Acórdão nº 789/11.1TACBR.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 03 de Abril de 2013

Magistrado ResponsávelOLIVEIRA MENDES
Data da Resolução03 de Abril de 2013
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

* Acordam no Supremo Tribunal de Justiça No âmbito do processo comum com intervenção do tribunal colectivo supra referenciado da Vara Mista de Coimbra, tendo em vista o conhecimento superveniente de concurso de crimes, foi o arguido AA, com os sinais dos autos, condenado na pena conjunta de 11 anos de prisão e 200 dias de multa à taxa diária de € 5,00.

O arguido interpôs recurso para o Supremo Tribunal de Justiça.

É do seguinte teor o segmento conclusivo da motivação[1]: 1. O arguido, pelo tribunal a quo, foi, em cúmulo jurídico, condenado na pena única de 11 anos de prisão e 200 dias de multa com €5,00 de taxa diária.

  1. Ora, salvo devido respeito, o Tribunal a quo não valorou devidamente a personalidade do agente aquando da determinação da medida da pena.

  2. O presente recurso visa impugnar a matéria de direito, nomeadamente, impugnar o desajustamento do quantum da pena aplicada em relação à culpa do agente e às exigências da prevenção associadas a este caso.

  3. Deste modo, tendo em conta que "É consabido que os critérios de definição da pena única - factos e personalidade - se reconduzem, em síntese, aos critérios gerais de que a lei faz depender a determinação de cada pena concreta. É, ainda, conhecida a moldura legal dos crimes em concurso: o limite máximo corresponde ao somatório das penas parcelares e o limite mínimo à mais elevada daquelas, tendo sempre como limite máximo os 25 anos para a prisão e os 900 dias para a multa (n.º 2 do art. 77.º do Código Penal). No caso dos autos temos, desta feita, uma pena de concurso de prisão 3 anos e 10 meses a 25 anos (o somatório das penas parcelares ultrapassa tal limite máximo legal). No caso das penas de multa (processos em 6, 7 e 15), temos um limite máximo de 320 dias e mínimo de 120 dias. Nesta moldura, consideraremos tratarem-se, os mais graves, de crimes relacionados com o património e o lapso temporal entre estes. (...) Tudo ponderado temos por adequada a pena de cúmulo de 11 anos de prisão e 200 dias de multa, à taxa diária de € 5,00, esta e cúmulo jurídico material (art. 77.º, n.º 3 do Cód. Penal). (...)".

  4. E ainda, "que o arguido frequentou a escolaridade até ao 9 ano. Aos 18 anos, começou a trabalhar numa empresa ligada ao sector da electricidade. Mais tarde, trabalhou como carpinteiro de cofragens, actividade que veio a desenvolver entre 2003 e 2005. Entre 2005 e 2007, atravessou um período de desemprego que terá perdurado até Outubro desse ano. Posteriormente, trabalhou cerca de 2 anos numa empresa de montagem de estufas, donde saiu por alegada incompatibilidade com o patrão. Não exerce uma actividade regular desde o início de 2009. Em 2000, contraiu matrimónio, fruto do qual tem três filhos menores de idade, com os quais vivia antes de preso, tendo o agregado uma situação económica referentes ao filho, sendo necessário recorrer a ajuda de terceiros. (...)." 6. Assim como, o facto de, o arguido ser um jovem de 32 anos, pai de 3 filhos menores, a Irina com 11 anos, o Rui com 7 anos e a Irene com apenas 5 anos de idade e, antes de ser preso, era o recorrente quem sustentava o agregado familiar.

  5. Tendo em conta que o arguido pretende, no futuro, assim que restabeleça a vida societária, retomar a sua via profissional. 8. Ora, o arguido encontra-se a cumprir na E.P. de Lisboa, no âmbito de outro processo judicial em que foi julgado (sob o n.º 88/06.0GBSRT, que correu termos no Tribunal Judicial da Sertã), em que foi condenado numa pena de prisão de 2 anos e 10 meses, sendo que esta pena foi o suficiente para tomar consciência que a privação da liberdade, está impedir que retome a sua vida normal, "cá fora", junto da sua companheira e dos seus 3 filhos, os quais dependem inteiramente de si e do seu trabalho.

  6. É perfeitamente notório que o arguido se encontra amargurado pela privação de acompanhar o crescimento dos seus filhos, que se encontram numa idade precoce, necessitando da presença do seu progenitor.

  7. Assim, a determinação da medida concreta da pena há que fazer apelo aos critérios definidos pelo artigo 71º do Código Penal, nos termos do qual, tal medida será encontrada dentro da moldura penal abstractamente aplicável, em função da culpa do agente e das exigências de prevenção, atendendo ainda a todas as circunstâncias que, não fazendo parte dos tipos de crime, deponham a favor ou contra o agente.

  8. Já que, tendo em conta, o disposto nos artigos 79.º, 71.º, 70.º e 40.º, n.ºs 1 e 2 do CP e pelos motivos aí expostos, donde resulta ser suficiente a aplicação ao arguido de uma pena detentiva de uma duração inferior, a fim de se conseguir de forma adequada e suficiente a recuperação social do arguido e se satisfazerem as exigências de reprovação e de prevenção do crime.

