Acórdão nº 0489/12 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 23 de Maio de 2012

Magistrado ResponsávelFRANCISCO ROTHES
Data da Resolução23 de Maio de 2012
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)
  1. RELATÓRIO 1.1 A…… (adiante Executado, Reclamante ou Recorrido), invocando o disposto no arts. 276.º e 278.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), reclamou para o Juiz do Tribunal Tributário de Lisboa da decisão do Chefe do Serviço de Finanças de Lisboa - 2 que lhe indeferiu o pedido de dispensa de garantia formulado em ordem à suspensão do processo de execução fiscal que aí corre termos contra ele e na sequência do deferimento do pagamento em prestações no processo .

1.2 A Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Lisboa julgou a reclamação procedente e, em consequência, anulou o acto reclamado.

Para tanto, em síntese, tendo enunciado como primeira questão a apreciar e decidir a de «[s]aber se relativamente ao acto de dispensa de prestação de garantia se impunha a prévia audiência do interessado», considerou que aquele acto enferma de vício de forma por preterição de formalidade essencial, a determinar a sua anulação, na medida em que não foi precedido da notificação do Executado para, querendo, exercer do direito de audiência previamente à decisão sobre o pedido de dispensa de garantia, como o impunha o disposto no art. 60.º da Lei Geral Tributária (LGT) e no art. 100.º do Código do Procedimento Administrativo (CPA).

1.3 A Fazenda Pública (adiante também Recorrente) não se conformou com essa sentença e dela interpôs recurso para este Supremo Tribunal Administrativo, apresentando com o requerimento de interposição do recurso as respectivas alegações, que resumiu em conclusões do seguinte teor: « A) Por muito respeito que mereça o vertido na decisão a quo, com a mesma não se pode, de modo algum concordar, B) Pelo que com o devido respeito, bastaria que fosse dada uma maior acuidade ao escopo do vertido nos arts. 54.º, 60.º,103.º, todos da LGT, dos arts. 89.º, nº. 1, 151.º, n.º 2 do art. 169.º, n.º 3 e 4 do art. 170.º e n.º 2 do art. 198.º todos do CPPT e art. 100.º do CPA conjugadamente com a mais recente Jurisprudência dos nossos Tribunais superiores, mormente do nosso Supremo Tribunal Administrativo, para que, se pudesse aquilatar pela improcedência da Reclamação aduzida pelo Recorrido/Reclamante, maxime, para que melhor se pudesse aferir pela inexistência de um qualquer vício de preterição da formalidade essencial sub judice.

  1. Pelo que, in casu a Recorrente, conclui não ter razão o Tribunal a quo, que julgou num determinado sentido que, perante a mais recente Jurisprudência do Tribunais superiores e com os elementos constantes dos autos, não tem a devida correspondência com o modo como as normas que constituem o fundamento jurídico da decisão a quo deveriam ter sida interpretadas e aplicadas.

  2. Na douta decisão sub judice o respeitoso areópago a quo julgou procedente a reclamação apresentada pelo ora Recorrido/reclamante tendo, consequentemente, determinado a anulação do despacho do órgão da execução fiscal que indeferiu o pedido de dispensa de prestação de garantia formulado pelo aqui Recorrido, por entender ter o dito despacho sido proferido com preterição de formalidade legal (in casu a preterição de audiência prévia do reclamante, à decisão de dispensa de prestação de garantia) mais concretamente a prevista no art. 60º da LGT.

  3. Ora, salvo o devido respeito por opinião contrária, entende a Fazenda Pública que o citado normativo legal não é aplicável em sede de execução, maxime, antes da decisão que recaia sobre um pedido de dispensa da prestação de garantia formulado pelo executado/recorrido, tal como sucedeu no caso vertente F) A questão essencial com a qual a Fazenda Pública, respeitosamente, discorda com a forma como foi interpretada pelo areópago a quo, reconduz-se a saber se no âmbito de um processo de execução fiscal – maxime, tal como no caso vertente antes da decisão do órgão da execução fiscal que recaia sobre um pedido de dispensa prestação de garantia formulado pelo executado – é aplicável o direito de participação previsto no art. 60 da LGT, tal como foi asseverado pelo areópago a quo.

  4. Para tanto, consta vertido na douta decisão recorrida, na sua “Fundamentação de Direito”, relativamente ao tema da preterição de audiência prévia do ora Recorrido/reclamante, uma análise relativamente à natureza jurídica do acto que decida a dispensada prestação de garantia: - “...é certo que o processo de execução fiscal à um processo de natureza jurisdicional, como dispõe o art. 103º da Lei Geral Tributária, onde logo se lê “sem prejuízo da participação dos órgão da administração tributária nos actos que não tenham natureza jurisdicional”, donde se retira a conclusão, que não é pelo facto de o processo de execução fiscal ter natureza judicial que não podem ser praticados, na respectiva tramitação, actos de natureza administrativa.

