Acórdão nº 0696/12 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 24 de Outubro de 2012

Magistrado ResponsávelPEDRO DELGADO
Data da Resolução24 de Outubro de 2012
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo 1 – A…… melhor identificado nos autos, vem recorrer para este Supremo Tribunal da sentença do Tribunal Tributário de Lisboa de 11 de Abril de 2012, que julgou improcedente a reclamação por si deduzida contra o despacho do chefe de serviço de finanças de Lisboa 2, que indeferiu o pedido de dispensa de prestação de garantia, no âmbito de processo de execução fiscal nº 3247201001216309.

Termina as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões: I. A Meritíssima Juiz a quo julgou improcedente a Reclamação proposta pelo aqui Recorrente, por duas ordens de razões, as quais delimitam o presente Recurso.

Na verdade, e salvo o devido respeito por opinião contrária, o Tribunal a quo, ao decidir como decidiu, aplicou incorrectamente o Direito, ao ter interpretado o estatuído nos artigos 52º, 60º, 74º, 103º, todos da Lei Geral Tributária (doravante LGT), 151º, 169º, 170º, 195º, 199º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (doravante CPPT), 8.º do Código do Procedimento Administrativo, concomitantemente com a análise da jurisprudência dos Tribunais Superiores, os quais têm decidido num sentido mais favorável ao contribuinte.

  1. Igualmente considera o Recorrente que a ordem escolhida pela Meritíssima Juiz o quo, para elaboração da sentença ora colocada em crise, foi escolhida de forma invertida, isto porque, quer aquando a Reclamação proposta, quer ao nível da análise da própria questão controvertida, importará, primeiramente, apreciar das questões relacionadas com as invocadas preterição de observância de formalidade legais, e só depois, se aí tiver cabimento, apreciar a questão relacionada com os motivos que sustentaram o pedido de isenção de prestação de garantia.

  2. O mesmo equivalerá a dizer que primeiro dever-se-á discutir as questões de forma, e depois, caso não padeçam de nenhuma ilegalidade, aí sim, apreciar do mérito, das questões relacionadas com a substância.

    Em face do exposto, e tendo sempre em atenção a delimitação do presente recurso, as conclusões de recurso irão seguir a seguinte ordem: - Saber se relativamente ao acto de dispensa de prestação de garantia, se impunha ou não, a audiência prévia do interessado, ora Recorrente; - Saber se se verificam os pressupostos para o preenchimento dos requisitos para a efectivação da dispensa de prestação de garantia.

  3. O Recorrente esclarece que, desde a notificação do despacho alvo da Reclamação, que tem efectuado todos os pagamentos prestacionais, como se a isenção de prestação de garantia tivesse fico aceite. Com isto, o Recorrente quer demonstrar que não utilizou a Reclamação, nem o presente recurso, como expediente dilatório para retardar o pagamento da dívida.

  4. O Recorrente pretende apenas ver reconhecido como aplicável, o Direito que alegou. O direito que o Recorrente exerceu — Reclamação — advêm do estatuído no disposto no artigo 276º do CPPT, sendo que, foi o próprio Chefe do Serviço de Finanças Lisboa 2, no seu despacho datado de 25-10-2011, que notificou o Executado dessa mesma possibilidade.

  5. Ora, o aludido artigo (276º do CPPT) estatui a garantia dos interessados no direito de reclamação dos actos materialmente administrativos praticados pelos órgãos da Administração Tributária.

  6. Pese embora o processo de execução fiscal tenha natureza judicial, não podemos esquecer que os órgãos da Administração Tributária têm participação nos actos que não tenham natureza jurisdicional.

  7. Ora, é precisamente este o motivo que permitiu ao Recorrente efectuar a Reclamação do acto administrativo, praticado pelo Chefe do Serviço de Finanças 2, o qual indeferiu a isenção de prestação de garantia.

  8. Estamos verdadeiramente, perante uma defluência da norma consagrada constitucionalmente, a qual, garante a todos os cidadão, o direito de recorrer à impugnação contenciosa de todo e qualquer acto da administração que lese os seus direitos e interesses — artigo 268.º, nº 4, da Constituição da República Portuguesa (adiante apenas designada por CRP).

  9. Como referido, o ora Recorrente, deduziu Reclamação do despacho do Chefe do Serviço de Finanças Lisboa 2, datado de 25-10-2011, por o mesmo ter indeferido o pedido formulado para obter a dispensa de prestação de garantia, pedindo a sua anulação, por ter sido omitida a formalidade essencial de audição prévia, considerando ainda que se verificavam preenchidos os requisitos para a aludida dispensa, porquanto, a Autoridade Tributária dispunha de todos os elementos tendentes à prova do preenchimento daqueles requisitos.

  10. Em face disto, considera o Recorrente que a circunstância da Administração Tributária ter omitido a audiência prévia do interessado no acto de indeferimento do pedido de dispensa de prestação de garantia deveria ter sido avaliada, pois, sendo aquela devida, o interessado foi castrado no seu direito de poder, posteriormente, fazer a prova que a Administração Tributária considerou como não feita.

