Acórdão nº 00008/10.8BCPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 25 de Outubro de 2012

Magistrado ResponsávelAnabela Ferreira Alves Russo
Data da Resolução25 de Outubro de 2012
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

I - RELATÓRIO Os Municípios de C P (…), F (…), L (…), M (…), P F (…), P (…) e P(…) instauraram, ao abrigo dos do disposto nos arts 9º, nº 2, 72º e seguintes do CPTA e 2º, nº 2 da Lei 83/95, de 31-08, a presente acção administrativa especial de impugnação de normas contra o Conselho de Ministros (doravante CM) e contra-interessadas EP (…), S.A e L (…), SA (actualmente denominada A (…), SA, pedindo que seja decretada a ilegalidade, com força obrigatória geral, das normas constantes: 1- «da Resolução do Conselho de Ministros n.º 75/2010, de 22 de Setembro, (i) de adoptar o princípio da universalidade na implementação do regime de cobrança de taxas de portagem em todas as auto-estradas sem custos para o utilizador (SCUT); (ii) de introduzir um regime efectivo de cobrança de taxas de portagens nas auto-estradas SCUT Norte Litoral, Grande Porto e Costa da Prata a partir de 15 de Outubro de 2010; (iii) de introduzir um regime efectivo de cobrança de taxas de portagem nas restantes auto-estradas SCUT, designadamente SCUT Interior Norte, Beiras Litoral e Alta, Beira Interior e Algarve, até 15 de Abril de 2011; 2- do Decreto-Lei n.º 67-A/2010, de 14 de Junho, aprovado pelo Conselho de Ministros, (i) de identificação dos lanços e sublanços de auto-estrada sujeitos ao regime de cobrança de taxas de portagem aos utilizadores (constante do anexo I do referido diploma), e (ii) de fixação do dia 1 de Julho de 2010 como a data a partir da qual se inicia a cobrança das mesmas, em todos os (2) segmentos referidos na parte relativa (apenas) à Concessão Grande Porto; por violação dos seguintes princípios constitucionais: a) «da legalidade, da precedência de lei e do congelamento de grau hierárquico», nos termos que resultam dos artigos 157.º a 198.º da p.i.; b) «Da coesão territorial dos domínios económico e social consagrado na alínea g) do artigo 9º e na alínea d) do artigo 81.º, ambos da CRP», nos termos que resultam dos artigos 199.º a 209.º da p.i.; c) «da protecção da confiança» (art. 266º, nº 2 da CRP); «da violação das obrigações de satisfação de pretensões dos habitantes da região instrumentais dos direitos fundamentais à vida e à integridade física (arts 24º e 25º da CRP), e das liberdades fundamentais de deslocação (arts 27º da CRP), trabalho e de iniciativa económica» (arts 47º, nº 1 e 61º da CRP) e do «princípio da igualdade» (“material ou real”- art. 9º, al. d) da CRP)», nos termos que resultam dos artigos 210.º a 234.º da p.i.; d) «Da liberdade de circulação de pessoas e bens» (arts 27º, nº 1 da CRP e 18.º do TFEU), nos termos que resultam dos artigos 235.º a 252.º da p.i.; e e) «Da igualdade» (art. 13.º da CRP), nos termos que resultam dos artigos 253.º a 503.º da p. i..

O Réu e as contra-interessadas contestaram por excepção e por impugnação.

Por excepção, opuseram: O Conselho de Ministros A incompetência absoluta da jurisdição administrativa e fiscal para conhecer o pedido referente às disposições constantes do DL 67-A/2010, de 14-06, o que faz, alegando que, nos termos do n° 2 do art. 4° do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais (doravante ETAF), está excluída dessa jurisdição a apreciação de litígios que tenham por objecto a impugnação de actos praticados no exercício da função legislativa; A incompetência absoluta da jurisdição administrativa e fiscal para conhecer do pedido de declaração de inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, das disposições contidas naquele diploma e na Resolução do Conselho de Ministros nº 75/2010, com fundamento exclusivo na violação de preceitos constitucionais, por tal juízo, nos termos do n.º 1 do art. 281º da CRP e nº 2 do art. 72º do CPTA, estar exclusivamente reservado ao Tribunal Constitucional; A ilegitimidade dos Autores para o pedido de declaração de ilegalidade, com força obrigatória geral, das normas impugnadas, por, na falta de desaplicação das normas impugnadas em três casos concretos, apenas o Ministério Público ter legitimidade para a formulação daquele pedido - cfr. art. 73º, nº 3 do CPTA; A ilegitimidade dos Autores para o pedido formulado em relação à Resolução nº 75/2010, por, pretendendo os mesmos – pessoas colectivas públicas territoriais - ancorar a sua legitimidade no direito de acção popular, apenas lhes ser legítimo formular pedidos impugnatórios para a protecção de interesses que relevem na respectiva área territorial, o que não acontece no caso, em virtude de, com exclusão da SCUT do Grande Porto para os municípios por ela atravessados, as restantes auto-estradas nada terem a ver com as atribuições das autarquias por elas não são atravessadas, não estabelecendo qualquer tipo de relação com os interesses das suas populações; A particular ilegitimidade dos Municípios de C P(…), F (…) e P (…) por, não sendo atravessados pela SCUT do Grande Porto, ser absolutamente irrelevante, para efeitos de fixação de um elemento de conexão que permita a sua intervenção processual nos autos, a invocada integração dos mesmos na região do Tâmega (NUTS ITT Tâmega) ou a alegação de que a maioria dos utilizadores dessa auto-estrada são maioritariamente residentes nos municípios integrados nessa região, sendo que aqueles Autores não indicam interesses específicos que sustentem a sua legitimidade e pelo menos o Município da Maia não integra a NUTS III Tâmega.

