Acórdão nº 910/12.2S5LSB-A.L1-9 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 11 de Outubro de 2012

Magistrado ResponsávelCRISTINA BRANCO
Data da Resolução11 de Outubro de 2012
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam, em conferência, na 9.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Lisboa I. Relatório 1. Nos autos de inquérito n.º 910/12.2S5LSB que correm termos no Departamento de Investigação e Acção Penal de Lisboa, em que é arguida I…, foi esta apresentada para primeiro interrogatório judicial, tendo o Meritíssimo Juiz do 2.º Juízo de Instrução Criminal comunicado que as declarações da arguida iriam ser gravadas através do sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso no tribunal, o que veio a suceder.

  1. Não se conformando com essa decisão, o Ministério Público de imediato ditou para a acta um requerimento, invocando a nulidade por insuficiência de inquérito, dado não ter sido praticado acto legalmente obrigatório (art. 120.º, n.º 2, al. d), do CPP), ou, caso assim não se entenda, uma irregularidade, nos termos do art. 123.º do CPP, e solicitando a respectiva reparação.

  2. Tal requerimento mereceu despacho de indeferimento, nos seguintes termos: «Não existe qualquer vício decorrente da não transcrição escrita das declarações do arguido em interrogatório ou da não existência de súmula dessas declarações.

    Na realidade, tais declarações foram gravadas em suporte magnetofónico ao abrigo do disposto no art. 101.º do Código de Processo Penal, não havendo lugar a qualquer transcrição de acordo com o disposto no art. 101.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, desde a alteração operada pela Lei n.º 48/2007 de 29 de Agosto.

    Foram expressamente informados os sujeitos processuais dessa utilização aquando da realização do interrogatório, tendo sido disponibilizado o respectivo suporte digital nos termos gerais de processo.

    A utilização desses meios não só se mostra mais útil para o Tribunal (designadamente de Julgamento, mas também de Instrução Criminal), pela melhor percepção das declarações do arguido, da sua atitude e credibilidade (pelo momento em que ocorrem), como se mostra mais fiável quanto ao próprio teor dessas declarações (as súmulas escritas, de acordo com o disposto no art. 100.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, apenas devem corresponder ao essencial das declarações).

    Não existe qualquer interesse, com relevância jurídica, na redacção por súmula de tais declarações, sendo até de duvidosa constitucionalidade (atendendo ao disposto no art. 32.º, n.º 1, da Constituição) a possibilidade de redacção do auto com uma súmula das declarações quando se encontram disponíveis, em concreto, meios que possibilitam a gravação de tais declarações por via magnetofónica, salvo em situações de manifesta simplicidade da imputação factual e do teor das declarações, porque tal meio de prova é muito menos sindicável, em recurso ou noutras fases do processo.

    Por isso, em julgamento, com a introdução das sucessivas revisões do Código de Processo Penal, foi expressamente eliminada a possibilidade de qualquer declaração que deva constituir meio de prova ser redigida por súmula.

    Não é apresentado um qualquer fundamento ou valor que suporte posição diversa (desconsiderando-se, por não ser atendível, nem ter qualquer suporte jurídico, o interesse do Ministério Público não participante do interrogatório em saber da posição do arguido sem ter de ouvir a gravação em causa).

    E, note-se, o 1.º interrogatório judicial de arguido detido não constitui essencialmente uma diligência de investigação, antes mostra ser um acto judicial com vista à determinação ou aplicação de medidas de coacção, ou seja, um acto de garantia da posição processual do arguido que pode ocorrer em qualquer fase do processo (designadamente no caso dos arguidos contumazes).

    No sentido ora sustentado, considerando a ausência de Jurisprudência uniforme, veja-se a decisão de TRL de 10.10.2011 proferido no processo nº. 344/11.6 PFLSB-B.L1 de 15/2011 e a decisão de STJ proferido no processo 2443/10.1 TASTB-A de 5/05/2011.

    Pelo exposto, improcede o promovido.» 4. Inconformada, interpôs a Digna Magistrada do Ministério Público o presente recurso, que termina com as seguintes conclusões (transcrição): «1.O despacho exarado pelo Mmo. JIC referente à gravação das declarações prestadas pelo arguido em sede de primeiro interrogatório, violaram por erro de interpretação e subsunção jurídica o disposto nos arts. 89º n.º 3, 94º, 95º, 99º nºs 1 e 2 al. c), 100º, 101º, 120º nº 2 al. d) 122º, 123º, 141º, 275º e 296º (a contrario) todos do CPP.

  3. De facto, através dos aludidos despachos, determinou aquele Magistrado que as declarações dos arguidos detidos que lhe foram presentes para primeiro interrogatório judicial, em sede de inquérito, fossem gravadas através do sistema de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso naquele Tribunal em vez de, tal como foi requerido e decorre da lei, serem reproduzidas por escrito no pertinente auto.

  4. O Mmo. JIC interpretou aqueles normativos, mormente o art.º 101º do CPP, no sentido de permitir a substituição da redução a escrito das declarações prestadas pelo arguido, no decurso do primeiro interrogatório judicial, pela gravação das mesmas.

  5. Para tanto, salientou que as declarações foram gravadas em suportes magnetofónicos ao abrigo do disposto no art.º 101º do CPP, não havendo lugar a qualquer transcrição de acordo com o disposto no art.º 101º nºs 1 a 3 do CPP, 5. Interpretação que não tem qualquer apoio na letra da lei ou no espírito do legislador.

  6. Na verdade, o legislador, apenas previu e permite que as diligências orais de prova sejam gravadas, nos moldes em que o Mmo. JIC ordenou, na audiência de julgamento, na instrução e, em sede inquérito, nas declarações para memória futura, estabelecendo pois, de certa forma, uma tipicidade para as fases processuais em que a gravação pode ser utilizada – cfr arts. 271º, 296º e 364º do CPP.

  7. O que se compreende se...

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