Acórdão nº 08B2600 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 09 de Outubro de 2008

Magistrado ResponsávelSALVADOR DA COSTA
Data da Resolução09 de Outubro de 2008
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I AA, Engenharia de Sistemas, SA, intentou, no dia 7 de Junho de 2004, contra a Sociedade de Panificação BB, Ldª, acção declarativa de condenação, com processo ordinário, pedindo a sua condenação a pagar-lhe € 8 196, 29 e juros de mora vencidos e vincendos, com fundamento em débito do preço de equipamentos fornecidos.

Em contestação, a ré invocou a excepção de não cumprimento do contrato, e, em reconvenção, pediu a condenação da autora a pagar-lhe, a título de indemnização pelos prejuízos sofridos, as quantias de € 3 231,13 e de € 24 250,99, com juros desde a notificação da reconvenção, a primeira respeitante à parte do subsídio do Instituto de Apoio às Pequenas e Médias Empresas Industriais deixado de receber, e a segunda atinente aos salários pagos ao trabalhador que teve de contratar.

A autora, na réplica, sustentou que, caso a obra apresentasse defeitos, teria o direito de denúncia caducado, por força do disposto nos artigos 1220º, nº 2 e 1224º do Código Civil.

Seleccionada a matéria de facto assente e controvertida, realizou-se a audiência de julgamento, em cujo âmbito foi requerida pela ré e admitida ampliação do pedido reconvencional.

Na sequência, foi proferida sentença, no dia 18 de Maio de 2007, por via da qual, a ré foi absolvida do pedido e a autora condenada a pagar-lhe € 3 231,13 relativos à perda de subsídio, € 24 250,99 correspondentes às remunerações do trabalhador, e juros de mora, à taxa legal, contados desde a data da notificação da reconvenção até efectivo pagamento e, ainda, a quantia de € 9 267,75, acrescida de juros de mora, contados desde a data da notificação da ampliação, à mesma taxa.

Apelou a autora, e a Relação, por acórdão proferido no dia 11 de Março de 2008, julgou-lhe o recurso parcialmente procedente, limitando a sua condenação ao pagamento à ré de € 28 553,58, acrescida de juros de mora, à taxa legal, contados sobre a quantia de € 19 285,83, desde a data da notificação da reconvenção, e sobre a quantia de € 9 267,75 desde a data da notificação da ampliação do pedido reconvencional, do qual ambas interpuseram recurso de revista: A primeira formulou, em síntese útil, as seguintes conclusões de alegação: - a Relação julgou mal a questão da caducidade, não podendo deixar de conhecer dela como foi suscitada face à matéria de excepção, aplicando o disposto no artigo 1224º do Código Civil; - a Relação devia ter conhecido a questão dos defeitos da obra com base no instituto da redução do preço, uma vez que a caducidade foi invocada em resposta à excepção envolvida pelo pedido reconvencional; - com defeitos ou sem eles, acompanhada ou não de recusa de aceitação, os factos revelam que a obra foi entregue à recorrida no dia 31 de Dezembro de 2001, e a recusa de aceitação, quanto muito, em Fevereiro de 2002; - os direitos que a recorrida invoca caducaram, por terem sido exercidos fora do termo do prazo de um ano a contar da recusa da aceitação da obra - artigo 1224º, nº 1, do Código Civil; - mesmo que assim não fosse, os mesmos direitos, porque exercidos mais de dois anos após a entrega da obra, caducaram - nº 2 do referido artigo 1224º; - o acórdão efectuou errada interpretação e aplicação dos artigos 664º do Código de Processo Civil e 1224º do Código Civil, pelo que deve ser revogado, condenada a recorrida a pagar-lhe o que pediu, e juros, e absolvida a recorrente do pedido reconvencional.

A segunda formulou, por seu turno, em síntese útil, as seguintes conclusões de alegação: - no caso de ser apreciada a questão da caducidade, deverá sê-lo a impugnação do facto descrito sob 64, que invocou no recurso de apelação; - o sistema fornecido pela recorrida está inacabado, é inadequado aos fins a que se destina, não funciona, deixando aquela de perceber apenas cerca de um quarto daquilo que auferiu indevidamente; - a Relação não podia operar a compensação que operou, pois a havê-la dos danos com os lucros obtidos, o montante que pagou à recorrida devia ser levado em conta a título de danos, para além dos que foram objecto do pedido reconvencional; - e devia ter sido levado em conta, a título de lucro indevido para a recorrida, e enriquecimento sem causa, por não ter cumprido a referida obrigação, não obstante ter recebido mais de metade do preço acordado; - ao efectuar a compensação que efectuou por dedução, a Relação violou, por erro de interpretação e aplicação, os artigos 562º, 564º, nº 1, e 566º, nº 2, do Código Civil; - o caso é de cumprimento defeituoso, e, não tendo a recorrente pedido a resolução do contrato, resta apenas a redução do preço, nos termos dos artigos 884º e 1222º, nº 2, do Código Civil, em termos de nada mais dever à recorrida; - o facto de a recorrente beneficiar da redução do preço ou no caso de resolução do contrato não implica que não possa demandar a recorrida pelos danos sofridos com o incumprimento nos termos gerais, ou seja, no caso dos danos resultarem da falta de cumprimento do contrato ou cumprimento defeituoso, à obrigação de indemnizar são aplicáveis as regras gerais dos artigos 562º e 566º do Código Civil; - como a recorrida não cumpriu a prestação a que estava vinculada, deverá restituir a situação que existia se não tivesse ocorrido o evento que obriga à reparação.

