtenção dessa licença como impossibilidade originária da promessa.

A questão a decidir, nos termos em que a Apelante a delimitou no seu recurso, cinge-se, assim, à determinação de se o contrato-promessa celebrado entre os RR., enquanto promitentes-vendedores, e o A., enquanto promitente-comprador, era, como o afirma reiteradamente a Apelante, legal, originária e objectivamente impossível. Outras questões colocadas pela Sentença apelada que não apresentem uma ligação sequencial a esta, importa sublinhá-lo aqui, designadamente as questões respeitantes ao enriquecimento sem causa e ao direito de retenção do Apelado, mostram-se ausentes do recurso (concretamente da síntese conclusiva...

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