Acórdão nº 0235/13 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 17 de Abril de 2013

Magistrado ResponsávelDULCE NETO
Data da Resolução17 de Abril de 2013
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo 1.

A……, com os demais sinais nos autos, interpõe recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto que julgou improcedente a reclamação por si deduzida contra o acto praticado em 1/08/2012 pelo órgão de execução fiscal no processo de execução fiscal nº 3182199201017551 e apensos – processo que contra si correra no Serviço de Finanças do Porto-2 entre 1992 e 2004 para cobrança de dívidas tributárias – acto que lhe determinou que procedesse ao pagamento, na Secção de Cobrança do Serviço de Finanças do Porto-2, da quantia de € 39.708,38, correspondente ao montante que esse órgão de execução fiscal lhe pagara em 4/11/2004 no aludido processo executivo como remanescente do produto da venda do seu imóvel após a integral liquidação da quantia exequenda e dos legais acréscimos.

1.1.

Terminou as respectivas alegações de recurso com as seguintes conclusões: 1. O direito de exigir a restituição daquilo que foi atribuído ao Recorrente regula-se pelas regras do enriquecimento sem causa, previstas nos artigos 473º a 482º, todos do Código Civil; 2. Assim, o direito de exigir a restituição daquilo que foi atribuído ao Recorrente do valor do produto da venda em apreço já há muito que prescreveu, pois já decorreram mais de três anos desde o pagamento verificado em 3 de Novembro de 2004, nos termos do artigo 482º do Código Civil; 3. A AT não tem legitimidade nem fundamento legal para declarar nula ou anular a venda, a adjudicação e os pagamentos realizados no âmbito dos processos executivos nsº 3182199201017551 e 3514200107000987, como igualmente prescreveu o seu direito de exigir a restituição ao Recorrente do montante de € 39.108,38; 4. Se aderirmos à posição do Tribunal a quo de que o direito do enriquecido resulta da omissão da formalidade em causa e que a nulidade daí resultante é arguível, então teremos de considerar os termos em que tal pode ocorrer, isto é, em que termos pode a AT arguir a nulidade ao abrigo do artigo 201º do CPC; 5. Verificamos que a arguição da presente nulidade pelo Serviço de Finanças do Porto 2, de acordo com o artigo 201º do CPC, não é de conhecimento oficioso, nos termos do artigo 202º do CPC, e, por conseguinte, tem de ser arguida pela parte interessada. Nos termos do n.º 1 do art. 201º do CPC, os actos de reembolso e aplicação de verbas nos processos, são nulos, por omissão de uma formalidade, quando a irregularidade cometida possa influir na decisão da causa (pág. 3 do parecer notificado através do Ofício n.º 6217/3182-30, de 2 de agosto de 2012); 6. De acordo com o n.º 2 do artigo 203º do CPC, “não pode arguir a nulidade a parte que lhe deu causa ou que, expressa ou tacitamente, renunciou à arguição”; 7. O Serviço de Finanças do Porto-2 não pode arguir a nulidade porque deu efectivamente causa à nulidade aqui em crise, ao não ter efectuado, por sua única culpa, o procedimento de verificação e graduação de créditos ao Tribunal; 8. A CEMG também não pode arguir a nulidade porque renunciou tacitamente à arguição quando pagou o preço do bem penhorado e quando a penhora foi cancelada e levantada pelo Serviço de Finanças, nunca tendo questionado ou arguido a tempo a nulidade em causa (ver alínea R. da especificação); 9. Assim, quer a AT, quer a CEMG, carecem de legitimidade para arguírem a nulidade aqui em crise, nos termos do artigo 203º, nº 2, do CPC, e, por conseguinte, do direito de exigirem a restituição do indevidamente pago; 10. Acresce o facto de que o direito a arguir a nulidade aqui em crise é intempestivo, nos termos do artigo 205º e 153º, ambos do CPC; 11. Se a nulidade ocorreu durante a prática de um ato, estando a parte presente, no momento em que a irregularidade é cometida, esta só pode ser arguida até ao termo do ato. Não estando a parte presente, o prazo da arguição de dez dias (artigo 153º n.º 1 do CPC) só se conta a partir do momento em que ela tomou, podia ou devia tomar conhecimento da falta, nos termos do artigo 205º do CPC; 12. No caso concreto, a AT e a CEMG estiveram presentes no momento em que a irregularidade foi cometida, isto é, no decurso da penhora e venda do prédio no processo executivo, pelo que o prazo para arguir a nulidade já foi ultrapassado; 13. Caso se considere que a AT e a CEMG não estiveram presentes, o certo é que há muito já foram ultrapassados os dez dias a contar do momento em que deviam ter tomado conhecimento da falta, pois a venda e o pagamento do preço do prédio já decorreu, e nessa altura a falta era devia ser perfeitamente conhecida, sobretudo tendo em conta que se tratam de entidades com conhecimento superior ao de um destinatário normal; 14. Deste modo, podemos concluir que a douta sentença recorrida incorre em erro de julgamento, pois o Tribunal a quo, na interpretação e aplicação dos artigos 59º, n.º 5, 52º e 131º, todos do CPPT, não determinou o dever legal da AT em convolar a declaração de substituição em reclamação graciosa de autoliquidação; 15. Consequentemente, deve o presente recurso ser julgado procedente e revogada a douta sentença do Tribunal a quo, e, em consequência, o pedido subjacente à reclamação do ato do órgão de execução fiscal interposta pela Recorrente deve ser julgado procedente, com todas as consequências legais.