Respondeu BB, Ldª apelada ao recurso interposto por AA, SA em síntese de conclusão: - só suscitada no recurso de apelação, não pode ser apreciada a questão da caducidade relativa aos defeitos, por não ter sido suscitada na réplica, sendo que o instituto da denúncia dos defeitos é diverso do da excepção de caducidade; - a réplica só se refere ao prazo de denúncia dos defeitos a que alude o artigo 1220º do Código Civil, configurados em resposta à excepção invocada pela recorrida em contestação, sem se traduzir na invocação de excepção propriamente dita por parte da recorrente; - o instituto da caducidade não foi invocado na resposta à excepção nem em sede de resposta ao pedido reconvencional - a mera referência ao artigo 1224º do Código Civil na réplica, desprovida de factualidade, não revela invocação da excepção; - na primeira instância foi operada a redução do preço e tal questão foi suscitada no âmbito da excepção de não cumprimento, questão de mera qualificação jurídica; - relativamente à questão da verificação ou não da excepção, não estamos perante um problema de mera qualificação jurídica, e sem alegação de factos é insusceptível de ser integrada no artigo 1224º do Código Civil; - os factos alegados só integram o instituto previsto no artigo 1220º do Código Civil; - os factos provados não revelam que a obra foi entregue, mas que foi alterado o plano de pagamento por mútuo acordo; - o facto nº 64 foi incorrectamente julgado por estar em contradição com toda a matéria de facto dada como provada sob os nºs 32 a 48, dela decorrendo que o sistema nunca esteve em serviço, termos em que, nos termos do artigo 690º-A do Código de Processo Civil, deve ser dado por assente; - atenta a contradição entre os referidos factos, uma vez que tal acordo não poderia ter sido feito depois do início da colocação em serviço, porque nunca esteve em serviço ou funcionamento, impugna a título subsidiário a decisão proferida sobre o ponto 64º da matéria de facto; - a aceitação ou não da obra pressupõe a sua conclusão, o que não ocorreu no caso em análise; - não houve recusa da aceitação da obra, porque ela não foi concluída, pelo que não pode ter sido aceite e, não tendo sido concluída, não ocorreu a sua entrega, pelo que não poderá ocorrer a caducidade dos direitos da recorrida.

II É a seguinte a factualidade declarada provada no acórdão recorrido inserida por ordem lógica e cronológica: 1.A autora tem por actividade principal a realização de estudos técnicos e projectos, produção, instalação e manutenção de sistemas e equipamentos integrados ou não, no domínio da indústria de telecomunicações, da sonorização, da sinalização, das comunicações, da automação, do software e hardware, da robótica e similares, bem como a prestação de serviços de consultoria de organização informática e formação profissional, e ainda a importação, exportação, representação e comercialização de equipamentos computorizados e respectivos componentes com aplicação na área da informática, automação e róbotica, e a ré dedica-se à indústria da panificação.

  1. No dia 29 de Maio de 2001, a autora apresentou à ré uma proposta para um sistema de automação de estufa e forno, e, no dia 22 de Junho de 2001, a ré enviou à autora, através de fax, o documento inserto a folhas 118, comunicando-lhe a sua aceitação.

  2. A ré contratou com a autora o fornecimento e a montagem de um sistema de automação para a linha de produção contínua de todos os tipos de pão da panificadora, de que fazem parte a estufa e o forno-túnel, conhecido abreviadamente como "automação da estufa e forno".

  3. Eram condições de pagamento do preço de 6 750 000$, o constante da cláusula 5.2 da proposta: 1º - 30% do valor com a adjudicação; 2º - 40% do valor com a entrega dos equipamentos; 3º- 20% do valor com o início da colocação do serviço; 4º - 10% do valor com a recepção provisória, tendo sido pagas as verbas referentes aos pontos 1º a 3º, não tendo a ré pago parte da verba indicada em 2º e a totalidade da indicada em 4º.

  4. O objecto do contrato reporta-se a um sitema integrado e sequencial com vista a automatizar todas as funções/fases do processo de produção do pão, a saber: o corte e a pesagem da massa e seu enrolamento; o alongamento da massa; a descarga dos pães em massa nos tabuleiros da estufa para fermentação; e a descarga dos pães fermentados no forno com a respectiva cozedura, sistema esse já montado e implantado nas instalações da ré sitas na sua sede em Albufeira, mas accionado por um sitema semi-automático, que se pretendia melhorar, automatizando-o totalmente.

  5. O sistema acordado a implantar visava, ainda, em consequência: a) produzir na linha, sem sobressaltos e sequencialmente, vários tipos de pão; b)...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT