Acórdão nº 1458/07.2PCSTB.E1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 03 de Abril de 2013
Magistrado Responsável | SOUSA FONTE |
Data da Resolução | 03 de Abril de 2013 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam na Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça: 1.
No processo em epígrafe, o Tribunal Colectivo da Vara de Competência Mista de Setúbal, depois de realizada a audiência a que se refere o artº 472º do CPP, procedeu ao cúmulo jurídico de diversas penas em que o arguido AA, nascido em ..., em ..., filho de BB e de CC e residente na Rua ..., havia sido condenado e fixou a pena conjunta em 6 (seis) anos e 6 (seis) meses de prisão.
Por não se conformar com esta decisão, o Senhor Procurador da República interpôs dela recurso directo para o Supremo Tribunal de Justiça[1], cuja motivação culminou com as seguintes conclusões: «1ª- O douto acórdão recorrido procedeu ao cúmulo da pena aplicada neste processo com as penas aplicadas em mais três outros processos tendo, a final, sido aplicada a pena única de 6 (seis) anos e 6 (seis) meses de prisão; 2ª- No caso em apreço, o limite máximo da pena situa-se em 13 anos e 4 meses de prisão, atendendo à soma das penas parcelares concretamente aplicadas aos crimes em concurso, e o limite mínimo situa-se em 5 anos de prisão; 3ª- No douto acórdão recorrido considerou-se, para a determinação da pena única, o seguinte: a) natureza dos crimes em concurso; b) o facto dos crimes terem sido praticados entre 2006 e 2009; c) a personalidade do agente; d) a sua situação actual; 4ª- Nesta decisão deu-se particular relevância à situação actual do arguido, de acordo com o teor do relatório social, o que levou à aplicação da pena única um pouco acima do limite mínimo; 5ª- Embora se tenha que atender à situação actual do arguido, aquando da determinação da pena em concreto há que considerar fundamentalmente ao conjunto dos factos praticados e à personalidade do agente, efectuando-se uma avaliação da gravidade da ilicitude dos factos em concurso; 6ª- Ponderando a globalidade dos factos e a personalidade do arguido, verifica-se que o arguido demonstrou uma persistência criminosa, na medida em que, desde final de 2006 e até final de 2007, cometeu cinco crimes e que, não obstante a sua prisão em 15.12.2008 ainda veio a cometer o crime de falsas declarações objecto de condenação no âmbito do Proc. nº 22/10.3TASTB do 5º Juízo Criminal de Lisboa, 1ª Secção; 7ª- Acresce ainda que o arguido tem ainda registadas outras sete condenações criminais, o que também deve ser considerado na ponderação da sua personalidade; 8ª- No caso em apreço, atendendo ao conjunto dos factos, onde se revela a dimensão e a gravidade do seu comportamento criminoso, estando patente uma tendência criminosa e tendo em vista a personalidade do arguido resultante da forma como praticou esses factos, sem esquecer a sua situação actual de reclusão, a pena única deve situar-se junto ao ponto médio da moldura penal aplicável; 9ª- Por último, a situação actual do arguido resultante do relatório social – que apesar de ser de atender – nunca poderá ser determinante em função da razão da aplicação da pena única, não se podendo escamotear a gravidade dos factos e as necessidades de prevenção geral; 10ª- Assim sendo, nos termos do art. 77º, nºs 1 e 2 do Código Penal, considera-se justa e adequada a aplicação da pena única de 8 (oito) anos e 6 (seis) meses de prisão; 11ª- O douto acórdão recorrido violou o disposto no art. 77º, nºs 1 e 2, por via do art. 78º, nº 1, todos do Código Penal, por não ter atendido à gravidade da globalidade dos factos e à personalidade do agente em função desses mesmos factos.
Termos em que deverá ser concedido provimento ao recurso e, em consequência, revogar-se o douto acórdão recorrido, com a aplicação de pena única não inferior a 8 (oito) anos e 6 (seis) meses de prisão».
Respondeu o Arguido que conclui do modo seguinte: «1- A pena aplicada ao arguido em sede de cúmulo jurídico, foi devidamente ponderada e reputa-se por justa e adequada.
2- No douto acórdão, foi ponderado e bem a natureza dos crimes a concurso, o tempo em que os crimes foram praticados, a personalidade do arguido e a sua situação actual, bem como o seu percurso em reclusão.
3- Coadjuvado pelo Relatório social, foi aplicada uma pena ainda assim acima do seu limite mínimo, o que de resto, se concorda em absoluto.
4- Foi, como decorre do mesmo, na nossa opinião, devidamente ponderado o conjunto e tipologia dos factos praticados.
5- Foi devidamente ponderado, o curto espaço de tempo em que foram praticados os crimes.
6- Foi devidamente atendido seu Relatório Social, que o dá como elemento útil à sociedade, como decorre do seu comportamento prisional, e da sua constante evolução académica nesse período.
