Acórdão nº 0775/12 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 26 de Fevereiro de 2013

Magistrado ResponsávelPOLÍBIO HENRIQUES
Data da Resolução26 de Fevereiro de 2013
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo 1. RELATÓRIO A………, já devidamente identificada nos autos, instaurou no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, contra o Centro Hospitalar de Gaia (Hospital Eduardo Santos Silva) e contra o Hospital Geral de Santo António, acção ordinária para efectivação de responsabilidade civil extracontratual, pedindo a condenação solidária dos réus no pagamento, em seu favor, da quantia de € 279 580, 00, acrescida de juros à taxa legal, desde a data da citação até efectivo e integral pagamento.

Pediu ainda, como gestora de negócios, a condenação dos réus a pagarem aos menores, filhos do seu marido, a quantia € 8 978,36, mais uma quantia mensal de €75,00 a cada um deles, desde o mês da citação até estes atingirem a maioridade – em 13/5/2005 em relação ao B……… e em 11/01/2009 no concernente à C……… – quantia actualizável anualmente de acordo de acordo com os coeficiente de desvalorização da moeda.

A fls 953-981, foi proferido despacho saneador no qual, além do mais, foi julgada improcedente a excepção da prescrição suscitada pelos réus Centro Hospitalar de V. N.de Gaia e Hospital Geral de Santo António.

Pela sentença de fls. 1772 – 1793 o Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto julgou a acção improcedente, absolvendo os réus do pedido.

1.1. Os Réus interpuseram recursos do despacho saneador que foram admitidos com subida diferida.

1.2. No recurso do despacho saneador o réu Centro Hospitalar de V. N. de Gaia apresentou alegações com as seguintes conclusões: 1º O Recorrente Centro Hospitalar de Vila Nova de Gaia é uma pessoa colectiva de direito público e, como tal, insusceptível de ser sujeito ou agente de qualquer conduta ou facto criminoso, por carecer de livre arbítrio onde se fundamenta a culpa, pilar estruturante de todo o direito penal.

2° Deste modo, não podendo ser sujeito de um facto ilícito criminal, não lhe é aplicável o n° 3 do art°. 498° do Código Civil.

3° Da mesma opinião são VAZ SERRA e ANTUNES VARELA que entendem que o prazo mais longo do n° 3 do art°. 498° do CC só deve ser aplicável ao causador directo do facto ilícito criminal (ao prevaricador) e não ao responsável indirecto, solidário ou comitente a quem apenas se aplicaria o prazo geral do n° 1 daquele artigo 498° - Das Obrigações em Geral, 8 edição, pág. 641 e 642 e RLG, nºs. 1234 e 125, págs. 30 e 31 e 39 a 49.

4º Mesmo na óptica do douto Despacho saneador que quer responsabilizar o Recorrente pela conduta — essa de ilícito criminal — dos seus agentes, no caso seus médicos, conduta essa que se reflectiria na esfera jurídica do Recorrente, o direito da A. estava já prescrito pois, mesmo aplicando ao caso o prazo do art° 498°, n° 3 do CC, há muito que passou o prazo de 5 anos entre a morte do marido da A. — 8 de Março de 1998 - e as datas das citações dos médicos do recorrente e aqui 3º, 4º, 5°, 6° e 7° Réus, pelo que estando prescrito o direito face aos agentes, prescrito está o direito em relação ao Recorrente.

5° Por outro lado, o início do prazo do art°. 498°, n° 3 do CC, em relação ao Recorrente, não é o da morte do marido da A., mas sim o dia da alta concedida a este pelo recorrente — 3 de Fevereiro de 1998 — já que, a partir desta data a A. e seu marido, interromperam deliberadamente o possível nexo de causalidade entre o tratamento feito pelo Hospital do recorrente e os hipotéticos danos sofridos pelo marido da A., impedindo este de voltar a ser tratado pelo Recorrente, internando-o no Hospital de Santo António onde lhe foi retirada toda a medicação feita pelo Recorrente.

6º Deste modo, a A. e seu marido, logo em 3 de Fevereiro de 1998 tomaram conhecimento dos pressupostos condicionantes da responsabilidade do Recorrente, sendo a partir desta data que se conta o prazo de 5 anos, o qual estava já esgotado a quando da citação do Recorrente: 7 de Março de 2003.

7º De todo o modo, nunca o Tribunal a quo poderia pronunciar-se definitivamente, como o fez, no saneador sobre a prescrição do direito da A. sobre o Recorrente, pois ainda não estavam assentes nem provados todos os pressupostos da referida prescrição — Ac. da Rel. de Lisboa de 21/1/1997, in CJ, 1, 105, Acs do STA de 16/01/2003, in DR, Ap. De 9-06-2004, 1, pg. 333 e ac do STA de 31/10/2000, in DR, Ap. De 12/02/2003, 1, Pg. 7831.

8° Ao decidir, logo no saneador, pela não prescrição do hipotético direito da A. em relação ao Recorrente, o douto Despacho recorrido violou, por errada interpretação, os art°s. 498°, n° 3 do Código Civil e 512° do CPC.

TERMOS EM QUE deve dar-se provimento ao recurso e revogar-se o douto despacho saneador na parte em que conheceu definitivamente da prescrição em relação ao Recorrente, considerando prescrito o direito da A. face ao Recorrente.

