Acórdão nº 290/10.0TBAGN-A.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 20 de Junho de 2012

Magistrado ResponsávelANT
Data da Resolução20 de Junho de 2012
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra I A...

veio deduzir oposição à execução que, na comarca de Arganil, lhe move B...

, S.A., concluindo que "deve declarar-se nulo o contrato celebrado entre o Oponente e a B...

e consequentemente declarar-se nula a livrança objecto do presente contrato, ou se assim não se entender considerar o contrato de financiamento resolvido." O executada alegou, em síntese, que comprou um tractor de marca Case, modelo MXM, 120 C4, matrícula (...) AD, à D...

L.

da e, não tendo dinheiro suficiente para a compra, a empresa vendedora disse-lhe que lhe arranjava um empréstimo para essa aquisição.

Com a essa compra, e sem que na altura tivesse a noção exacta disso, celebrou com a exequente um contrato de concessão de crédito e subscreveu, ainda em branco, a livrança dada á execução. Na ocasião não ficou com cópia do contrato, nem se apercebeu que também tinha subscrito uma livrança em branco.

Mais alega que não sabe ler e que não lhe foi explicado qualquer uma das cláusulas do contrato, que estavam previamente redigidas em letra de imprensa, e em que apenas apôs a sua assinatura, acrescentando nunca recebeu duplicado ou cópia dos documentos que assinou.

Não autorizou o preenchimento da livrança, nem tal lhe foi devidamente informado.

A exequente contestou impugnando a versão apresentada pelo executado, referindo nomeadamente que este foi informado das cláusulas do contrato, que lhe foi entregue cópia do mesmo e que autorizou o preenchimento da letra.

Proferiu-se despacho saneador, dispensando-se, então, a fixação dos factos assentes e a elaboração da base instrutória Realizou-se julgamento e proferiu-se sentença em que se decidiu: "Pelo exposto, julga-se procedente por provada a oposição à execução e, em consequência, declara-se extinta a execução relativamente ao executado/opoente A (...).

" Inconformado com tal decisão, o exequente dela interpôs recurso, que foi admitido como de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e efeito meramente devolutivo, findando a respectiva motivação com as seguintes conclusões: A. Nesta conformidade, face ao acima exposto, deverá a Douta sentença proferida pelo Tribunal a quo ser revogado por errada apreciação de facto e errada interpretação das disposições legais aplicáveis ao caso em concreto.

  1. Os factos “VIII”, “IX” e “X” da matéria de facto provada, salvo melhor entendimento e opinião, estão em clara contradição com os restantes factos dados por assente na sentença recorrida, nomeadamente os factos “I” a “VII” da matéria de facto provada.

  2. Em primeiro lugar, o facto “X” da matéria da facto provada é claramente um facto conclusivo, pelo que a Recorrente não compreende da leitura da sentença que importância pôde o Tribunal a quo retirar desse facto para proferir a decisão ora recorrida, nomeadamente que consequência jurídica resultou da prova desse facto para a boa decisão da causa.

  3. Note-se que o objecto da acção executiva proposta pela Recorrente contra o Recorrido, bem como o objecto da própria oposição à execução movida pela Recorrente estão delimitadas à validade, eficácia e incumprimento do contrato de financiamento para a aquisição de um tractor agrícola celebrado entre a Recorrente e o Recorrido e fornecido pela empresa “ D (...), Lda.” ( D (...)).

  4. Existindo uma situação juridicamente considerada por união de contratos, não se consegue compreender pelo conteúdo da decisão proferida pelo Tribunal a quo qual dos contratos foi considerado um bom negócio, se o contrato de financiamento, se o contrato de compra e venda; Além disso, a Recorrente não consegue descortinar na fundamentação jurídica da decisão sub judice que importância é que este facto, meramente conclusivo e retirado do articulado do Recorrido, contribuiu para a boa decisão da causa, pelo menos para a decisão jurídica da causa a que o Tribunal a quo chegou e que ora se recorre.

  5. Tratando-se de um facto conclusivo sem qualquer relevância para a boa decisão da causa, outra conclusão não pode ser retirada que não seja o de se dar por não escrito o facto “X” da matéria de facto provada na sentença em análise, aplicando-se analogicamente o disposto no Artigo 646.º, n.º 4 do Código de Processo Civil (CPC), uma vez que, de acordo com as normas processuais vigentes, o juízo pelo tribunal de factos provados ou não provados só pode recair sobre factos com relevância jurídica para a decisão da causa, o que não é seguramente o caso, pois tratando-se de um facto conclusivo nenhuma relevância daí pode resultar.

  6. Em segundo lugar, nenhuma das testemunhas arroladas pelo Recorrido logrou demonstrar ao Tribunal a quo o que a sentença vem dar como provado nos factos “VIII” e “IX” da matéria de facto provada, para tanto confronte-se os depoimentos de todas as testemunhas arroladas pelo Recorrido e que se encontram gravados no CD1 da audiência de julgamento realizada no dia 13 de Outubro de 2011.

