Decisões Sumárias nº 438/08 de Tribunal Constitucional (Port, 01 de Outubro de 2008

Data01 Outubro 2008
Órgãohttp://vlex.com/desc1/2000_01,Tribunal Constitucional (Port

DECISÃO SUMÁRIA N.º 438/2008

Processo n.º 653/08

  1. Secção

    Relator: Conselheiro Benjamim Rodrigues

    1 – A., melhor identificado nos autos, recorre para o Tribunal Constitucional ao abrigo do disposto no artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro (LTC), na sua actual redacção, pretendendo ver fiscalizada a constitucionalidade da norma constante do “artigo 188.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, na redacção aplicável aos autos, quando interpretada a expressão imediatamente no sentido de permitir que os autos de intercepção de chamadas telefónicas realizadas por órgãos de policia criminal, acompanhadas das respectivas cassetes, possam ser presentes primeiro ao Ministério Público e depois ao Juiz de instrução Criminal, desde que o JIC as receba num prazo que não exceda um mês”, fazendo constar do requerimento de interposição de recurso que “relativamente àquela norma, pretende o requerente que o Tribunal Constitucional determine a interpretação ‘conforme à constituição’, decidindo que o advérbio ‘imediatamente’, não admite – sob pena de nulidade insanável –, à luz do acompanhamento judicial a que a CRP condiciona a constitucionalidade das escutas telefónicas, que os autos de intercepção e as respectivas cassetes sejam presentes ao JIC num prazo superior a 5 dias”. Pretende, ainda, ver apreciada a constitucionalidade “[d]as normas constantes dos artigos 119.º, 126.º, n.º 3 e 188.º, n.º 1, 2 e 3 e 189.º do Código de Processo Penal, na redacção aplicável aos autos, interpretadas no sentido de se julgarem lícitos, e não feridos de nulidade insanável, os autos de transcrição realizados por iniciativa exclusiva da entidade investigadora, Policia Judiciária, e lícita a sua posterior validação e junção aos autos através de Despacho Judicial”, por violação do disposto nos artigos 18.º, 32.º, n.º 8 e 34.º da Constituição.

    2 – O presente recurso vem interposto do Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 21 de Maio de 2008, que julgou improcedente o recurso interposto pelo arguido na parte relativa à validade das escutas telefónicas, matéria essa que havia sido impugnada com base nas seguintes premissas conclusivas:

    “1 – O presente recurso concerne às questões prévias apreciadas da douta decisão recorrida relativas à nulidade das intercepções, gravações e transcrições das conversas telefónicas e à legitimidade do MP para a promoção do procedimento criminal quanto ao crime de violação de segredo por funcionário.

    Da nulidade das intercepções, gravações e transcrições:

    2 – A douta decisão recorrida, directamente ou por remissão para o douto Ac. TRL de 21.01.2004, decidiu, em síntese, que:

    1. No caso concreto, os formalismos legais foram suficientemente respeitados, já que todas as escutas foram judicialmente ordenadas, assim como as respectivas prorrogações e as gravações foram levadas ao conhecimento do JIC no tempo mais rápido possível.

    2. No que respeita à intercepção ao posto n.º 09314983068 os autos foram presentes, de imediato, ao JIC. Já não assim nos restantes. No entanto, os postos ………, ………, ………, ……… e ……….., todos eles, são primeiro entregues ao Ministério Público que, depois, remete ao Juiz dentro de prazo que não excede um mês. Esta dilação temporal embora não seja excelente como no caso do posto n.º …….., não é excessiva.

    3. Que a expressão “imediatamente” contida no nº 1 do art. 188º do CPP, deve ser interpretada no sentido de no tempo mais rápido possível e o seu desrespeito poderá eventualmente dar lugar a um pedido de aceleração, mas nunca a uma nulidade.

    4. Não obsta ao cumprimento do formalismo previsto no artigo 188º, do CPP, o facto de o órgão de polícia criminal que procedeu à investigação ter tomado previamente conhecimento do conteúdo das comunicações interceptadas e de ter as ter transcrito em auto, seleccionando as passagens que considerou como relevantes – sem prévia análise ou autorização judicial –, desde que os autos sejam depois confirmados judicialmente pelo Magistrado Judicial, que ordenou a sua junção aos autos.

      3 – No que concerne à falta de supervisão judicial da intercepção, gravação e transcrição das conversas telefónicas verifica o Recorrente o seguinte:

    5. Pese embora a multiplicidade dos despachos – sistematizados a fls. 1579 – que ordenaram a intercepção e gravação das chamadas telefónicas (doze), não existiu efectiva supervisão judicial sobre a intercepção, gravação e transcrição das escutas telefónicas realizadas sobre os postos telefónicos sob escutas;

    6. Toda a iniciativa e verificação do interesse da matéria interceptada ficou a cargo da Polícia Judiciária, o que não se coaduna com o modelo constitucional e legal, que pressupõe e exige uma apertada e interventora actuação do JIC.

