Acórdão nº 0222/12 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 21 de Novembro de 2012

Magistrado ResponsávelFERNANDA MAÇÃS
Data da Resolução21 de Novembro de 2012
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: I - RELATÓRIO 1. A……., S.A., com a identificação constante dos autos, deduziu impugnação judicial, no Tribunal Tributário de Lisboa – 4ª Unidade Orgânica, dos actos de cobrança relativos às facturas nºs 700000020810 e 700000021826, referentes a publicidade, praticados pela Câmara Municipal de Lisboa, que foi julgada improcedente.

2.

Não se conformando com tal decisão, A……., S.A., veio interpor recurso, para a Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, tendo nas Alegações, apresentado as seguintes Conclusões: “I— A douta sentença recorrida ao confirmar a legalidade da cobrança de taxas de publicidade pela afixação, em propriedade privada ou espaço contíguo a esta, de mensagens publicitárias com os sinais distintivos do comércio do estabelecimento ou do respectivo titular da exploração, ou relacionadas com bens ou serviços comercializados no estabelecimento, ainda que visíveis do espaço público, viola o BLOCO DE LEGALIDADE do Direito da UE aplicável ao caso sub judice, designadamente os Princípios da Necessidade e da Proporcionalidade e Gratuitidade, descritos no n° 3 alíneas b) e c) do art° 15° da Directiva Serviços n.º 2006/123/CE, ex vi imposição resultante da liberdade de Estabelecimento e do Princípio da Excepcionalidade de regimes de autorização administrativa (art°s 49° e 50 n° 2 al.c) do TFUE) — bloco este directamente invocável e aplicável, ex officio, na ordem jurídica interna, por força da aplicabilidade directa do direito da União, nesta sede - tal como decidido pelo TJUE em diferentes acórdãos, designadamente Acórdão Van Gend & Loos, Acórdão Marleasing SA, Acórdão Konstantinos Adeneler, Acórdão Francovitch, Acórdão Simmenthal e Acórdão Coster - em consequente violação do Princípio do Primado do Direito da EU consagrado no art. 8°, n.° 4, da CRP — vicio de que igualmente enferma o Acórdão do TC n° 177/2010 de 5 de Maio — acórdão fundamento da douta sentença recorrida; II — Consequentemente, se requerendo o reenvio prejudicial ao TJCE para apreciação da existência, no caso recorrido, de uma violação aos art°s 49º, 50° n°2 alínea c) do TFUE em vigor, bem como violação, quer pela Entidade Recorrida - pela via do Regulamento impugnado nos autos — quer pela sentença recorrida, dos princípios da necessidade e da proporcionalidade descritos no n° 3, alíneas b) e c) do art° 15° da indicada Directiva Serviços n° 2006/123/CE, ex vi imposição e aplicabilidade directa, ao caso dos autos, do princípio da excepcionalidade de regimes de autorização administrativa. (art° 50 n° 2 al.c) do TFUE); III — Reenvio prejudicial que é da competência obrigatória deste V. STA, ex vi art°s 19° n° 3 al. b) do Tratado CE e art° 267° do TFUE.

IV — Sem conceder, deve ser declarada - ipso jure - a nulidade da douta sentença recorrida, bem como dos actos de cobrança que nela vêm confirmados - por evidente violação do Princípio da Legalidade, pois que tal cobrança não assenta, na realidade, em qualquer contrapartida comprovável, como tal, de serviços que, concretamente, efectivamente sejam prestados pelo ente autárquico ao particular, igualmente não assentando (a mesma cobrança) na utilização de qualquer bem público ou semi-público, assim resultando violado o princípio da equivalência jurídica (art.° 4° da RTL) — neste sentido, cfr. Ac. deste STA n° 033/10 de 2/06/2010; V - Pelo Dec. Lei n° 92/2010 de 26 de Julho (que transpõe, fora de prazo, para a ordem jurídica interna a Directiva Serviços n° 2006/123/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de Dezembro), vem determinar-se que os Princípios da Proporcionalidade, Adequação, Necessidade e Proporcionalidade em sentido restrito, bem como o Princípio da Gratuitidade, devem presidir a todo o leque de permissões administrativas para acesso ou exercício de actividades de serviços (art° 8° do citado DL.), VI - Por força do imposto pela citada Directiva, vem o Dec. Lei n° 48/2011 de 1 de Abril, designadamente no seu art° 31°, dispor no sentido da isenção de quaisquer permissões ou licenças ou autorizações administrativas para a afixação de publicidade em propriedade privada, mesmo que visível do domínio público, quando esta consista na publicitação de marcas ou sinais distintivos de comércio detidos pelos titulares ou detentores dos edifícios ou estabelecimentos onde a mesma seja colocada - vindo terminar com os regimes de permissão/autorização administrativa aplicáveis ao tipo de acto administrativo de cobrança sub judice — mas cumpre repetir que, por força da eficácia prática e aplicabilidade directa da citada Directiva, o termo de tais regimes permissivos ou autorizatórios, no direito interno, teve o fim logo a 28 de Dezembro de 2006, data da entrada em vigor daquela Directiva, nos respectivos Estados-Membros e independentemente do acto de transposição, por estarem em presença direitos e liberdades análogos a direitos fundamentais com tutela constitucional.

