Acórdão nº 0565/12 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 09 de Outubro de 2012

Magistrado ResponsávelPOLÍBIO HENRIQUES
Data da Resolução09 de Outubro de 2012
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo 1. RELATÓRIO O Estado Português e a Administração Regional de Saúde do Norte, IP recorrem para este Supremo Tribunal da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo do Círculo de Lisboa, a fls. 938-969, que julgando parcialmente procedente a acção intentada contra eles por A…… e B……, os condenou, solidariamente, a pagar: - à autora A.….. a quantia de € 231 816,34,a título de danos patrimoniais e a quantia de € 22 500,00, a título de danos não patrimoniais, e nos juros de mora vincendos, a contar desta data, à taxa legal de 4% ao ano; - ao autor B……. a quantia de € 61 512,80, a título de danos não patrimoniais, e a de € 15 000,00, a título de danos não patrimoniais, e nos juros de mora vincendos, a contar desta data, à taxa legal de 4% ao ano.

1.1. O Estado apresenta alegações com as seguintes conclusões: 1- Vem o presente recurso interposto da, aliás, douta sentença que julgou parcialmente procedente, por provada a presente acção, instaurada por A……e B……, e que condenou este, solidariamente, por danos patrimoniais e por danos morais.

2 - Tais montantes resultariam da alegada efectiva responsabilidade civil extracontratual por facto ilícito e teriam na sua génese a prolação de dois despachos, pela então Ministra da Saúde, através dos quais aplicou a pena de demissão da função pública, aos AA.

3- Tendo o 2° A. optado por não ser reintegrado na função pública, numa manifestação de vontade que só ao mesmo respeita, nunca poderá ser tal atitude assacada ao R. — Estado Português, obrigando-o ao cumprimento de um dever de indemnizar.

4- Nunca ao R. - Estado Português poderá ser imputada a responsabilidade pela divulgação pela comunicação social de noticias que alegadamente terão causados danos morais aos AA..

5- Inexiste qualquer nexo de causalidade entre uma decisão de demissão da função pública dos AA., datada de 27.02.1987, e o facto de os AA., não terem tido filhos, ou se terem divorciado, divórcio esse decretado por sentença, em 07.02.2000.

6- Estando assim excluída toda a responsabilidade do R. — Estado Português que, supostamente, pudesse dar origem a obrigação de indemnizar, por danos morais.

7- Só há responsabilidade civil por factos ilícitos quando se encontrem provados os pressupostos dessa responsabilidade, quais sejam o facto, a ilicitude, a culpa, a existência de um dano, e o nexo de causalidade entre a conduta e o dano.

8- Para que haja responsabilização da Administração por danos materiais e morais resultantes de actos culposos dos seus agentes impõe-se que haja negligência destes, traduzida em acção ou omissão imputável ao exercício da função pública.

9 - Tal, não acontecendo, não se mostra preenchido o pressuposto relativo à ilicitude.

10- Nos termos do n° 1 do art° 4° do D.L. n°48 051, de 21.11.1967, a culpa dos titulares do órgão ou dos agentes é apreciada nos termos do art° 487° do C.C..

11 - Para que o facto ilícito gere responsabilidade, é necessário que o autor tenha agido com culpa, não bastando reconhecer que ele procedeu objectivamente mal.

12 - Na tramitação do processo disciplinar, que culminou com a aplicação da pena de demissão aos aqui AA., inexiste qualquer elemento fáctico que nos permita concluir pela existência do elemento culpa.

3 - E, não ocorrendo culpa - nem ilicitude - e só existindo responsabilidade civil por factos ilícitos quando se encontrem provados os pressupostos dessa responsabilidade, cumulativos, inexistindo um requisito que seja, inexiste responsabilidade civil, por parte do R. — Estado Português.

14- A douta sentença recorrida é nula, padecendo de erro de fundamentação, erro de julgamento e absoluta falta de motivação, violando, por isso, o disposto no artigo 668.°, n.° 1, alínea b), do Código de Processo Civil.

15 - Pelo que não deve o R. - Estado Português ser condenado ao pagamento seja de que importância for, a titulo de indemnização aos ora AA..

16 - Pelo exposto, deverão V. Exas., Colendos Conselheiros, substituir a aliás douta sentença ora em crise, por outra que absolva o R. — Estado Português do pedido.

1.2. Por sua vez, a Administração de Saúde do Norte, apresentou alegações com as seguintes conclusões: 1- A ilicitude e a culpa são dois pressupostos autónomos da responsabilidade civil extracontratual e à verificação de um, a ilicitude (que pode bastar para anular um acto administrativo e, em consequência, implicar vários efeitos, bem como dar lugar a um processo de execução de sentença administrativa) não se segue necessariamente que se verifique o outro; 2 - Com efeito, «… a culpa comporta um juízo de censura e representa, por isso algo mais do que a mera constatação da ilegalidade. Ademais, sendo a culpa aferida pela diligência de um funcionário médio (por adaptação do conceito de bonus pater famílias), dificilmente se compreenderia que esse funcionário incorresse em conduta culposa sempre que se tivesse limitado a adoptar, na apreciação do caso concreto, uma das soluções plausíveis de direito» (in op. cit).

