Acórdão nº 00217/08.0BEVIS de Tribunal Central Administrativo Norte, 03 de Maio de 2013

Magistrado ResponsávelCarlos Lu
Data da Resolução03 de Maio de 2013
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: 1.

RELATÓRIO MM(...) e OUTROS, “JUNTA DE FREGUESIA DE MANGUALDE”, devidamente identificados nos autos, inconformados, vieram de per si interpor recursos jurisdicionais (respetivamente, independente e subordinado) da decisão do TAF de Viseu, datada de 23.03.2011, proferida na ação administrativa especial por aqueles instaurada contra o ente público demandado e que anulou a deliberação impugnada [tomada em reunião de 24.12.2007 e que reconhecendo como público e sua propriedade o caminho situado na Quinta da R(...) pertencente aos AA. intimou estes a que obstassem à colocação de quaisquer obstáculos no referido caminho ou que por qualquer forma impedissem ou dificultassem a livre circulação por pessoa, de pé ou de carro] condenando aquele ente a proferir novo ato com sanação do único de fundamento de ilegalidade julgado verificado [preterição/violação do direito de audiência - arts. 01.º, n.º 1, 55.º, n.º 1, 86.º e 100.º todos do CPA] [foram julgados improcedentes os fundamentos de ilegalidade assentes na usurpação de poderes, na violação do direito de propriedade dos AA., na infração dos arts. 17.º, 34.º e 38.º da Lei n.º 169/99, de 18.09, na falta de fundamentação (arts. 124.º e 125.º do CPA), no desrespeito dos arts. 03.º e 06.º-A do CPA].

Formulam os AA., aqui recorrentes, nas respetivas alegações as seguintes conclusões que se reproduzem (cfr. fls. 349 e segs.

- paginação processo suporte físico tal como as referências posteriores a paginação salvo expressa indicação em contrário): “...

1) Vem o presente recurso interposto do acórdão do Tribunal a quo, que anulou a deliberação impugnada, mas apenas condenando a recorrida Junta de Freguesia a proferir novo ato, com sanação do vício de preterição do direito de audiência prévia dos interessados; 2) Os recorrentes, contudo, haviam invocado diversas causas de invalidade/ilegalidade, além do referido vício, nomeadamente o da nulidade por usurpação de poderes, extravasamento das competências da recorrida e ofensa ao direito de propriedade daqueles; 3) O objeto do presente recurso respeita à parte do acórdão recorrido, que decidiu não existir o alegado vício de usurpação de poder, nem qualquer violação do direito de propriedade dos AA., nessa medida ficando vencidos os ora recorrentes (cfr. n.º 2 do art. 141.º do CPTA); 4) A deliberação em causa consubstancia a declaração/reconhecimento da dominialidade pública do caminho em causa; 5) Na data da deliberação sub judice estava pendente, há muito, ação judicial proposta pela recorrida contra os recorrentes, em que pede a declaração de tal caminho como público e a condenação daqueles nesse reconhecimento e demais consequências legais; 6) Antes do recurso ao Tribunal Judicial, quer para a providência cautelar, quer para a ação judicial, bem como (antes) da deliberação em causa, nunca a recorrida havia «definido» ou sequer ventilado a «situação jurídico-administrativa do caminho»; 7) Sendo certo que, obviamente, antes do recurso ao Tribunal Judicial e da presente deliberação, já havia oposição manifesta dos recorrentes à passagem de terceiros por aquele caminho dentro da sua propriedade; 8) É pacífico, pois, que é no âmbito dos tribunais judiciais, como, de resto, a recorrida o fez, que se deve discutir/pedir o reconhecimento e/ou qualificação, como vicinal, de um determinado caminho e, consequentemente, se declarada a dominialidade pública, poder a autarquia administrar e fiscalizar o mesmo, coercivamente, se necessário; 9) Estava, enfim, vedada à recorrida Junta deliberar sobre a natureza pública de tal caminho, tanto mais que estes (caminhos públicos) não pertencem ao património da Junta de Freguesia, mas ao domínio público (cfr. art. 84.º da CRP); 10) Às autarquias locais, nomeadamente à recorrida Junta e à Assembleia de Freguesia, compete apenas a gestão e/ou fiscalização e não a deliberação sobre a natureza pública e/ou afetação à dominialidade pública vicinal de determinado caminho (cfr. arts. 17.º e 34.º da Lei n.º 169/99, de 18 de setembro); 11) A recorrida Junta de Freguesia, ao deliberar/determinar a afetação do caminho em causa ao domínio público, alegadamente sua propriedade, invade a esfera das atribuições do poder judicial; 12) Por isso, consubstancia tal deliberação um ato nulo, por usurpação de poderes, nos termos da al. a) do n.º 2 do art. 133.º do CPA; 13) Extravasando o ato impugnado as atribuições/competências da recorrida Junta, bem como da Assembleia de Freguesia, que o «ratificou», manifesta se torna a nulidade de ambos os atos (cfr. os cits. arts. 17.º e 34.º da Lei n.º 169/99, de 18 de setembro, als. a), b) e d) do n.º 2 do art. 133.º do CPA e o n.º 1 do art. 111.º e o n.º 4 do art. 268.º, ambos da CRP); 14) Violou, pois, o acórdão recorrido, que não declarou a nulidade daquela deliberação, as normas atrás referenciadas; 15) Deverá, assim, dando-se provimento ao recurso, ser o acórdão recorrido revogado e substituído por outro que declare a existência do(s) vício(s) invocado(s), que comportam a nulidade daquela deliberação impugnada, obstando-se, consequentemente, à sua renovação, tudo com as demais consequências legais …”.

