Decisões Sumárias nº 72/08 de Tribunal Constitucional (Port, 18 de Fevereiro de 2008

Magistrado ResponsávelCons. Mário Torres
Data da Resolução18 de Fevereiro de 2008
EmissorTribunal Constitucional (Port

DECISÃO SUMÁRIA N.º 72/2008

Processo n.º 81/08 2.ª Secção

Relator: Conselheiro Mário Torres

1. O representante do Ministério Público junto da 10.ª Vara Cível da Comarca de Lisboa interpôs recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional, aprovada pela Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, e alterada, por último, pela Lei n.º 13-A/98, de 26 de Fevereiro (LTC), contra a sentença de 12 de Novembro de 2007 do juiz da referida 10.ª Vara Cível, que – “desaplicando, por inconstitucional, a norma que se extrai dos artigos 8.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 322/90, de 18 de Outubro, e 3.º, n.º 1, do Decreto Regulamentar n.º 1/94, de 18 de Janeiro, quando interpretada no sentido de que a atribuição da pensão de sobrevivência por morte de beneficiário do ISSS, a quem com ele convivia em união de facto, depende também da prova do direito do companheiro sobrevivo a receber alimentos da herança do companheiro falecido, o qual terá de ser invocado e reclamado na herança do falecido, com o prévio reconhecimento da impossibilidade da sua obtenção nos termos das alíneas a) e b) do artigo 2009.º do Código Civil, por violação do princípio da proporcionalidade, ínsito no artigo 18.º, n.º 2, mas decorrente também do princípio do Estado de direito, consagrado no artigo 2.º, conjugado com o disposto no artigos 36.º, n.º 1, e 61.º, n.ºs 1 e 3, todos da Constituição da República Portuguesa” – julgou procedente a acção intentada por A. contra o Instituto de Solidariedade e Segurança Social, declarando que “a autora viveu em condições análogas às dos cônjuges por mais de dois anos com (…) B., beneficiário nº 009706001 do ISSS-CNP, sendo por isso titular das prestações por morte deste”.

O mencionado juízo de inconstitucionalidade foi fundamentado nas seguintes considerações:

“Dispõe a alínea e) do artigo 3.º da Lei n.º 7/2001, de 11 de Maio, que as pessoas que vivem em união de facto nos termos da presente lei têm direito às prestações por morte do beneficiário pela aplicação do regime geral da segurança social e da lei.

Nos termos do artigo 8.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 322/90 citado, o direito às prestações previstas neste diploma e o respectivo regime jurídico são tornados extensivos às pessoas que se encontrem na situação prevista no n.º 1 do artigo 2020.º do Código Civil, acrescentando o n.º 2 do mesmo normativo (artigo 8.º citado) que o processo de prova das situações a que alude no n.º 1 (do referido artigo 8.º) consta de Decreto Regulamentar.

Dispõe o artigo 2020.º, n.º 1, do Código Civil que aquele que, no momento da morte de pessoa não casada ou separada judicialmente de pessoas e bens, vivia com ela há mais de dois anos em condições análogas às dos cônjuges tem direito a exigir alimentos da herança do falecido, se os não puder obter nos termos das alíneas a) a d) do artigo 2009.º

A regulamentação do direito reconhecido pelo artigo 8.º do Decreto-Lei n.º 322/90 foi concretizada através do Decreto Regulamentar n.º 1/94, de 18 de Janeiro.

Constituem requisitos de acesso às prestações por morte, nos termos dos diplomas supra citados:

1. que o requerente careça de alimentos, isto é, de meios de subsistência estritamente necessários para uma vida condigna, incluindo o conceito de alimentos tudo o que é indispensável para o sustento, habitação e vestuário (artigo 2003.º, n.º 1, do Código Civil);

2. que o requerente vivesse com o beneficiário não casado ou separado judicialmente de bens há mais de dois anos à data da sua morte em condições análogas às dos cônjuges (artigo 2.º do citado Decreto Regulamentar);

3. que o requerente não tenha cônjuge, ex-cônjuge, descendentes, ascendentes ou irmãos em condições de lhe prestar alimentos (artigo 2009.º, alíneas a) a d), do Código Civil);

4. que não seja reconhecido ao requerente direito a alimentos da herança, nos termos do artigo 2020.º, por inexistência ou insuficiência de bens da herança.

Com a publicação da Lei n.º 135/99, de 28 de Agosto, que estabelecia a regulamentação relativa à protecção jurídica das uniões de facto com duração superior a dois anos, posteriormente substituída pela Lei n.º 7/2001, de 11 de Maio, alguma jurisprudência considerou que estes diplomas estabeleciam uma equiparação plena entre a união de facto e o casamento para efeito de atribuição de pensões sociais, dispensando a prova da necessidade de alimentos e da impossibilidade de os obter nos termos do artigo 2009.º, alínea d), do Código Civil, e da herança (cf. artigo 2020.º do Código Civil).

Segundo essa jurisprudência, a Lei da União de Facto (primeiro a Lei n.º 135/99, de 28 de Agosto, e posteriormente a Lei n.º 7/2001, de 11 de Maio), teria consagrado a equiparação absoluta da união de facto ao casamento no que às prestações sociais concerne, bastando para a procedência da acção a prova da união de facto por um período superior a dois anos, dispensando-se a prova da necessidade de alimentos e a impossibilidade de os obter das pessoas enunciadas no artigo 2009.º e da herança (artigo 2020.º do Código Civil) (cf. acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, de 20 de Abril de 2004, Colectânea de Jurisprudência – Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, 2004, tomo II, p. 30; e das Relações de Lisboa, de 25 de Novembro de 2004, e de Évora, de 9 de Dezembro de 2004, Colectânea de Jurisprudência, 2004, tomo V, pp. 102 e 250, respectivamente).

Analisada a Lei n.º 7/2001, verifica-se que a diferença entre o estabelecido no Decreto-Lei n.º 322/90, de 18 de Outubro, e no Decreto Regulamentar n.º 1/94, de 18 de Janeiro, é apenas de redacção, não se registando qualquer alteração sensível de conteúdo.

Com efeito, se, de acordo com o seu artigo 1.º, a Lei n.º 7/2001 citada regula a situação jurídica das pessoas que vivem em união de facto há mais de dois anos, que sentido faz o regime estabelecido no artigo 6.º se não estabelecer requisitos adicionais à união de facto por mais de dois anos como pressuposto da atribuição de protecção na eventualidade de morte do...

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