Acórdão nº 899/06.7YXLSB.L1-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 18 de Outubro de 2012

Magistrado ResponsávelEZAGÜY MARTINS
Data da Resolução18 de Outubro de 2012
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam na 2ª Secção (cível) deste Tribunal da Relação I – A “A”, S.A. intentou ação declarativa, com processo comum, sob a forma sumária, contra “B”, pedindo a condenação do Réu a pagar à A. a quantia de € 5.563,24 acrescida de juros de mora à taxa legal, contados desde 2001.01.15 e até integral pagamento, vencidos, no valor de € 2.960,25 e vincendos.

Alega, para tanto e em suma, que no exercício da sua atividade a sociedade ““AA”, S.A.”, ora incorporada na A., celebrou com o R. um contrato com início em 26-01-1996, nos termos do qual aquela se obrigou a fornecer ao R. certos produtos, e a entregar-lhe, a título de contrapartida pela celebração do contrato e apoio à comercialização dos produtos acordados, a quantia de Esc. 1.600.000$00, que aquele se comprometeu a devolver-lhe em 36 prestações.

Mais se havendo o R. comprometido a adquirir à A., até ao fim do contrato – em 15-01-2001 – 30.000 L dos produtos abrangidos.

Apenas tendo porém adquirido 23.953 L, ficando por consumir litragem com o valor de venda de € 5.563,24, quantia que, nos termos da cláusula 4.6 do contrato, está obrigado a pagar à A.

O que não fez apesar de interpelado para esse efeito, por carta de 18-11-2004.

Contestou o R., arguindo a ilegitimidade da A., que com ele não celebrou nenhum contrato “face à inexistência de (…) prova documental” da invocada fusão por incorporação.

E, por outro lado a cessação dos efeitos do contrato, por atingido o seu termo resolutivo, em 15.01.2001.

Alegando ainda que para garantia do cumprimento de todas as obrigações emergentes do contrato, o R. entregou à “A” “contra a entrega da quantia mutuada”, uma garantia bancária de primeira ordem, o que obsta a que venha a A. agora peticionar como faz.

E arguindo a nulidade dos pontos 4.1 a 4.6 da cláusula 4 do contrato em causa, por contrárias à boa fé, nos quadros da LCCG.

Verificando-se em qualquer caso abuso de direito por parte da A. que só agora, passado cerca de 5 anos, vem alegar o incumprimento do R, e pedir-lhe nos termos da cláusula 4.6 uma indemnização, acrescida de juros desde 15/01/2001, esquecendo-se dos restantes pontos da cláusula 4, com os quais aquele conflitua, designadamente os pontos 4.4. e 4.7.

Sem prejuízo da contradição de tal cláusula 4ª com a cláusula 3ª, que estabelece o termo final alternativo de vigência do contrato.

Deduzindo, no mais, impugnação.

E rematando com a improcedência da ação e a sua “absolvição da instância e/ou do pedido”, e a condenação do legal representante da A., como litigante de má fé, em multa e indemnização a favor do R.

Houve resposta da A., pugnando pela improcedência das exceções deduzidas.

O processo seguiu seus termos, com saneamento – sendo dispensada a seleção da matéria de facto – vindo, realizada que foi a audiência final, a ser proferida sentença que – julgando não verificada a má fé da A. – julgou a ação improcedente absolvendo o R. do pedido.

Inconformada, recorreu a A., formulando, nas suas alegações, as seguintes conclusões: “1.ª – O entendimento do Tribunal a quo de que o facto de o Apelado não ter consumido os 30.000 litros no prazo de cinco anos não consubstancia qualquer incumprimento, face ao acordado, assenta numa interpretação errónea do contrato objecto dos presentes autos; 2.ª - Da cláusula 1.1. do aludido contrato consta que o Apelado obrigou-se a adquirir “para revenda ao público e consumo no estabelecimento” de que era titular “produtos constantes do Anexo I nas quantidades e prazos previstos na cláusula 3” (o sublinhado é nosso); 3.ª - Era, pois, esta a cláusula que estabelecia a obrigação essencial do contrato, de aquisição dos produtos nele relacionados, que o Apelado aceitou, obrigando-se, assim, de acordo com ela; 4.ª - Por outro lado, a cláusula 3ª refere o seguinte “o presente contrato vigorará até que o Revendedor compre 30.000 litros de produtos constantes do Anexo I ou pelo prazo de 5 anos a contar da data da sua assinatura, consoante o que primeiro ocorrer”; 5.ª - Assim, nesta cláusula 3ª, ficou consagrado o período de vigência do contrato, por referência a um prazo temporal de cinco anos e um limite quantitativo de 30.000 litros; 6.ª - E, por remissão para essa cláusula, ficou fixada, inequivocamente, a obrigação assumida pelo Apelado na cláusula 1.1., devendo este adquirir os produtos acordados “nas quantidades e prazos” nela mencionados; 7.ª - Nenhuma dúvida pode restar de que o Apelado se obrigou, em cinco anos, a adquirir 30.000 litros dos produtos previstos pelo contrato, respondendo pelo incumprimento, caso não cumprisse tal obrigação; 8.ª - É certo que, verificando-se o decurso do prazo temporal estabelecido pela cláusula 3ª do contrato, e qualquer que fosse a quantidade adquirida, esse contrato cessaria os seus efeitos, deixando de vigorar; 9.ª - Mas, nesse caso, o incumprimento da quantidade estabelecida faria nascer para o Apelado uma nova obrigação, sendo responsável, perante a Apelante, pela indemnização por incumprimento da cláusula 1.1., nos termos da cláusula 4.6. desse contrato; 10.ª - Estabelece a cláusula 4.6. do contrato que “se no termo do prazo temporal do contrato o Revendedor não tiver efectuado o volume de compras aqui estabelecido, a “A” poderá exigir uma indemnização, pelo incumprimento, que por acordo se estipula ser igual a valor das bebidas não adquiridas, considerando-se, para o efeito, o preço praticado pela “A” à data do incumprimento”; 11.ª - Resulta provado que “no âmbito do referido contrato, o R. consumiu 23.953 litros dos produtos comercializados pela A.