A contra-interessada EP(…), S.A A incompetência absoluta da jurisdição administrativa para conhecer os pedidos relativos ao DL 67-A/2010 e à Resolução nº 75/2010, por, respeitando a actos praticados respectivamente no exercício de funções legislativa e política, estarem excluídos do âmbito da jurisdição administrativa por respeito ao princípio da separação de poderes e em conformidade com o art. 4º, n.º 2, al. a) do ETAF; A incompetência do Tribunal Central Administrativo Norte para apreciar a matéria dos autos porquanto, estando formulado um pedido de declaração de ilegalidade de normas emanadas do Governo, órgão constitucional, aprovadas pelo Conselho de Ministros, ser o Supremo Tribunal Administrativo o competente para conhecer da presente acção, cf. al. a)- iii) do nº 1 do art. 24º do ETAF; A ilegitimidade dos Autores para formularem o pedido de declaração de ilegalidade de normas com alcance geral, já que para isso apenas o Ministério Público detém legitimidade, cf. 73º, nº 1 do CPTA; A ilegitimidade dos Autores, por o interesse que visam defender - e que se reconduz a assegurar a circulação, a título gratuito, em determinadas vias rodoviárias, com postergação de um regime legal que impõe o pagamento de taxas – não caber no âmbito material de protecção da acção popular nem nos critérios de aferição da legitimação processual para esta demanda (cf. arts 9º, nº 2 do CPTA, 2º, nº 2 da Lei da Acção Popular e 52º, nº 3 da CRP); Ilegitimidade dos Autores para tutela ou representação dos cidadãos estrangeiros, já que a terem legitimidade sempre a mesma estaria limitada à tutela dos interesses dos residentes nos seus concelhos, devendo o Tribunal abster-se de conhecer as questões suscitadas nos arts 235º a 252º da petição inicial (cf.art. 2º, nº 2 da Lei da Acção Popular) A contra-interessada L(…), S.A.

, A inimpugnabilidade das normas legais que são objecto da presente acção por, sendo as normas do DL 67-A/2010 formal e materialmente um acto legislativo e a Resolução nº 75/2010 conter apenas decisões preliminares de cariz político, não serem, nem umas nem outras, sindicáveis pelos Tribunais Administrativos e Fiscais, em conformidade com o art. 4º, nº 2 do ETAF; Ilegitimidade dos Autores para formularem pedidos de declaração de ilegalidade de normas com força obrigatória geral, por a aplicação das disposições impugnadas não ter sido judicialmente recusada, com fundamento em ilegalidade, em três casos concretos (cf. arts 9º, nº 2 e 73º, nºs 1 e 3 do CPTA).

Por impugnação, o Réu e as contra-interessadas defendem, em máxima síntese, que o DL 67-A/2010 e, bem assim, a Resolução do CM nº 75/2010 não violam qualquer dos princípios constitucionais invocados pelos Autores.

Os Autores, a fls 668 a 699, responderam à matéria das excepções, pugnando pela improcedência de todas elas.

*** II- Cumpre apreciar as excepções, mostrando-se para o efeito assente, com interesse, o seguinte: 1- Em 5-11-2004, foi publicada, no Diário da República, a Resolução n.º 157/2004 do Conselho de Ministros, de que consta o seguinte: «O Estado Português lançou, em 1999, sete concessões de auto-estradas em regime de SCUT (sem cobrança para o utilizador) num total de 914 km de extensão, representando cerca de um terço das concessões rodoviárias nacionais num investimento de 3,1 mil milhões de euros.

Os custos deste projecto foram à data diferidos cerca de cinco anos, tendo os encargos mais significativos com as concessões começado apenas em 2004. Depois de picos de despesa em 2007 e em 2008, onde os encargos anuais com as SCUT ascendem a mais de 820 milhões de euros, o valor médio dos encargos anuais, entre 2008 e 2023, ascende a cerca de 700 milhões de euros.

Estes encargos referem-se a três componentes de despesa: o valor da renda anual a pagar às concessionárias, as expropriações, e os reequilíbrios financeiros em negociação.

Dadas as restrições orçamentais existentes, o modelo actual impõe aos contribuintes um encargo com estes 914 km de estradas SCUT que é três vezes superior ao valor total suportado pelo Estado/IEP (Instituto de Estradas de Portugal) para construir 2500 km até 2008 e ainda manter e conservar mais de 14000 km de rodovia já existente, num total de 17000 km.

Considerando que o IEP recebeu em 2004, directamente do Orçamento do Estado para investimento, uma verba de cerca de 400 milhões de euros, resulta evidente que o esforço financeiro devido às concessões SCUT anula totalmente a capacidade de investimento do IEP nas suas actividades tradicionais de manutenção da rede viária, segurança rodoviária, conservação de estradas e pontes e construção de obra nova, pondo em causa a sustentabilidade da totalidade do...

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