7- Deverá ser atendido, o período de tempo em que o arguido se encontra preso sem ter tido uma única saída jurisdicional, por força da não existência de uma única liquidação da pena.
8- Em face de que a continuidade de Recursos apenas fará atrasar que o arguido seja devolvido à liberdade.
9- Mais será de atender à urgência no julgamento deste Recurso por forma a que seja efectuada liquidação da pena, e o mesmo tenha direito à liberdade condicional que tanto anseia.
10- Foi correctamente atendida no Douto acórdão a personalidade do arguido, bem como a data e gravidade dos factos.
TERMOS EM QUE, NÃO DEVE SER CONCEDIDO PROVIMENTO AO RECURSO APRESENTADO, E, CONSEQUENTENTE, MANTER-SE NA INTEGRA, O DOUTO ACÓRDÃO PROFERIDO».
No Supremo Tribunal de Justiça, a Senhora Procuradora-geral Adjunta emitiu parecer em que anotou, além do mais, que - o acórdão recorrido não indica a data em que transitaram em julgado as decisões condenatórias proferidas nos Pºs nº 1458/07.2PCSTB e 22/10.3TASTB; - «a condenação neste último processo … não foi em prisão efectiva»; - «não é feita a descrição dos factos praticados nem em que circunstâncias, mas só os tipos de crimes são referidos na fundamentação da determinação da pena unitária»; - o acórdão recorrido errou na determinação do limite máximo da pena conjunta que lhe «parece ser apenas de 13 anos de prisão»; - o Tribunal a quo considerou no cúmulo jurídico efectuado uma pena de suspensão da execução da prisão «sem ter sido revogada».
E, considerando que - «a sentença de cúmulo jurídico, nos termos dos artºs 78º do C.P. e 472º do CPP, deve conter a indicação das datas das condenações e respectivas penas aplicadas, “a caracterização dos crimes que foram objecto da condenação e todos os factos que interessem à compreensão da personalidade neles manifestada” (Ac. do STJ de 27/5/2010, p. 708/05.4PCOER)»; - que «o julgamento do concurso de crimes constitui um novo julgamento, destinado a habilitar o tribunal a produzir um juízo autónomo relativamente aos produzidos nos julgamentos dos crimes singulares, pois agora se aprecia a globalidade de conduta do agente e a sua personalidade referenciada a essa globalidade (Ac. do STJ de 22/1/2013, p. 1447/08.0TDPRT.S2)»; - que «na formulação do cúmulo jurídico resultante do concurso de crimes já julgados e com condenações transitadas não há “factos novos” a conhecer, sendo no entanto necessário que seja feita a descrição dos factos praticados efectivamente e em que circunstâncias, ainda que sinteticamente, bem como a citação dos tipos de crimes cometidos, a que terá de ser acrescentada, quanto à personalidade do arguido, a interligação da sua conduta e como se manifesta essa personalidade na maneira de actuar (neste sentido os Acºs do STJ de 8/2/2012, p. 8534/08.2, 5ª sec. e o último atrás citado)», concluiu pela nulidade do acórdão recorrido, nos termos dos arts. 374º, nº 2, 375º, nº 1 e 379º, nº 1, alínea a), do CPP.
Cumprido o disposto no artº 417º, nº 2, do CPP, o Arguido nada disse.
2.
Tudo visto, cumpre decidir.
2.1.
Antes, porém, de começarmos o julgamento do presente recurso, importa olhar para a estrutura formal do acórdão recorrido.
Depois da identificação do Arguido, segue-se a enumeração dos processos em que o mesmo foi condenado, com as seguintes especificações: «1.
[o Arguido] Foi julgado nos presentes autos (nº 1458/07.2PCSTB, 1º Juízo criminal de Setúbal) pela prática, a 5.12.2007 como autor material de um crime de ofensa [à integridade] física simples, p. e p. pelo artigo 143º/1 do Código Penal, na pena de 7 meses de prisão, em acórdão datado de 7.05.2012 e transitado em julgado.
2.
No PCC nº 541/08.1GBSXL, da 6ª Vara Criminal de Lisboa, foi julgado pela prática, a 10.12.2008, como autor material, de um crime de roubo agravado, p. e p. pelos artigos artigo 210º/1 e nº 2-b), por referência ao artigo 204º/2-a) e 202º-b), todos do mesmo compêndio normativo, na pena de 5 anos de prisão.
O Acórdão referido em 2. transitou em julgado no dia 3.11.2010.
-
No PCC nº 2158/05.3PBSTB, desta Vara Mista de Setúbal, foi condenado, pela prática a 9.1.2007, 23.12.2006, 13.03.2007 e 20.03.2007, pela prática de um crime de furto qualificado na forma tentada (p. e p. pelos artºs 203/1, 204º/2-a) e e), com refrª ao artº 202º-b), 22º e 23º, todos do C. Penal), de um crime de...
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