Acórdão nº 08357/11 de Tribunal Central Administrativo Sul, 08 de Novembro de 2012

Magistrado ResponsávelANA CELESTE CARVALHO
Data da Resolução08 de Novembro de 2012
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I.

RELATÓRIO A...& Co. KG, devidamente identificada nos autos, inconformada, veio interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, datada de 18/10/2011 que, no âmbito do processo cautelar por si movido contra o INFARMED – Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde, IP, o Ministério da Economia e Inovação e a Contrainteressada, B...– Comércio e Indústria de Produtos Farmacêuticos, Lda.

, indeferiu as providências cautelares requeridas, de suspensão de eficácia dos atos de autorização de introdução no mercado concedidos pelo Infarmed e de intimação da DGAE, na pessoa do Ministério da Economia e Inovação, a abster-se de, enquanto a patente europeia 502314B estiver em vigor, emitir os atos de PVP, para os medicamentos em causa ou a abster-se de emitir os referidos atos até à data da caducidade da PT 502314 e do CCP 41.

Formula a aqui recorrente nas respetivas alegações (cfr. fls. 1018 e segs. do processo físico), as seguintes conclusões que se reproduzem, depois de sintetizadas (cfr. fls. 1445 e segs): “1.

O presente recurso interposto da sentença que decidiu não decretar as medidas cautelares tem efeito suspensivo nos termos do art. 143.°, n.° 1 e n.° 2 do CPTA em conjugação com o art. 692.° n.° 3 alínea d) do CPC aplicável ex vi art. 140.° do CPTA, em conformidade, de resto, com o decidido por este Tribunal ad quem em 06.05.2010 (Processo n.° 06058/10)1, e sobe imediatamente e nos próprios autos, nos termos do artigo 147.°, n.° 1 do CPTA.

  1. Não tendo sido demonstrada a manifesta improcedência da ação principal e não se verificando quaisquer circunstâncias que determinem que a mesma não pudesse ser apreciada no seu mérito, deve dar-se aqui por verificado e preenchido o requisito do fumus non malus júris.

  2. Se outra for a perspetiva de Vossas Excelências relativamente à densidade da prova requerida para a constatação do fumus non malus juris, deverá a matéria de facto relevante ser alargada, de modo a abranger outros factos relevantes alegados pela Recorrente: • “Os Genéricos Telmisartan, cujas ÁIMs a Contra Interessada obteve, contêm “Telmisartan” que é fabricado pelo processo descrito na EP 502314.

    ” (artigo 59.° do Requerimento Inicial); • “À data do pedido de patente EP 502314 B (31.01.1992) e da prioridade reivindicada nessa patente, o Telmisartan nunca tinha sido sintetizado ou divulgado, nem tinha sido divulgada a aplicação do processo que é mencionado na patente para obter esse produto.

    ” (artigo 12.° do Requerimento Inicial); • “Não restam dúvidas que a EP 502314 B tem por objeto um processo de fabrico de um produto novo – o Telmisartan.” (artigo 65.° do Requerimento Inicial); 4.

    Não tendo sido alegados quaisquer factos, nem tendo sido aduzida qualquer prova demonstrativa de que a Contra-Interessada não viola os direitos da Requerente, e ainda, sendo absolutamente irrelevantes os factos alegados – e não demonstrados – pelo Infanned e pela Contra-Interessada quanto à existência de outros processos de obtenção do Telmisartan – pois tais factos não impedem (nem extinguem) os direitos da ora Recorrente – mantém-se aplicável a presunção constante do artigo 98.° do Código da Propriedade Industrial, pelo que os processos usados para o fabrico dos medicamentos das Contra-Interessadas são os mesmos dos que se encontram protegidos pela EP 502314, na titularidade da Recorrente, assim infringindo-a.

  3. Os DPI emergentes de uma patente constituem direitos exclusivos temporários, que se traduzem na proibição legal de qualquer terceiro, sem o consentimento do seu titular, explorar o invento patenteado, por qualquer das formas definidas no artigo 101º n.° 2.° do CPI, durante o seu período de vigência; 6.

    O direito emergente das Patentes e do CCP é um direito fundamental, análogo aos direitos liberdades e garantias, com especifica proteção constitucional, beneficiando do regime constitucional a estes aplicável, conforme resulta do artigo 17º da Constituição, estando assim a Administração vinculada ao seu respeito, nos termos do artigo 18.° da Constituição, devendo conformar a sua atividade à sua proteção de acordo com o artigo 266.° da Lei Fundamental.

  4. Sendo um ato de concessão da AIM a um medicamento violador de uma patente de terceiro um ato administrativo cujo objeto é o da viabilização jurídica de uma atividade ilícita, atividade essa que, doutro modo, estaria interdita ao interessado, tal ato será desrespeitador do princípio da legalidade, por violação do chamado bloco de legalidade.