  11. Mais considera o Recorrente que, o despacho reclamado, não é precedido de nenhuma outra notificação para que, querendo, pudesse exercer o seu direito de audição prévia, sobre qualquer projecto de despacho, reclamado com o pedido de dispensa de prestação de garantia que havia apresentado. Pois, não podemos descurar o Princípio que consagra a participação dos administrados na formação das decisões em que são directamente interessados.

  12. De resto, tal Principio encontra-se consagrado na previsão do artigo 60º., nº 1, da LGT: “A participação dos contribuintes na formação das decisões que lhes digam respeito pode efectuar-se, sempre que a lei não prescrever em sentido diverso, por qualquer das seguintes formas: (...)”.

    E, será através do estatuído na alínea b) do referido normativo legal, que o direito do Recorrente encontra acolhimento: “Direito de audição antes do indeferimento total ou parcial dos pedidos, reclamações, recursos ou petições”.

  13. Mas mais, este direito de participação tem quer consagração constitucional (artigo 267º. da CRP), quer no código de Procedimento Administrativo (Cfr. Artigo 100º.).

  14. Ora, como a dispensa de audição prévia do aqui Recorrente só seria legalmente admissível se a decisão do pedido efectuado fosse favorável ao mesmo, tal como previsto no nº 2 do artigo 60º da LGT, a Administração Tributária, ao agir como agiu, preteriu formalidades essenciais, querendo o mesmo significar que, ou não existiu projecto de decisão, ou ao existir, não foi concedido ao Executado o direito de se pronunciar sobre a decisão.

  15. Por tudo quanto vem sido dito, considera o Recorrente que o despacho reclamado é ilegal, quer por violação do disposto no artigo 60º., nº 1, da LGT, quer por violar um Principio constitucional, reconhecido aos interessados na condição de administrados.

  16. Chegados aqui, e atentas as razões aduzidas pela Autoridade Tributária na sua Resposta, bem como a fundamentação da sentença proferida pelo Tribunal a quo, afigura-se como necessário analisar a natureza jurídica do acto que decide isentar, ou não, a prestação de garantia.

  17. O Recorrente concorda em absoluto com a fundamentação de Direito utilizada pela Meritíssima Juiz no âmbito do processo nº 204/12.3BELRS, que corre os seus termos na 1ª Unidade Orgânica do Tribunal Tributário de Lisboa.

  18. No aludido aresto poder-se-á ler que, a decisão que incida sobre a dispensa de prestação de garantia, produz, por si só, efeitos jurídicos, nomeadamente a da não suspensão do processo de execução, preenchendo, por isso, o conceito de acto administrativo, e serem, por esse motivo, aplicáveis as normas atinentes ao procedimento administrativo, e, especificamente, as respeitantes ao processo tributário porquanto, “qualquer tomada de decisão administrativa tem sempre subjacente um procedimento administrativo, ainda que abreviado, nos termos do disposto no artigo 267., n.º 5 da Constituição da República Portuguesa, e do artigo 1º do Código de Procedimento Administrativo”.

  19. Esta conclusão deriva da análise efectuada na aludida sentença de que: “O acto administrativo, é nos termos do artigo 120º do Código do Procedimento Administrativo, para efeitos de aplicação daquele código, «as decisões dos órgãos da Administração que ao abrigo de normas de direito público visem produzir efeitos jurídicos numa situação individual e concreta”. É certo que o processo de execução fiscal é um processo de natureza jurisdicional, como dispõe o artigo 103º da Lei Geral Tributária, onde logo se lê «sem prejuízo da participação dos órgãos da administração tributária nos actos que não tenham natureza jurisdicional», donde se retira a conclusão, que não é pelo facto de o processo de execução fiscal ter natureza judicial que não podem ser praticados, na respectiva tramitação, actos de natureza administrativa”.

  20. No que tange à questão sobre a indispensabilidade de audiência prévia à decisão de dispensa de garantia, já o Supremo Tribunal Administrativo respondeu, no seu Douto Acórdão nº 01072/11 de 14/12/2011: “Como decorre do disposto no art. 103º da LGT, e tem sido repetidamente afirmado pela jurisprudência deste STA, o processo de execução fiscal tem natureza judicial, na totalidade, e embora a AT nele passa praticar actos que não tenham natureza jurisdicional é garantido aos interessados o direito de reclamação para o juiz da execução fiscal dos actos materialmente administrativos aí praticados por órgão da AT”.

  21. “Entre os actos que podem ser praticados pela AT no processo de execução fiscal inclui-se a suspensão da execução após prestação de garantia, nos casos enunciados nos arts. 52º da LGT e 169º do CPPT, bem como a decisão sobre a dispensa de prestação dessa garantia, nos casos previstos na lei (nºs 3 a 6 do citado art. 52º da LGT e art. 170º do CPPT”.

  22. “No caso, o acto reclamado substancia-se, precisamente, no indeferimento, por parte do órgão de execução fiscal, de pedido de dispensa de reforço (no montante de 406.950,06 Euros) de garantia, nos termos do art...

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