    Sendo certo que a decisão que incida sobre a dispensa da prestação de garantia, produz por si só efeitos jurídicos, nomeadamente a não suspensão do processo de execução fiscal, preenche-se o conceito de acto administrativo, e bem assim, são-lhe aplicáveis as normas respeitantes ao procedimento tributário, pois que qualquer tomada da decisão administrativa tem sempre subjacente um procedimento administrativo, ainda que abreviado, nos termos do disposto no art. 267. n.º 5 da Constituição da República Portuguesa, e do art. 1.º do Código de Procedimento Administrativo.

    ” H) No que tange à questão da indispensabilidade de audiência prévia à decisão de dispensa de prestação de garantia, o Tribunal a quo alicerçou-se, mutatis mutandis no teor do vertido no douto Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo n.º 01072/11 de 14.12.2011 o qual, por economia processual, se dá aqui por vertido para os devidos efeitos, I) Nesta senda, com base na tese sufragada naquele douto Acórdão do STA, o Tribunal a quo, com o devido respeito, erradamente considerou que “…conforme resulta da jurisprudência transcrita, dúvidas não restam que no caso das presentes autos, como no caso do Acórdão, era devida a audiência do interessado prévia à decisão, pois que aquele podia ainda, em face do projecto de decisão, vir juntar os elementos consideradas em falta para fazer a prova, que se revelou, para a decisão administrativa, insuficiente”.

  5. Todavia, a aqui Recorrente, tal como infra melhor se explanará, alicerça-se na mais recente jurisprudência do nosso Supremo Tribunal Administrativo, mormente no seu mui douto Acórdão de 7 de Março de 2012, no âmbito do Proc. 0185/12, o qual, mutatis mutandis, serviu para que a Fazenda Pública pudesse aferir no sentido de que a douta decisão a quo enferma de errada interpretação e aplicação do direito.

  6. Também no sentido favorável da posição assumida pela Fazenda Pública no caso vertente, com outro tipo de fundamentação, encontramos os doutos Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 7/12/2011, no rec. nº 01054/11 e o Acórdão de 23.02.2012 no Proc. 059/12.

  7. Aliás, nos presentes autos, também a Digníssima Magistrada do Ministério Público que teve vista no processo emitiu um parecer no sentido da improcedência da reclamação apresentada pelo Recorrido/reclamante, com os fundamentos do seu douto parecer de fls.105 a 108 do processo em apreço.

  8. O normativo legal (art. 60º da LGT) encontra-se previsto no Capítulo 1 do Título III da LGT referente às regras gerais do procedimento tributário.

  9. Como resulta do disposto al. h) do n.º 1 do art. 54º da LGT “O procedimento tributário compreende toda a sucessão de actos dirigida à declaração de direitos tributários, designadamente (…) a cobrança das obrigações tributárias, no parte que não tiver natureza judicial” O) Sendo que, naquele diploma legal, o art. 103º preceitua que “O processo de execução fiscal tem natureza judicial, sem prejuízo da participação dos órgãos da administração tributária nos actos que não tenham natureza jurisdicional”.

  10. Em face do teor dos citados normativos legais revela-se imperioso concluir que o processo de execução fiscal não pode ser qualificado como um “procedimento”, antes deve ser entendido como um “processo judicial”, e, assim sendo, forçoso se torna concluir que o referido normativo legal não pode ser aplicado no âmbito processual.

  11. Pela sua pertinência, e para que melhor fique cimentada a posição aqui defendida pela Fazenda Pública, é sobejamente pacífico que inexiste norma que determine, de forma geral, a aplicação do princípio da participação dos interessados (mediante audiência prévia) no âmbito da execução fiscal, com a devida salvaguarda da excepção prevista no art. 23.º, n.º 4 da LGT.

  12. Aliás, aquela referida excepção plasmada no art. 23.º, n.º 4 da LGT) vem, em bom rigor, confirmar a regra: De que de que tal direito de audição prévia às decisões proferidas, não é, salvo disposição expressa ao, contrário, aplicável no seio do processo de execução fiscal S) Ainda que se entenda que, não obstante a natureza judicial do processo de execução fiscal, os actos praticados pelo órgão da execução fiscal têm natureza administrativa, as normas legais que lhe são aplicáveis são apenas as respeitantes a esse mesmo processo e não as previstas para todo e qualquer procedimento tributário, que, como se referiu, o próprio legislador teve o cuidado de, expressamente, excluir no art. 54º, nº. 1, al. h) da LGT.

  13. Em face do sobredito, não sendo aplicável o dito normativo legal, nem existindo comando legal que imponha tal direito de participação previamente à decisão sobre a dispensa da prestação de garantia, é forçoso coligir que tal formalidade legal não foi preterida no caso sub judice.

  14. O respeitoso areópago a quo ao decidir de forma diversa, levou a que, com o devido respeito, a douta decisão a quo enferme da errada interpretação e aplicação do direito.

  15. Consequentemente, in casu, nenhum vício foi praticado pelo Chefe do 2º serviço de Finanças de Lisboa, no despacho proferido em 26 de Outubro de 2011.

  16. O âmago da temática em análise no caso vertente, consiste em determinar se aos actos praticados na execução fiscal são aplicáveis as normas do procedimento...

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