  5. A causa de invalidade das AIMs destes autos não consiste na violação direta da Patente ou de qualquer dever de investigação do Infarmed durante a fase de instrução do procedimento da sua concessão, mas a natureza ilegal do objeto das autorizações concedidas pelo Infarmed, por infração de disposições constitucionais (artigos 62.° e 266.° da Constituição) que visam a proteção de direitos fundamentais, sendo o seu único efeito útil a viabilização de uma prática criminosa (artigo 321° do CP1) por terceiros – no caso a Contra-Interessada – e, por isso, não podem deixar de ser considerados como atos inválidos ao abrigo dos artigos 135º e 133.° n.° 2 c) e d) do Código de Procedimento Administrativo.

  6. E tudo o que se disse se aplica igualmente aos PVPs a aprovar pela DGAE.

  7. Ao decidir que o requisito do periculum in mora não se verifica porque o indeferimento do presente processo cautelar não vai criar uma situação de facto consumado e que os danos invocados pela Recorrente não se enquadram no previsto no artigo 120.° do CPTA, a Sentença recorrida violou essa disposição legal, o princípio basilar da acessoriedade da indemnização em relação à reconstituição natural previsto no artigo 566.° do Código Civil e o artigo 349.° do Código Civil no que se refere à habilitação dos Tribunais para criar presunções (judiciais).

  8. A sentença que, na ação principal (proposta em 30 de março de 2011), venha a decretar a nulidade das AIMs dos Genéricos Telmisartan, apesar de, por força da lei, ter efeitos retroativos, não terá qualquer utilidade prática, visto que não se espera que a mesma seja decidida definitivamente antes de cinco ou mais anos a contar desta data, caso em que o exclusivo da Recorrente terá sido então, há muito, eliminado, tendo-se assim consumado, pelo mero decurso do tempo de processamento da ação principal, a inutilidade de tal sentença, apenas evitável com o deferimento do presente processo cautelar.

  9. O direito para o qual a Recorrente busca tutela nestes autos, embora dotado da natureza de um direito fundamental, protegido diretamente pela Constituição, é um direito efémero, sendo que o tempo de exclusivo que ainda resta é apenas de cerca de 2 anos, incluindo a prorrogação que lhe foi conferida pelo CCP 41 (i.e. até 12 de dezembro de 2013).

  10. Mesmo se assim não fosse considerado, o não decretamento desta providência causará à Recorrente danos imateriais de reparação difícil ou mesmo impossível, tal como previsto no artigo 120º n°1 b) do CPTA, e, em qualquer caso, não quantificáveis, tendo em conta a sua natureza, porquanto a comercialização dos Genéricos Telmisartan, antes de a Patente expirar, implica, desde logo, que a Recorrente fique, contra a sua vontade, privada do uso e fruição do exclusivo que constitui o conteúdo essencial do direito de propriedade industrial de que é titular deixando, assim, de usar e fruir, para sempre, do seu direito de propriedade relativo ao dito invento, o qual não poderá ser reparado mesmo que, na sequência de decisão condenatória a proferir na ação principal, lhe viesse a ser atribuída uma compensação de natureza financeira.

  11. O facto de os danos resultarem da comercialização futura dos genéricos Telmisartan pela Contra-Interessada não os desqualifica para efeitos da sua apreciação, uma vez que não têm que ser atuais mas sim, precisamente, futuros, no teor inequívoco das alíneas b) e c) do n.° 1 do artigo 120.° do CPTA.

  12. A aplicação correta do princípio da teoria da causalidade adequada ao caso dos autos leva-nos a concluir que a AIM de um medicamento é causa necessária e adequada dos danos produzidos por essa introdução/comercialização dos medicamentos objeto da AIM, e, por isso, se insere na cadeia causal juridicamente relevante dos prejuízos dela derivados, uma vez que ela é condição desses danos atuando adequadamente para que se produzam, sendo que o requisito do periculum in mora tanto pode consistir e se basta com o receio fundado de que, a não ser decretada a providência, ocorrerá uma situação de facto consumado ou prejuízos de difícil reparação.

  13. Com o maior respeito, dir-se-á que a douta sentença recorrida, para além de ter feito uma deficiente apreciação da prova produzida, violou e fez uma interpretação errada de diversos normativos legais, entre eles se contando os artigos 101.°, 32.° n.°4 e 316.° do CPI, artigos 3.°, 8.°, 112.° n.° 1 e 120 n.° l b) e c) do CPTA, artigos 563.° do Código Civil, artigos 133.° n.° 2 c) e d) do CPA e artigos 17.°, 18.°, 62.° e 266.° da CRP. A decisão recorrida é, ainda, contrária à jurisprudência maioritária deste Tribunal Central Administrativo do Sul.”.

    Termina pedindo que deve ser dado provimento ao recurso.

    * Foi atribuído efeito meramente devolutivo ao recurso, por despacho de fls. 1094.

    * A Contrainteressada contra-alegou (cfr. fls. 1108 e segs.), requerendo a ampliação do objeto do recurso, pedindo a revogação da sentença na parte referente à questão da competência material dos Tribunais Administrativos para conhecimento da ação principal e que o recurso seja julgado não provado e improcedente, mantendo-se a sentença recorrida, juntando dois documentos, concluindo, como segue, quanto à requerida ampliação: “(…) 3ª A presente contra-alegação inclui, ainda, um pedido de ampliação do objeto do recurso, nos termos do artigo 684º-A do CPC, aplicável ex vi do artigo 1º do CPTA, quanto...

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