Acórdão nº 0655/13 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 08 de Maio de 2013
Magistrado Responsável | FRANCISCO ROTHES |
Data da Resolução | 08 de Maio de 2013 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Recurso jurisdicional da decisão proferida no processo de contra-ordenação com o n.º 2996/12.0BEPRT 1. RELATÓRIO 1.1 No recurso de aplicação da coima em processo de contra-ordenação tributária deduzido pela sociedade denominada “A………, Lda.” (a seguir Arguida ou Recorrida), a Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto proferiu despacho no qual, considerando que a decisão administrativa recorrida «não contém factos que integrem a contra-ordenação imputada ao arguido, nem qualquer outra», decidiu «rejeitar a acusação de contra-ordenação, devendo os autos ser devolvidos, após trânsito, à entidade administrativa» ao abrigo do disposto no «artigo 311.º, n/s 1, 2/a) e 3/b), do CPP, aplicável por força do artigo 3.º/b), do RGIT e 41.º, n.º 1, do D.L. n.º 433/82, de 27.10».
1.2 Inconformado com essa decisão, o Representante do Ministério Público (a seguir Recorrente) junto do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto dela veio recorrer para este Supremo Tribunal Administrativo, apresentado alegação que resumiu em conclusões do seguinte teor: «1.ª No processo de contra-ordenação tributária, por força do disposto no art. 3.º b) e 81.º do RGIT, remetidos os autos ao tribunal competente e apresentados ao juiz pelo MºPº, nos termos do art. 62.º do RGCO, o juiz ou não aceita o recurso nos termos do art. 63.º do RGCO, ou o decide, em conformidade com o art. 64.º do RGCO.
-
Nos termos das disposições conjugadas dos arts. 63.º e 64.º do RGCO e 3.º b) e 80.º n.º 2 do RGIT, os motivos de rejeição são apenas a intempestividade e a falta de observância dos requisitos de forma: recurso apresentado sob a forma escrita, contendo alegações e conclusões.
-
Mesmo que existam excepções de que se deva conhecer o recurso não poderá ser objecto de rejeição, devendo o juiz proferir decisão nos termos do art. 64.º do RGCO.
-
Estando expressa e completamente regulado, no RGIT e no RGCO, a tramitação posterior à apresentação dos autos ao juiz, não há que aplicar subsidiariamente o regime do C. P. Penal, não havendo lugar a um despacho equivalente ao previsto no art. 311.º do C. P. Penal.
-
Não sendo revogada ou declarada nula a decisão que aplicou a coima e, ordenada a devolução dos autos à entidade administrativa que a aplicou, esta não pode proceder à renovação do acto sancionatório.
-
A decisão recorrida, ao rejeitar a acusação de contra-ordenação, enferma de erro de aplicação e de interpretação do direito, violando o disposto nos arts. 63.º e 64.º do RGCO e 3.º b) e 81.º do RGIT.
-
O presente recurso é admissível nos termos do art. 73.º n.º 2 do RGCO, por tal se afigurar manifestamente necessário a melhoria da aplicação do direito e por o justificar a dignidade da questão controvertida.
Termos em que deve ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se a decisão recorrida e determinando que seja proferida decisão nos termos do art. 64.º do RGCO, a fim de os autos prosseguirem seus regulares termos […]».
1.3 O recurso foi admitido, para subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.
1.4 Não foram apresentadas contra-alegações.
1.5 Cumpre apreciar e decidir, dispensando-se os vistos, uma vez que a questão suscitada nos presentes autos foi recentemente decidida por duas vezes pela mesma formação desta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo.
1.6 As questões que cumpre apreciar e decidir são as de saber (i) se o recurso é admissível, em abstracto; na afirmativa, (ii) se estão reunidos os requisitos para a sua aceitação pelo Supremo Tribunal Administrativo; ainda na afirmativa, (iii) se o art. 311.º do Código de Processo Penal (CPP) é subsidiariamente aplicável em sede de recurso da decisão da aplicação da coima, ou seja, se o juiz do tribunal tributário pode rejeitar a acusação ao abrigo do disposto naquele preceito legal.
* * * 2. FUNDAMENTAÇÃO 2.1 DE FACTO Dos autos resulta que:
a) A sociedade denominada “A………, Lda.” foi condenada por decisão de 22 de Outubro de 2012 do Chefe do Serviço de Finanças do Porto 4 numa coima de € 431,00 pela falta de entrega dentro do prazo do montante de € 1.438,01 de IRS retido na fonte no mês de Fevereiro de 2012 e que estava obrigada a entregar até 20 de Março de 2012, comportamento que a autoridade administrativa considerou integrar a infracção prevista pelo art. 98.º, n.º 3, do Código do IRS, e punida pelos arts. 114.º, n.ºs 2 e 5, alínea a), 24.º, n.º 2 e 26.º, n.º 4, todos do Regime Geral das Infracções Tributárias (RGIT) (cfr. decisão de aplicação da coima a fls. 18); b) Em 9 de Novembro de 2012, a Arguida fez dar entrada no Serviço de Finanças do Porto 4 petição inicial pela qual veio impugnar aquela decisão administrativa, pedindo ao Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto a anulação daquela decisão (cfr. petição inicial de fls. 23 a 25); c) Em 17 de Dezembro de 2012, a Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto proferiu decisão do seguinte teor: «Dispõe o artigo 3.º, b), do RGIT: São aplicáveis subsidiariamente:...
-
Quanto às contra-ordenações e respectivo processamento, o regime geral do ilícito de mera ordenação social; Nos termos do artigo 41.º, n.º 1, do referido D.L., são subsidiariamente aplicáveis ao processo de contra-ordenação os preceitos reguladores do processo criminal.
A propósito da remessa do processo de contra-ordenação para julgamento, dispõe o artigo 81.º, do RGIT: 1 - Recebida a petição, o dirigente do serviço tributário remete o processo, no prazo de 30 dias, ao tribunal tributário competente.
2 - Sempre que o entender conveniente, o representante da Fazenda Pública pode oferecer qualquer prova complementar, arrolar testemunhas, quando ainda o não tenham sido, ou indicar os elementos ao dispor da administração tributária que repute conveniente obter.
Embora este artigo não o diga expressamente, ao contrário do que fazia, por exemplo, o artigo 214.º, do antigo Código do Processo Tributário, deve continuar a entender-se que a apresentação do processo de contra-ordenação ao juiz vale como acusação, seja por aplicação subsidiária (nessa parte) do artigo 62.º, n.º 2, do D.L. n.º 433/82, seja por integração de eventual lacuna, em nome da harmonia geral do sistema, uma vez que seria de todo injustificado que as contra-ordenações comuns tivessem esse tratamento garantístico e as contra-ordenações tributárias se vissem privadas desse mesmo tratamento.
Por sua vez, dispõe o artigo 311.º, do CPP: 1 - Recebidos os autos no tribunal, o presidente pronuncia-se sobre as nulidades e outras questões prévias ou incidentais que obstem à apreciação do mérito da causa, de que possa desde logo conhecer.
2 - Se o processo tiver sido remetido para julgamento sem ter havido instrução, o presidente despacha no sentido:
-
De rejeitar a acusação, se a considerar manifestamente infundada; b) De não aceitar a acusação do assistente ou do Ministério Público na parte em que ela representa uma alteração substancial dos factos, nos termos do n.º 1 do artigo 284.º e do n.º 4 do artigo 285.º...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO