Acórdão nº 484/13.7TJCBR-A.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 21 de Março de 2013

Magistrado ResponsávelTELES PEREIRA
Data da Resolução21 de Março de 2013
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Decisão Sumária (Artigo 705º do Código de Processo Civil) 1.

Em 8 de Fevereiro, próximo passado, apresentaram-se, junto dos Juízos Cíveis de Coimbra (gerando a distribuição do processo ao 4º Juízo Cível), à insolvência, em coligação nos termos permitidos pelo artigo 264º, nº 1 do CIRE, A… e o seu marido, H… (Requerentes e aqui Apelantes), casados no regime de comunhão de adquiridos.

Logo no intróito do requerimento de apresentação, mencionaram os Requerentes como sua morada um local sito na Lousã, na freguesia de Vilarinho – logo, e é o que aqui interessa reter, indicaram os Requerentes como seu domicílio um local situado na Comarca da Lousã –, acrescentando mais à frente nesse mesmo articulado (está este integralmente certificado a fls. 5/17 deste recurso) o seguinte: “[…]3ºOs requerentes residem com os seus filhos na morada supra indicada, sendo essa a sua casa de morada de família desde Dezembro[[1]], mês em que deixaram de residir na cidade de Coimbra, onde sempre habitaram.

[…]12ºA requerente, que desempenha funções como auxiliar no …], auferindo pelo seu exercício a remuneração mensal líquida […].

[…]”.

Ainda no mesmo articulado inicial, a respeito da competência territorial do Tribunal de Coimbra, referiram os Requerentes o seguinte: “[…]28ºSendo o presente tribunal competente para apreciar e decidir a acção de insolvência em causa, nos termos do artigo 7º, nº 2 do CIRE.

[…]”.

[desta feita transcreve-se de fls. 13].

1.1.

Confrontada com esta apresentação à insolvência em Coimbra, proferiu a Exma. Magistrada titular do respectivo 4º Juízo Cível o despacho certificado a fls. 58/60 – constitui este a decisão objecto do presente recurso – no qual, depois de considerar ser-lhe acessível (oficiosamente) a apreciação da excepção de incompetência territorial nos processos de insolvência, considerou ser competente, em função da localização da residência declarada pelos Requerentes[2], o Tribunal da Lousã, recusando a competência da Comarca de Coimbra. Disse a este respeito a Senhora Juíza a culminar tal despacho: “[…] julga-se este tribunal territorialmente incompetente para o conhecimento da presente acção especial de insolvência, afirmando-se a competência do Tribunal da Comarca da Lousã, e, consequentemente, determina-se a remessa dos autos a esta comarca” (fls. 59).

1.1.1.

A remessa dos autos de imediato à Comarca da Lousã levou este último Tribunal, paralelamente à admissão do recurso aqui em causa, a decretar desde logo a insolvência dos Requerentes.

1.2.

Estes, com efeito, interpuseram atempadamente recurso do despacho contendo essa declaração de incompetência territorial do Tribunal de Coimbra, concluindo o seguinte a rematar as respectivas alegações: “[…] 1.2.1.

Como já se indicou, foi o recurso admitido – correctamente admitido, sublinhamos aqui[3] – no Tribunal da Lousã, a culminar a Sentença que declarou a insolvência dos Requerentes.

2.

Aqui chegados, relatado o desenvolvimento do processo que conduziu à presente instância de recurso, importa apreciar a apelação, sendo que o âmbito objectivo da mesma foi delimitado pelas conclusões acima transcritas (artigos 684º, nº 3 e 685º-A, nº 1 do CPC). Como resulta da estrutura deste texto, adopta-se a forma singular e liminar – decisão sumária – decorrente do artigo 705º do CPC, considerando o ora relator abrangida no espírito desta previsão normativa situações em que a questão suscitada no recurso, particularmente num processo de natureza urgente, convoque uma operação relativamente simples de interpretação e aplicação de normas a dados de facto inquestionáveis e inquestionados nesse recurso. Entendemos que o espírito da norma prevendo a decisão sumária não bloqueia o uso de tal forma de apreciação do recurso numa situação como a que aqui se configura.

