Acórdão nº 443/09.4PEOER.L1-5 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 03 de Julho de 2012

Magistrado ResponsávelNETO DE MOURA
Data da Resolução03 de Julho de 2012
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam, em conferência, na 5.ª Secção (Criminal) do Tribunal da Relação de Lisboa I - Relatório No âmbito do processo comum que, sob o n.º 443/09.4 PEOER, corre termos pelo 2.º Juízo de Competência Criminal do Tribunal da Comarca de Oeiras, mediante acusação do Ministério Público que lhe imputou a prática, em autoria material e em concurso real, de três crimes de furto qualificado, sendo dois deles previstos e puníveis pelos artigos 203.º, n.º 1, e 204.º, n.

0s 1, al. a), e 2, al. e), e o terceiro pelos artigos 203.º, n.º 1, e 204.º, n.º 2, al. e), todos do Código Penal, foi submetido a julgamento, por tribunal colectivo, A..., melhor identificado nos autos.

Realizada a audiência, com documentação da prova nela oralmente produzida, por acórdão de 10.11.2011 (fls. 394 e segs.), foi a acusação julgada totalmente improcedente e o arguido absolvido dos crimes que lhe eram imputados.

Inconformado, o digno magistrado do Ministério Público no tribunal recorrido interpôs recurso do acórdão absolutório para este Tribunal da Relação, definindo o seguinte quadro conclusivo (em transcrição integral): 1. «Foram incorrectamente julgados os factos a seguir indicados, que o Tribunal a quo teve por não provados: "

  1. Tenha sido o arguido A...

    o autor dos furtos praticados nos dias 8-06-09, 25-9-09 e 14-10-09, supra descritos em 20, 60, 7°, 10°, 11° e 12° dos factos assentes; b) Consequentemente, Não Provado que o arguido quis integrar no seu património os bens móveis que encontrou nas residências acima citadas, tendo para tanto arrombado as respectivas portas de entrada, o que logrou, apesar de saber que tais objectos não lhe pertenciam e que actuava contra a vontade dos respectivos proprietários, e que em todas as ocasiões agiu livre, deliberada e conscientemente, não ignorando que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei".

    1. Qualquer deles deveria ter sido acolhido como demonstrado em julgamento, assim o impondo a conjugação das provas elencadas seguidamente: a) Das imagens documentadas e que revelam muito claramente ser o arguido que ali aparece (confronto de fls. 34, de fls. 94 a 100 com fls. 102 e 253/254 com fls. 257 e o saco apreendido ao arguido de fls. 259 onde foram encontradas diversas ferramentas). Na verdade, as imagens não revelam só, salvo o devido respeito, "semelhanças ao nível da fisionomia do corpo com o do arguido, ambos altos e magros, e ambos com cabelo parcial/calvicie, da mera análise das mencionadas fotografias", elas revelam com um grau de certeza e segurança muito elevado tratar-se do arguido (como, aliás, referiu a entidade policial nas diversas informações prestadas) pela tipologia do seu crânio, olhos, nariz, testa e cabelo, corroborado pelo tipo do corpo (de tal forma que a advogada do arguido impugnou a sua utilização em julgamento, a fls. 378 dos autos, não certamente pelo seu carácter inócuo ... ). E também aqui se o Tribunal Colectivo tinha alguma dúvida sobre as datas das recolhas das imagens ou do seu teor não haveria como complementá-las documentalmente com as informações de serviço policiais ou confirmá-las junto de quem as recolheu e efectuou (ver, por exemplo, informação de serviço dos agentes da PSP de fls. 20 e 21, 90/100 e 101 e 279 a 281 dos autos).

  2. Do relógio de marca Karl Lagerfeld pertença de B... e furtado da sua residência, o qual declarou não ter quaisquer dúvidas de que o mencionado relógio é seu, por virtude de sinais próprios do uso que marcam o objecto e que foi apreendido na posse do arguido (facto provado 4° e auto de apreensão de fls.140 v.º).

  3. Do auto de apreensão de fls. 135 onde foram aprendidos ao arguido uma série de objectos utilizados para a prática deste tipo de factos.

    1. À avaliação crítica desses elementos de prova, a despeito da sua consistência objectiva, segurança e credibilidade, não presidiram, contudo, e como deveriam, as regras da experiência a que haveria que atender violando-se o art.º 127 do CPP.

    2. Tivessem estas provas sido adequadamente concatenadas, conjugadas e consideradas e nenhuma dúvida se colocaria ao Tribunal a quo quanto à procedência dos assinalados factos e à sua suficiência para sustentar a convicção de certeza honesta e responsável (raramente absoluta) necessária à condenação.

    3. Patenteia-se, igualmente, uma clara violação por parte do Tribunal Colectivo do art.º 340 do CPP uma vez que, se entendia necessário, como afirma expressamente ("Todavia, tais elementos policiais não foram arrolados nem ouvidos em julgamento, de molde a confirmar a identidade do indivíduo filmado com a do arguido"), ouvir os elementos policiais, como decorre claramente do acima referido, tinha estrita obrigação de os chamar a depor em audiência de julgamento.

    4. Ou seja, conforme jurisprudência constante de que é exemplo o Ac da Rel. Porto de 11-6-2003, relator: Orlando Gonçalves, in www.dgsi.pt.

      "independentemente de alguém ter ou não indicado uma prova anteriormente à audiência de julgamento, se no decurso desta o Tribunal, oficiosamente ou a requerimento, considerar que uma prova antes não indicada é necessária para a descoberta da verdade e à boa decisão da causa, deve obrigatoriamente ordenar a sua produção”.