  9. Deste modo, pode concluir-se que estes tipos de ilícito não mais serão cometidos pelo arguido e a simples censura do fato e a prisão de duração mais curta realizarão de forma adequada e suficiente as finalidades da punição na vertente da prevenção geral e especial.

  10. Assim, de acordo com o preceituado no artigo 50º do Código Penal, o tribunal afirma a prognose social favorável, devendo, para tal, atender à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste e concluir, face a esses elementos, que a medida adequada a afastar o delinquente da criminalidade terá que ser outra mais diminuída.

  11. Por isso, o Tribunal deverá correr um risco prudente; cremos pois, salvo melhor opinião que, atendendo: "Das condições pessoais do arguido", do juízo de prognose, salvo melhor opinião, deverá ser positivo, pois que, seguramente também decerto, será bastante para assegurar as finalidades da prevenção geral e as necessidades de prevenção especial ou de reintegração, o cumprimento da eventual pena única do cúmulo das penas anteriores, que vier, entretanto, a ser determinado.

  12. Assim, pelo supra exposto, discordamos da sentença recorrida, do tribunal a quo, já que quando "entende que é possível formular um juízo de prognose social favorável do arguido".

  13. Assim entende-se que medida da pena tão gravosa, que foi determinada em cúmulo jurídico, colocará em causa a reabilitação do arguido, sendo certo que uma medida da pena inferior, em nada iria prejudicar a crença da comunidade na validade da norma e a confiança dos cidadãos nas instituições jurídico-penais.

  14. Deste modo, entendemos que a redução da medida da pena será essencial, necessária e proporcional para satisfazer as necessidades de reprovação e prevenção (geral) do crime, devendo, salvo melhor opinião, reduzir-se a pena de prisão a aplicar ao arguido.

  15. Assim, se entende que todas as penas parcelares aplicadas ao arguido deverão sofrer um desagravamento conforme a todos aqueles circunstancialismos, situando-se, assim, e com respeito e por força das finalidades próprias das respostas punitivas em sede de Direito Penal, as penas parcelares aplicadas perto do mínimo legal.

  16. E, depois de determinadas as penas parcelares, terá de se fazer o cúmulo das mesmas, que não se reconduzirá a uma mera operação aritmética, antes a uma decisão expressiva e específica no tocante à simbiose factos/personalidade que se assuma como vector primordialmente determinativo do sancionamento unitário.

  17. Na determinação desta pena única teremos de ter em conta todas as considerações tecidas para a determinação das penas parcelares, e olhando à personalidade do arguido introduzir na medida da pena uma dimensão de justiça material.

  18. No caso em apreço, atendendo a que todas possíveis atenuantes militam a favor do arguido, não se vislumbrando que outras atenuantes poderiam existir, impõe-se a diminuição da pena única de 11 anos em que o recorrente foi condenado pelo acórdão em crise, só assim se cumprindo a máxima do direito penal moderno "punição sem desinserção social".

  19. Assim, há que fazer uso da moldura penal aplicável a estes crimes, que tem um limite mínimo e um limite máximo, que serão aplicados consoantes os circunstancialismos do caso concreto - Trate-se o igual de igual forma e o desigual de desigual forma - será esta a razão pela qual as penas previstas no Código Penal não são determinadas, mas antes determináveis dentro de uma moldura penal pelo Tribunal, na pessoa do Juiz.

  20. Terão de ser utilizados critérios de equidade na determinação da pena concreta a aplicar a um arguido, que passarão, necessariamente, pela ponderação dos factos e da personalidade do agente (art. 77.º n.º 1 CP).

  21. Quanto aos factos, e como retiramos das lições de Figueiredo Dias, em sede de pena conjunta/unitária, "tudo deve passar-se como se o conjunto dos factos fornecesse a gravidade do ilícito global perpetrado, sendo decisiva para a sua avaliação a conexão e o tipo de conexão que entre os factos concorrentes se verifique".

  22. Os factos de que foi alvo de condenação, tendo o Tribunal a quo considerado, "sendo os crimes mais graves", os crimes relacionados com o património.

  23. Não se concorda com tal entendimento no douto acórdão, até porque os crimes mais graves, face à lei penal, são crimes contra a vida.

  24. Importa, agora, discutir se a decisão recorrida violou ainda o disposto nos artigos 77º, n.º 1 do C.P., e 374º n.º 2 e 379.º do C.P.P., ao não valorar devidamente a personalidade do arguido e não fundamentar devidamente a razão pela qual optou pela determinação da medida da pena junto dos seus limites máximos, sendo por isso nula.

  25. Assim como refere o Prof. Germano Marques da Silva o objectivo do dever de fundamentação, imposto pelos sistemas democráticos, é permitir " a sindicância da legalidade do acto, por uma parte, e serve para convencer os interessados e os cidadãos em geral acerca da sua correcção e justiça, por outra parte, mas é ainda um importante meio para obrigar a autoridade decidente a ponderar os motivos de facto e de direito da sua decisão, actuando por isso como meio de autodisciplina ." 29. Por isso, as regras de punição do concurso, estabelecidas nos...

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