      4 – De facto, no caso “sub judice”:

    7. Todos os postos interceptados foram-no pela Entidade de Investigação Criminal;

    8. A Entidade de Investigação Criminal transcreveu por sua iniciativa e segundo critérios previamente impostos pelo seu superior hierárquico as conversas telefónicas por si interceptadas e seleccionadas; (vd. fls. 80 e 194, entre outras); e

    9. Neste método, baseado na audição e transcrição, o agente da PJ ia apondo nos denominados Autos de Transcrição, por sua iniciativa, expressões como “Conversa sem interesse aparente para os autos” (Vd., por exemplo, fls. 914, 918 e 924, entre outras)

      5 – Ou seja, primeiramente o órgão de polícia criminal procedia às transcrições das fitas gravadas, por sua iniciativa e segundo critério por si escolhido e, só depois eram as mesmas cassetes e respectivos Autos de Transcrições presentes ao Ministério Público e, finalmente, ao JIC.

      6 – Pelo que, conclui o Recorrente que não foram os autos de intercepção e a gravação das conversas telefónicas “imediatamente” presentes ao JIC, seu primeiro destinatário.

      7 – Só “a posteriori” é que o JIC ordenou a junção dos denominados Autos de Transcrições aos autos; (Vd., por exemplo, fls. 122 – II).

      8 – Tal só ocorreu por quatro vezes, pese embora existam doze despachos a ordenar a intercepção e gravação de conversas telefónicas, e tais operações se tenham verificado ao longo de meses, o que ditou a elaboração oficiosa de vastos e numerosos Autos de Transcrição.

      Acresce ainda que:

      9 – Os despachos judiciais que foram, sucessivamente, autorizando e prorrogando as intercepções e gravações aos postos sob escuta, não se acham (aparentemente) precedidos da necessária audição das correspondentes cassetes, antes parecem estribados na posição adoptada pelo MP relativamente ao interesse das mesmas, sem que exista no processo demonstração da confirmação judicial – aferida através de efectiva audição das cassetes – relativamente ao alegado interesse para a prova e descoberta da verdade. (vd. por exemplo o despacho de fls. 287).

      10 – Do exposto se conclui que não existiu o necessário controlo judicial sobre a actividade da entidade investigadora, violando-se, assim, o disposto nos artigos 188º, nºs 1 e 3, do CPP, 18º e 32º, nº 8 da CRP.

      11 – Perante a Jurisprudência do Tribunal Constitucional fixada, nomeadamente, nos doutos Acórdãos 407/97 e 528/03, forçoso é concluir que a douta decisão recorrida, aplicou o artigo 188º, nº 1, do CPP, atribuindo-lhe um sentido interpretativo materialmente inconstitucional.

      Por outro lado:

      12 – A douta decisão recorrida, quanto às consequências da inobservância do disposto no artigo 188º, nº 1 do CPP, acolhe uma interpretação do complexo normativo constituído pelos artigos 119º, 126º, nº 3, 188º, nº 1 e 189º do CPP materialmente inconstitucional, por violação dos artigos 32º nº 8, 34º nºs 1 e 4 e 18º, n.º 1, 2 e 3 da CRP, ao interpretar tais normas no sentido de que o não cumprimento do estatuído no artigo 188º, nº 1 do CPP – no que respeita a exigência da imediata entrega do auto de intercepção e dos suportes com as gravações das escutas telefónicas ao JIC – poderá eventualmente dar lugar a um pedido de aceleração, mas nunca a uma nulidade.

      13 – As normas em causa, assim interpretadas, violam de forma desnecessária e desproporcional o direito à protecção da vida privada e das telecomunicações previsto no artigo 32º, nº 8 e 34º da CRP, atingindo-o no seu núcleo essencial.

      14 – Tal sentido interpretativo, elimina quaisquer consequências práticas para o desvalor que a violação de tal direito constitucional implica, o que não é inaceitável e desconforme à constituição.

      Por outro lado:

      15 – As transcrições não foram – e teriam legal e constitucionalmente de o ser – previamente ordenadas através de decisão judicial (vd. por exemplo fls. 122-II).

      16 – Consequentemente, são nulos, nos termos conjugados dos artigos 119º, 126º, nº 3 e 189º do CPP e arts. 32º, nº 8 e 34º, da CRP, por violação do disposto no artigo 188º, nºs 1 e 3, do CPP, os denominados Autos de Transcrição, sendo igualmente nulos os seguintes Despachos Judicias que ordenaram a sua junção aos autos:

      - Despacho datado de 09.06.99, a fls. 122, II Vol.;

      - Despacho datado de 15.11.99, a fls. 287, III Vol.;

      - Despacho datado de 05.05.00, a fls. 762 – V Vol.; e

      - Despacho datado de 15.05.00, a fls. (quis dizer, fls. 766) – V Vol.

      17 – Tal nulidade é insanável e acarreta a proibição de prova, imposta pelo artigo 32º, nº 8 da CRP e art. 126º, nº 3 do CPP. (v.g. Ac. STJ de 17 de Janeiro de 2001, relatado pelo Exmº Senhor Conselheiro Lourenço Martins).

      18 – As normas constantes nos artigos 119º, 126º, nº 3 e 188º, nº 1, 2 e 3 e 189º do CPP, interpretadas no sentido de julgarem lícitos, e não feridos por nulidade (ainda que sanável), os autos de transcrição realizados por exclusiva iniciativa da entidade investigadora, Polícia Judiciária, e lícita a sua posterior validação e junção aos autos através de Despacho Judicial, são inconstitucionais por violação do disposto nos artigos 18º e 32º, nº 8 e 34º da CRP.

      19 – Face ao supra exposto, deveria a douta decisão recorrida ter, conforme requerido a fls. 1768, declarado a nulidade (a) de todos os Autos de Transcrição, (b) de todos os despachos judiciais que ordenaram “a...

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