Acórdão nº 08S1986 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 22 de Outubro de 2008

Data22 Outubro 2008
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1997_01,Supreme Court of Justice (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I 1.

Em 16 de Novembro de 2006, no Tribunal do Trabalho de Vila Nova de Gaia, 2.º Juízo, AA, BB e CC intentaram, em separado, acções, com processo comum, emergentes de contrato individual de trabalho contra PP, S.A., mais tarde apensadas, pedindo que se declare que resolveram os correspondentes contratos de trabalho com justa causa e que a ré seja condenada a pagar-lhes, a título de retribuições vencidas, férias e subsídio de férias relativos a 2005, proporcionais de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal relativos a 2006, e indemnização por antiguidade, as quantias de € 26.686,84, € 25.672,57 e € 8.882,71, respectivamente, acrescidas de juros de mora, à taxa legal, desde a citação até integral pagamento.

Em síntese, os autores alegaram que, em 1 de Agosto de 2006, resolveram com justa causa os contratos de trabalho que mantinham com a ré, perante a recusa desta «em fornecer trabalho no local de trabalho, com impedimento da entrada nas instalações, o que ocorreu, diariamente e de forma continuada, desde o [...] dia 26 de Maio de 2006 até ao dia 31 de Julho de 2006, e, ainda, falta de pagamento pontual das remunerações devidas relativas aos meses de Junho e Julho [de 2006]...».

A ré contestou, alegando, que não se verificou recusa de fornecer trabalho aos autores, mas antes que estes que se recusaram, injustificadamente, a trabalhar no local que lhes foi indicado, apesar do meio de transporte posto à sua disposição, pelo que «não tinham direito a receber a sua remuneração, encontrando-se numa situação de indisponibilidade para o trabalho e de faltas injustificadas», e deduziu pedido de compensação dos créditos que detinha em relação aos autores, atinentes à falta de cumprimento do prazo de aviso prévio, com as quantias de que aqueles são credores, a título de retribuição de férias e subsídio de férias vencidos em 1 de Janeiro de 2006, e dos proporcionais de férias e subsídios de férias e de Natal referentes a 2006.

Realizado julgamento, foi proferida sentença que, considerando não ocorrer justa causa para a resolução dos contratos de trabalho, julgou as acções parcialmente procedentes e, operando a pedida compensação de créditos, condenou a ré a pagar aos autores as quantias de € 785,32, € 729,48 e € 638,44, respectivamente.

  1. Inconformados, os autores apelaram para o Tribunal da Relação do Porto, que, concluindo que os autores resolveram os contratos de trabalho com justa causa, julgou parcialmente procedente a apelação e condenou a ré a pagar aos autores as quantias de € 22.027,68, € 21.299,38 e € 6.378,78, respectivamente, decorrendo o valor da primeira quantia mencionada de posterior rectificação (fls. 302), «sendo a sentença revogada, excepção feita à parte em que a R. havia sido condenada».