      Em suma: 7. Os autos contêm elementos bastantes e suficientes para uma decisão diversa da causa, nos termos do art.º 426 n.º 1 do CPP, procedendo-se á condenação do arguido pela totalidade dos factos imputados.

    5. Caso, assim não se considere, o que se coloca por mera hipótese, entende-se que deverá ser determinado o reenvio parcial do processo para novo julgamento por violação confessada do art.º 340 do CPP, sem prejuízo do conhecimento oficioso dos vícios do art.° 410 n.

      o 2 do CPP».

      * O arguido respondeu ao recurso, culminando a resposta com as seguintes conclusões: 1. O douto acórdão recorrido fundamenta devidamente a decisão de absolver o arguido, respeitando todos os critérios legais.

    6. Tal decisão tem de se considerar justa e adequada, com observância do princípio da livre apreciação da prova e suportado pelo processo lógico-formal que serviu de base à decisão.

    7. Pelo que deve ser negado provimento ao recurso, mantendo-se o Acórdão inalterado.

      * Admitido o recurso e já nesta instância, na vista a que se refere o n.º 1 do artigo 416.º do Cód. Proc. Penal, a Ex.ma Procuradora-Geral Adjunta nesta Relação expressou a sua adesão à motivação do recurso interposto, que assim deve proceder.

      * Foi cumprido o disposto no art.º 417.º, n.º 2, do Cód. Proc. Penal, mas não houve resposta do recorrente.

      * Perante a perspectiva de ocorrer uma alteração não substancial dos factos, foi o arguido notificado nos termos e para o efeito do disposto no art.º 424.º, n.º 3, do Cód. Proc. Penal, mas nada disse.

      * Colhidos os vistos e realizada a conferência, cumpre apreciar e decidir.

      * II – Fundamentação São as conclusões pelo recorrente extraídas da motivação do recurso que, sintetizando as razões do pedido, recortam o thema decidendum (cfr. artigos 412.º, n.º 1, e 417.º, n.º 3, do Cód. Proc. Penal, e acórdão do STJ de 27.05.2010, www.dgsi.pt/jstj).

      Mas, sendo esta a regra, nada obsta a que (antes se impõe que) o tribunal aprecie outras questões que são de conhecimento oficioso, como é o caso das nulidades insupríveis e dos vícios da sentença, estes previstos no n.º 2 do art.º 410.º do Cód. Proc. Penal.

      Como evidenciam as conclusões supra transcritas, o recorrente considera que o tribunal errou na apreciação crítica e na valoração da prova que tinha à sua disposição e por isso pretende a sua reapreciação.

      Não é claro quanto à consequência do que entende ser uma violação do artigo 340.º do Cód. Proc. Penal que o tribunal teria cometido, mas, aparentemente, considera que o acórdão recorrido ficou afectado por um dos vícios, que não especifica, do n.º 2 do art.º 410.º da mesma Codificação.

      Podemos, então, identificar como questões a decidir as seguintes: § se o acórdão recorrido padece de algum dos vícios previstos no n.º 2 do art.º 410.º do Cód. Proc. Penal; § se o tribunal errou na apreciação e valoração que fez da prova produzida.

      * Para uma correcta decisão, não só das questões colocadas à apreciação deste tribunal pelo recorrente, mas também de outras que se imponha conhecer, por serem de conhecimento oficioso, é fundamental conhecer a factualidade em que assenta a condenação proferida, pelo que aqui se reproduzem (ipsis verbis) os factos que o tribunal recorrido deu como provados e não provados: Factos provados 1. “No dia 8 de Junho de 2009, pelas 23:00 horas, um indivíduo cuja identidade não se logrou apurar decidiu entrar no imóvel sito na Rua Prof. Dr. Fr…., n.º 1, 6.º Dto, em …, a fim de se apoderar dos bens de valor que aí encontrasse.

    8. Para tanto, tal indivíduo arrombou a fechadura do apartamento sito na Rua Prof. Dr. Fr…, n.º 1, 6.º dto, em …., entrou no imóvel, percorreu todas as divisões de onde retirou os seguintes objectos, avaliados globalmente em cerca de € 8 880,00: 2.A) 1 arma de fogo, tipo revolver de defesa de marca Charter Arms n.º 1022388 de calibre .38 e respectivas munições no valor de € 500,00, a qual se encontrava dentro de um cofre que foi arrombado pelo arguido: 2.B) 1 playstation no valor de € 300,00; -1 jogo de consolas no valor de € 29,99; - 1 jogo de consolas no valor de € 34,99; 7 pulseiras de ouro amarelo no valor de € 1 250,00; 1 par de brincos em ouro amarelo com diamantes no valor de € 750,00; 1 broche em ouro amarelo com pedras preciosas no valor de € 2 000,00; 1 broche em ouro amarelo no valor de € 1 000,00; 1 broche com rubi e brilhantes no valor de € 400,00; 1 broche em ouro branco no valor de € 750,00; 1 broche em ouro branco com diamantes incrustados no valor de € 750,00; 1 medalha em ouro no valor de € 35,00; 1 par de brincos em ouro amarelo no valor de € 60,00; 1 relógio de bolso LONGINES em prata no valor de € 500,00; 1 relógio banhado a ouro amarelo no valor de € 250,00; 1 relógio de marca LONGINES de cor dourada no valor de € 150,00; 1 relógio de marca KARL...

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