1.2. Por sua vez, o réu Hospital Geral de Santo António, alegando no recurso do despacho saneador, concluiu: 1º Ao recorrente, pessoa colectiva de direito público, não é aplicável o disposto no nº 3 do art. 498º do CC.

2º Assim deveria a excepção da prescrição ter sido julgada procedente nos termos do nº 1 do citado art. 498º, que assim resultou violado.

3º Caso assim se não entendesse, sempre se deveria ter relegado para a sentença final o conhecimento da excepção por os autos não conterem factos provados que permitam concluir pela existência do crime.

4º Ao não o fazer, resultou violado o disposto nos arts. 508º-A e 510º do CPC.

Termos em que, dando provimento ao recurso e julgando-se procedente a excepção da prescrição invocada pelo recorrente ou, caso assim se não entenda, relegando-se a o seu conhecimento para a sentença final, se fará Justiça! 2. Tendo os autos prosseguido, o Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, pela sentença de fls. 1772 – 1793 julgou a acção improcedente e absolveu os réus do pedido 2.1 Inconformada com a sentença, a Autora recorre para este Supremo Tribunal apresentando alegações com as seguintes conclusões: 1ª O presente recurso tem por objecto a sentença proferida a fls. 1772 a 1793 dos autos e respectiva resposta à matéria de facto, que julgou improcedente a acção proposta pela Autora, com fundamento em responsabilidade extracontratual e versará sobre matéria de facto e de direito.

  1. Na matéria de facto apurada, referida nas alíneas O) e P), foi dada como provado que, na madrugada em que o marido da Autora recorreu aos serviços de urgência, foi, nas circunstâncias de modo, abordada por um profissional médico Dr. D……….

  2. Sucede porém que, como se reconhece na página 1 da douta sentença, a Autora, para além dos Réus que ainda mantêm essa qualidade na presente demanda, intentou a presente acção ainda contra oito médicos, entre os quais, o Sr. Dr. D………, em relação ao qual veio, logo de imediato, a desistir do pedido, como melhor se alcança do requerimento junto aos autos a fls. 309 e 309 e do despacho de fls. 310 destes autos que sobre o mesmo recaiu.

  3. A aqui Recorrente veio posteriormente a reconhecer que o profissional médico a que fez alusão no artigo 5º da sua petição inicial não era o Dr. D………, tanto mais que, segundo conseguiu apurar, este profissional jamais trabalhou no Centro Hospitalar de Gaia, aqui Réu, mas sim a médica que veio a ser, por si, indicada como testemunha, a Sra Dra E……….

  4. A confundibilidade do nome assentou apenas na errónea colocação do número de cédula profissional do profissional médico que atendeu o marido da Autora e que, só depois de a Autora ter tido acesso à escada de serviço do CHVNG (cfr. documento junto de fls. 397 a 403, com especial o mencionado a fls. 399, naquela madrugada de 29 de Novembro de 1997, logrou apurar que se tratava da Sra. Dra. E………, a qual foi indicada como testemunha e que confirmou, em sede de audiência de discussão e julgamento, que assistiu o marido da Autora.

  5. Para que a matéria de facto apurada seja reveladora da factualidade ocorrida e plasmada no processo, requer-se, ao abrigo do disposto no artigo 249º do Código Civil, conjugado com o disposto no art. 667º do Código de Processo Civil, aplicável ex vi do art. 102º da LPTA, seja rectificado o erro de escrita no sentido de no ponto II – Matéria de facto apurada, alíneas O) e P), em vez de “Dr. D………” passe a constar “Dra E………”.

  6. Não obstante o impressionante desfecho, como clara e inequivocamente refere o Tribunal a quo, este mesmo Tribunal afasta a responsabilidade dos ora Recorridos, por um lado, por não ter sido possível identificar a origem da bactéria ligada à meningite, e, por outro, que o marido da Recorrente tenha sido submetido a terapêutica ou medicação desadequada à situação clínica que apresentava, concluindo, por isso, não ter havido violação das leges artis.

  7. Apesar da dificuldade acrescida que esta situação representa atento o facto de a factualidade vertida contender com conhecimentos médicos técnicos muito complexos, a prova produzida e constante dos autos, conjugada entre si, impugna conclusão diversa, como melhor se demonstrou.

  8. A compreensão das circunstâncias anteriores, as contemporâneas e as posteriores à intervenção cirúrgica a que o marido da aqui Recorrente foi submetido, é possível, de um ponto de vista lógico, racional e científico, formar-se a convicção acerca do tipo de bactéria que infectou o paciente e, desse modo, apontar-se a sua origem.

  9. Atente-se na matéria de facto apurada que se revela determinante para este ponto: - Em 19 de Novembro de 1997, pelas 20h00, o F……… deu entrada no Serviço de Otorrinolaringologia do Centro Hospitalar de Vila Nova de Gaia (CHVNG) a fim de ser submetido a uma micro – cirurgia dos seios perinasais para extracção de pólipos nasais; - No dia 20 de Novembro de 1997, pelas 08h00, o F......... deu entrada no Bloco Operatório (BO) do CHVNG para ser operado pelo Dr. G………; - O F......... teve alta do CHVNG nesse mesmo dia – 20 de Novembro de 1997 –tendo a micro-cirurgia sido adiada para o dia 27 de Novembro de 1997; 11ª Da produção de prova em sede de audiência de discussão e julgamento resultou provado...

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