  7. Por outro lado, os factos “VIII” e “IX” da matéria de facto estão ainda em clara contradição com a restante factualidade dada por assente na sentença, nomeadamente com os factos “I” a “VII”.

    I. Neste sentido, não é possível o Tribunal a quo dar como provado, na mesma sentença, que o Recorrido celebrou um contrato de financiamento com a Recorrente (para tanto utilizou o Tribunal a quo a expressão “acordo celebrado” em várias ocasiões) e, ao mesmo tempo dar como provado que o Recorrido não sabia que tinha celebrado um contrato de concessão de crédito J. É incongruente que na mesma sentença se dê como provado a circunstância do Recorrido não ter disponibilidade financeira para adquirir o tractor agrícola a pronto pagamento e, em consequência disso, ter o fornecedor do bem mediado na obtenção de um financiamento junto da Recorrente, com a circunstância de se dar igualmente como provado que o Recorrido não sabia que estava a assinar um contrato de financiamento para a compra do referido bem.

  8. Note-se que a invocação do desconhecimento do contrato de financiamento por parte do Recorrido só vem ocorreu aquando da apresentação da sua oposição à execução, em 20 de Setembro de 2010, ou seja, decorridos mais de 5 (cinco) anos após a celebração do contrato de financiamento, pois nunca antes o Recorrido tinha invocado junto da Recorrente o desconhecimento do contrato ou de alguma das suas cláusulas.

    L. Também não é possível o Tribunal a quo dar como provado ter sido assinada uma livrança pelo Recorrido a favor da Recorrente e celebrada a respectiva convenção de preenchimento de livrança em branco e, logo de seguida, na mesma sentença, o que era entendido como um “acordo celebrado” entre Recorrente e o Recorrido passou a ser um mero desconhecimento do Recorrido de que tinha “subscrito a livrança em branco.”.

  9. Tais factos são em si incongruentes e revelam uma clara e manifesta contradição da matéria de facto tida como provada pelo Tribunal a quo e que levou a uma errada interpretação e aplicação do direito ao caso concreto.

  10. Em terceiro lugar, da leitura que se faz da motivação da decisão sobre a matéria de facto, o Tribunal a quo refere, e bem, de forma clara e inequívoca, que todas as testemunhas arroladas pelo Recorrido tinham conhecimento da aquisição do tractor agrícola financiado e que o mesmo era usado pelo Recorrido para o exercício da sua actividade profissional.

  11. Do testemunho prestado pelas testemunhas do Recorrido não se consegue concluir com uma certeza irrefutável quais os documentos que não lhe foram entregues, nomeadamente não ficou demonstrado de forma clara e inequívoca que o Recorrido referia aos documentos do contrato de financiamento e não aos documentos que titulam a propriedade do tractor financiado, cujo envio era da total responsabilidade da empresa D (...).

  12. O Tribunal a quo omitiu na sua valoração algumas circunstâncias de facto importantes e que tiveram influência na decisão jurídica da causa e podem levar a outra conclusão.

  13. Por outro lado, apesar de o Tribunal a quo ter dado como provado o contrato de financiamento celebrado entre a Recorrente e o Recorrido (vide facto “I” da matéria de facto provada), vem por outro lado, desvalorizar a circunstância de as prestações terem um vencimento semestral, bem como a circunstância de entre a celebração do contrato de financiamento e o vencimento da primeira prestação do contrato de financiamento ter decorrido um ano de carência (vide a cláusula 7ª do contrato de financiamento), o que por si só configura pelo menos 2 (anos) em que o Recorrido cumpriu integralmente o contrato de financiamento e beneficiou do bem financiado, sendo certo que durante esse período nunca colocou em causa o contrato de financiamento ou as suas cláusulas ou parte delas.

  14. O depoimento da testemunha Senhora D. I (...) que na qualidade de irmã do Recorrido declarou ser a sua “grande confidente”, não foi devidamente valorado pelo Tribunal a quo, tendo desconsiderado na sua apreciação factos com relevância para a boa decisão da causa.

  15. O avalista do Recorrido no contrato de financiamento em causa, sendo uma pessoa com maior instrução, com uma relação de grande proximidade com o Recorrido, não se vislumbra possível que tenha aceitado ser avalista daquele e que tenha assinado a documentação solicitada, sem que o Recorrido nunca tivesse tido a noção de ter contraído um financiamento junto da Recorrente.

  16. O Tribunal a quo decidiu não considerar grande parte do testemunho da Dra. J (...), que de forma clara e precisa, explicou ao Tribunal a quo a relação tripartida existente entre o Recorrido, a Recorrente e o fornecedor do bem.

  17. Também não teve em consideração que esta testemunha referiu de forma clara e precisa que toda a documentação contratual tinha sido enviada ao Recorrido, tendo a cópia da carta sido mostrada ao Tribunal a quo através do sistema de teleconferência, uma vez que a testemunha prestou depoimento nos termos do Artigo 623.º do CPC (vide o depoimento gravado no CD2 da audiência de julgamento realizada no dia 24 de Outubro de 2011...

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