Por sua vez a R., enquanto recorrente subordinado, veio nas suas alegações (cfr. fls. 373 e segs.

) formular as seguintes conclusões: “...

a) O impedimento de circulação de pessoas e veículos através do denominado «caminho da R(...)», não ocorre desde o ano de 2005, sendo irrelevante a pendência de processo judicial desde tal data, já que a livre circulação se efetuava e encontrava garantida por decisão proferida em procedimento cautelar.

b) Somente por acórdão proferido no processo n.º 759/05.9TBMGLB.C1 datado de 11.09.2007 e notificado por ofício de 14.09.2007 é que foi revogada a decisão que deferiu a providência requerida na alínea anterior e deixou de estar assegurada a livre circulação de pessoas e veículos.

c) Somente em 24.12.2007 é que os recorridos impediram a livre circulação através do caminho, colocando neste o veículo automóvel marca Peugeot, matrícula (...); d) Na sequência do sobredito impedimento à livre circulação a recorrente deliberou tomar as medidas necessárias a garantir a livre circulação de pessoas e veículos através do sobredito caminho público e, em 08.01.2008, retirou deste o veículo marca Peugeot restabelecendo a circulação; e) O veículo marca Renault foi colocado no caminho, impedindo a circulação de pessoas e veículos, após a retirada do veículo marca Peugeot e foi deste retirado em 18.01.2008, não estando provado que este tenha a matrícula indicada pelos recorridos e que seja sua propriedade, carecendo este de legitimidade para impugnarem a decisão recorrida quanto a tal veículo; f) A recorrida, com a celeridade devida, tomou as providências necessárias a garantir a livre circulação de pessoas e veículos através do caminho público, retirando os veículos que a impediam, sendo a reposição da livre circulação incompatível com o cumprimento dos prazos processuais de audiência prévia dos interessados em procedimento administrativo, e a decisão urgente, e justificada a dispensa de tal audiência.

g) A sentença recorrida, por erro de interpretação e aplicação violou o disposto nos artigos 100.º, n.º 1 e 103.º, nº 1 alínea a) do CPA …”.

Terminam no sentido do provimento do recurso com consequente revogação da decisão judicial recorrida e improcedência total da pretensão dos AA..

O R., enquanto recorrido e uma vez notificado, apresentou ainda contra-alegações (cfr. fls. 373 e segs.

), nas quais sustenta a manutenção do julgado naquilo que constituía o objeto do recurso jurisdicional deduzido pelos AA. sem que, todavia e neste âmbito, haja formulado conclusões.

O Digno Magistrado do Ministério Público (MP) junto deste Tribunal, notificado nos termos e para efeitos do disposto no art. 146.º do CPTA, não emitiu qualquer parecer ou pronúncia (cfr. fls. 401 e segs.

).

Colhidos os vistos legais juntos dos Exmos. Juízes-Adjuntos foram os autos submetidos à Conferência para julgamento.

  1. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelos recorrentes, sendo certo que, pese embora por um lado, o objeto dos recursos se acha delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, nos termos dos arts. 144.º, n.º 2 e 146.º, n.º 4 do CPTA, 660.º, n.º 2, 664.º, 684.º, n.ºs 3 e 4 e 685.º-A, n.º 1 todos do Código de Processo Civil (CPC) (na redação introduzida pelo DL n.º 303/07, de 24.08 - cfr. arts. 11.º e 12.º daquele DL -, tal como todas as demais referências de seguida feitas relativas a normativos do CPC) “ex vi” arts. 01.º e 140.º do CPTA, temos, todavia, que, por outro lado, nos termos do art. 149.º do CPTA o tribunal “ad quem” em sede de recurso de apelação não se limita a cassar a decisão judicial recorrida porquanto ainda que a declare nula decide “o objeto da causa, conhecendo de facto e de direito” reunidos que se mostrem no caso os necessários pressupostos e condições legalmente exigidas.

    As questões suscitadas resumem-se, em suma, em determinar se a decisão judicial recorrida ao julgar parcialmente procedente a pretensão deduzida pelos AA. incorreu ou não em erro de julgamento por enfermar: A) Quanto ao recurso independente, de violação do disposto, nomeadamente, nos arts. 17.º e 34.º da Lei n.º 169/99, de 18.09, 133.º, n.º 2, als. a), b) e d) do CPA, 111.º, n.º 1 e 268.º, n.º 4 ambos da CRP; B) Quanto ao recurso subordinado, de infração ao preceituado nos arts. 100.º, n.º 1 e 103.º, nº 1 al. a) do CPA [cfr. alegações e demais conclusões supra reproduzidas].

    Considerando as questões que se mostram colocadas em ambos os recursos jurisdicionais passaremos à análise do recurso independente porquanto, no caso, o conhecimento do recurso subordinado não precede o do recurso principal/independente face ao que deriva dos arts. 288.º, 682.º e 713.º todos do CPC, na certeza de que desde que se...

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