Acórdão nº 774/09.3TBVCD.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 11 de Abril de 2013

Magistrado ResponsávelHELDER ROQUE
Data da Resolução11 de Abril de 2013
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

ACORDAM OS JUÍZES QUE CONSTITUEM O SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA[1]: AA propôs a presente acção, com processo especial de divisão de coisa comum, contra BB ambos, suficientemente, identificados nos autos, pedindo que, na sua procedência, se decida pela indivisibilidade do imóvel, infradiscriminado, efectuando-se a sua adjudicação ou venda [a] e se realize a divisão, em substância, dos móveis [b], alegando, para o efeito, em suma, que, no decurso da união de facto que manteve com a ré, adquiriram, em compropriedade, uma fração autónoma destinada à habitação, onde passaram a viver, fazendo desta a casa de morada de família, apesar de, na altura, a ré ter outorgado como compradora a respectiva escritura, sozinha, não obstante, em 13 de Setembro de 2007, ambos haverem celebrado uma escritura pública de venda de metade do referido imóvel, passando, assim, os dois a ser comproprietários do mesmo, em partes iguais, mas sendo este, igualmente, indivisível, por lei e por natureza, enquanto que os bens móveis constituintes do recheio da habitação foram adquiridos por ambos e no decorrer da vida em comum.

Na contestação, a ré alega, em síntese, que o apartamento foi comprado, unicamente, por ela, à sua custa e com o recurso ao crédito bancário para habitação, pois que o autor nunca contribuiu com qualquer quantia em dinheiro para pagamento de metade do apartamento, tendo o contrato de compra e venda invocado pelo autor com vista à presente acção de divisão de coisa comum, sido simulado, para enganar os filhos da ré, e que esta assinou, sob coação do autor, com medo e receio de que o mesmo a abandonasse.

Por seu turno, continua a ré, os eletrodomésticos da cozinha foram por si comprados, pelo preço de €100.000,00, e bem assim como todos os móveis, com excepção de alguns candeeiros e algumas peças.

Conclui pela improcedência da acção e, em reconvenção, pede que se declare a nulidade da escritura de compra e venda celebrada entre ambos [I], se declare que a ré é dona e legitima possuidora do apartamento, designado pela fracção “J” do prédio, sito na ............, .....º, ...., dtº, Vila do Conde, descrito na Conservatória do Registo Predial, sob o nº 0000 [II], e se ordene o cancelamento da inscrição no registo predial, a favor do autor [III].

Na réplica, o autor conclui pela improcedência das excepções de simulação e de coação, e, na tréplica, a ré finaliza como na contestação-reconvenção.

A sentença julgou a acção, parcialmente, procedente, e improcedente a reconvenção e, em consequência, “Declarou a indivisibilidade dos bens móveis supra descritos e do bem imóvel supra descrito, devendo proceder-se à respetiva adjudicação ou à venda nos termos do art. 1056º/2 do Código de Processo Civil [I], absolvendo quanto ao mais a Ré do pedido e o A dos pedidos deduzidos pela ré na reconvenção [II]”.

Desta sentença, a ré interpôs recurso, tendo o Tribunal da Relação julgado procedente a apelação, alterando a sentença recorrida e julgando, parcialmente, procedente a contestação/reconvenção, declarando anulada a compra e venda, celebrada pela escritura pública de 13.09.2007, de metade indivisa da fração autónoma designada pela letra J, correspondente ao terceiro andar, no Bloco B, com entrada pela Avenida Infante ......, para habitação, do tipo T-Dois, com duas varandas, uma na frente e outra nas traseiras e com um aparcamento (…) do prédio urbano, em regime de propriedade horizontal, sito na Rua ............, lugar da .........., desta cidade de Vila do Conde, descrito na Conservatória do Registo Predial deste concelho, sob o número zero mil quinhentos e oitenta da freguesia de Vila do Conde, declarou ainda que a referida fração autónoma é exclusiva propriedade da ré/reconvinte e ordenou o cancelamento da inscrição no registo predial da aquisição de ½ dessa fração, a favor do autor, determinando o prosseguimento da presente acção de divisão de coisa comum, nos termos ordenados na sentença recorrida, apenas relativamente aos bens móveis.

Do acórdão da Relação do Porto, o autor interpôs agora recurso de revista, terminando as alegações com o pedido da sua revogação, formulando as seguintes conclusões, que, integralmente, se transcrevem: 1ª - O Recurso de apelação interposto pela ora Recorrida foi admitido pelo douto despacho do Senhor Desembargador Relator de 28 de Setembro, como fundamento de que o facto da parte final das alegações ter sofrido um atraso de menos de cinquenta minutos não obsta a que se considere que a apresentação da alegação foi tempestiva.

  1. - O Recorrente não se conforma com esta decisão, entendendo que a mesma é violadora da lei do processo, nomeadamente o Art. 684°-B, 685° e 685°-A do CPC.

