Acórdão nº 0892/12 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 12 de Setembro de 2012

Data12 Setembro 2012
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1541_01,Supremo Tribunal Administrativo (Portugal)
  1. RELATÓRIO 1.1 O “A………, S.A.”, credor reclamante num processo de execução fiscal (adiante Credor reclamante, Reclamante ou Recorrido), veio junto do Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga reclamar ao abrigo do disposto nos arts. 245.º, n.º 3, e 276.º a 278.º, do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), da decisão do Chefe do Serviço de Finanças de Valença, que procedeu à verificação dos créditos reclamados e sua graduação com o crédito executado.

    Sustentou, em síntese, que aquela decisão (i) enferma de nulidade por falta de fundamentação; (ii) enferma de nulidade por não ter sido observado o disposto no art. 866.º do Código de Processo Civil (CPC), uma vez que não foi notificado das demais reclamações deduzidas nos autos; (iii) fez errada interpretação e aplicação da lei ao não ter reconhecido a totalidade dos créditos reclamados pelo Reclamante e ao ter reconhecido (e graduado) créditos fiscais provenientes de Imposto Municipal sobre Imóveis que, por não respeitarem o lapso temporal previsto no art. 744.º do Código Civil, não beneficiam de privilégio imobiliário especial.

    1.2 O Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga julgou a reclamação judicial procedente. Isto, em síntese, porque, entendendo conhecer prioritariamente da questão da invocada falta de notificação ao Credor reclamante dos demais créditos reclamados, considerou que a omissão dessa formalidade – imposta na lei (art. 866.º do CPC, aplicável ex vi do art. 246.º do CPPT) e susceptível de influir na decisão a proferir – constitui nulidade, a determinar a anulação de todos os actos praticados ulteriormente, inclusive a decisão reclamada, tudo nos termos do art. 201.º do CPC. Em consequência, considerou prejudicado o conhecimento das demais questões suscitadas.

    1.3 A Fazenda Pública não se conformou com essa sentença e dela recorreu para este Supremo Tribunal Administrativo, apresentando com o requerimento de interposição do recurso a respectiva motivação, que resumiu em conclusões do seguinte teor: « 1. A questão a decidir nos presentes autos consiste em saber se o órgão da execução fiscal, no âmbito da verificação e reclamação de créditos (artigo 245.º do CPPT) está obrigado a notificar o reclamante, nos termos do disposto no artigo 866.º do CPC, ex vi do artigo 246.º do CPPT, ou se, pelo contrário, havendo reclamações de créditos ou juntas as certidões de dívida referidas no artigo 241.º do CPPT, procede de imediato à verificação e graduação de créditos, dela notificando todos os credores que reclamaram créditos.

  2. A sentença recorrida considerou que, não obstante as alterações legislativas introduzidas pela Lei n.º 55-A/2010, de 31/12, aos artigos 97.º n.º 1 o), 151.º n.º 1, 243.º, 245.º e 278.º, todos do CPPT, a referida Lei manteve inalterado o artigo 246.º do CPPT, que estipula que, nas reclamações de créditos, observar-se-ão as disposições do Código de Processo Civil e que o órgão de execução fiscal, ao proferir a decisão de verificação e graduação de créditos, sem dar conhecimento ao credor reclamante dos outros créditos verificados e graduados, nomeadamente pertencentes à Fazenda Pública, omitiu uma formalidade que a lei prescreve (artigo 866.º do CPC) e que tem influência na decisão da causa.

  3. Ressalvado o devido respeito que nos merece, entendemos que a douta sentença padece de erro de julgamento decorrente de uma incorrecta interpretação e aplicação da norma contida no artigo 245.º, n.ºs 2 e 3, do CPPT.

  4. Atendendo aos princípios que regem a interpretação das leis, consagrados no artigo 9.º do Código Civil (CC), e à dupla função contida na letra da lei, como ponto de partida e limite da interpretação (cfr. nº 2 do art. 9.º do CC), diremos que do teor literal da norma se extrai a obrigação legal do órgão de execução fiscal, havendo reclamações de créditos ou tendo sido juntas as certidões de dívidas referidas no artigo 241.º do CPPT, proceder à verificação e graduação de créditos, dela notificando todos os credores que reclamaram créditos.

  5. De acordo com o n.º 3 da referida disposição legal, os credores podem reclamar da verificação e graduação de créditos nos termos e prazos previstos nos artigos 276.º e seguintes.

  6. Resulta da interpretação da letra da lei (elemento literal), no sentido que, a nosso ver, mais adequadamente exprime a motivação do legislador, que o órgão da execução fiscal procede à verificação e graduação de créditos imediata e subsequentemente à apresentação das reclamações e junção das certidões referidas no artigo 241.º do CPPT, sem prévia notificação dos credores reclamantes e do executado para a impugnação dos créditos reclamados, a que se refere o art. 866.º do CPC.

  7. A solução oposta, no sentido de que o órgão de execução fiscal deve dar cumprimento ao disposto no art. 866.º do CPC, ex vi do art. 246.º do CPPT (não alterado pela Lei n.º 55-A/2010, de 31/12), parece-nos, com o devido respeito, que muito dificilmente se poderá compatibilizar, por um lado, com as notificações a efetuar pela secretaria do tribunal, nomeadamente ao exequente, e bem assim com a possibilidade deste poder impugnar as reclamações, atendendo a que o exequente é o próprio órgão de execução fiscal.

  8. Por outro lado, e principalmente, tal solução não se coaduna com a natureza jurisdicional do julgamento, no caso de a verificação de algum dos créditos impugnados depender de produção de prova, o qual seguirá o regime aplicável ao processo sumário de declaração, conforme determina o artigo 868.º do CPC.

  9. A aplicação do art. 866.º do CPC poderá, neste sentido, configurar uma ilegalidade, por violação do disposto no n.º 2 do artigo 202.º da CRP, atento o âmbito da função jurisdicional dos tribunais nela consagrado, nomeadamente a competência para dirimir os conflitos de interesses públicos e privados, atinentes à verificação dos créditos impugnados, pelo órgão de execução fiscal.

  10. As alterações introduzidas pela Lei n.º 55-A/2010, de 31/12, aos artigos 97.º n.º 1 o), 151.º n.º 1, 243.º, 245.º e 278.º do CPPT, não obstam a que, a final, em caso de reclamação do ato do órgão de execução fiscal, a decisão da verificação e graduação de créditos caiba ao tribunal, como expressamente resulta do disposto no artigo 247.º do CPPT.

  11. Com efeito, de acordo com o disposto no n.º 1 daquele artigo 247.º do CPPT, Os processos que tiverem subido ao tribunal tributário de 1.ª instância, em virtude de reclamação da decisão do órgão da execução fiscal, para a decisão da verificação e graduação de créditos, são devolvidos ao órgão da execução fiscal após o trânsito em julgado da decisão, sendo também ao tribunal a quem compete a liquidação, nos termos do n.º 2 do referido artigo (sublinhado nosso).

  12. A respeito da competência para conhecer da matéria relativa à verificação e graduação de créditos, o STA já se pronunciou em diversos e recentes acórdãos, de que se dá como exemplo o proferido no recurso n.º 0362/11, cuja jurisprudência foi uniformemente seguida nos posteriores arestos, no sentido de que as alterações introduzidas pela Lei n.º 55-A/2010, de...

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