Acórdão nº 4752/08.1TBLRA.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 12 de Junho de 2012
Magistrado Responsável | FONTE RAMOS |
Data da Resolução | 12 de Junho de 2012 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam na 2ª secção cível do Tribunal da Relação de Coimbra: I. T (…), Lda., intentou, em 02.9.2008, no Tribunal Judicial de Leiria, a presente acção declarativa com processo sumário contra H (…)[1], pedindo que o Réu seja condenado a pagar-lhe todos os encargos com a instalação de uma segunda cama nos veículos com as matrículas 53-DC-94 e 53-DC-95, no valor de 6 344,22 € cada, a importância de 14 282,62 € referente à reparação dos três veículos indicados na petição inicial (p. i.), 833,04 € de juros de mora, às taxas comerciais, vencidos até 13.12.007 e juros de mora vincendos.
Alegou, em resumo, que se dedica ao transporte de mercadorias e reparações de veículos e o Réu desenvolve a actividade de venda e comercialização de veículos automóveis; em 20.02.2007, a A. e o Réu celebraram entre si, a primeira como compradora e o segundo como vendedor, um contrato verbal de contrato de compra e venda de três camiões, pelo preço global de 85 910 €; o Réu entregou os referidos veículos em 06.3.2007, 09.3.2007 e 21.3.2007; dado que dois dos veículos não possuíam duas camas, como pretendia a A., o Réu, aquando da conclusão do negócio, obrigou-se a proceder à instalação de uma segunda cama, pagando os respectivos encargos; a A. não teria concluído o negócio se o Réu não tivesse assumido tal encargo, dado que apenas tinha interesse em camiões com duas camas; os mencionados veículos apresentavam as avarias descritas na p. i., a A. reclamou junto do Réu devido a esse facto e este havia garantido o bom funcionamento das viaturas durante um ano; efectuadas nos ditos veículos as necessárias reparações, como se descreve na p. i., realizadas em Abril, Maio, Agosto, Setembro e Outubro de 2007, no montante global de 14 282,62 € e remetidas ao Réu as correspondentes notas de débito e facturas, este não pagou; o Réu sempre aceitou e reconheceu o dever de reparar as viaturas e a obrigação de pagar as respectivas reparações.
O Réu contestou, por excepção e por impugnação.
Invocou, nomeadamente, que os veículos pesados de mercadorias foram vendidos e entregues à A. a 26.02.2007; a A. devia instaurar a acção a exigir a reparação dos pretensos defeitos no prazo de 6 meses após a denúncia, conforme o disposto nos art.ºs 916º e 917º, do Código Civil (CC), prazo há muito decorrido, pelo que o seu direito caducou; jamais prometeu à A. instalar uma segunda cama nos veículos, sendo que em toda a negociação nunca a A. sugeriu ao Réu que pretendia veículos com duas camas; não foi convencionada qualquer garantia.
Concluiu pela improcedência da acção.
A A. respondeu concluindo pela improcedência da matéria de excepção e como na p. i..
Foi proferido despacho saneador que relegou para final o conhecimento da excepção de caducidade e seleccionou-se, sem reparo, a matéria de facto (assente e controvertida).
Realizada a audiência de discussão e julgamento e decidida a matéria de facto, o tribunal recorrido julgou procedente a invocada excepção peremptória da caducidade e improcedente por não provada a presente acção e, em consequência, absolveu o Réu do pedido.
Inconformada e reafirmando a factualidade e a pretensão constantes da p. i., a A. interpôs recurso de apelação formulando as conclusões que assim vão sintetizadas: 1ª - O Tribunal recorrido deveria ter considerado provada a factualidade do art.º 2º da b. i. (base instrutória).
2ª - Atenta a prova produzida, nomeadamente o depoimento de José Sousa, constata-se que “(…) a empresa comunicou que queria que os camiões tivessem duas camas”, referindo-se, clara e inequivocamente, às viaturas 53-CX-54 e 53-DC-95.
3ª - Tal facto deve ser conjugado com a documentação junta aos autos, nomeadamente os orçamentos solicitados pela A. e a correspondência remetida ao Réu, e a demais factualidade, nomeadamente a que consta das alíneas H) e I).
4ª - O cumprimento integral do negócio dependia do facto dos camiões terem duas camas, questão que não se enquadra no domínio do cumprimento defeituoso do contrato (“stricto senso”)/compra e venda de coisa defeituosa mas no incumprimento do contrato (no sentido mais lato) - a A. negociou com o Réu a compra de dois camiões com duas camas, sendo que o Réu entregou dois camiões com uma cama.
5ª - Tratando-se de um incumprimento contratual, não se aplicam, nesse segmento, os prazos de caducidade previstos no regime da compra e venda de coisa defeituosa (art.ºs 913º e seguintes, do CC), aplicando-se as regras gerais do incumprimento contratual.
6ª - Considerando que o Réu foi notificado dos orçamentos para a inclusão de duas camas nos camiões vendidos, deve ser responsabilizado pelo pagamento de tais encargos, pelo que, nessa parte, deve improceder a excepção invocada pelo Réu.
7ª - Quanto às reparações efectuadas nas viaturas, a A. denunciou as avarias no prazo de 6 meses, contado da entrega das viaturas, e a acção deu entrada em juízo no prazo de 2 anos, após a denúncia, daí que também aqui improceda a excepção de caducidade invocada pelo Réu.
O Réu não respondeu à alegação da recorrente.
Atento o referido acervo conclusivo (delimitativo do objecto do recurso nos termos dos art.ºs 684º, n.º 3 e 685º-A, n.ºs 1 e 3, do Código de Processo Civil (CPC) [2], na redacção conferida pelo DL n.º 303/07, de 24.8), importa decidir: a) se existe erro na apreciação da prova; b) se a factualidade apurada integra situação de incumprimento do contrato; c) se ocorre a caducidade do direito de acção. * II. 1. A 1ª instância deu como provados os seguintes factos: a) A A. é uma sociedade por quotas que se dedica, no âmbito do seu objecto social, ao transporte de mercadorias e reparações de veículos. (A) b) O Réu dedica-se à actividade de venda e comercialização de veículos automóveis. (B) c) Em 20.02.2007, a A. e o Réu celebraram entre si, a primeira como compradora e o segundo como vendedor, contrato verbal que reciprocamente denominaram de contrato de compra e venda de três veículos automóveis, a saber: - Veículo marca “Scania”, modelo R114380, matrícula 53-CX-54, pelo preço de 30 250 €; - Veículo marca “Scania”, modelo R114380, matrícula 53-DC-95, pelo preço de 27 830 €; e - Veículo marca “Scania”, modelo R114380, matrícula 53-DC-94, pelo preço de 27 830 €. (C) d) A. e o Réu convencionaram que o preço da aquisição dos veículos automóveis, objecto do contrato de compra e venda...
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