  2. - A ora Recorrida apresentou, em 21 de Maio, último dia do respectivo prazo de interposição do recurso de apelação, um requerimento, acompanhado de uma peça incompleta de alegações, incompleta de conclusões, sem que nestas conclusões sejam indicadas quais as normas jurídicas violadas pela decisão apelada e sem formular qualquer pedido final, nomeadamente de alteração ou anulação da decisão recorrida e desacompanhado de qualquer DUC e comprovante de liquidação da taxa de justiça devida (v. Ref. CITIUS 1212765).

  3. - Estabelece a Lei que os recursos são interpostos através do requerimento previsto no Art. 684-B do CPC, que tem de incluir a alegação do recorrente e esta alegação, por sua vez, tem de estar acompanhada das respectivas conclusões (com a indicação expressa das normas jurídicas violadas pela decisão recorrida) e do pedido de alteração ou anulação da decisão recorrida (Art. 685°-A do CPC), e este requerimento tem de ser apresentado no processo no prazo de 30 dias, acrescido de 10 quando o recurso tiver por objecto a reapreciação de prova gravada (Art. 685°).

  4. - O prazo de apresentação do requerimento de interposição de recurso é um prazo peremptório e o seu decurso extingue o direito a praticar o acto e a lei não estabelece nenhuma dilação ou extensão de tal prazo, nomeadamente de "menos de cinquenta minutos".

  5. - A ora Recorrida não apresentou nenhum requerimento de recurso competente, já que a peça de 21 de Maio não cumpre o "ónus de concluir", nem o ónus de indicação das normas violadas pela decisão de 1a instância, nem tão pouco formula qualquer pedido de alteração ou anulação da decisão recorrida, impostos pelo Art. 685°-A do CPC, pelo que o recurso de apelação não devia ter sido recebido e o douto despacho de 28 de Setembro terá de ser revogado, proferindo-se douta decisão de rejeição daquela apelação, com todas as consequências legais.

  6. - Decidiu a Veneranda Relação alterar a decisão da matéria de facto, alterando as respostas dadas pelo tribunal de 1a instância aos quesitos 8o e 10°, no sentido de ser dada por provada a respectiva matéria de facto.

  7. - Entende o ora Recorrente que tal decisão foi tomada em total violação do disposto no Art. 712° do CPC, sendo esta violação também fundamento do presente recurso, nos termos e para os efeitos do disposto no Art. 722°, n° 1, al. b) do CPC.

  8. - A Meritíssima Juiz de 1a Instância julgou o quesito 8° não provado e deu resposta restritiva ao quesito 10° e diz ter formado a sua convicção no conjunto das provas produzidas, nomeadamente no depoimento da autora e das testemunhas inquiridas e nos documentos, tendo verificado a existência de contradições entre os depoimentos e que as testemunhas não tinham conhecimento directo das ameaças do Recorrente à Recorrida, concluindo que esta outorgou a escritura de forma livre e voluntária, até porque seaconselhou previamente com advogado.

  9. - A Veneranda Relação, reconhecendo que nenhuma testemunha tinha conhecimento pessoal e directo da ameaça do Recorrente sobre a Recorrida e que a gravação do depoimento de várias testemunhas apresenta deficiências que impedem a sua percepção parcial, fundamenta a sua decisão de alterar as respostas àqueles quesitos em inferências, meios de persuação, presunções baseadas em regras da experiência e nestas mesmas regras de experiência.

  10. - Estipula a norma do n° 1 do Art. 712° do CPC e é jurisprudência firme e constante de todas as instâncias superiores que não é lícito à Relação alterar um quesito, especialmente o que tiver sido dado por não provado ou provado de forma restrita, se do processo constarem todos os elementos de prova que serviram de base à decisão e se os elementos fornecidos pelo processo impuserem decisão diversa, insusceptível de ser destruída por quaisquer outras provas, já que no processo civil vigoram os princípios da oralidade e da imediação, bem como o princípio da livre apreciação da prova pelo julgador.

  11. - A Relação não pode modificar a decisão da matéria de facto se não dispuser, desde logo, da totalidade da prova gravada, como é reconhecidamente o caso dos autos.

  12. - E, por outro lado, é necessário também que as provas constantes dos autos não permitam - de forma categórica, absoluta - a resposta dada pela 1a instância e que esta resposta configure uma manifesta desconformidade ou violação grosseira entre a prova efectivamente produzida e a decisão.

  13. - O Tribunal da Relação, reconhecendo expressamente que não há testemunhas que tenham presenciado as alegadas ameaças e que a prova gravada apresenta deficiências que impedem a sua percepção completa, recorre a meras inferências, ilações, meios de persuasão, presunções e de alegadas regras de experiência para pretender assim fundamentar a sua decisão de dar por provados os quesitos 8° e 10°.

  14. - À Relação incumbia fundamentar a sua decisão de alterar as respostas aos quesitos, com o argumento de que os elementos de prova constantes dos autos não permitiam, de forma clara, obrigatória e evidente, as respostas dadas pela 1a Instância e não o faz.

  15. - Isto é, o Tribunal formou uma convicção própria, contrária à da 1a Instância, sem afirmar que esta é errada e violadora do mais elementar sentido comum em matéria de apreciação das provas ou que houve nesta apreciação um erro grosseiro da Julgadora.

  16. - Acresce...

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