Os dados de facto relevantes traduzem-se, fundamentalmente, em incidências processuais, são, pois, factos processuais, estando estes documentados nos autos e aqui devidamente certificados, nos exactos termos relatados ao longo do item 1. desta decisão. Chama-se a atenção, designadamente, para os trechos do requerimento inicial relevantes para determinar a competência territorial que transcrevemos supra no item 1. Será essencialmente com base neles que determinaremos a competência do Tribunal, encerrando os mesmos os elementos que à Senhora Juíza a quo se apresentavam, à partida, para aferição dos pressupostos formais da instância, concretamente quanto à questão da competência do Tribunal em razão do território[4].

Trata-se aqui de determinar, pois, em função dos dados emergentes do requerimento de apresentação à insolvência e documentos a ele anexos – constitui, portanto, o fundamento da presente apelação –, se o Tribunal territorialmente competente para o processo concursal por apresentação dos Apelantes, era – é – o de Coimbra, por integração, face ao teor do requerimento de apresentação, da facti species do nº 2 do artigo 7º do CIRE, como entendem os Apelantes, ou se, pelo contrário, o Tribunal territorialmente competente seria – será – o da Lousã, por os termos da apresentação dos Requerentes apenas induzirem a aplicação ao caso da regra do nº 1 do mesmo artigo 7º: a regra do domicílio do devedor.

Todavia, preliminarmente, tomaremos posição sobre a natureza oficiosa ou não do conhecimento pelo Tribunal da competência territorial nos processos concursais – nos processos especiais de insolvência regulados no Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas –, testando o entendimento que o Tribunal a quo adoptou a esse respeito, in itinere para a decisão oficiosamente tomada de se considerar territorialmente incompetente. Embora os Apelantes não ataquem no recurso esse pressuposto do processo argumentativo construído pela Senhora Juíza a quo, envolve esse elemento uma típica questão de Direito (v. o artigo 664º do CPC) e esta, se aqui for (fosse) resolvida diversamente – se afirmarmos (se afirmássemos) que o Tribunal não tinha acesso oficioso à apreciação da competência territorial nos processos de insolvência –, se considerássemos não ser possível essa apreciação oficiosa, dizíamos, a decisão recorrida cairia pela base, ficando prejudicada a ulterior apreciação dos fundamentos da alocação da competência territorial a outro Tribunal (v. o artigo 660º, nº 2 do CPC).

2.1.

Começando, assim, pela questão acabada de equacionar, estando em causa um problema de incompetência relativa (artigo 108º do CPC) e sendo esta subtraída, em princípio – pode-se dizer assim –, à apreciação oficiosa do tribunal (artigo 109º do CPC), existem situações de conhecimento oficioso da mesma, previstas no que aqui interessa no nº 1 do artigo 110º do CPC (vale aqui, por ser a vigente ao tempo da propositura desta acção, a redacção introduzida neste artigo 110º pela Lei nº 14/2006, de 26 de Abril):Artigo 110º Conhecimento oficioso da incompetência relativa1 – A incompetência em razão do território deve ser conhecida oficiosamente pelo tribunal, sempre que os autos fornecerem os elementos necessários, nos casos seguintes: a) Nas causas a que se referem o artigo 73.º, a primeira parte do n.º 1 e o n.º 2 do artigo 74.º, os artigos 83.º, 88.º e 89.º, o n.º 1 do artigo 90.º, a primeira parte do n.º 1 e o n.º 2 do artigo 94.º; b) Nos processos cuja decisão não seja precedida de citação do requerido; c) Nas causas que, por lei, devam correr como dependência de outro processo.

Ora, verificando, através das situações indicadas na transcrita alínea a) deste preceito, quais os processos em que é estabelecida a apreciação oficiosa do pressuposto processual da competência em razão do território, constatamos a ausência, isto na actual redacção, de qualquer referência remetendo para o processo de insolvência – é esta técnica indirecta (a chamada remissão)[5] a utilizada no artigo 110º. Sucede assim (a falta de referência aos processos de insolvência) desde que o Decreto-Lei nº 53/2004, de 18 de Março (o diploma...

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