Acórdão nº 0891/12 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 27 de Novembro de 2012

Data27 Novembro 2012
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1541_01,Supremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo 1. RELATÓRIO “A……”, já devidamente identificada nos autos, interpõe, para este Supremo Tribunal, ao abrigo do disposto no art. 150º/1 do CPTA, recurso de revista do acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, proferido a fls. 594-601 dos autos.

Nesse aresto, o TCA negou provimento ao recurso interposto da sentença do Tribunal Administrativo do Círculo de Lisboa, de fls. 341-342, que rejeitara liminarmente as providências cautelares de (i) suspensão de eficácia do acto, do Infarmed, de autorização de introdução no mercado (AIM), do medicamento ácido Zoledrónico B…… Mono – hidratado 4mg/5ml concentrado para solução para perfusão, a favor da contra-interessada “B…… Lda” e (ii) de intimação do Infarmed a abster-se de : a) na vigência da Patente e do CCP 100, autorizar a transferência da titularidade da AIM concedida à contra-interessada, sob a designação acima ou quaisquer outras designações futuras do mesmo medicamento; b) fixar os preços máximos requeridos.

1.1. Apresenta alegações com as seguintes conclusões: 1. O presente recurso tem efeito suspensivo da decisão recorrida, nos termos do nº 1 do artigo 143º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos.

  1. A apreciação da aplicação ou desaplicação da Lei nº 62/2011, de 12 de Dezembro tem de conduzir à conclusão de que o presente recurso excepcional de revista reveste uma utilidade jurídica fundamental dadas (i) a dificuldade que suscitam as operações exegéticas necessárias à decisão das questões ora colocadas a este tribunal e a (ii) probabilidade de tais questões serem colocadas em litígios futuros.

  2. O presente recurso jurisdicional diz respeito a questões de relevância jurídica e social fundamental, que revestem importância jurídica excepcional por envolverem princípios, normas e direitos fundamentais consagrados na ordem jurídica nacional e supranacional.

  3. Assim o entendeu já este Supremo Tribunal Administrativo, nos seus Acórdãos de 28.03.2012 e de 26.04.2012, no âmbito dos Processos, respectivamente, nºs 225/12 e 388/12.

  4. Face ao corpo factual que resulta provado, é manifesto o erro de julgamento do Acórdão recorrido e a necessidade premente de melhor aplicação do Direito.

  5. Os direitos de propriedade industrial são direitos fundamentais pessoais que beneficiam do mesmo regime de protecção constitucional aplicável à liberdade fundamental de criação cultural em que se apoiam ou seja, do regime específico dos direitos, liberdades e garantias.

  6. Os direitos de propriedade industrial são, por outro lado e conforme reconhecido pelo Tribunal Constitucional e por ilustres constitucionalistas, direitos de propriedade privada e, como tal, direitos fundamentais de natureza análoga à dos “direitos, liberdades e garantias”, beneficiando, assim, do regime constitucional que a estes é aplicável, conforme resulta do artigo 17º da Constituição, designadamente do estabelecido no seu artigo 18º.

  7. Tais direitos gozam ainda de uma tutela constitucional acrescida, se bem que por via indirecta ou reflexa, decorrente da protecção directa que têm vindo a merecer ao nível do Direito Internacional e do Direito da União Europeia, cujas normas vigoram na ordem jurídica interna portuguesa por força do disposto no artigo 8º da Constituição.

  8. A Lei nº 62/2001 não tem qualquer relevância para a questão que nos ocupa, não devendo ter sido aplicada pelo Tribunal a quo ao caso vertente, por carência dos pressupostos para a sua aplicação.

  9. Com efeito, os pedidos formulados na acção principal e na presente providência cautelar fundamentam-se, além do mais, na circunstância de a AIM ter por objecto mediato uma actividade – a comercialização dos medicamentos genéricos da Contrainteressada – violadora dos direitos de patente da Recorrente, como direitos constitucionalmente protegidos.

  10. Nesta acção não se defende que a AIM em causa seja, per se, violadora dos direitos de patente invocados pela ora Recorrente.

  11. Com efeito, invocou a Recorrente na acção principal a nulidade do acto de concessão de AIM destes autos com base nos dispositivos do artigo 133º, nº 2, alíneas c) e d) do Código do Procedimento Administrativo (CPA), por tal acto ser violador do conteúdo essencial do seu direito fundamental emergente da Patente e CCP dos autos e porque a actividade por eles licenciada é uma actividade criminosa, punida como tal pelo artigo 321º do Código da Propriedade Industrial.

  12. Mais invocou que o mesmo era inválido, nos termos do art. 135º do CPA, por ter como única finalidade a de permitir uma prática comercial ofensiva de vinculações que para o Estado derivam dos efeitos que a lei atribui a um acto administrativo desse mesmo Estado que lhe era anterior, ofendendo, nomeadamente, o artigo 18º da Constituição que tem aplicação directa.

  13. O que se pretende, em suma, na acção principal, é a verificação da invalidade do acto administrativo de concessão da AIM e não a sindicância da observância das regras procedimentais pelo INFARMED.

  14. A Lei nº 62/2011 não revogou nem modificou as normas dos artigos 133º e 135º do CPA e como tal não alterou os fundamentos em que se baseia a pretensão da ora Recorrente na acção principal de que estes autos cautelares são dependentes.

  15. Uma vez que a declaração de invalidade do acto de AM pedida na acção principal é formulada à luz dos referidos artigos 133º e 135º do CPA, da Lei nº 62/2011 não pode decorrer que a acção principal deva ser julgada improcedente e com esse fundamento que a presente providência cautelar deva ser rejeitada liminarmente.

  16. A nova norma do artigo 23º - A do Estatuto do Medicamento apenas tem a ver com os pressupostos de facto dos actos de emissão de AIMs, relativos à saúde pública e não já com a teleologia dessas mesmas AIM, que é o que releva para a decisão desta causa, tal como se encontra formulada pela ora Recorrente, não impedindo a declaração de ilegalidade de uma AIM pelos Tribunais com base na violação de direitos de patente decorrente da comercialização de um medicamento por ela consentida e, mesmo, imposta.

  17. As normas dos artigos 25º nº 2 e 179.° nº 2 do Estatuto do Medicamento, com a redacção que lhes foi dada pela Lei nº 62/2011, têm que ser entendidas como contendo uma proibição procedimental de o INFARMED sindicar a existência de direitos de propriedade industrial no contexto de processos de concessão de AIMs, mas não como uma revogação dos artigos 133º e 135º do CPA nem um impedimento de os Tribunais apreciarem a validade dos actos do INFARMED à luz dessas disposições.

  18. As referidas normas não têm, assim, a virtualidade de impedir que os Tribunais sindiquem a validade de uma AIM que, com violação dos preceitos constitucionais e das normas gerais aplicáveis ao procedimento administrativo, licencie a comercialização de medicamentos violadores de patentes de terceiros.

  19. Se, porém, tais normas forem entendidas - o que não deriva do seu texto - como contendo uma proibição absoluta de que o INFARMED aprecie, no contexto daquele ato administrativo, a eventual avaliação da violação direitos de propriedade industrial, tais disposições serão inconstitucionais, por violação nomeadamente, do artigo 18º da Constituição, por falta de uma protecção mínima adequada de um direito fundamental devida pela Administração Publica, como tem vindo a ser consistentemente declarado pelo Tribunal Central Administrativo do Sul.

  20. As disposições constantes do artigo 19º n.° 8, do artigo 23º - A, nº...

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