3- No caso dos autos não há qualquer elemento de facto que consubstancie o pressuposto culpa da Administração (e a factualidade praticada pelos lesados geradora de todo o processo seria, hoje, salvaguardo o anacronismo, gravemente ilegal e censurável); 4- E a anulação do acto, confirmada pelas instâncias legais, não estabelece um comportamento materialmente autónomo dos actos jurídicos invalidados que possa consubstanciar o pressuposto culpa; 5- Nos termos das normas do art 464º do Código Civil, a obrigação de indemnizar não pode abranger danos aleatórios e imprevisíveis, como o são a prestação por um médico de trabalho extraordinário e intervenção em Juntas Médicas; nem podem ser considerados danos inelutáveis, que devam ser ressarcidos independentemente de qualquer prestação material; 6- Não podem relevar danos que tenham sido causados por factos pessoais do próprio lesado, sendo de desatender os danos inerentes a uma promoção profissional que o lesado desistiu de alcançar, quando era alcançável, como sucedeu no caso análogo da outra lesada; 7 - Com efeito, porque o lesado não concorreu ao concurso habilitacional - concurso autónomo por relação à relação de emprego e a que poderia concorrer para obtenção do grau de consultor - para assim aceder como sucedia ao tempo, automaticamente, à categoria seguinte, de assistente graduado, unicamente porque não quis, em acto voluntário, não pode integrar na sua esfera jurídica o direito a ser indemnizado como se tivesse acedido a essa categoria profissional: 8 - Não podia o Tribunal a quo deixar de atender ao contributo dos lesados para a causação da lesão, que pela forma como se comportaram, «justificando» as faltas um do outro, em intervenção recíproca, se puserem incursos num comportamento hoje eticamente censurável.

9- E não pode haver danos morais quando a situação de constrangimento criada teve contributo dos próprios lesados; e muito menos em valores que constituem um claro favorecimento dos próprios lesados; 10- A presente acção ser julgada improcedente, por falta do elemento ‘culpa’ da Administração, indispensável à verificação da responsabilidade civil extracontratual», por errada consideração da extensão dos danos indemnizáveis, por errada consideração de um pressuposto, pessoal, de evolução da carreira de um dos lesados, e por inconsideração do contributo dos lesados para a causação do dano.

11- Ao julgar como o fez, violou a couta sentença recorrida as normas dos arts 483°/1 e 487° do Código Civil e art 4° do Decreto-Lei n°48051, de 21-11-1967, então aplicável, bem como as normas dos arts 564° e 570º do Código Civil; 12 - Com efeito, o Tribunal não pode condenar a Administração sem o estabelecimento claro de factos que consubstanciem a culpa dos agentes intervenientes, nem estender os danos a domínios do imprevisível e do indeterminável para a obrigação de indemnizar.

Termos em que, e nos melhores da douta ponderação de V. Exas, na atendibilidade das enunciadas conclusões, e no seu objecto, deve proferir-se acórdão que revogue a decisão recorrida, com as legais consequências.

Assim se fazendo JUSTIÇA! 1.3. Os autores, ora recorridos, contra - alegaram, concluindo: I. Importa apenas apurar a responsabilidade das Recorrentes pelos seus actos ilícitos, culposos e danosos e quantificar o valor dos danos a ressarcir aos Recorridos.

  1. Os factos dados como provados são todos os constantes dos Factos Assentes (Factos Assentes de A a AJ) e as respostas dadas pelo Tribunal aos Quesitos 1 a 26, designadamente os factos considerados provados constantes dos Quesitos 3, 6 e 7, 9 e 10, 11 a 13 (na redacção do tribunal), 14, 15 (na redacção do tribunal), 16 a 18, 19 (na redacção do tribunal), 20 a 26 — Factos Provados n.°s 1 a 54; III. Os Recorridos lograram fazer toda a prova dos factos cujo ónus recaía sobre si: os factos que estão na base dos vários pressupostos da responsabilidade extracontratual da Administração por actos ilícitos: o acto ilícito e culposo, os danos e o nexo de causalidade entre os actos e os danos, naqueles se incluindo os danos materiais e os morais.

  2. Alguns factos não se conseguiram provar por evidente falta do dever de colaboração da Administração, pois foram pedidas as informações e elas não chegaram, apesar de várias insistências do próprio Tribunal, o que deve ser tido em consideração; V. Estamos no âmbito da responsabilidade extracontratual da Administração por actos ilícitos, pelo que devemos ter em conta o artigo 22° da Constituição os artigos 1° a 7° do DL 48.051, os artigos 483° e seguintes do Código Civil, aplicados com as necessárias adaptações, e a jurisprudência pacifica e continuada dos nossos tribunais em aplicação desses normativos, considerando que os factos ocorreram entre Abril 1987 e Dezembro 1996, razão porque não será aqui aplicável a legislação que entretanto foi publicada e que veio substituir...

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