1.2.

Não houve contra-alegações.

1.3.

O Ministério Público emitiu douto parecer no sentido de que o recurso não merecia provimento, por entender, por um lado, que a questão da legitimidade do órgão da execução fiscal para decretar oficiosamente a nulidade processual cometida no processo executivo é uma questão nova, que não foi invocada pelo Reclamante na 1ª instância, e, por outro, por entender que, ao contrário do que defende o Recorrente, a decisão reclamada não se baseou na aplicação das regras do enriquecimento sem causa para determinar ao executado o pagamento da quantia de € 39.708,38.

  1. Na sentença constam como provados os seguintes factos: A) Em 10/09/1992, o Serviço de Finanças do Porto-6º Bairro, instaurou contra A……., NIF ……., o processo de execução fiscal n.º 3182921017551, para cobrança coerciva de dívidas de IVA referente a 1991 — cfr. fls. 2/4 dos autos.

    B) Em 15/02/2001 foram apensos ao processo de execução fiscal identificado em A) os processos de execução fiscal nºs 3182199301028081, 3182199301039350, 3182199401007211, 3182199601005251, 3182199601037382, 3182199701038460, 3182199801000012, 3182199901026763, 3182199901026763, 3182199901034359 e 318220001034073 — cfr. fls. 9 e informação de fls. 156 dos autos.

    C) Em 20/03/2001 foi remetida carta precatória para o Serviço de Finanças de Matosinhos-2, a qual foi autuada, em 12/07/2001, sob o nº 35142001070000987 — cfr. fls. 12 e 13 dos autos.

    D) Em 19/12/2001, na sequência do mandado de penhora nº 1577/2001, o Serviço de Finanças de Matosinhos-2 lavrou auto de penhora, do qual consta, entre o mais, o seguinte: “…em cumprimento do respectivo Mandado, fizemos Penhora e efectiva apreensão do bem abaixo designado para pagamento da quantia de Esc. 1.899.039$00 (um milhão e oitocentos e noventa e nove mil e trinta e nove escudos), para além dos respectivos adicionais, juros de mora e custas provenientes da Execução que a Fazenda Nacional move a “A……..” (...), por dividas de Imposto Sobre o Rendimento de Pessoas Singulares e de Imposto Sobre o Valor Acrescentado, no valor global de 1.899.039$00.

    BENS PENHORADOS VERBA ÚNICA: Prédio urbano sito à Rua …….., ……..., freguesia de …….., destinado a habitação, inscrito na respectiva matriz urbana da freguesia de …… sob o n. 03879, fracção AO; e descrito na Conservatória do Registo Predial de Matosinhos sob o n.º zero oito seis três/zero quatro um zero nove um, composto por hall, três divisões assoalhadas, cozinha, despensa, casa de banho, lavabo e corredor interior, Corresponde-lhe à presente data o valor patrimonial de 7.371.000 (…)” — cfr. fls. 47 dos autos.

    E) Em 30/05/2003 o Chefe do Serviço de Finanças de Matosinhos-2 proferiu despacho, pelo qual designou o dia 17/09/2003 para a venda do imóvel identificado em D) — cfr. fls. 62 dos autos.

    F) Na mesma data, foi afixado pelo Serviço de Finanças de Matosinhos um edital, cujo teor ora se transcreve parcialmente: EDITAL CITAÇÃO DE CREDORES DESCONHECIDOS VENDA POR PROPOSTAS EM CARTA FECHADAB………, Chefe do 2.º Serviço de Finanças do concelho de Matosinhos.

    Faz saber que por este Serviço de Finanças correm éditos de 20 dias, contados da data da publicação deste anúncio, CITANDO os credores desconhecidos e os sucessores dos credores preferentes, para no prazo de 15 dias, posterior ao dos éditos, virem reclamar dos seus créditos que gozem de garantia real sobre os bens abaixo indicados, penhorados a: Designação/nome: A……… NIPC/NIF: …….

    Sede/residente: Rua …….., ……. - ………..

    Para pagamento de dívidas de: IRS (...)” — cfr. fls. 78 dos autos.

    G) Em 06/08/2003 o Serviço de Finanças de Matosinhos-2 remeteu à Caixa Económica Montepio Geral, carta registada com aviso de recepção assinado em 07/08/2003, contendo o oficio n.º 12683, datado de 05/08/2003, onde se lê, para além do mais, o seguinte: “(...) Fica V. Ex.ª citado nos termos do art. 239.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), conjugado com o artigo 886º e 888º-A do Código de Processo Civil, para os efeitos tidos por convenientes, de que os bens penhorados no processo de execução fiscal supra referido instaurado por dívidas de IVA, na quantia de 12.571,30 Euros, (DOZE MIL QUINHENTOS SETENTA E UM EUROS E TRINTA CÊNTIMOS), e constantes do auto de penhora anexo por fotocópia, vão ser postos à venda por meio de proposta em carta fechada, cuja abertura se verificará nas instalações deste Serviço de Finanças no próximo dia 17/09/2003, pelas 10 horas” - cfr. fls. 75 dos autos.

    H) Em 11/08/2003 foram afixados editais com o mesmo teor do referido em F) na Junta de Freguesia de ……. e na morada do executado — cfr. fls. 79 dos autos.

    I) Em 25/08/2003 a Caixa Económica Montepio Geral...

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