    É contra esta decisão que a ré agora se insurge, mediante recurso de revista, apenas admitido relativamente aos autores AA e BB, em que formula as seguintes conclusões: «1.ª Da matéria de facto resulta que os AA. prestavam serviço na secção de produção de vigas da Vilaje, em Seixezelo (facto 61 do acórdão), tendo sido transferidos para a sede da R., no início de 2003, porque a R. decidiu acabar com a produção de vigas da Vilaje, devido a defeitos resultantes de as pistas das vigas estarem desgastadas, o que conduzia a reclamações dos clientes e decréscimo de encomendas (factos 62, 63 e 64); os AA. apresentavam-se ao serviço em Seixezelo e aí eram recolhidos por uma carrinha da R., que os levava para a sede, a uma distância de 10 km (cerca de 10-15 minutos), contando o tempo da deslocação como tempo de trabalho (facto 65), tendo estado nesta situação até Junho de 2005 (facto 66), altura em que lhes foram solicitados outros serviços em Vilaje, Seixezelo, relativos a obras de reparação de um muro e de pavimentação (facto 67); findas essas obras (e no dia 26.5.2006) a R. ordenou aos AA. que tornassem a trabalhar com os colegas para a sede da R., pondo--lhes a carrinha à disposição, e estes recusaram esse trabalho (factos 68, 69 e 70), vindo depois a resolver o contrato de trabalho com justa causa, alegando recusa de fornecer trabalho no local de trabalho e falta de pagamento dos salários; 2.ª Não houve qualquer recusa da R. em fornecer trabalho aos AA.: [o]s AA. é que manifestaram expressamente a vontade de não acatar a ordem e o trabalho ordenado, que envolvia a sua deslocação para a sede da R.; a R. quis que os AA. continuassem a prestar serviço nas instalações da sede, para onde tinham sido mudados em 2003, e os AA. recusaram-se a cumprir a ordem que lhe foi dada, não obstante o meio de deslocação posto à sua disposição - como bem de decidiu na 1.ª instância; 3.ª Tal fizeram aliás em consonância com o que já tinham afirmado anteriormente de forma expressa, de não mais querer trabalhar na sede da R. (facto 49), o que constitui uma declaração peremptória prévia de não cumprimento; 4.ª Os AA. tinham sido transferidos para a sede da R. no início de 2003 (factos 62 e 64), com o serviço de produção a que pertenciam, que acabou nessa altura, por decisão unilateral da R. (facto 62), tendo sido nessa altura que as condições de trabalho se alteraram (definitiva e não meramente temporariamente, como incorrectamente refere o acórdão a fls. 256), não podendo pois os AA. recusar-se a cumprir três anos volvidos; 5.ª Tanto mais que não tinham qualquer prejuízo (facto 65); 6.ª Também, a questão de os AA. não terem sido avisados na forma e com a antecedência devida é uma falsa argumentação: [a] transferência deu-se no início de 2003, quando o regime legal era o do art. 37.º da LCT (DL n.º 49.408) e não o do art. 317.º do Código do Trabalho, que entrou só em vigor no dia 1.12.2003; 7.ª Seja como for, essa questão era irrelevante, não só em face das comunicações escritas que a R. lhe fez (maxime a carta de 12.6.2006 - doc. 3 da p.i. - facto 75), como também porque os AA. não queriam cumprir nem iam para a sede da R., independentemente da forma por que a ordem fosse transmitida (facto 49) - essa é que é a verdade e não pode ser escamoteada; 8.ª É até duvidoso que haja in casu uma verdadeira transferência ou alteração do local de trabalho, na medida em que os AA. entravam ao serviço e saíam no mesmo sítio, nas instalações de Seixezelo, tudo se passando no âmbito da mesma empresa entendida como unidade económica e como mera medida de gestão empresarial, maxime de recursos humanos, envolvendo a sua deslocação; porventura até sem necessidade de recorrer ou fazer apelo ao moderno conceito de empresa constante da Directiva 2001/23/CE do Conselho, de 12 de Março, e do art. 318.º, n.º 4, do CT; 9.ª Ora, não cumprindo a ordem, nem tomando o transporte que a R. lhes disponibilizou, nem continuando a comparecer e a trabalhar na sede da R., como lhes foi determinado, verbalmente e por escrito, os AA. não tinham direito a receber a sua remuneração, encontrando-se numa situação de indisponibilidade para o trabalho e de faltas injustificadas (ac. STJ de 31.10.2000, in CJ, 2000, tomo 3, p. 278); 10.ª A resolução do contrato, pelos AA., foi sem justa causa, o que confere o direito à R. a uma indemnização correspondente ao período de aviso prévio em falta (art. 446.º do CT): 2 meses; 11.ª Dada a situação e o procedimento dos AA., também não pode deixar de se considerar uma violência para a R. a fixação da indemnização em 40 dias de retribuição de base e diuturnidades, pois que sempre se teria de entrar em linha de conta com a culpa do próprio lesado, na criação e no agravamento dos danos (art. 570.º do CC), o que levaria a fixar a indemnização no mínimo de 15 dias, se a justa causa de resolução fosse atendível; 12.ª O acórdão recorrido fez incorrecta interpretação dos factos e, s.m.o., errada aplicação dos [artigos] 315.º, 316.º, 317.º, 441.º e 443.º do CT e das demais normas jurídicas citadas nas conclusões anteriores.» Termina pedindo que seja «repristinada a sentença de 1.ª instância».

    Os recorridos contra-alegaram, defendendo a confirmação do julgado.

    Neste Supremo Tribunal, a Ex.ma Procuradora-Geral-Adjunta concluiu que a revista devia improceder, parecer que, notificado às partes, não obteve resposta.

  2. No caso vertente, as questões suscitadas são as que se passam a enunciar, segundo a ordem lógica que entre as mesmas intercede: - Se os autores AA e BB resolveram os seus contratos de trabalho sem justa causa [conclusões 1.ª a 10.ª e 12.ª, na parte atinente, da alegação do recurso de revista]; - Se a ré tem direito a indemnização por resolução ilícita dos contratos de trabalho dos mencionados autores [conclusão 10.ª, na parte atinente, da alegação do recurso de revista]; - Se deve ser reduzido o valor da indemnização devida pela resolução dos contratos de trabalho dos sobreditos autores [conclusões 11.ª e 12.ª, na parte atinente, da alegação do recurso de revista].

    Corridos os vistos, cumpre decidir.

    II 1.

    O tribunal recorrido deu como provada a seguinte matéria de facto: 1) Os AA. trabalhavam para a Ré como operários industriais, sendo o A. AA com a categoria de operador de fabrico de 2.ª e os AA. BBe CC com a categoria de servente, prestando trabalho nas instalações da Ré, sitas no lugar da Feiteira, Freguesia de Pedroso, deste concelho e comarca, onde antes funcionava a empresa VV L.da; 2) Os AA. tinham sido contratados por esta empresa VV, L.da, sendo o AA e o BB por contrato verbal e o CC por contrato escrito, em 10-05-1982, 01-01-1981 e 08-01-1999, respectivamente; 3) Em Abril de 2001, a ré adquiriu a Vilage e assumiu o funcionamento da actividade comercial desta, incluindo os postos de trabalho e os trabalhadores, com todos os encargos inerentes; 4) E continuou a laborar nessas instalações, sitas na Feiteira, mantendo os postos de trabalho, incluindo os dos AA.; 5) No dia 26 de Maio de 2006, cerca das 7 horas e 45 minutos, os autores, ao chegarem ao local de trabalho, depararam com o portão da...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT