Acórdão nº 08955/12 de Tribunal Central Administrativo Sul, 20 de Setembro de 2012
Magistrado Responsável | PAULO PEREIRA GOUVEIA |
Data da Resolução | 20 de Setembro de 2012 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Sul |
ACORDAM, em conferência, na 1ª Secção do Tribunal Central Administrativo Sul: I.RELATÓRIO O presente recurso de apelação vem interposto por A...COMPANY LIMITED.
· A...COMPANY LIMITED intentou no T.A.C. de Sintra processo cautelar contra · INFARMED, · MINISTÉRIO DA ECONOMIA E DA INOVAÇÃO, e · (Contra-interessada) B...- Comércio e Indústria e Produtos Farmacêuticos, Lda, pedindo a suspensão de eficácia de actos administrativos que concedem as AIM e que fixam os preços de venda ao público (PVP) para os medicamentos genéricos com Candesartan e Hidroclorotiazida como substâncias activas, durante o período de vigência da patente.
Por decisão cautelar de 23-3-2012, o referido tribunal decidiu indeferir o pedido, mas o TCASul, em recurso e por ac. de 6-10-11, revogou tal decisão e deferiu o pedido feito no r.i.
Após requerimento e resposta, o TAC de Lisboa por despacho de 30-3-12 decidiu, invocando o art. 124º CPTA, revogar a precedentemente determinada suspensão da eficácia dos identificados actos de AIM e de intimação do MEI a não fixar os PVP, relativos aos medicamentos genéricos aqui em causa, Não condenar o INFARMED a suspender a eficácia das AIM identificadas e requeridas, concedidas à Contra-Interessada; Não intimar o MEI a abster-se de emitir os PVP requeridos ou a requerer pela Contra-interessada relativamente aos medicamentos identificados.
* Inconformada, a A...recorre para este Tribunal Central Administrativo Sul, formulando nas suas alegações as seguintes conclusões: 1. Ao presente recurso deve atribuir-se efeito suspensivo, nos termos da regra geral relativa ao efeito dos recursos contida no n.° 1 do artigo 143.° do CPTA, urna vez que não foi interposto de uma decisão que adote uma providência cautelar, mas, ao invés, foi interposto de uma decisão que revogou tal providência.
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A apreciação da viabilidade da ação principal não pode ser feita no estrito contexto das normas da Lei n° 62/2011 e do Decreto-Lei n° 176/2006, como o fez a douta decisão recorrida.
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A Lei n° 62/2011 não revogou nem modificou as normas dos artigos 133.° e 135.° do CPA e, por isso, dele não pode decorrer que a ação principal deva ser julgada procedente porque a declaração de invalidade do ato de AIM destes autos nela pedida é formulada à luz das referidas normas.
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As disposições constantes do artigo 19.°, n.° 8, do artigo 23.°-A, n.° 1 e n.° 2, do artigo 25.°, n.° 2 e do artigo 179.°, n.° 2 do Estatuto do Medicamento — na redação conferida pelo artigo 4.° da Lei n.° 62/2011 —, bem como o artigo 8.°, n.° 1, 2, 3 e 4 do mesmo diploma, são insuscetíveis de obstarem ao provimento do presente recurso e procedência da ação principal, ou seja, à declaração de invalidade ou invalidação dos atos impugnados ou à declaração da sua ineficácia, até ao termo dos direitos de propriedade industrial da Requerente e, consequentemente também não poderão obstar à procedência do presente processo cautelar.
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Se se entendessem as normas do artigo 19.°, n.° 8, do artigo 23.°-A, n.° 1 e n.° 2, do artigo 25.°, n.° 2 e do artigo 179.°, n.° 2 do Estatuto do Medicamento — na redação conferida pelo artigo 4.° da Lei n.° 62/2011 —, bem corno o artigo 8.0, n.° 1, 2. 3 e 4 do mesmo diploma, como contendo urna proibição absoluta de que o lnfarmed (e o MEE/DGAE) tome conhecimento, no quadro de procedimento de concessão de AIM (e de aprovação de PVP), da existência de violação de patente por parte do medicamento objeto desse procedimento, ou o obriguem a deferir requerimento de concessão de AIM (e, respetivamente, de aprovação de PVP) para um tal medicamento, tais disposições seriam materialmente inconstitucionais por violação, nomeadamente, dos artigos 17°, 18°, 62° n°1 e 266° da Constituição da República Portuguesa.
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Tendo o Tribunal a quo entendido que as normas constantes do artigo 19.°, n.° 8, do artigo 23.°-A, n.° 1 e n.° 2, do artigo 25.°, n.° 2 e do artigo 179.°, n.° 2 do Estatuto do Medicamento — na redação conferida pelo artigo 4.° da Lei n.° 62/2011 — contêm uma proibição absoluta de que o Infarmed tome conhecimento, no quadro de procedimento de concessão de AIM, da existência de violação de patente por parte do medicamento objeto desse procedimento, ou o obrigue (vinculadamente) a aprovar o respetivo requerimentos de concessão de AIM para um tal medicamento, tais disposições são materialmente inconstitucionais por violação, nomeadamente, dos artigos 17.°, 18.°, 62.° n.° 1 e 266.° da Constituição da República Portuguesa, devendo, consequentemente, o Tribunal ad quem recusar a sua aplicação com fundamento na sua inconstitucionalidade.