”, quando, como vimos, estava obrigado a adquirir, até essa data, 30.000 litros.

  1. - Ou seja, resulta provado que o Apelado não cumpriu integralmente o contrato que celebrou com a Apelante e, nessa medida, não observou o disposto no artigo 406º do Código Civil, que estabelece que os contratos devem ser integralmente cumpridos, só cumprindo, o devedor, a obrigação a que está adstrito quando realiza integralmente a prestação.

  2. – Por conseguinte, e de acordo com o disposto no artigo 798º do Código Civil, o Apelado tornou-se responsável pelos prejuízos que esse seu incumprimento causou à Apelante; 14.ª - O montante da indemnização a que a Apelante tinha direito por força do incumprimento do Apelado foi, de acordo com a faculdade constante do artigo 810º do Código Civil, fixado por acordo entre as partes (cfr. a acima descrita cláusula 4.6. do contrato escrito ora em causa).”.

Requer a revogação da sentença recorrida, e sua substituição “por outra que julgue a acção procedente”.

Contra-alegou o Recorrido, pugnando pela manutenção do julgado.

II- Corridos os vistos legais, cumpre decidir.

Face às conclusões de recurso, que como é sabido, e no seu reporte à fundamentação da decisão recorrida, definem o objecto daquele – vd. art.ºs 684º, n.º 3, 690º, n.º 3, 660º, n.º 2 e 713º, n.º 2, do Cód. Proc. Civil – é questão proposta à resolução deste Tribunal a de saber se nos termos do contrato dos autos, ficou o R. obrigado a adquirir, no prazo máximo de vigência daquele, 30.000L de produtos da A.

Sendo que na positiva, e assim configurado incumprimento de banda do Réu, importará verificar – atento o disposto no art.º 715º, n.º 2, do Código de Processo Civil – se a garantia bancária prestada por aquele obsta à procedência do pedido da A..

E, na negativa, quanto à antecedente questão, se se verifica abuso de direito de banda da A.

Certo aqui que quanto à questão da (não) qualificação do contrato dos autos como contrato de adesão, se pronunciou já a 1ª instância, sem impugnação a propósito.

E que a apreciação da questão da definição contratual de uma quantidade de produtos a adquirir no prazo máximo de vigência do contrato, implica o conhecimento da, pelo R., acusada contradição entre pontos da cláusula 4ª e entre esta e a cláusula 3ª do mesmo contrato.

* Considerou-se assente, na 1ª instância, sem impugnação a propósito e nada impondo diversamente, a factualidade seguinte: 1. A sociedade ““AA” – “A”, S.A.” tinha por actividade a indústria de refrigerantes e cervejas e a comercialização, quer de produtos que fabricava, quer dos fabricados por outras empresas (Artigo 1º da petição inicial).

  1. Em 2001/12/14 foi incorporada, através de uma fusão, na sociedade A., antes denominada “….– S.G.P.S., S.A.” que já detinha, de forma directa ou indirecta, a totalidade do seu capital social e que no acto de fusão alterou também a sua denominação social para “A” – Sociedade “A”, S.A.(Artigos 2º e 3º da petição inicial).

  2. No exercício da sua actividade, a mencionada ““AA” – “A”, S.A.” celebrou, em 26 de Janeiro de 1996, com o R., um contrato que teve nessa data o seu início de vigência (Artigo 5º da petição inicial).

  3. O contrato respeitava ao estabelecimento denominado “Discoteca “C”” situado na praia..., de que o R. era, nessa data, titular e onde se dedicava, designadamente, à venda de bebidas ao público (Artigo 6º da petição inicial).

  4. Por força desse contrato, o R. obrigou a “(...) a comprar-lhe (à “AA”, S.A.), para revenda ao público e consumo no estabelecimento produtos constantes do Anexo I nas quantidades e prazos previstos na cláusula 3”, bem como a “(...) a não vender e não publicitar no estabelecimento produtos similares aos constantes do Anexo II, nem permitir que...

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