VII - A afixação de publicidade em causa está isenta de qualquer acto de licenciamento, permissão ou autorização administrativa, bem como do pagamento de qualquer taxa, pelo que é livre a respectiva utilização e afixação em bens imóveis de propriedade ou legítima detenção por parte dos Interessados - face à revogação sistemática da legislação anterior e / ou posterior à Directiva, se tal legislação se mostrar desconforme ao Bloco de Legalidade emergente do direito da EU, maxime da Directiva Serviços n°2006/123/CE do Parlamento Europeu e Conselho de 12 de Dezembro.

VIII - Face ao Bloco de Legalidade aplicável ao caso concreto - quer das normas do Ordenamento Comunitário, quer das normas do Ordenamento Interno àquele necessariamente subjacente - deve revogar-se a douta Sentença recorrida, por enfermar a mesma do vício de erro de julgamento em matéria de Direito, decidindo em violação do Princípio da Legalidade.” 3.

Foram apresentadas Contra-alegações pela CÂMARA MUNICIPAL DE LISBOA, com as seguintes Conclusões: “1.ª Ao contrário do pugnado pela Recorrente, para a correcta interpretação das liquidações objecto dos autos a que respeita o presente, são aplicáveis as disposições constitucionais, legais e regulamentares tidas em conta pela douta Decisão recorrida, não carecendo a questão sub judice da interpretação de quaisquer normas de Direito da União Europeia; 2.ª Mais, consideradas tais normas e o real enquadramento jurídico das liquidações, só pode concluir-se como a douta Sentença recorrida e a generalidade da jurisprudência dos nossos Tribunais superiores, pela natureza de taxa das liquidações impugnadas, consubstanciadas nos tributos devidos pela concessão de licenciamentos de publicidade, ainda que reportados a renovações automáticas, e a publicidade afixada em imóveis particulares; 3.ª- O legislador constitucional concedeu expressamente, aos municípios, um conjunto de atribuições, de entre as quais avultam, com relevo para a presente questão, o exercício de poderes tributário e regulamentar (cfr. n.° 4, do art. 238.°, § único do art. 254.° e art. 241.°, todos da CRP). Os municípios encontram-se, assim, constitucionalmente habilitados, não só a liquidarem e cobrarem as taxas que se encontrem previstas na lei, como é o caso da taxa devida pelo licenciamento de publicidade, como a definirem, de forma geral e abstracta, os termos em que o pretendem fazer.

4.ª- A afixação de mensagens publicitárias de natureza comercial, na área de cada município, depende de Licenciamento prévio da Câmara Municipal respectiva, nos termos do disposto no art. 1.º, da Lei n.° 97/98, de 17 de Agosto, diploma que regula a afixação de tais mensagens e que, para além de remeter o licenciamento da publicidade para competência municipal, atribui à mesma a definição dos critérios de licenciamento aplicáveis na área do respectivo concelho (n°2, art. 1.°); 5.ª- De acordo com o art. 3.°, da Lei n.° 53-E/2006, de 29 de Dezembro, que aprovou o Regime Geral das Taxas das Autarquias Locais, consubstanciam as mesmas tributos que assentam, para o que aqui importa, ou na utilização de bens do domínio público ou privado das autarquias, ou na remoção de obstáculo jurídico ao comportamento dos particulares, acrescendo, nos termos das alíneas b) e c), do art. 6.°, do mesmo Diploma, que as taxas municipais podem incidir sobre diferentes utilidades, prestadas aos particulares ou geradas pela actividade dos municípios, constituindo contrapartida, nomeadamente, da concessão de licenças ou da utilização e aproveitamento do bens municipais, integrantes do domínio público ou privado dos municípios; 6.ª- Por seu turno, a Lei das Finanças Locais aprovada pela Lei n.° 2/2007, de 15 de Janeiro consagra como receita municipal, em continuidade da anterior, o rendimento decorrente da cobrança de taxas proveniente da concessão de licenças, na al. c), do art. 10.º, as quais podem ser criadas nos termos definidos no já mencionado Regime Geral das Taxas das Autarquias Locais (cfr n.° 1 do art. 15.°); 7.ª- A descrita disciplina jurídica, desconsiderada pela Recorrente, faz decair toda a argumentação que apresenta, a propósito da alegada falta de sinalagmaticidade da taxa impugnada e da correspondente arguição de nulidade, esvaziando-a de qualquer conteúdo; 8.ª- Acresce, a definição de publicidade inserta na al. a), do art.º 3.º, do Código da Publicidade, a qual abrange as mensagens cuja exibição a Recorrente sujeitou a licenciamento, de acordo Com as anteditas disposições Legais e com a regulamentação da publicidade em vigor no município; 9.ª- O licenciamento da Publicidade, na cidade de Lisboa, encontra a sua sede no Regulamento de Publicidade - Edital n.° 35/92, de 19 de Março, com a redacção dos Editais n.° 42/95, de 25 de Abril e 53/95, publicados respectivamente nos Boletins Municipais n.º 16331, de 12/03/1992, 61, de 25/04/1995, e 66, de 30/05/1995, sendo as taxas concretamente aplicáveis a cada licenciamento as estabelecidas na Tabela de Taxas e Outras Receitas...

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