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Do mesmo modo, o Tribunal a quo entendido que as normas constantes do artigo 8.°, n.° 1, 2, 3 e 4 da Lei n.° 62/2011, contêm uma proibição absoluta de que o MEE/DGAE tomem conhecimento, no quadro de procedimento de aprovação de PVP, da existência de violação de patente por parte do medicamento objeto desse procedimento, ou os obriguem a deferir os respetivos requerimentos de aprovação de PVPs para um tal medicamento, tais disposições seriam materialmente inconstitucionais por violação, nomeadamente, dos artigos 17°, 18°, 62° n°1 e 266° da Constituição da República Portuguesa, devendo, consequentemente, o Tribunal ad quem recusar a sua aplicação com fundamento na sua inconstitucionalidade.
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Se se entendesse que as referidas normas eram aplicáveis no caso vertente por via do artigo 9.°, n.° 1 da Lei n.° 62/2011, a interpretação e aplicação deste artigo introduziria uma restrição retroativa – e, portanto, inconstitucional por violação do art. 18.°, n.° 3 da Constituição — de um direito fundamental.
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As normas acima referidas, com tal conteúdo, constituem verdadeiras limitações não consentidas pela Constituição ao regime dos direitos de propriedade intelectual, considerados corno direitos fundamentais análogos aos direitos, liberdades e garantias.
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A norma do artigo 9.°, n.° 1 da Lei n.° 62/2011 é, também ela inconstitucional, por violação do artigo 18.° n.° 3 da Lei Fundamental, uma vez que, atribuindo natureza interpretativa às normas atrás mencionadas do Decreto-Lei n.° 176/2006, visam atingir situações criadas ao abrigo de leis pré-existentes que não continham as limitações a direitos fundamentais nelas introduzidas, devendo, consequentemente, o Tribunal ad quem recusar a sua aplicação com fundamento na sua inconstitucionalidade.
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Contrariamente ao que parece ser defendido pelo Tribunal a quo, a inconstitucionalidade deve ser analisada e decidida no presente processo, uma vez que a natureza cautelar dos presentes autos não afeta a decisão da inconstitucionalidade pelo Tribunal Constitucional.
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Uma decisão final e favorável para a ora Recorrente na ação principal — de que esta providência cautelar é dependente — ficaria irremediavelmente comprometida, em violação do disposto no artigo 20.° da Constituição, se não for avaliada a questão da inconstitucionalidade da aplicação dos artigos 8.° e 9.° da Lei n.° 62/2011, suscitada pela Recorrente.
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As normas da Lei n.° 62/2011, não só pelo seu alcance, mas também por serem inconstitucionais, são insuscetíveis de inviabilizar o mérito da ação principal, pelo que não podem provocar a verificação do fumus malus juris nestes autos.
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A douta decisão recorrida, ao revogar a providência decretada, nos termos em que fez, não aplicou, como devia ter feito, os dispositivos dos artigos 17°, 18°, 62° e 266° da Constituição e dos artigos 133° e 135° do CPA e fez uma errada aplicação aos autos dos artigos 4° e 5° e 9.° da Lei n° 62/2011, violando as normas dos artigos 120° n° 1 b) e 124° do CPTA.
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Atendendo a que a Lei n.° 62/2011 não deverá ser considerada no caso vertente ou deverá ser desaplicada, recorda-se que, na ação principal, a ora Recorrente invocou a nulidade do ato de concessão de AIM destes autos com base nos dispositivos do artigo 133° n° 2 c) e d) e do artigo 135°, ambos do CPA, por tal ato ser violador do conteúdo essencial do seu direito fundamental emergente da patente e certificado complementar de proteção dos autos e porque a atividade por ele licenciada é uma atividade criminosa, punida como tal pelo artigo 321° do Código da Propriedade Industrial.
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Mais invocou que o mesmo ato era inválido, nos termos do art.° 135.° do Código de Procedimento Administrativo, por ter como única finalidade a de permitir uma prática comercial ofensiva de vinculações que para o Estado derivam dos efeitos que a lei atribui a um ato administrativo desse mesmo Estado que lhe era anterior, ofendendo, nomeadamente o artigo 18.° da Constituição que tem aplicação direta.
O recorrido INFARMED conclui assim as suas contra-alegações: 1. Nos termos do artigo 143.º/2 do CPTA, os recursos de providências cautelares têm sempre efeito devolutivo.
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A regra do artigo 143.º/2 do CPTA justifica-se para obstar o interessado de interpor um recurso da decisão desfavorável com o único objetivo de continuar a usufruir da proibição imposta à Administração de executar o ato administrativo suspendendo durante a pendência do recurso.
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O pedido de revogação da decisão que decretou a providência cautelar apresentado pela contra interessada vem na sequência da publicação da Lei 62/2011, que procedeu à quinta alteração ao Decreto-Lei n.º 176/2006, de 30 de Agosto, que aprovou o Estatuto do Medicamento, requerendo a revogação da decisão tomada pelo Venerando Tribunal Central Administrativo do Sul em 06.10.2011, que deferiu o pedido de suspensão de atos de autorização de introdução no mercado (“AIMs”) de medicamentos genéricos com a substância ativa “Candesartan”.
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Ora, na decisão tomada pelo Venerando Tribunal Central Administrativo do Sul, que concedeu a presente providência de suspensão de eficácia de AIMs de medicamentos genéricos contendo a substância ativa Candesartan foi deferida por se considerar verificados os requisitos previstos no artigo 120.º/1/b) do CPTA.
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De referir que nos termos do artigo 120.º/1/b) do CPTA, para além do requisito do periculum in mora, que se consubstancia no...
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